Serie A

O adeus aos herois

Os 11 titulares da final que marcou o fim de uma era vencedora na Inter. Desses, apenas Samuel, Chivu, Zanetti, Cambiasso e Milito seguem no elenco interista (Inter.it)

Em 2009-10, a Internazionale encerrava um ciclo vitorioso com o pentacampeonato italiano, mais uma conquista da Coppa Italia e a tão sonhada Liga dos Campeões, que voltava a ser vencida depois de um jejum de 45 anos. A temporada havia sido de sonho com o comando de José Mourinho. Os nerazzurri contavam com um sistema defensivo sólido, o camisa dez Sneijder como protagonista no meio-campo e Diego Milito decidindo com os gols – marcou em todas as partidas decisivas do triplete.

Na final da Liga dos Campeões, a Inter foi escalada por José Mourinho no seu habitual 4-2-3-1 com Júlio César; Maicon, Lúcio, Samuel e Chivu; Zanetti e Cambiasso; Eto’o, Sneijder e Pandev; Milito. Com esta formação e os dois gols do centroavante argentino, os nerazzurri venceram por 2 a 0 o Bayern de Munique e conquistaram a taça das grandes orelhas.

O técnico português foi um dos grandes responsáveis pelo título e confirmou que iria treinar o Real Madrid após levantar a taça no Santiago Bernabéu. Porém, mesmo com a saída do comandante, a Inter optou pela manutenção da base campeã e resistiu às propostas pelos principais jogadores. A exceção foi o importante reserva Balotelli, que foi negociado com o Manchester City por 22 milhões de euros. O objetivo era tentar repetir o desempenho da temporada perfeita, pois, em tese, o grupo era vencedor, bem entrosado e mantinha o desejo de vencer todas as competições que disputasse.

Porém, depois da saída de José Mourinho, a Inter pareceu ter perdido o fôlego e ambição para acumular títulos. Os primeiros movimentos do novo treinador Rafa Benítez mostraram isto: derrota na Supercopa da Europa para o Atlético de Madrid e início ruim na Serie A. Milito não repetia o desempenho do triplete e, com isso, o camaronês Eto’o assumia o protagonismo. Muitas vezes, o talento do camisa 9 era o único responsável pela conquista de importantes pontos para que o clube não ficasse ainda pior nas competições que disputava.

Apesar dos problemas sob o comando de Benítez, a Inter venceu com facilidade o Mazembe e foi campeã do Mundial de Clubes em dezembro de 2010. Mas foi com Leonardo que os nerazzurri se recuperaram na Serie A, ameaçaram o título do Milan e conquistaram a Coppa Italia, onde Eto’o mais uma vez esteve em destaque. Mas, com o brasileiro no banco de reservas, a Beneamata parou nas quartas de final da Liga dos Campeões, depois de sofrer derrota desmoralizante para o Schalke 04 por 7 a 3 no placar agregado – 5 a 2 no Giuseppe Meazza.

O desmanche começou para valer na temporada 2011-12. Logo no início do ano, Pandev foi para o Napoli por empréstimo, Materazzi se aposentou e, o principal destaque do ano anterior, Eto’o, deixou o clube para jogar no Anzhi. Mas outras mudanças vieram na janela de inverno: Thiago Motta, que atuou bastante na conquista do triplete, foi para o Paris Saint-Germain e Muntari, que veio do banco no 2 a 0 contra o Bayern, foi emprestado ao Milan. Logo após a saída de Milão, o ítalo-brasileiro explicou à Gazzetta os motivos de ir jogar na França: “A saída de Eto’o afetou muito o time, ele era quem poderia sempre fazer a diferença”. Thiago Motta havia percebido que com o mesmo grupo, os títulos não voltariam à Appiano Gentile. Faltava motivação.

Ao contrário do primeiro ano após o triplete, a manutenção dos campeões já não se mostrava tão importante e passava longe de ser garantia de sucesso. Ao mesmo tempo que os jogadores renomados saíam, a Inter apostava em atletas mais jovens e, no elenco principal, o espaço para a categoria de base aumentava.

