Serie A

Um Milan em busca de alegria

Infelizmente não deu: Allegri se perdeu e acabou sendo demitido pelo Milan, fato raro na Era Berlusconi (AFP)

Depois de três anos e meio, Massimiliano Allegri deixou o comando do Milan nessa segunda-feira. Uma passagem contestada, marcada por altos e baixos e um futebol pouco atraente. Curiosamente, o toscano foi apenas o quinto treinador a ser demitido em 27 anos desde que Berlusconi comprou o Diavolo – foram dez treinadores ao longo deste período, e apenas Liedholm, Tabárez, Zaccheroni e Terim saíram no meio da temporada.

Até então o único treinador rossonero na segunda década do século XXI, Allegri conduziu o time que conquistou dois títulos, o scudetto e a Supercoppa Italiana, ambos em 2011, e em três temporadas completas terminou sempre entre os três primeiros na Serie A, sendo duas vezes semifinalista da Coppa Italia. Na Champions League, cruzamentos complicados e a queda técnica e financeira do futebol italiano não permitiram que o Milan fosse além de duas oitavas e uma quarta de final. Um desempenho mais que aceitável, e não só em termos de conquistas, mas de números (veja tabela abaixo).

Treinadores | Pontos por partida | Porcentagem de vitórias

Argumentos que credenciam Allegri como o segundo melhor treinador da era Berlusconi considerando as médias de pontos/jogo, atrás apenas de Carlo Ancelotti. Apesar disso, o livornês vinha perdendo crédito com Silvio Berlusconi.

Nas duas últimas temporadas, essa média poderia abaixar muito, não
fosse a recuperação a partir da metade da temporada 2012-13. Somando-se
os primeiros turnos desta e da temporada anterior, o Milan teria
retrospecto similar ao de times que brigam contra o rebaixamento.

Brigar
para não cair é o objetivo da equipe, que tem 22 pontos em 19 jogos e
está apenas seis pontos acima do Bologna, que abre a zona da degola. Após primeiro
semestre fraco, Allegri caiu em 13 de janeiro de 2014, um dia após a virada
sofrida para o Sassuolo do garoto Berardi e novo primeiro turno
tenebroso para os rossoneri. A demissão que não veio por pouco na temporada passada, enfim aconteceu.

Galliani vinha segurando o treinador por dois anos, mesmo com as ameaças de demissão de Silvio Berlusconi. Inclusive, a queda de Allegri é uma clara amostra de que o dirigente perde espaço para Barbara Berlusconi, com quem não tem a melhor das relações – já falamos sobre como o desprestígio de Galliani atrapalha o Milan aqui. Conhecido pela elegância com os funcionários, em um comportamento
chamado de “stile Milan”, faltou estilo na hora de demitir o treinador
(efeito Barbara?): o clube emitiu uma nota deixando claro que o técnico
havia deixado o clube de forma definitiva. Rumores ainda dão conta de
que Allegri foi avisado da demissão por telefone, enquanto estacionava
no CT do clube.

O peso dos erros

Diferentemente de seus antecessores, Allegri não contou com um elenco do padrão Milan, mas os talentos individuais sempre estiveram em Milanello. E nisso os milanistas ficam na bronca com o livornês: seus times sempre dependeram demasiadamente de certos jogadores, a exemplo de Ibrahimovic, El Shaarawy, Balotelli e Kaká. Isto demonstra a falta de sintonia e uma fase ofensiva mal trabalhada, que se baseia na individualidade dos “top players” e nas bolas longas (Thiago Silva já foi líder no quesito na Itália, como De Jong é nesta temporada).

O sistema defensivo também foi outro ponto baixo do Milan de Allegri, e apresentou muita insegurança, falhas infantis e pouca compactação nestes dois anos, depois que Thiago Silva e Nesta deixaram a equipe. É verdade que a reposição não foi (e dificilmente poderia ter sido) à altura, mas Zapata e Mexès não são exatamente dois cabeças de bagre e já viveram ótimos momentos na Itália. As boas atuações defensivas contra o Barcelona na Champions foram meros momentos passageiros. Somado com os fracassos em dérbis (5 últimos jogos sem vencer a Inter; apenas 2 vitórias contra a Juventus em 11 jogos), a avaliação do trabalho nas últimas temporadas é negativa.

