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István Nyers foi algoz do Milan e se tornou um dos maiores artilheiros da história da Inter

István, Etienne, Stefano. A forma de ser chamado pouco importava, em tempos nos quais o futebol começava a se globalizar. Chamado de Etienne na França e de Stefano na Itália, o húngaro István Nyers se importava apenas em jogar futebol. Nisso, era um dos melhores nos tempos em que jogou, entre meados da década de 1940 e início dos anos 1960. Quando se fala de jogadores magiares, muita gente se lembra de Gyula Zsengellér, Lajos Détári, Flórián Albert, Sándos Kocsis, Nándor Hidegkuti, László Kubala e todos, claro, citam Ferenc Puskás. Nyers, porém, também foi uma grande estrela do futebol do país do Leste Europeu, e teve muito sucesso na Itália, atuando pela Inter.

Nascido na França, onde seu pai era mineiro, Nyers viveu a juventude na Hungria. Na capital, Budapeste, estudou e se tornou jogador de futebol, mas foi pelo Szabadkai Vasutas, de Subotica, que ele deu seus primeiros passos no futebol. Subotica, cidade sérvia que estava sob domínio húngaro por questões ligadas à II Guerra Mundial, foi, por incrível que pareça, um local acolhedor para o atleta. Tendo vivido ali o final da adolescência e o início da vida adulta, acabou se afeiçoando.

Após três anos na antiga Iugoslávia, Nyers se transferiu ao Ganz, da terceira divisão, onde encontrou outro mito do futebol europeu: László Kubala, também em início de carreira. Foi apenas pelo Újpest, um dos grandes times do país, que o ala ofensivo conseguiu maior destaque, em 1946. As atuações o fizeram ser convocado para a seleção da Hungria. Curiosamente, por ter nascido na França – que, através do jus sanguinis, considera cidadão do país os descendentes de franceses e não os nascidos em seu território – e a Hungria ter como lei o jus soli, que dá apenas aos nascidos no país os direitos de cidadania, Nyers era apátrida. Mesmo assim teve chances com uma das melhores seleções do mundo à época.

O ala ofensivo, no entanto, defendeu a seleção magiar apenas por duas vezes. Não por falta de qualidade, claro. Mas ainda em 1946, Nyers acertou com o Viktoria Zizkov, da Checoslováquia, e por não atuar mais na Hungria, não foi mais convocado. A partir de então, se dedicou a fazer uma sólida carreira em clubes. Passou pouco tempo em Zizkov, e meses depois retornou à França.

Nyers se destacou principalmente nos clássicos com o Milan, mas também teve bons momentos contra a Juventus (Arquivo/Inter)

Em terras francesas, sua trajetória se cruzou com a de um personagem que, assim como ele, marcaria época na Inter. Helenio Herrera, que montou a Grande Inter nos anos 1960, treinava o Stade Français, de Paris, e era admirador do futebol de Nyers. Em 1946, o levou para atuar na primeira divisão nacional, e o treinou por duas temporadas de sucesso, em que o clube brigou pelo título. Em 1948, o atacante acabou chamando a atenção da Inter em um amistoso e foi contratado.

Em Milão, Nyers atuou ao lado de jogadores importantes naquele período do clube nerazzurro, como o holandês Faas Wilkes e o italiano Amedeo Amadei. Sua marca mais impactante foi deixada juntamente com o italiano Benito “Veleno” Lorenzi e o sueco Lennart Skoglund, com quem fez um dos trios mais dinâmicos e goleadores da história nerazzurra. Lorenzi estava na Inter desde 1947, e Skoglund chegou em 1950. Ambos acompanharam Nyers até seus últimos dias no clube de Milão.

Atacante de flanco, o húngaro, ambidestro, preferia jogar pelo lado esquerdo, mas também atuava centralizado com alguma frequência. Habilidoso e muito bom finalizador tanto com as pernas quanto com a cabeça, nos seis anos em que jogou pela Internazionale, ele viveu seu auge: com 133 gols em 182 partidas, é um dos 10 maiores artilheiros da história nerazzurra.

Chamado de Enfant Terrible, Nyers marcou 110 vezes nas quatro primeiras temporadas atuando pela Beneamata. O franco-húngaro foi o máximo goleador da Serie A em 1949, com 26 gols, e nas três temporadas seguintes, em que anotou, respectivamente, 30, 31 e 23 gols, alternou entre a segunda e a terceira posições na tábua de artilharia – assim como seu time no campeonato.

Naquela época, a Itália tinha alguns grandes goleadores, como Gunnar Nordahl, do Milan, e John Hansen, da Juventus. Ao lado da Inter, Juve e Milan disputavam o primado do futebol italiano após o Desastre de Superga, que matou excelente geração do Torino em 1949. Mesmo assim, Nyers só foi conquistar títulos no final de sua passagem pela Inter.