Em recente entrevista à revista El Grafico, Cambiasso tratou como natural a queda do elenco depois do acumulado de conquistas e isentou Mourinho de culpa de uma eventual queda física e psicológica do time. “Desde que ele saiu, falou-se muito disso, mas acho que depois de um ano, em que ganha tudo é normal ter uma queda, pois as expectativas são para ganhar tudo de novo, mesmo que estejamos com menos energia do que antes. [O degaste de um elenco após ganhar tudo] Não é um problema exclusivo de equipes treinadas por Mourinho”. Esta baixa tratada como natural por um dos líderes do elenco para alguns jogadores não durou apenas uma temporada e foi um atalho para a saída de Milão.

Os brasileiros Júlio César, Maicon e Lúcio, que foram muito bem em 2009-10, já não rendiam o mesmo que antes. O protagonista na criação de jogadas, Sneijder também pouco aparecia em campo e vivia às voltas com lesões. O holandês jogou nos primeiros dois anos de contrato 78 vezes e, neste último um ano e meio, foram apenas 37 participações. Além da queda de rendimento em campo, o sucesso que os atletas conquistaram com a Inter fez com que muitos contratos do elenco fossem renegociados em momentos de alta e os custos salariais dos nerazzurri subiram. Por outro lado, dentro de campo o rendimento era ruim em relação aos vencimentos recebidos.

Os insucessos em 2011-12 consumiram técnicos. Gian Piero Gasperini foi um desastre, Claudio Ranieri teve bons resultados, mas não foi constante e, na reta final, o jovem Andrea Stramaccioni foi escolhido para conduzir o processo de renovação nerazzurro e conseguiu classificar a Inter para a Liga Europa. Com o treinador romano, o espaço para os campeões, que não rendiam bem, diminuiu e, no início de 2012-13, três titulares dos anos mais vencedores foram negociados. Lúcio, após recisão amigável, acertou com a Juventus; Júlio César, que perderia espaço com a chegada de Handanovic, foi jogar no Queens Park Rangers e Maicon acertou com o Manchester City.

O dinheiro recebido com as transferências foi mínimo, mas a Inter economizou 13 milhões de euros anuais com a liberação do trio. As baixas da base campeã de tudo seguiram com as aposentadorias de Córdoba e Orlandoni, reiterando que o elenco de 2009-10 contava com muitos veteranos. A saída da dupla limpou outros 3,2 milhões de euros da folha salarial interista. No ambiente de crise europeia, a aposta na base e o corte de gastos foi a alternativa encontrada pelos clubes italianos e a Inter não fugiu disso.

Mas um dos jogadores com maior salário da Itália ainda seguia sem futuro definido. Sneijder perdia importância no elenco, devido às lesões, e a equipe já havia ganhado outra forma de jogar sem ele – com Guarín, Coutinho, Cassano e Palacio. Ele relutava em renegociar seu salário e, depois de meses de impasse e longa negociação, o holandês não aceitou o corte de cerca dois milhões de euros anuais e também deixou a Inter para jogar no Galatasaray por 7,5 milhões de euros. Os turcos pagaram 6 milhões para Wes assinar e, além do salário de 3,5 milhões anuais, ofereceram diversos bônus para o jogador.

Com a saída de Sneijder em janeiro de 2013, dos 11 titulares da final, apenas cinco continuam no elenco e, dos sete que estiveram no banco de reservas, apenas Mariga e Stankovic seguem na Inter. A reconstrução parece estar próxima da conclusão, pois a maior parte dos remanescentes dos anos de glória está se aproximando da aposentadoria que deve ocorrer vestindo nerazzurro. Por outro lado, ao fim da temporada, o contrato de Samuel se encerra e ele pode deixar o clube juntamente a Milito, que pode retornar ao Racing.

Para o futuro, o caminho deve ser seguir apostando em Stramaccioni e em jogadores da base do clube, que tem tido sucesso nos últimos anos. Além disso, com as saídas dos campeões, a folha salarial foi desafogada e, aos poucos, a tendência é que o poder de investimento seja recuperado. Os atuais alvos de mercado da Inter (Belhanda, van der Wiel, Jung, Quintero, Weiss e Schelotto, por exemplo) mostram que a renovação pode acontecer com qualidade.

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