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Stephan Lichtsteiner, o ‘expresso suíço’ que rasgou o território italiano

A década de 2010 do futebol italiano teve um domínio incontestável da Juventus. Entre os muitos responsáveis por esse ciclo vitorioso está Stephan Lichtsteiner, lateral-direito que também liderou a Suíça em um período de presença carimbada da seleção nas competições internacionais entre 2008 e 2018, com exceção da Euro 2012. “Licht” é um dos jogadores mais representativos em Eurocopas com a camisa de La Nati e encerrou sua trajetória como terceiro que mais vezes vestiu a farda alvirrubra na história, com 108 partidas – apesar de ultrapassado posteriormente, segue entre os 10. Tudo isso se tornou possível porque o atleta teve uma regularidade invejável pela Velha Senhora e, antes, pela Lazio.

Lichtsteiner nasceu no ano de 1984, em Adligenswil, pequeno município localizado no Cantão de Lucerna. Desde cedo, a segurança, que se tornaria sua marca nos gramados, fez parte de sua personalidade. Mesmo jogando no time profissional do Grasshopper, pelo qual estreou em 2002, quis ter um plano alternativo e chegou a estagiar no Credit Suisse em 2004, conciliando os treinamentos e as partidas do Campeonato Suíço ao trabalho no banco.

Foi no clube de Zurique que Licht conquistou o seu primeiro título na carreira, na temporada 2002-03, quando foi o titular na lateral direita da equipe que faturou a Nationalliga A. Ali já se destacava nacionalmente e recebia convocações para a seleção helvética sub-21, pela qual estreou ainda em 2003. Muito promissor, ficaria no seu país natal até 2005, quando foi contratado pelo Lille pela quantia de 650 mil euros.

Em uma década de completo domínio do Lyon de Juninho Pernambucano na Ligue 1, o Lille não conquistou títulos, mas se mostrou importante para que o lateral-direito suíço se consolidasse como um jogador que alternava muito bem as funções defensivas e ofensivas em sua posição. Stephan fez muitas partidas como defensor pelo lado direito em esquemas como o 5-3-2 ou 4-4-2, e muitas outras como um ala com liberdade para atacar, normalmente no 4-5-1, atuando na ponta direita do ataque e recompondo no meio sem a bola. Na temporada 2007-08, por exemplo, foram quatro gols e três assistências atuando assim no Campeonato Francês.

A versatilidade de Lichtsteiner para atuar bem das duas formas fornecia ao técnico Claude Puel a possibilidade de variações táticas e essa característica passou a ser a sua marca registrada. Não à toa, Stephan ficou conhecido como “Expresso Suíço”, um verdadeiro trem que subia ao ataque e descia para a defesa, sem parar ou demonstrar exaustão. A característica lhe rendeu também o apelido de Forrest Gump, o incansável corredor interpretado por Tom Hanks no filme dirigido por Robert Zemeckis.

A temporada 2007-08 marcou a consolidação da carreira do lateral, que foi convocado para disputar a sua primeira grande competição pela seleção: a Eurocopa de 2008, que seria sediada na Áustria e na própria Suíça. Além disso, Lichtsteiner chamou a atenção do futebol italiano. Mais exatamente de Walter Sabatini, diretor da Lazio. Após a Euro, Stephan rejeitou uma proposta do Paris Saint-Germain e reforçou a equipe do técnico Delio Rossi por 1,2 milhão de euros.

Com muita personalidade, Lichtsteiner rapidamente se tornou absoluto na lateral direita da Lazio (imago)

A Eurocopa de 2008, a passagem pela Lazio e a Copa de 2010

Em 2008, defender as cores alvirrubras da seleção não era exatamente uma novidade para Lichtsteiner, que tinha estreado em 2006, um amistoso contra o Brasil – terminado em vitória canarinho por 2 a 1. A partir dali, o nome do lateral seria assíduo nas listas de La Nati, no posto de pilar da retaguarda de uma equipe que se caracterizou por se defender muito bem e sempre vender caro suas partidas, mesmo contra adversários tecnicamente muito melhores.

