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Hristo Stoichkov não repetiu no Parma o sucesso dos tempos de Barcelona

2 de julho de 1995. Naquele dia, o Parma dava o seu maior passo na tentativa se acomodar entre os grandes times da Itália e da Europa. No dia citado, duas décadas atrás, a equipe emiliana anunciava a contratação de Hristo Stoichkov, o primeiro jogador a ganhar uma Bola de Ouro que atuaria com as cores do clube. Antes dele, alguns jogadores de renome internacional já haviam passado pelo estádio Ennio Tardini, e títulos haviam conquistado, mas nenhum jogador com tanto cartaz jamais havia pisado os pés no centro de treinamentos da equipe, que seis anos antes estreava na elite italiana. O tiro, no entanto, saiu pela culatra: o búlgaro se converteu em um dos maiores flops da história recente da Serie A.

Stoichkov fechou com o Parma pouco depois de viver o auge da carreira. Um ano antes, ele era um dos principais nomes do Barcelona vencedor de Johan Cruijff, ao lado de Romário, Michael Laudrup, Andoni Zubizarreta e Ronald Koeman. Sagrava-se, também, artilheiro da Copa do Mundo de 1994, ao lado do russo Oleg Salenko, com seis gols. Na campanha histórica da Bulgária, que ficou com um quarto lugar, marcou um gol importante na fase de grupos contra a Argentina, e balançou as redes em todos os estágios do mata-mata: vitimou México, Alemanha e Itália, respectivamente. Parou em Roberto Baggio, a quem sucedeu como dono da Bola de Ouro, conquistada pelos feitos de 1994.

Em 1994-95, o búlgaro ainda jogava bem e era um dos atacantes mais temidos da Europa. Deixava o Barcelona apenas pelos constantes atritos com Cruijff. Ao mesmo tempo, seria a contratação que o Parma, financiado pela gigante de laticínios Parmalat, queria fazer para se impor como novo rico no cenário europeu. Claro, a equipe conquistou Recopa, Copa Uefa, Supercopa Europeia e Coppa Italia entre 1991 e 1995, mas era preciso mais. A ambição era maior.

A família Tanzi, dona da multinacional e do clube parmense, queria tanto um jogador com Stoichkov que fez um grande esforço. Os diretores costuraram um acordo com a Inter, que também queria contratá-lo para ocupar a última vaga de estrangeiro e estava mais perto de fechar com o jogador. O pacto entre os clubes leva os nerazzurri a desistirem do búlgaro em troca do direito de contratarem Roberto Carlos, então jogador do Palmeiras – o alviverde paulista, na época, era patrocinado e co-gerido pela Parmalat. Assim foi: o brasileiro viajou para Milão e o búlgaro para Parma. Ambos duraram apenas uma temporada na Itália.

Apesar da pompa, Stoichkov marcou apenas sete gols pelo clube gialloblù (Allsport)

Canhoto de grande habilidade, velocidade, chutes acrobáticos e bom aproveitamento nas bolas paradas, Stoichkov teve um bom início no Parma do técnico Nevio Scala. O treinador armava o time ocasionalmente no 4-3-3, e o Bola de Ouro era o centroavante do time; outras vezes, no 3-5-2, dividia o comando de ataque com seu principal parceiro no setor, Gianfranco Zola.

Logo na primeira rodada, gol do búlgaro: em sua estreia na Serie A, o camisa 8 marcou sobre a Atalanta, e muitas vezes tentou acionar Zola. No final, Christian Vieri empatou o jogo, frustrando a boa primeira partida da dupla. A rodada seguinte reservava o encontro entre Parma e Inter, Stoichkov e Roberto Carlos. O confronto teve boas atuações individuais da dupla: o brasileiro marcou um gol e acertou uma bomba na trave, e o búlgaro deu primorosa assistência para Dino Baggio marcar. 2 a 1 para o Parma, placar final.

Nos cinco primeiros jogos da temporada, Stoichkov já tinha quatro gols marcados e a artilharia da competição. Na 4ª rodada, contra a Fiorentina, fez seu primeiro no estádio Tardini, e na semana seguinte, diante do Padova, dois gols mostrando oportunismo. O sonho, porém, durou até o início de novembro, por volta da 9ª rodada. Na Recopa Europeia, o atacante fez um de seus principais jogos com a camisa gialloblù. O sueco Halmstad, de um jovem Fredrik Ljungberg, havia feito 3 a 0 na partida de ida das oitavas da competição. Para conseguir reverter a vantagem nórdica, Stoichkov entrou em ação, em uma das partidas mais emocionantes do futebol dos anos 1990.

O jogo tinha um componente de tensão a mais, já que Pippo Inzaghi, escalado como titular, estava de malas prontas para o Napoli. Logo aos 2 minutos, Stoichkov achou o atacante com um belo passe, e o placar foi aberto – até hoje, o ex-ídolo do Milan considera este como um dos gols mais importantes da carreira, porque a torcida pressionou a diretoria a não liberá-lo, e sua permanência foi selada. Depois disso, mais uma assistência, desta vez para Dino Baggio. No segundo tempo, o búlgaro ainda marcou um golaço de falta, e só não participou da jogada do gol de Antonio Benarrivo, que deu a classificação aos ducali.

