No fim da década de 1950, a Fiorentina teve um dos seus melhores times de todos os tempos: seu elenco tinha craques como Julinho Botelho, Miguel Montuori e Giuseppe Virgili, que ficaram eternizados com a camisa violeta. Mas, especificamente em 1957, comandada por Fulvio Bernardini, a Viola foi longe, sonhou com o título europeu, mas parou no poderosíssimo Real Madrid em uma final que foi decidida com um grave erro da arbitragem.
No dia 30 de maio de 1957, Real Madrid e Fiorentina fizeram a final da Copa dos Campeões, a competição antecessora da Liga dos Campeões, que foi introduzida no formato que conhecemos hoje no ano de 1992. O favoritismo estava do lado merengue, afinal, o time madrilenho havia vencido a edição inaugural disputada na temporada anterior. Além de contar com astros que tinham habilidade fora do comum, como Alfredo Di Stéfano, Francisco Gento e Raymond Kopa, os espanhóis jogaram em casa e tiveram com o apoio incessante da torcida. Diante de cerca de 124 mil torcedores presentes no Santiago Bernabéu, as equipes fizeram uma decisão digna do público que teve.
A Viola apostava na receita que vinha construindo desde o início da década de 1950. Sob a presidência de Enrico Befani, a equipe de Florença apostou na juventude de jogadores da base, como o arqueiro Giuliano Sarti, o meia-atacante Guido Gratton e o atacante Virgili. Ao mesmo tempo, dedicou olhar especial a talentos do mercado sul-americano: foi à Universidad do Chile buscar o argentino Montuori e, no Brasil, contratou o habilidosíssimo Julinho Botelho, da Portuguesa. Juntos, sob o comando de Bernardini, praticam um futebol bonito, rápido e eficiente, que encantou os amantes do esporte da época.
Mas antes de chegar na decisão, ambas as equipes tiveram caminhos tortuosos. A Viola se classificou para a Copa dos Campeões por ter vencido a Serie A da temporada anterior – foi o primeiro título dos gigliati. Para estarem na final, os italianos eliminaram os suecos do Norrköping, os suíços do Grasshopper e os sérvios do Estrela Vermelha. Já os merengues precisaram da partida de desempate para avançar frente ao Rapid Vienna, da Áustria, e depois passaram por Nice, da França, e Manchester United, da Inglaterra. Vale destacar que, nesta época, a competição era disputada inteiramente no formato mata-mata, com jogos de ida e volta, sendo que os dois times ingressaram na segunda fase, a de oitavas de final.
Quando a partida começou no Bernabéu, a Fiorentina parecia não sentir o peso do barulho ensurdecedor que fazia a torcida da casa. Nas tribunas de honra, inclusive, o general Francisco Franco acompanhava bem de perto a defesa do título pelo Real Madrid. Essas questões, porém, não entraram em campo. A Viola, como costumava fazer, começou propondo, tendo mais posse de bola e criando mais chances. Foi em uma dessas escapadas que chegou perto de marcar o primeiro gol com Gratton, mas o bom posicionamento da defesa merengue evitou o pior para os mandantes.
O ímpeto inicial foi caindo diante da habilidade coletiva e individual dos madridistas – fatores responsáveis por equilibrar a partida. Os comandados de José Villalonga foram criando boas chances, principalmente através das combinações entre Di Stéfano, Gento e Kopa, porém pararam na solidez do sistema defensivo da Viola e na excelente exibição de Sarti.
A partida se desenhou com oportunidades para ambos os lados. Enquanto o Real Madrid contava com seus craques, a Fiorentina apostava na bola no pé e em muitas trocas de passes, sem ligações diretas. No ataque, Julinho era o principal destaque, com velocidade e habilidade para romper o sistema de marcação adversário. Contudo, sempre que chegava na frente do gol merengue, o brasileiro não conseguia concluir com êxito.
Chances iam e vinham. O confronto permanecia aberto e indefinido até o minuto 70, quando o árbitro holandês Leo Horn apontou para a marca do pênalti após Enrique Mateos ter sido derrubado por Ardico Magnini. Na bola, Di Stéfano chutou e fez o primeiro gol da final, para delírio e alívio da torcida merengue presente no Bernabéu. A bola foi indefensável para Sarti, que até tentou correr para fora da linha, mas não conseguiu evitar o tento.
O lance parecia ter sido mais um acontecimento corriqueiro de jogo, porém estava repleto de irregularidades. Inicialmente, o árbitro ignorou a sinalização do bandeirinha, que marcava o impedimento de Mateos ao receber a bola. Outro motivo para controvérsia foi o local em que Mateos foi derrubado: o espanhol sofreu a falta fora da área, dentro da meia-lua. O pênalti dos blancos, portanto, foi inexistente.

Jogando em casa, o Real Madrid contou com um pênalti mal assinalado para dar início à vitória sobre a Fiorentina (Marca)
Depois do duro golpe, os comandados de Bernardini ainda conseguiram uma excelente chance para marcar com Julinho, o homem mais perigoso do lado italiano. No entanto, o brasileiro esbarrou na boa defesa do goleiro Juanito Alonso. Com isso, o sonho do esquadrão violeta ficava mais distante.
Aos 76 minutos, a Fiorentina teve a sua última esperança ceifada. A defesa comandada pelo capitão Sergio Cervato, que foi sólida durante toda a partida, cometeu um erro de posicionamento e Gento não perdoou. Em um passe em profundidade de Kopa, o atacante espanhol se desvencilhou da retaguarda italiana e colocou por cima de Sarti, que também nada pode fazer: estava anotado o 2 a 0.
Depois do segundo gol, a Viola não teve forças para tentar reverter o placar. Dentro do Bernabéu, a Fiorentina foi valente, mas, no fim, não conseguiu ser páreo ao poderosíssimo Real Madrid, que conquistava o seu segundo título europeu. O tento irregular tornava a derrota difícil de ser digerida, mas não necessariamente injusta.
A Fiorentina não tinha o peso do trio formado por Inter, Juventus e Milan, mas foi capaz de fazer uma final digna de um grande do futebol italiano. No fim, esbarrou no erro de arbitragem que minou qualquer chance do sonho do título europeu. Apesar disso, a derrota não interrompeu a era de ouro da Viola: o time ainda brigou por outros scudetti e até conquistou a Coppa Italia e a Recopa Uefa em 1961, fazendo com que uma taça continental enfeitasse a sua sala de troféus. Os gigliati, contudo, jamais voltaram a outra decisão da principal competição de clubes da Europa – seja Copa dos Campeões ou Champions League.
Real Madrid 2-0 Fiorentina
Real Madrid: Alonso; Lesmes, Torres, Marquitos; Muñoz, Zárraga; Kopa, Rial, Mateos, Gento; Di Stéfano. Técnico: José Villalonga.
Fiorentina: Sarti; Magnini, Orzan, Cervato; Scaramucci, Segato; Julinho, Gratton, Montuori, Bizzarri; Virgili. Técnico: Fulvio Bernardini.
Gols: Di Stéfano (69’) e Gento (75’)
Árbitro: Leo Horn (Holanda)
Local e data: estádio Santiago Bernabéu, Madrid (Espanha), em 30 de maio de 1957
Obs: a Fiorentina voltou a jogar uma final, a copa da UEFA de 1989, contra a Juventus.