Na competição europeia, os helvéticos caíram em um grupo complicado, junto a Portugal de Cristiano Ronaldo, João Moutinho, Nani e Deco; Turquia, de Arda Turan; e Chéquia, de Petr Cech, Jaroslav Plasil e Jan Koller. A Suíça também possuía um elenco experiente e com bons destaques, com uma base oriunda da campanha da Copa de 2006, da qual foi eliminada nas oitavas de final sem perder nenhuma partida no tempo normal. Marco Streller, Tranquillo Barnetta, Alexander Frei, Valon Behrami, Hakan Yakin e Philippe Senderos eram alguns dos bons nomes que haviam disputado o Mundial da Alemanha. Mas também havia espaço para a chegada de novas peças, como o bom volante Gökhan Inler e o próprio Lichtsteiner.

A seleção chegava ao torneio, portanto, com boas perspectivas de passar da fase de grupos, impulsionada também pelo fato de ser a anfitriã. Entretanto, a campanha foi péssima. Treinada por Jakob Kuhn desde 2001, a Suíça jogava um futebol bastante pragmático e defensivo, sendo montada no tradicional 4-4-2, com o Licht atuando na linha de quatro defensores, sem tanta liberdade tática para subir ao ataque. Na Euro, diferentemente da Copa de 2006, as peças ofensivas não funcionaram a contento e a própria defesa não conseguiu repetir o feito do Mundial, quando não levou nenhum gol em quatro partidas. Logo na primeira partida, a equipe rossocrociata perdeu seu principal atacante, Frei, e sucumbiu diante dos checos, por 1 a 0.

Na segunda partida, contra a Turquia, a Suíça começou melhor e Hakan Yakin, que entrara na vaga de Frei, fez o gol helvético. Mas, no segundo tempo, os turcos empataram e, nos acréscimos, viraram o placar, com Arda. Os rossocrociati davam adeus ao torneio de forma precoce, com a última colocação do grupo. Lichtsteiner e seus companheiros fizeram ainda a última partida contra os portugueses, vencendo, por 2 a 0, uma seleção lusitana com vários titulares poupados. Ainda assim, era apenas o início da relação entre o lateral e o ferrolho suíço.

As boas exibições do lateral-direito no torneio continental garantiram a sua ida para a Lazio, onde chegou a atuar em algumas partidas pela meia direita. Mesmo numa função mais defensiva na maioria das vezes, ainda subia ao ataque para municiar a dupla de ataque formada por Goran Pandev e Mauro Zárate. Foi o titular absoluto da linha de defesa celeste que normalmente costumava ser formada com quatro defensores. Os outros três sempre mudavam: havia rodízio entre Aleksandar Kolarov, Emílson Cribari, Stefan Radu, David Rozehnal e Sebastiano Siviglia.

Já na temporada 2008-09, o suíço obteve destaque graças a atributos como versatilidade, força defensiva, personalidade forte, raça, aplicação tática e muita resistência física. Das 38 partidas da Serie A, Licht esteve presente em 35, aparecendo com quatro assistências e um gol, marcado de cabeça na vitória por 4 a 2 justamente contra a maior rival dos celestes, a Roma. Os aquilotti terminariam a campanha na 10ª posição.

Ainda na mesma época, o Forrest Gump laziale também seria importante na conquista do quinto título de Coppa Italia pelo clube romano. No torneio, jogou como lateral pelos dois flancos e também como meia pela direita. O autêntico coringa demonstrou assim a sua polivalência e, na final contra a Sampdoria, decidida nos pênaltis, converteu o seu, deixando sua marca na história do time da capital.

Lichtsteiner começou a temporada seguinte, já sob o comando de Davide Ballardini, levantando uma taça: a da Supercopa Italiana, em partida em que a Lazio venceu a Inter por 2 a 1, em Pequim. Apesar disso, o fim do ciclo de Rossi foi atribulado e o time celeste teve dificuldades ao longo de 2009-10, chegando a trocar de treinador. Com Edy Reja, a equipe capitolina se recuperou e fez uma boa Serie A em 2010-11, ficando de fora da zona de classificação para a Liga dos Campeões apenas por causa do saldo de gols, inferior ao da Udinese. A regularidade naquela campanha rendeu ao suíço um posto de destaque entre os jogadores da posição em atividade no Belpaese.