Com desempenho positivo nos clássicos com o Milan, Nyers se tornou um dos maiores artilheiros da história nerazzurra (Arquivo/Inter)

O tridente formado por Nyers, Skoglund e Lorenzi, mais entrosado, foi o grande responsável por tirar o clube de uma fila de 13 anos sem Serie A, com o bicampeonato em 1953 e 1954. Naquela época, Nyers, que tinha quase 30 anos, marcava menos gols, mas era importante como antes. E, no início da temporada 1953-54, atingiu o ápice da idolatria.

Nyers e os dérbis

Marcar sobre o Milan era sua especialidade: ao todo, foram 11 gols, o que lhe conferem o título de vice-artilheiro nerazzurro no Derby della Madonnina e terceiro colocado geral. O húngaro está empatado com Nordahl, e só perde para Giuseppe Meazza, vice-artilheiro do confronto, com 13 gols, e Andriy Shevchenko, que tem 14. A média do húngaro interista, porém, é absurda: ele jogou 12 dérbis, o que significa uma frequência de quase um gol por jogo. Ao todo, ele passou em branco em cinco clássicos, mas nos outros sete deixou uma pá de gols.

O dérbi de 8 de novembro de 1953 foi o mais simbólico da carreira do atacante. Após ser barrado pelo presidente Carlo Masseroni por ter pedido um aumento de salário, Nyers voltou ao time titular no dérbi contra o Milan, e marcou os três gols da vitória por 3 a 0, mostrando bastante oportunismo e frieza.

Outros dérbis muito importantes para o atacante foram os de sua primeira temporada vestindo nerazzurro. Era seu quinto jogo oficial pelo clube, e ele não decepcionou: fez um gol e deu uma assistência para Lorenzi, na vitória por 2 a 0 sobre o rival, que estava invicto no clássico há seis jogos.

No duelo do returno, nasceu a rivalidade entre Nyers e Nordahl. O sueco, que chegara ao Milan em janeiro, marcou dois gols, mas Nyers respondeu com uma doppietta, no emocionante 4 a 4. Um dos dérbis mais emocionantes de toda a história também teve o peso da rivalidade entre os atacantes. Meses depois do empate cheio de gols, em novembro de 1949, a Inter aplicou 6 a 5 sobre o Milan. Nyers fez três, Nordahl apenas um. Na Serie A 1950-51, outra vez o duelo apareceu com força: cada um fez duas vezes, mas foi Skoglund, no final do jogo, que deu a vitória à Inter.

Relação especial com o Derby della Madonnina fez de Nyers um dos maiores ídolos nerazzurri (Arquivo/Inter)

O final de carreira e da vida

Depois de deixar a Inter, em 1954, Nyers ainda teve dois anos dignos por uma Roma que às vezes fazia barulho. O Enfant Terrible foi titular em ambas as temporadas, e ajudou a equipe a ser terceira colocada, em 1955.

Depois disso, Nyers perambulou pela Espanha, e não chegou a fazer nenhum jogo oficial nos dois anos em que esteve nos elencos de Barcelona, Terrassa e Sabadell, todos da Catalunha. Assim, ele voltou à Itália para jogar pelo Lecco, na Serie B, e se tornou figura histórica do clube: após quase conseguir levar o clube à elite em 1959, Nyers contribuiu ao primeiro acesso da equipe bluceleste à Serie A em sua história. Nyers, no entanto, se transferiu ao Marzotto, e encerrou a carreira jogando pouco, no clube que caiu para a Serie C.

Depois de se aposentar, Nyers ainda viveu alguns anos em Milão, antes de retornar a Subotica. Muito influenciável por elogios, o ex-atacante costumava tomar decisões arriscadas e fazer grandes apostas no pôquer, um de seus hobbies preferidos. Acabou perdendo grandes quantias na jogatina e ficou quase sem posses. Em 2005, morreu, em estado de solidão e pobreza. Um triste fim para um dos grandes campeões do futebol italiano.

István Nyers
Nascimento: 25 de maio de 1924, em Freyming-Merlebach, França
Morte: 9 de março de 2005, em Subotica, Sérvia
Posição: meia-atacante
Clubes: Szabadkai Vasutas (1941-44), Ganz (1944), Kispest (1945), Újpest (1945-46), Viktoria Zizkov (1946), Stade Français (1946-48), Inter (1948-54), Roma (1954-56), Barcelona (1956-57), Terrassa (1957), Sabadell (1958), Lecco (1958-60) e Marzotto (1960-61)
Títulos: Campeonato Húngaro (1946) e Serie A (1953 e 1954)
Seleção húngara: 2 jogos e 2 gols

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