Depois dessa atuação, Stoichkov teve apenas espasmos de sua classe. O blecaute do jogador teve, principalmente, um motivo ligado à forma física. Desde que chegara à Itália, apesar das boas partidas, o búlgaro raramente conseguia terminar as partidas sem ser substituído, e parecia pouco motivado com a realidade da cidade de Parma e com os treinamentos. Reapareceu para o futebol apenas em janeiro, quando fez boa partida contra a Inter, em San Siro, e em março, quando fez o gol da vitória do Parma sobre o Paris Saint-Germain, na ida das quartas da Recopa. Na volta, com dois de Raí e 3 a 1 no placar, os franceses eliminaram os italianos.

Além da habilidade, Stoichkov também era conhecido pelo pavio curto e personalidade forte. Com a eliminação na Recopa, isso começou a aparecer com mais força. O jogador declarou se sentir entediado com o futebol italiano, que privilegiava a força física e a tática em detrimento dos gols. Também atacou os torcedores, que disse se comportarem “como se fossem ver uma peça de teatro”. Arrumou bodes expiatórios para manifestar o seu desejo de deixar o clube após uma temporada de poucos altos e muitos baixos, em que raramente se entendeu em campo com Zola. A última partida do búlgaro pelos ducali foi na 30ª rodada da Serie A: saiu do banco para ver a equipe perder por 2 a 1 com a Lazio, em Roma.

No final das contas, o búlgaro passou longe de corresponder às expectativas de quem pagou 12 bilhões de liras para tê-lo em um contrato de três anos, que passou longe de ser cumprido até o seu fim. Na única temporada em que ficou no clube, realizou 31 partidas e sete gols com a camisa crociata, em tempos de entressafra. Em 1995-96, o Parma ficou com o 6º lugar na Serie A, caiu no primeiro turno da Coppa Italia e nas quartas da Recopa.

Nevio Scala, assim como Stoichkov, deixou o clube. O Parma voltou a vencer apenas a partir de 1998, com Alberto Malesani no comando técnico, e estrelas como Gianluigi Buffon, Lilian Thuram, Fabio Cannavaro, Juan Sebastián Verón e Hernán Crespo entre os titulares de uma equipe fortíssima. Já Stoichkov, com a saída de Cruijff do Barça, retornou à Catalunha para fazer uma temporada apenas regular no Camp Nou e entrar na fase descendente da carreira. A Parmalat, por sua vez, tentou diminuir o prejuízo: contou com o búlgaro como garoto-propaganda nos Estados Unidos e no Leste Europeu até falir, em 2004.

Stoichkov e Deschamps disputam bola em um dos acirrados Parma-Juventus dos anos 1990 (Allsport)

O restante da carreira
Antes de chegar ao Parma, Stoichkov havia garantido seu lugar na história como o maior jogador búlgaro da história. Além dos prêmios individuais já mencionados e da histórica campanha com a Bulgária no Mundial de 1994, ele teve momentos gloriosos com as camisas de CSKA Sofia e Barcelona.

Nas quatro temporadas em que atuou como titular do maior clube da Bulgária, Stoichkov virou um semideus – tanto é que o vilarejo em que nasceu, Yasno Pole, próximo a Plovdiv, mudou o nome para Stoichkovo, em sua homenagem, no ano de 1997. No último ano no CSKA, o atacante chegou a marcar 38 gols em 40 jogos, uma média absurda, que lhe valeu a Chuteira de Ouro como maior goleador europeu, em 1990.

Depois disso, assinou com o Barcelona, e fez parte de uma das gerações mais vitoriosas do clube: ganhou quatro títulos espanhois e uma Copa dos Campeões, diante de uma forte Sampdoria. Em sua primeira passagem pela equipe blaugrana, anotou 114 gols em 225 jogos, uma média de um gol a cada dois jogos.

Após deixar o Parma, Stoichkov teve, ainda, passagem de um ano e meio pelo Barcelona, antes de rodar o mundo em campeonatos de menor expressão, mas com altos salários – Arábia Saudita, Japão e Estados Unidos. Pela seleção da Bulgária, participou de dois Mundiais – 1994 e 1998 – e uma Euro, a de 1996. É o terceiro maior artilheiro dos Leões, com 38 gols – superado apenas por Hristo Bonev e Dimitar Berbatov. Depois de encerrar a carreira de jogador, Stoichkov ainda treinou a Bulgária por três anos, sem obter sucesso. Como treinador, aliás, o seu desempenho é de se esquecer. Assim como quase toda a sua passagem pelo Parma.

Hristo Stoichkov
Nascimento: 8 de fevereiro de 1966, em Plovdiv, Bulgária
Posição: atacante
Clubes: Hebros (1982-84), CSKA Sofia (1984-90 e 1998), Barcelona (1990-95 e 1996-98), Parma (1995-96), Al Nassr (1998), Kashiwa Reysol (1998-99), Chicago Fire (2000-02) e DC United (2003)
Títulos: Copa dos Campeões (1992), Supercopa Europeia (1992 e 1997), Recopa Europeia (1997), La Liga (1991, 1992, 1993, 1994 e 1998), Supercopa Espanhola (1992, 1994 e 1996), Copa do Rei (1997), Campeonato Búlgaro (1987, 1989 e 1990), Copa da Bulgária (1985, 1987, 1988 e 1989), Supercopa da Bulgária (1989), Recopa Asiática (1998) e US Open Cup (2000)
Carreira como técnico: Bulgária (2004-07), Celta de Vigo (2007), Mamelodi Sundows (2009-10), Litex Lovech (2012-13) e CSKA Sofia (2013)
Seleção búlgara: 84 jogos e 38 gols

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