A sua exposição já tinha aumentado por conta da sua consolidação como titular da Suíça. O lateral fez ótimas eliminatórias junto com sua seleção, que chegou à Copa de 2010 novamente em um grupo complicado, ao lado da poderosa Espanha, de um Chile com boa geração e de Honduras. O grande feito de La Nati nesse mundial foi ter sido o único esquadrão que derrotou a campeã Espanha, por 1 a 0, em um jogo de bastante inspiração defensiva, inclusive de Stephan, no 4-4-2 montado pelo técnico Ottmar Hitzfeld.

Apesar da excelente estreia, a Suíça perdeu a segunda partida para o Chile, concorrente direto à segunda vaga da chave, e não passou de um empate com Honduras. Neste duelo, Lichtsteiner teve bastante espaço para avançar e jogar no campo adversário, tentando muitos cruzamentos na defesa hondurenha e até arriscando chutes de fora da área, mas no fim das contas, os helvéticos acabaram ficando na terceira posição e sendo eliminados. O ferrolho novamente funcionara: os rossocrociati levaram apenas um gol no Mundial, mas este tento cruelmente lhes custou a classificação.

Na capital, o suíço se destacou pela regularidade e por um gol no dérbi romano (imago)

Lichtsteiner em Turim: símbolo de uma Juventus avassaladora

O ano de 2010 pode ser considerado como um divisor de águas no futebol italiano, principalmente porque ali se encontram as origens da reconstrução da agremiação hegemônica a nível nacional, a Juventus. Tendo passado pela experiência recente do Calciopoli, da venda de grandes jogadores e da disputa da Serie B, o clube passava por uma reformulação que começava na presidência, com a chegada de Andrea Agnelli, passava pelo incremento de sua infraestrutura, com a construção do Juventus Stadium, e resultava no campo com um novo projeto de time, que precisava de contratações para ser realizado. Após o término da temporada 2010-11, a Velha Senhora caminhava para rumos vencedores.

Ainda em 2011, chegaram à Juventus, através de uma política de mercado bastante agressiva e inteligente, alguns dos baluartes da redenção bianconera, que seria traçada a partir daquele ano: o novo técnico Antonio Conte, Arturo Vidal, Andrea Pirlo e também Stephan Lichtsteiner, após 117 aparições pela Lazio. Os novos contratados se somaram a outros importantes jogadores que haviam chegado em 2010-11, como Andrea Barzagli e Leonardo Bonucci, e a bandeiras com mais tempo na casa, como Giorgio Chiellini, Gianluigi Buffon e Claudio Marchisio. Era um projeto ambicioso que começou da melhor forma possível em 2011-12.

Começou melhor ainda para o suíço. Contratado pela cifra de quase 10 milhões de euros, logo provou dentro de campo que o valor investido tinha sido modesto se comparado ao que o jogador devolveria em termos de produção. Como um sinal dos bons ventos que estavam vindo, o clube bianconero estreou em seu novo Juventus Stadium, diante do Parma, com uma vitória incontestável por 4 a 1.

E o primeiro gol da história do estádio em jogos oficiais foi justamente do expresso que estacionara em Turim. Em ação que ficaria bastante conhecida pela torcida bianconera a partir daquela temporada, Lichtsteiner percorreu toda a lateral e penetrou em diagonal na grande área adversária para receber um belo passe por elevação de Pirlo e estufar as redes As bolas longas e assistências pelo alto do regista italiano no intuito de encontrar o veloz suíço pelos flancos ou em infiltrações foram jogadas muito repetidas e bem-sucedidas ao longo de várias partidas daquele time.

