Brasileiros no calcio

Roberto Carlos, um dos grandes desperdícios da história da Inter

Seu chute potente e preciso se tornou uma marca registrada e sinônimo de sucesso por onde passou. Menos na Itália. Não que sua passagem pela Inter tenha sido um fiasco, longe disso. Mas em meio a tantas estrelas que a equipe tinha na década de 1990, Roberto Carlos não conseguiu ter o destaque que o time nerazzurro esperava quando o contratou. O mesmo destaque que lhe garantiu o posto de uma dos melhores laterais esquerdos do mundo e símbolo de uma geração vitoriosa do Real Madrid, clube no qual foi jogar assim que deixou Milão.

A trajetória de Roberto Carlos na Itália não foi longa. Durou apenas uma temporada, a 1995-96. Antes disso, o lateral esquerdo de chute forte, muita velocidade e força física incomum para alguém de apenas 1,68m, já havia conquistado o Brasil, com os dois títulos brasileiros vestindo a camisa do Palmeiras – além de dois títulos paulistas e um Rio-São Paulo. Aquele time marcou época, consagrando não apenas ele, como diversos outros jogadores que também viriam a obter sucesso no continente europeu. Nessa mesma época, Roberto Carlos também iniciou a longa trajetória na seleção brasileira.

Com essas credenciais, Roberto Carlos chamava a atenção de grandes clubes europeus. O brasileiro acabou indo parar na Inter, depois de um acordo de cavalheiros entre os nerazzurri e o Parma. Para ocupar a última vaga de estrangeiro do elenco, a Beneamata queria fechar com o atacante búlgaro Hristo Stoichkov, do Barcelona, que havia vencido a Bola de Ouro da France Football no ano anterior. No entanto, os ducali acabaram acertando com o jogador e, como forma de compensação, deram carta branca para a Inter assinar com Roberto Carlos. À época, é bom lembrar, a família Tanzi, dona da Parmalat, controlava o Parma e financiava o Palmeiras, o que acelerou a negociação.

No meio da década de 1990, num negócio que envolveu o Parma, Roberto Carlos parou em Milão (Arquivo/Inter)

Dessa forma, a Beneamata investiu o equivalente a 7 milhões de dólares no jovem de 22 anos, que chegava para o lugar do holandês Wim Jonk, vendido ao PSV Eindhoven. Naquela mesma janela de mercado, a Inter também contratou Paul Ince e Javier Zanetti, e iniciava a montagem do elenco que seria campeão da Copa Uefa em 1997-98. Na primeira temporada de Massimo Moratti como proprietário do clube, Roberto Carlos foi a segunda contratação mais cara, atrás apenas de Ince.

Com força física e explosão, Roberto Carlos rapidamente se adaptou à Itália e ao estilo de jogo local. A Inter começou a temporada treinada por Ottavio Bianchi, mas a queda na primeira fase da Copa Uefa para o suíço Lugano fez com que o treinador fosse demitido – Luis Suárez, ícone interista nos anos 1960, assumiu interinamente. Apesar da fase negativa dos nerazzurri, Roberto Carlos teve um início fulminante: fez cinco gols em oito jogos, uma marca digna de um atacante.

Tudo, no entanto, mudou com a chegada do substituto de Bianchi. Segundo palavras do próprio jogador, foi o técnico Roy Hodgson (que hoje comanda a seleção inglesa) que selou sua saída ao final da temporada 1995-96. Sem lugar cativo na seleção brasileira, o lateral queria consolidar sua posição com a amarelinha, mas Hodgson insistia em colocar o brasileiro como meia aberto pela esquerda em seu 4-4-2 clássico. O inglês ainda considerava que Roberto, improvisado, era indisciplinado taticamente.

Roberto Carlos não recebeu a melhor utilização por parte de Hodgson (EMPICS/Getty)

“Como poderia jogar avançado com apenas um metro e meio? Gostava de ter espaço para jogar. É melhor ter 80 metros para correr que ter 20. Se continuasse assim, perderia meu espaço como lateral”, disse, certa vez, a uma rádio italiana. “Foi muito bom jogar na Inter, mas ainda bem que saí. Caso contrário não teria jogado por dez anos no Real Madrid”, completou.

