Nascido em Catania, no sul da Itália, Pietro Anastasi fez história no futebol italiano entre o final dos anos 60 e os anos 70, principalmente vestindo o preto e branco da Juventus. O bomber, além de marcar gols de todas as formas, tinha duas características peculiares: a incrível velocidade e os dribles. Por ter a pele mais amorenada e ter sido um dos primeiros jogadores sicilianos a brilharem no futebol italiano, justamente na Juve da industrial Turim, acabou sendo um ponto de referência para muitos imigrantes e operários. Sobretudo entre os trabalhadores de origem sulista da Fiat, comandada, assim como a equipe turinense, pela família Agnelli.
Antes de virar jogador, sua vida na Sicília era modesta, e a família, composta por sete pessoas, se dividia em dois quartos. O futuro craque parecia não prestar atenção nisso e, quando não estava na escola, estava na praça jogando o futebol. Nesta época, foi chamado de Pietruzzu, apelido de origem siciliana que o acompanhou durante a vida.
Sua trajetória começa ainda na Sicília, na Massiminiana, onde, em seu segundo ano, com menos de 18 anos, marcou 18 gols e ajudou o clube fundado no final dos anos 50 por Giuseppe Massimino, irmão do presidente do Catania, Angelo, a alcançar a Serie C. Porém, após dois anos jogando em sua cidade natal, o menino do sul foi ganhar a parte de cima da Bota. A porta de entrada no norte italiano foi o Varese, à época, integrante da Serie B.
Com Anastasi no elenco, os Leopardi foram promovidos à primeira divisão. No ano seguinte, os 11 gols do atacante foram fundamentais para clube terminar o campeonato na oitava posição. Naquele campeonato, o jogador de menos de 20 anos chamou a atenção da Juventus ao realizar uma tripletta contra a própria Velha Senhora, em uma goleada por 5 a 0. Na época, o Varese brigava com o Milan e era vice-líder, mas acabou tendo um fim de temporada ruim e caiu para o meio da tabela.
O destaque por um clube pequeno na elite o colocou na seleção principal e logo na Eurocopa 1968 disputada em casa – à época, apenas quatro times participavam da fase final da competição, que durava somente cinco dias. Nas duas finais, frente à Iugoslávia, Anastasi foi titular e marcou o segundo no 2 a 0 decisivo. Além da participação de Pietruzzu, o título teve gols de Domenghini (no empate, em 1 a 1, no primeiro jogo) e de Riva (o primeiro do segundo jogo).
Este desempenho chamou a atenção de dois gigantes. A Inter foi a primeira a se aproximar de Anastasi, que chegou a ser fotografado como interista, mas a alegria não foi dos nerazzurri. A Juventus atravessou o negócio no dia em que foi goleada pelo Varese e teve um acerto verbal com o presidente da equipe varesina – reza a lenda que Gianni Agnelli, então presidente do clube, foi aos vestiários e acertou tudo com o dirigente Giovanni Borghi.
Pelo negócio, a Juve desembolsou cerca de 650 milhões de liras (valor recorde para a época) pelo jogador, mas nunca se arrependeu de gastar esta quantia. A partir dali, Anastasi começaria a escrever sua história como um “atacante do povo”, já que havia saído de uma vida pobre e, sozinho, estava começando a ser importante. Era como Anastasi que muitos queriam ser.
Anastasi se tornou ídolo bianconero rapidamente, e já na primeira temporada fez 15 gols na Serie A, se consagrando como o vice-artilheiro da disputa. Em 1969-70, o atacante repetiu o número de gols no campeonato. Apesar de ir bem em campo, o jogador constantemente entrava em atrito com o técnico Heriberto Herrera, que tinha obsessão pela organização tática, enquanto Anastasi preferia jogar um futebol mais solto, dado ao improviso.
Como o técnico da Squadra Azzurra, Ferruccio Valcareggi, gostava de seu futebol, não ligava para isso, tudo levava a crer que o juventino estaria na Copa do México. E ele foi convocado, mas uma estranha lesão na concentração da Itália para o Mundial de 1970, já em solo mexicano, o deixou de fora da disputa.
Anastasi estava importunando o massagista Tresoldi, para se divertir, e apesar de ter sido advertido pelo terapeuta, continuou. Impaciente, o profissional da saúde respondeu com um soco no baixo ventre do jogador, que teve de operar os testículos e acabou sendo cortado da seleção juntamente ao meia Giovanni Lodetti – Pierino Prati e Roberto Boninsegna os substituíram, já que Valcareggi optou por preencher a lacuna chamando dois atacantes para substitui-lo. Esta foi uma das maiores decepção de sua carreira, e Anastasi sempre se lembrou do caso com um sorriso amargo no rosto.