Aquela foi uma primeira demonstração da centralidade do Forrest Gump de Turim para o padrão de jogo implementado por Conte. E a importância de Stephan se deu principalmente pela sua já mencionada versatilidade, que casou perfeitamente com as constantes variações do treinador nas disposições táticas daquela equipe.

Contra o Parma, por exemplo, o time entrou em um 4-4-2, com o lateral formando linha defensiva com Chiellini, Barzagli e Paolo De Ceglie, e tendo o corredor direito livre para subir ao ataque quando a Juve estivesse com a posse de bola, como fez em seu tento. Marchisio e Pirlo se posicionavam à frente da defesa, enquanto Simone Pepe e Emanuele Giaccherini atuavam como meias pelos lados do campo, municiando Alessandro Del Piero e Alessandro Matri. Contra o Palermo, nove rodadas depois, a equipe entrou no 4-3-3, com Pirlo, Marchisio e Vidal formando um poderoso trio de meias e o suíço na linha defensiva, mas sempre avançando ao ataque, como na bela enfiada de bola para Matri fazer um dos gols.

Entretanto, a formação em que Lichtsteiner mais ficou conhecido pelos juventinos foi a de ala, no 3-5-2 que Conte começou a experimentar ali e tanto usou ao longo das temporadas no comando do time. Naquele modelo, Stephan acabava se tornando uma das principais vias de ataque da equipe, por sua explosão e sua velocidade pelo lado direito. Na campanha seguinte, ficaria consagrada a dupla de externos dos bianconeri, com Kwadwo Asamoah pelo lado esquerdo e o suíço na lateral oposta.

Antes disso, em 2011-12, tendo Licht como peça-chave, a Velha Senhora conquistou o título de campeã da Serie A – e de maneira invicta, o que só tinha acontecido em 1992, com o Milan de Marco van Basten. Na Coppa Italia, os piemonteses foram derrotados pelo Napoli na final. Contudo, deram o troco nos partenopei na final da Supercopa Italiana que inaugurou a temporada seguinte.

Em 2012-13, tendo liberdade para atacar no 3-5-2 protegido pela lendária zaga composta por Barzagli, Bonucci e Chiellini, o expresso acelerou e aumentou ainda mais suas participações diretas nas jogadas ofensivas, com cinco gols e quatro assistências, somando todas as competições. Naquela temporada chegava mais um notável reforço para o setor de meio-campo: Paul Pogba, que normalmente entrava durante as partidas e chegou a atuar em muitas delas como titular, oferecendo mais criatividade à Juve.

A Velha Senhora, então, foi bicampeã italiana e voltou a fazer uma boa Champions League, apresentando um ótimo futebol e avançando da fase de grupos em primeiro de sua chave, e de forma invicta. Contudo, foi eliminada nas quartas de final pelo Bayern de Munique, que seria o vencedor daquela edição.

A gigante piemontesa começou o ano seguinte faturando a Supercopa nacional, dessa vez em cima da Lazio, antigo time de Lichtsteiner. E, nessa partida, o lateral teve exibição de gala: participou de três tentos no pesado triunfo por 4 a 0. No primeiro gol, em cobrança de falta ensaiada, o suíço recebeu passe de Pirlo, tocou para dentro da grande área e Pogba mandou para as redes. Já aos 51 minutos, avançou com a bola pelo corredor direito e deu a assistência para Chiellini ampliar. Além disso, fez também o terceiro, em uma linda tabela com Mirko Vucinic, com direito a passe de calcanhar do montenegrino e infiltração na defesa antes de mandar para as redes.

Em 2013-14, apesar da eliminação na fase de grupos da Champions League e da derrota para o Benfica nas semifinais da Liga Europa, a Juventus foi dominante em âmbito doméstico e conquistou o tricampeonato italiano com um elenco ainda mais reforçado, que mantivera a base e ganhara o acréscimo de Carlos Tevez. Lichtsteiner viveu a sua melhor temporada em termos estatístico, chegando a ser o segundo maior assistente da equipe, com oito passes para gol, atrás apenas de Pogba, com 11. Com grande importância na construção ofensiva do time de Conte, o Expresso Suíço rumou ao Brasil para disputar a Copa de 2014.

