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Srecko Katanec mostrou sua polivalência na era de ouro da Sampdoria

Volante de origem, muito tempo de serviços prestados como defensor e também com capacidade para ajudar no ataque. O perfil de faz-tudo colocou Srecko Katanec numa posição privilegiada: o jogador chegou ao patamar mais elevado do futebol da Iugoslávia e da Eslovênia, além de ter feito parte de um dos mais importantes times italianos dos anos 1990. Katanec parou no auge, ainda jovem para os padrões atuais, mas entrou para a história da Sampdoria como parte da era de ouro dos blucerchiati.

Nascido em Liubliana, hoje capital da Eslovênia, Katanec começou no futebol local, atuando pelo Ljubljana nos juvenis e, depois, pelo Olimpjia. Com apenas 18 anos, fez sua estreia como profissional em 1980, mas foi se destacar dois anos depois, quando assumiu a titularidade e mostrou uma de suas grandes virtudes: o jogo aéreo ofensivo. Antes de jogar por Dinamo Zagreb e Partizan, dois dos principais times da antiga Iugoslávia, Srecko disputou a Eurocopa e a Olimpíada de 1984. Em Los Angeles, os iugoslavos deram um aperitivo da geração que estavam construindo e conquistaram a medalha de bronze.

Katanec participou pela segunda vez dos Jogos Olímpicos, em 1988, já que naquela época ainda não havia restrição de idade aos elencos. Depois de disputar a competição, em Seul, o volante se transferiu ao Stuttgart. Pelos suábios, Katanec ganhou um maior destaque continental, visto que foi vice-campeão da Copa Uefa em 1988-89, única temporada em que atuou na Alemanha. O esloveno chamou atenção da Sampdoria e rumou à Itália.

Naqueles anos, a equipe de Gênova vinha formando um time consistente e traçando planos ambiciosos sob o controle do presidente Paolo Mantovani. Srecko se juntou a um elenco que já tinha como pilares Gianluca Pagliuca, Pietro Vierchowod, Toninho Cerezo, Roberto Mancini e Gianluca Vialli, por exemplo. Logo em seu primeiro ano na Velha Bota, Katanec alternou atuações como zagueiro, volante e lateral-esquerdo e marcou gols importantes na Serie A. Começou garantindo um empate por 3 a 3 contra a Udinese – jogo que a Samp perdia por 3 a 0 –, anotou o tento solitário na vitória sobre a Atalanta e, no returno, uma doppietta no empate por 2 a 2 com a Dea. Além disso, conquistou a Recopa, primeiro título continental blucerchiato.

O desempenho ao longo da temporada fez com que sua convocação à Copa do Mundo de 1990 fosse mera formalidade. Katanec, então com 26 anos, era uma das principais referências para uma boa participação da Iugoslávia. Na edição de junho de 1990 da Revista Placar, o defensor era tratado como um fenômeno da seleção do Leste Europeu. “Ele é uma espécie de ‘faz-tudo’ no esquema de Ivica Osim. Nos seus pés está a obrigação de ajudar a defesa, bloquear as investidas dos adversários no meio-campo – é um excelente ladrão de bola – e, como se não bastasse, apoiar o ataque”, escreveu a revista.

Katanec jogou cinco anos pela Sampdoria (Soccer Nostalgia)

Na Copa, apesar da grande expectativa, Katanec teve uma participação discreta e foi titular em três dos cinco jogos da Iugoslávia. Porém, o defensor ficou marcado por um fato inóspito. Srecko estava no banco de reservas no duelo que culminaria na eliminação para a Argentina, nas quartas de final. No intervalo, ele se dirigiu até o árbitro Kurt Röthlisberger para reclamar da expulsão de Refik Sabanadzovic e não voltou para o segundo tempo porque acreditava ter sido expulso. Somente no dia seguinte, tomou conhecimento de que o fato não foi mencionado no relatório da partida.

Como o Mundial ocorreu na Itália, Katanec não precisou sair do país que já considerava sua casa. Em entrevista à Gazzetta dello Sport, o jogador ressaltou como Mancini e Vialli o recepcionaram de forma calorosa e lhe fizeram se sentir confortável em Gênova. O esloveno também contou que o treinador Vujadin Boskov e seus auxiliares sabiam tudo sobre ele. Como, na época, o número de estrangeiros por equipe da Serie A era limitado a três, os clubes eram obrigados a serem cuidadosos na hora de adquirir jogadores de outras nações. “Se você não rendesse, voltava para seu país”, concluiu Srecko.