Após se recuperar, Anastasi voltou a ser destaque e, no vice-campeonato da antiga Copa das Feiras, marcou dez vezes, terminando como artilheiro do torneio. Para o jogador, ao menos ficou o dado estatístico: foi ele que marcou o último gol da história do torneio que daria lugar à Copa Uefa. Faltavam títulos por clubes na carreira, lacuna que foi preenchida na temporada 1971-72, quando a Juventus venceu a Serie A, com 11 gols seus – naquele ano, ele foi o artilheiro da equipe no campeonato. No ano seguinte, a Juventus conquistou o bicampeonato, mas Anastasi não teve destaque na tabela de goleadores.
O grande ano da carreira veio após participação discreta na Copa de 1974, quando a Itália vacilou e foi eliminada na primeira fase, e o atacante marcou só um gol, frente ao Haiti. Após o vexame, Anastasi acabou sendo um dos poucos poupados pela torcida, que esperou a seleção italiana com ovos podres no aeroporto de Malpensa, em Milão, obrigando os azzurri a saírem por uma porta de emergência, e escoltados pela polícia.
Na temporada que viria, ele foi campeão italiano, em campanha em que marcou nove vezes. Três desses gols foram marcados em uma goleada por 4 a 0 sobre a Lazio campeã italiana no ano seguinte, conduzida dentro de campo por Giorgio Chinaglia e Bruno Giordano e, fora dele, por Roberto Lovati, que substituía temporariamente treinada por Tommaso Maestrelli, operado por câncer no fígado. Além disso, o atacante ajudou a Vecchia Signora a chegar à última fase de grupos da Coppa Italia. Os bianconeri não foram finalistas, mas Anastasi terminou como artilheiro, com nove gols – até hoje, Anastasi é o maior artilheiro da Juventus na competição, com 30 tentos.
O ano seguinte, porém, seria de mudanças para o jogador. Após ser afastado pelo técnico Carlo Parola, com quem teve alguns atritos, Pietruzzu se despediu da Juventus, meio chateado por não ter sido tido a solidariedade de velhos companheiros, como Giuseppe Furino, Francesco Morini e Roberto Bettega. Porém, o atacante ficou marcado no coração dos torcedores, que, em algumas fases, o apelidaram como “Superpietro” e até mesmo como “Pelé branco”.
Em 1976, Anastasi finalmente foi jogar na Inter e Boninsegna fez o caminho inverso. Mas, vestindo nerazzurro, o atacante não repetiu as atuações que lhe renderam as comparações com Pelé. Em duas temporadas em Milão, foram 66 partidas, 13 gols e apenas um título, o da Coppa Italia, em 1977-78.
Antes de encerrar a carreira, Pietruzzu jogou mais três temporadas na Serie A, pelo Ascoli, novamente sem tanto brilho individual. No entanto, em 1979-80, fez parte do elenco treinado pelo eficiente técnico Gibì Fabbri, que levou os ascolanos à quarta posição, a melhor na história do clube. Anastasi foi titular naquele time, jogando um pouco mais afastado da meta adversária, e marcou cinco gols na campanha. Pelo Ascoli, o atacante também faturou um torneio internacional, a Red Leaf Cup, e o Torneio de Capodanno, organizado pela Federação Italiana.
Anastasi pendurou as chuteiras jogando pelo Lugano, da Suíça, pelo qual atuou 14 vezes e marcou 10 gols. Depois de encerrar a carreira, o ex-jogador chegou a atuar como comentarista de algumas redes de televisão italianas, e volta e meia era chamado para dar a sua opinião sobre algum tema relacionado ao futebol.
Isso ocorreu até que o ex-jogador adoeceu, acometido de um tumor intestinal. Quando retirou o abscesso, Pietruzzu foi diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica, condição que o abateu. Depois de três anos convivendo com este mal degenerativo, que não tem cura e o fazia sofrer, Anastasi optou pela morte assistida, em janeiro de 2020.
*Atualizado em fevereiro de 2020.
Pietro Anastasi
Nascimento: 7 de abril de 1948, em Catania, Itália
Morte: 17 de janeiro de 2020, em Varese, Itália
Posição: atacante
Clubes: Massiminiana (1964-66), Varese (1966-68), Juventus (1968-76), Inter (1976-78), Ascoli (1978-81) e Lugano (1981-82)
Títulos: Serie D (1966), Jogos do Mediterrâneo (1967), Eurocopa (1968), Serie A (1972, 1973 e 1975), Coppa Italia (1978), Red Leaf Cup (1980) e Torneio de Capodanno (1981)
Seleção italiana: 25 jogos e oito gols.