Não bastasse a enorme contribuição dada à Juve por sete anos, Lichtsteiner ainda marcou o primeiro gol do Allianz Stadium (imago/Buzzi)

A consolidação como líder da seleção

A Suíça chegou ao Mundial no Brasil com status de um esquadrão que daria trabalho a qualquer outro. A participação nas Eliminatórias foi excelente e culminou com a classificação invicta para a Copa. Em alta na Juventus, Stephan também produzia mais pela seleção, até em termos ofensivos: Hitzfeld melhorara este quesito no jogo helvético.

La Nati iniciou a competição em um grupo com França, Equador e Honduras. Levou uma goleada dos franceses, mas venceu os sul-americanos e, na última partida, para expurgar os traumas de 2010, derrotaram os hondurenhos numa grande partida do raçudo lateral-direito juventino. Uma multiétnica Suíça finalmente avançava na competição, apresentando boas tramas no ataque e um futebol convincente, para além do ferrolho.

No entanto, os pareamentos de chave para as oitavas de final destinaram um adversário indigesto para os alvirrubros: a Argentina de Lionel Messi. Mesmo assim, a partida foi equilibradíssima e terminou em 0 a 0 no tempo normal, com a seleção de Hitzfeld acertando até mesmo a trave. A peleja só foi decidida na prorrogação, com gol de Ángel Di María, nos últimos minutos: ficou famosa a imagem de Lichtsteiner agarrado ao fundo das redes lamentando o tento argentino e a desclassificação. Depois daquela boa participação no Mundial, o defensor passou a ser a principal referência de liderança do elenco e, com a aposentadoria de Inler da equipe nacional, assumiu de vez a faixa de capitão da Suíça em 2015. No mesmo ano, inclusive, foi eleito o melhor jogador do país.

A consagração na Juventus e a liderança na Euro 2016

Se Lichtsteiner havia participado ativamente da reconstrução da Juventus em solo italiano, ele também seria um dos líderes da concretização de uma verdadeira hegemonia, conquistada através de mais títulos de nível nacional e, em 2015, com a volta da Velha Senhora a uma final de Liga dos Campeões depois de 12 anos. A temporada 2014-15 começou atribulada, por conta da inesperada saída de Conte, que não acreditava que o elenco bianconero fosse capaz de competir pelo título continental Massimiliano Allegri chegou bastante contestado pela torcida, mas mudou o humor dos juventinos muito rapidamente.

Max ganhou o vestiário e fez algumas alterações táticas que surtiram efeito no time, principalmente quando decidiu adotar o 4-3-1-2 ao invés do 3-5-2 de seu antecessor. Assim, fortaleceu o meio-campo, que tinha um poderoso quarteto formado por Pirlo, Marchisio, Pogba e Vidal. Assim, Allegri tornava o estilo de jogo da equipe mais ofensivo, sem abrir mão de uma forte defesa, composta por Bonucci e Chiellini ao centro e Patrice Evra acompanhando Lichtsteiner nas laterais.

De acordo com a necessidade, Allegri também adotava o 3-5-2, até por adaptação do elenco. Foi assim que o clube de Turim faturou seu quarto scudetto consecutivo, conquistou a Coppa Italia (que Conte não havia ganhado) e chegou à final da Liga dos Campeões de 2015 para disputar o título com o poderoso Barcelona de Messi, Neymar e Luis Suárez. Presente em todas as partidas, o lateral suíço foi um dos baluartes daquela campanha, que terminou com a derrota para os catalães. O Barça abusou da velocidade e da troca rápida de passes, sendo que muitas jogadas se deram pelo lado esquerdo da Juventus, onde Lichtsteiner tinha muita dificuldade para marcar Neymar. No primeiro tempo, em uma dessas ações rápidas pelo setor, Ivan Rakitic abriu o placar.

