Jogadores

Bastaram cinco anos para Fabio Cudicini entrar no hall da fama do Milan

Nenhum goleiro tem o apelido de Aranha Negra por acaso. Além de ostentar uniforme todo preto, o jogador em questão precisa ainda apresentar características longilíneas e muita técnica e agilidade para realizar defesas complicadas. Contemporâneo de Lev Yashin, lendário goleiro soviético das décadas de 1950 e 1960, Fabio Cudicini foi um dos melhores da posição no futebol italiano. Brilhou, sobretudo, com as camisas de Roma e Milan, tendo vencido tudo que um jogador possa conquistar, da Serie A à Copa Intercontinental, mesmo sem jamais ter entrado em campo com a camisa da seleção.

Sua história como jogador começou logo aos 15 anos, pelos juvenis da modesta Ponziana, time pelo qual seu pai Guglielmo havia atuado por oito temporadas. Fabio se destacou na base do pequeno clube de Trieste, sua cidade natal, e, mesmo sem nunca ter jogado no time profissional, foi negociado com a Udinese. A agremiação friulana começava a dar seus passos para assumir o lugar da Triestina como principal clube da região e Cudicini fez parte deste trajeto: conquistou suas primeiras oportunidades na Serie B de 1955-56 e ajudou os bianconeri a conquistarem o acesso à Serie A.

Ao longo de duas temporadas, o jovem Cudicini dividiu espaço com o veterano Primo Sentimenti e, embora não fosse titular absoluto, fez 17 partidas no Campeonato Italiano. As boas atuações de Fabio ajudaram a Udinese a ficar com a 4ª e a 9ª posições na Serie A e também chamaram a atenção da Roma, que o contratou pensando no futuro.

Depois de se aperfeiçoar pela Roma, Cudicini virou titular do Milan (Torrini Fotogiornalismo)

Inicialmente, Cudicini fez o papel de reserva de Luciano Panetti, enquanto era preparado para assumir a titularidade dos giallorossi. O goleiro fez apenas seis partidas como titular ao ongo de duas temporadas, mas logo recebeu o apelido de Pennellone (escovão, em português), por causa de seu 1,91m de altura. Fabio assumiu de vez a meta romanista a partir da temporada 1960-61 e, com a camisa 1, conquistou seu primeiro título logo de cara: faturou a Copa das Feiras, antecessora da Copa Uefa e da Liga Europa.

Ao todo, o goleiro fez 165 jogos pelo time da Cidade Eterna e ainda ajudou a Loba a fazer boas campanhas na primeira divisão e a conquistar a Coppa Italia de 1964. Pelo bom nível das atuações, também recebeu uma Convocação para a seleção B italiana, em 1963. Embora já fosse o pesadelo de muitos atacantes, Fabio definiu John Charles, que marcou época na Juventus e foi seu companheiro por uma temporada na Roma, como a sua “besta negra”. “Sua dimensão, seu senso de posicionamento e porte físico lhe permitiam cabeçadas mortais. Dessa forma, fez muitos gols contra mim”, confessou em uma entrevista, anos depois de sua aposentadoria.

Apesar de ser uma das principais figuras da Roma, Cudicini quase que inexplicavelmente acabou deixando os giallorossi para acertar com o modesto Brescia. O motivo para trocar de clube depois de oito temporadas, segundo o próprio Fabio, teria sido uma questão política: o goleiro era amigo do chefe de governo de Brescia e essa amizade permitiu a aproximação, já que o jogador, então com 31 anos, acreditava estar chegando ao fim de sua carreira. “Saí da Roma em lágrimas e cheguei no Brescia jogando mal e pouco. Felizmente durou apenas um ano e depois chegou a proposta do Milan”.

O Aranha Negra marcou época como titular do Milan (imago/WEREK)

Uma curiosidade sobre a passagem de Cudicini pelo Brescia é que foi no clube da Lombardia que ele utilizou o uniforme preto pela primeira vez – via de regra, os goleiros utilizavam camisas verdes naquele período da Serie A. Pennellone foi peça importante para evitar o rebaixamento dos andorinhas e acabou se transferindo para a capital da região lombarda, já que foi contratado pelo Milan.

Com a camisa do gigante italiano, Cudicini viveria os melhores momentos de sua carreira aos 32 anos e receberia o apelido de Aranha Negra. Suas atuações de altíssimo nível foram fundamentais para dar o scudetto aos rossoneri, que tiveram uma das melhores defesas da competição. Com somente 24 gols sofridos em 30 partidas e com um ataque avassalador, liderado por Pierino Prati, a equipe treinada por Nereo Rocco nadou de braçada e foi campeã com nove pontos de vantagem sobre o Napoli – se o sistema de disputa já previsse três pontos a cada vitória, seriam 14. “Aquele Milan tinha uma defesa de grandes valores, seja pela situação individual, seja pelo desempenho de jogadores que se ajudavam e deixavam menos perigoso o ataque adversário”, disse o goleiro.

Já no ano seguinte, Cudicini foi fundamental na conquista do segundo título europeu pelo Milan, batendo o Manchester United, então detentor da taça da Copa dos Campeões. Meses depois, também levantou o troféu pela conquista do Mundial Interclubes. Suas atuações foram premiadas com a primeira convocação à seleção italiana. Tendo Dino Zoff e Enrico Albertosi como concorrentes, era difícil para o “Ragno Nero” jogar – especialmente porque as partidas dos selecionados nacionais eram muito menos frequentes do que hoje em dia. O fato de nunca ter entrado em campo pela Squadra Azzurra é considerado por muitos uma das grandes injustiças do futebol do Belpaese.

Pelo Milan, Cudicini amarga um gol sofrido pela equipe diante do Tottenham, na Copa Uefa de 1972 (Keystone/Hulton Archive/Getty)

Cudicini fez 127 partidas e conquistou quase todos os títulos possíveis com a camisa milanista – a exceção foi a Copa Uefa, que ele já havia vencido pela Roma – além de ter estabelecido, à época, o recorde de 1132 minutos sem levar gols em casa. Em 1972, prestes a completar 37 anos e após cinco temporadas fantásticas, era a hora de pendurar as luvas. Chegava ao fim a carreira de um fantástico jogador, um dos melhores goleiros do futebol italiano, que ficaria marcado eternamente no Hall da Fama do Milan.

Logo após se aposentar, o Aranha Negra pode curtir o nascimento de seu filho, que aconteceria em setembro de 1973. Carlo seguiria seus passos como goleiro e, após começar nas categorias de base do Milan, se destacaria no Chelsea, da Inglaterra – embora nunca tenha sido titular absoluto. Se a carreira de sua prole voltou a colocá-lo em evidência, Fabio Cudicini também foi lembrado pelos milanistas mais antigos e passou a ser conhecido pelos mais jovens nos últimos anos. Tudo porque sua altura e grande envergadura, somadas à classe nas defesas decisivas fizeram emergir comparações com Gianluigi Donnarumma. Revelado na base rossonera, possui atributos muito similares e foi elogiado pelo mestre diversas vezes. No entanto, não teve o mesmo apego às cores do clube.

Fabio Cudicini

Nascimento: 20 de outubro de 1935, em Trieste, Itália
Posição: goleiro
Clubes: Udinese (1955-58), Roma (1958-66), Brescia (1966-67) e Milan (1967-72)
Títulos: Copa das Feiras (1961), Coppa Italia (1964 e 1972), Serie A (1968), Recopa Uefa (1968), Copa dos Campeões (1969) e Copa Intercontinental (1969)

Compartilhe!

Deixe um comentário