Katanec não sofreu com a ameaça de voltar à Iugoslávia. Com sua polivalência, era um dos jogadores que sempre quebravam o galho para Boskov e conquistou todos os títulos locais, como a Serie A de 1990-91. Srecko ainda foi vice-campeão europeu, em 1992, frente ao Barcelona. Feitos que, na opinião do próprio jogador, dificilmente serão reeditados. “Aquele time era fortíssimo. A começar pela figura de Paolo Mantovani, que falta no futebol de hoje, e um belíssimo grupo”, declarou.

Em 1992, além de ter sido vice na Copa dos Campeões, Katanec viveu uma grande decepção, pela exclusão da Iugoslávia da Eurocopa. O país atravessava uma guerra sanguinária, que resultou na independência de diversas repúblicas, como a Eslovênia de Srecko. Por causa de uma resolução da Organização das Nações Unidas, a ONU, a Iugoslávia recebeu sanções como um embargo comercial e o banimento em eventos esportivos. A seleção foi substituída na Euro pela Dinamarca, que viria a ficar com o título. Apesar de ter jogadores fora de série e ser uma das favoritas, Katanec não acreditava no título. “Talvez tivéssemos vencido, talvez não. No fundo, creio mais na segunda hipótese”, ponderou.

Aquele ano também marcou o fim do ciclo de ouro na Sampdoria. As saídas do técnico Boskov e de outros jogadores importantes, seguidas pelo falecimento de Mantovani, em 1993, fizeram com que a equipe caísse em termos de rendimento, o que culminaria num rebaixamento no final da década. Para Srecko, a decadência veio antes: nas temporadas 1992-93 e 1993-94, ele fez apenas 11 partidas, devido a uma série de lesões. Com o fim de seu contrato com o clube de Gênova, se despediu depois de 126 aparições e 17 gols pelos blucerchiati.

Versátil, o esloveno executou diversas funções no meio-campo e na defesa da Sampdoria (Imago/Kicker)

Em 1994, Katanec também fez seus únicos jogos pela seleção de sua terra natal. A equipe da Eslovênia havia estreado oficialmente dois anos antes, mas os problemas físicos de Srecko atrasaram sua estreia. No total, o volante fez quatro amistosos e atuou num confronto válido pelas Eliminatórias da Eurocopa – sempre como capitão. A partida pela qualificatória do torneio continental, contra a Itália, em setembro de 1994, calhou de ser a última da carreira de Katanec: aos 31 anos, o craque pendurava as chuteiras.

Embora tenha atuado pouco pela Eslovênia, Srecko entraria de vez para a história do país como técnico, anos mais tarde. O ex-defensor deu seus primeiros passos pela equipe nacional sub-21 e pelo Gorica até ser escolhido para o cargo de treinador do selecionado principal. Com sua experiência, ajudou a revigorar o futebol local e levou a seleção para sua primeira participação na Euro e na Copa do Mundo, em 2000 e 2002, respectivamente.

Katanec deixou os alpinos para treinar o Olympiacos, em 2002-03, mas não voltou a ter sucesso na carreira: rodou pelas seleções da Macedônia do Norte, dos Emirados Árabes Unidos e teve nova passagem pela Eslovênia, porém não obteve grandes feitos. Em setembro de 2018, o técnico assumiu a seleção do Iraque, com o objetivo de fazer os Leões da Mesopotâmia voltarem a uma Copa do Mundo após 36 anos de ausência.

O ex-jogador sabia que o desafio seria grande e deixou isso claro logo em sua apresentação. Na prática, a sua impressão se confirmou: logo na primeira competição oficial, a Copa da Ásia de 2019, o time não passou das oitavas de final. Foi eliminado pelo anfitrião, o Catar, que viria a ficar com o título. O trabalho de Katanec ainda está no início e a experiência do esloveno, sobretudo por seus conhecimentos táticos de movimentos defensivos, é considerada providencial para que a equipe iraquiana se consolide.

Srecko Katanec
Nascimento: 16 de julho de 1963, em Liubliana, Eslovênia (antiga Iugoslávia)
Posição: defensor e volante
Clubes como jogador: Ljubljana (1979-81), Olimpija Ljubljana (1981-85), Partizan (1986-88), Stuttgart (1988-89) e Sampdoria (1989-94)
Títulos como jogador: Bronze Olímpico (1984), Campeonato Iugoslavo (1987), Serie A (1991), Coppa Italia (1994), Supercopa Italiana (1991) e Recopa Uefa (1990)
Carreira como treinador: Eslovênia Sub-21 (1996-98), Gorica (1998), Eslovênia (1998-2002 e 2013-17), Olympiacos (2002-03), Macedônia do Norte (2006-09), Emirados Árabes Unidos (2009-11), Iraque (2018-atual)
Seleção iugoslava: 31 jogos e 5 gols
Seleção eslovena: 5 jogos e 1 gol

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