Na segunda etapa, a Juve conseguiu o empate e a jogada nasceu justamente dos pés do Expresso Suíço, que avançou com a bola, entrou na grande área e deu passe para Tevez chutar; o arqueiro Marc-André ter Stegen espalmou nos pés de Álvaro Morata, que só empurrou para o gol. O equilíbrio no placar durou pouco, pois aos 68 minutos, em contra-ataque veloz, Messi chutou de fora área, Buffon espalmou e Suárez fez o segundo da equipe blaugrana; nos minutos finais, Neymar fechou a conta para os culés.

Na temporada 2015-16, o suíço se manteve como pilar juventino, mas viveu um dos momentos mais difíceis da carreira. Na quinta partida da Serie A, contra o Frosinone, teve que sair de jogo com dificuldades respiratórias e foi diagnosticado com arritmia cardíaca: precisou ficar um mês afastado dos gramados para se tratar. Voltou em grande estilo, em novembro, na peleja contra o Borussia Mönchengladbach, na Alemanha.

A Juventus perdia por 1 a 0 até os 44 minutos. Então, os bianconeri engataram uma bela e longa troca de passes que culminou em um lançamento por elevação de Pogba para, já dentro da área da defesa alemã, Lichtsteiner emendar de primeira para a meta adversária. Uma verdadeira obra de arte, que mais tarde seria eleita pela Uefa como o gol mais bonito da competição. A Velha Senhora caiu nas oitavas, sendo eliminada pelo Bayern de Munique, e faturou mais uma dobradinha nacional.

Pela sua seleção, Lichtsteiner ostentou a faixa de capitão na Euro 2016, fazendo novamente boas exibições e atuando como pilar defensivo do ferrolho de Vladimir Petkovic. A Suíça fez o básico: levou apenas um gol na fase de grupos, fez dois, venceu uma partida contra a Albânia e empatou as outras duas com Romênia e França. Mais que o suficiente para avançar naquela edição reformulada, com 24 participantes, na qual era possível avançar à fase de mata-mata mesmo com apenas três pontos. Nas oitavas, os helvéticos ficaram no 1 a 1 com a Polônia e foram eliminadas nas cobranças de pênaltis. Como bom capitão, Stephan cobrou e converteu a primeira penalidade.

Lichtsteiner superou arritmia e continuou sendo devastador pela Juventus (Insidefoto)

O Expresso deixa Turim

Na temporada 2016-17, a Velha Senhora ainda se via consumida pela sanha de conquistar o principal torneio de clubes do mundo e, para isso, reforçou-se. Os principais contratados foram Gonzalo Higuaín, que chegou pelo estratosférico valor de 90 milhões de euros, Daniel Alves, vindo do Barcelona e Juan Cuadrado, emprestado pelo Chelsea.

Dois dos recém-chegados, portanto, atuavam no setor do suíço e isso refletiu nas atuações de Lichtsteiner, que diminuíram principalmente na Champions League: não foi inscrito na fase de grupos, perdendo o posto para o brasileiro. Só atuou contra o Porto, nas oitavas, e, do banco, viu a Juve ser novamente vice-campeã, dessa vez ante o Real Madrid, num acachapante 4 a 1. Mesmo na Coppa Italia, que foi novamente conquistada, Allegri usou Cuadrado e Daniel Alves em três ocasiões, escalando Stephan em apenas duas.

Na Serie A, entretanto, o lateral suíço continuou sendo peça principal em mais um título da liga, fazendo parte do revezamento proposto por Allegri, para manter todos os jogadores do elenco na condição física mais próxima possível do ideal. Mesmo ainda tendo papel fundamental nas conquistas nacionais, Licht viu o fato de ter sido preterido na Liga dos Campeões e a chegada de dois atletas para o setor direito serem motivos para especulações de sua saída.

A temporada seguinte foi de despedida e de marcos para um esportista que escreveu seu nome na história do clube. Fez seu 250º jogo pela Velha Senhora na partida de volta das oitavas de final da Liga dos Campeões, contra o Tottenham, em Wembley, e foi o autor do cruzamento que deu origem ao gol da classificação bianconera. Antes disso, já tinha utilizado a braçadeira de capitão do time em duelo contra o Chievo, na terceira rodada da Serie A. Lichtsteiner realizou sua última partida pela Juve na derradeira rodada do campeonato, contra o Verona, quando já era público que não renovaria o contrato. Ali, comemorou o sétimo scudetto seguido.