Ao final da temporada, a Inter ficou com a sétima posição na Serie A, amargou a queda nas semifinais da Coppa Italia para a Fiorentina, mas ficou com uma vaga na Copa Uefa. Para Roberto Carlos, 34 jogos realizados e sete gols (número alto para um lateral), e a terceira posição na artilharia da Beneamata na temporada. Quando  a campanha acabou, o brasileiro implorou para Massimo Moratti deixá-lo sair. O presidente não fez vista grossa e liberou o jogador para negociar com o Real Madrid, com o qual assinou por um valor inferior ao que foi comprado pela Inter: 6 milhões de dólares.

A contratação de Roberto Carlos pelos merengues foi um pedido expresso de Fabio Capello, que dirigiu o Milan na única temporada do brasileiro na Itália. Após vencer tudo pelo Milan, o italiano foi confirmado como novo treinador blanco e levou consigo na bagagem um belo reforço do rival milanês. Anos depois, o lateral afirmou que Capello foi o mais importante treinador de sua carreira.

Roberto Carlos teve grande início no futebol italiano, mas questões táticas lhe fizeram trocar de clube (Arquivo/Inter)

Por outro lado, Hodgson permaneceu na Inter e voltou a criticar o brasileiro por questões táticas. O inglês não durou mais que uma outra temporada na Pinetina e deu lugar, provisoriamente a Luciano Castellini, que dirigiu a equipe nas duas últimas rodadas da Serie A. Para alguns, a derrota na final da Copa Uefa, para o Schalke 04, foi responsabilidade do inglês, que além de deixar Roberto Carlos sair, não soube aproveitar o que de melhor a equipe tinha. Para se ter uma ideia, até mesmo o sempre calmo e educado Zanetti demonstrou irritação com o técnico na partida de volta da final – desculpando-se em seguida.

O futuro fala por si só. Em dez anos na capital espanhola, Roberto venceu três Ligas dos Campeões, tanto quanto a Inter ganhou em 107 anos de história, e se tornou um dos maiores laterais esquerdos daquele período, com títulos mundiais conquistados por clube e Seleção.

Depois de uma década no time blanco, foi para a Turquia, já desacreditado e marcou época ao lado de Alex, no Fenerbahçe. Voltou ao Brasil para jogar pelo Corinthians e, mesmo aos 36 anos, conseguiu destaque, porém, problemas de convivência fizeram com que sua carreira não fosse encerrada em seu país natal. Se aventurou num projeto inovador do Anzhi, da Rússia, por dois anos. Ao final, iniciou lá mesmo sua carreira de treinador. Depois de ter treinado o Sivasspor – e feito uma campanha surpreendente –, deixou a equipe contra a vontade da torcida e hoje desbrava a Turquia como comandante do Akhisar Belediyespor, embora ainda deixe o sonho de voltar à Itália ou à Espanha para repassar seus ensinamentos.

Roberto Carlos da Silva
Nascimento: 10 de abril de 1973, em Garça (SP)
Posição: lateral-esquerdo
Clubes como jogador: União São João (1990-92), Atlético-MG (1992), Palmeiras (1993-95), Internazionale (1995-96), Real Madrid (1996-2007), Fenerbahce (2007-09), Corinthians (2010-11) e Anzhi (2011-12)
Clubes como treinador: Anzhi (2012-13), Sivasspor (2013-14) e Akhisar Belediyespor (2015)
Títulos: Copa do Mundo (2002), Copa das Confederações (1997), Copa América (1997 e 1999), Liga dos Campeões (1997-98, 1999-00 e 2001-02), Supercopa Europeia (2002), Copa Intercontinental (1998 e 2002), Campeonato Espanhol (1996-97, 2000-01, 2002-03 e 2006-07), Supercopa da Espanha (1997, 2001 e 2003), Supercopa da Turquia (2007), Campeonato Brasileiro (1993 e 1994), Torneio Rio-São Paulo (1993) e Campeonato Paulista (1993 e 1994)
Seleção brasileira: 125 jogos e 11 gols

Compartilhe!

1 Comentário

  • Em outras palavras, o técnico aí conseguiu a proeza de subaproveitar e subutilizar um Roberto Carlos novinho e com muito ainda para mostrar. Tanto que, por causa do técnico, ele saiu da Inter, foi para o Real Madrid e ganhou tudo por lá.

    Não é a toa que quando se fala de escolas formadoras de técnicos, sempre se fala de Alemanha, Portugal, Espanha e até mesmo de Itália e Argentina, mas Inglaterra sequer é mencionada.

    Quer dizer, na verdade é mencionada sim. Como importadora de técnicos. De técnicos alemães, portugueses, espanhóis, italianos e argentinos.

Deixe um comentário