Milan edições 2010-11 e 2011-12

De 2010 a 2012, seu time se baseava em Thiago Silva e Ibrahimovic, respectivamente as referências da defesa e do ataque. Com a dupla em campo o Milan chegou ao scudetto na temporada 2010-11, na que foi a melhor época coletivamente do time com boa participação dos coadjuvantes, a exemplo de van Bommel, Seedorf, Cassano, Robinho e Alexandre Pato na conquista italiana.

Na temporada seguinte, porém, a dependência por Zlatan se tornou ainda maior com os problemas físicos de Pato e Cassano e a irregularidade de Boateng e Robinho, além da queda de rendimento acentuada dos veteranos e os desencontros com o treinador. O resultado acabou sendo um frustante segundo lugar na Serie A ao perder a liderança nos momentos finais do campeonato, abrindo passagem para uma Juventus arrasadora.

Não ter conquistado o bicampeonato italiano, algo que não acontecia desde a conquista dos scudetti de 92 e 93 com o time invicto de Capello, acabou sendo um baque para o clube, que teve de se adaptar com a nova realidade financeira do clube. Os investimentos foram baixos e pouco surtiram efeito num mercado em que os dois pilares do time, Thiago Silva e Ibrahimovic, foram para o rico Paris Saint-Germain. O mercado fraco e o futebol pouco atrativo resultaram em queda drástica na média de público e arrecadação com os abbonamenti.

Aqui, as versões 2012-13 e 2013-14. Mudanças devem acontecer

Resultado: início desastroso de campeonato, 14 rodadas entre os 10 piores da Serie A e sufoco na Champions League, mas vaga garantida na fase final. A reação surpreendente no segundo turno, iniciada pelo garoto El Shaarawy e depois continuada por um Balotelli em fase surreal a partir de janeiro. O time outra vez foi vítima do Barcelona, mas a terceira colocação e a vaga na Europa deixaram a temporada com cara melhor.

O que não garantiu novo fracasso em 2013-14. 19 rodadas se passaram na Serie A e o Milan ocupa a 11ª posição, sendo que a melhor colocaçã oda equipe foi a 7ª posição ainda na 2ª rodada – ou seja, nada. Foram apenas 5 vitórias, com 7 empates e 7 derrotas (para se ter ideia, na última temporada o time teve 8 derrotas em 38 jogos), com 31 gols marcados e 30 sofridos (em 12-13, foram 39 gols sofridos em 38 jogos). Na Europa, apesar do sufoco, o time de Allegri ainda se credenciou como o único italiano na fase final da Champions League.

Com a demissão após virada embaraçosa para o Sassuolo, Allegri paga o pato por um elenco mal montado, muitos problemas físicos e sua própria incapacidade de tirar o melhor de seus jogadores e de se reinventar taticamente. Além de ter se demonstrado sempre dependente de valores individuais, o técnico manteve o imutável trivote no meio-campo, que não garantia a equipe superioridade numérica, proteção à defesa e muito menos desenvoltura na frente.

Seja quem for seu sucessor, Pippo Inzaghi ou Clarence Seedorf, este terá trabalho para levantar o moral de um time desgastado psíquica e fisicamente. Os reforços de Rami e Honda também qualificam o elenco e dão possibilidades do grupo se recuperar como na temporada passada e minimizar um dos piores anos da era Berlusconi. Seja Inzaghi ou Seedorf, a inexperiência no cargo pode atrapalhar. Porém, não há dúvidas de que tanto o italiano quanto o holandês conhecem o clube e o elenco a fundo. Respeito não vai faltar. Se, sem Allegri, a felicidade voltará a aparecer em Milanello já em 2014 é outra história.

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