Pela Juventus, o Expresso Suíço atuou em sete temporadas, nas quais faturou sete scudetti, quatro edições da Coppa Italia e três Supercopas nacionais. Licht contribuiu com 259 jogos, 15 gols e 30 assistências, tendo participações fundamentais em todas as competições nas quais participou, inclusive na campanha que levou o clube à final continental em 2015, depois de tanto tempo sem chegar ali. Forrest Gump conseguiu um lugar na longa história de defensores de desempenho expressivo pelo lado bianconero de Turim, já que é um dos 50 jogadores que mais vezes vestiram a camisa juventina. Não à toa, a torcida tem o suíço como um verdadeiro ídolo e símbolo de entrega.

Aos 34 anos, Lichtsteiner saiu da Juventus para ir jogar no Arsenal, onde alternou a titularidade a momentos na reserva. Foi importante na campanha que levou os Gunners à final da Liga Europa, perdida para o rival Chelsea. Na única temporada pelo clube da Inglaterra, fez um gol e deu uma assistência. Forrest Gump encerrou a sua carreira em 2020, aos 36 anos, depois de representar o Augsburg em 20 partidas da Bundesliga.

Pela seleção, o lateral também escreveu bela história, com 108 partidas, oito gols e sete assistências, sendo o seu capitão em duas importantes competições. Além da Euro de 2016, Stephan liderou a Suíça na Copa de 2018: na fase de grupos, a equipe rossocrociata empatou com Brasil, num jogo em que Lichtsteiner efetuou boa marcação sobre Neymar, e Costa Rica. Os alvirrubros avançaram às oitavas após vitória num tenso duelo contra a Sérvia.

Naquela ocasião, Stephan mostrou sua veia política. Torcedores adversários mostravam cartazes discriminatórios contra albaneses e alguns usavam vestimentas com a imagem de Ratko Mladic, ex-militar e genocida sérvio que promoveu a morte de milhares de muçulmanos bósnios na década de 1990. Quando os alvirrubros viraram o placar para 2 a 1, o capitão manifestou solidariedade aos amigos kosovares Xherdan Shaqiri e Granit Xhaka, usando as mãos para fazer o símbolo da águia de duas cabeças, que representa a luta do povo albanês-kosovar contra o nacionalismo da Sérvia, que não reconhece a autonomia do Kosovo. Lichtsteiner e os companheiros foram multados em 5 mil francos suíços. Por acúmulo de cartões amarelos, o lateral não esteve presente na partida contra a Suécia, que marcou a eliminação helvética.

O capitão ainda tinha o desejo de disputar a Eurocopa de 2020 para se despedir do seu selecionado, mas a pandemia de covid-19 ocasionou o adiamento da competição para 2021 e o defensor não quis esperar. Aposentou-se em agosto de 2020 e passou a se dedicar a dois ofícios distintos: integra o conselho de administração do HC Lugano, clube de hóquei no gelo de seu país, e atua como relojoeiro. Segundo o ex-jogador, fazer relógios é algo bem parecido com a arte de defender. Em entrevista ao jornal Marca, Lichtsteiner fez uma curiosa metáfora sobre as duas atividades: “Basta girar um botão para conseguir grandes efeitos”.

Stephan Lichtsteiner
Nascimento: 16 de janeiro de 1984, em Adligenswil, Suíça
Posição: lateral-direito
Clubes: Grasshopper (2001-05), Lille (2005-08), Lazio (2008-11), Juventus (2011-18) Arsenal (2018-19) e Augsburg (2019-20)
Títulos: Campeonato Suíço (2003), Coppa Italia (2009, 2015, 2016, 2017 e 2018), Supercopa Italiana (2010, 2013, 2014 e 2016) e Serie A (2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017 e 2018)
Seleção suíça: 108 jogos e 8 gols

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