Alguém que joga no meio-campo, entre a defesa e o ataque, para construir seu jogo e destruir o do adversário. Seria muito simplista resumir assim aquela que é, provavelmente, a posição mais complexa do futebol – seja pelas variações táticas ou pela grande área de jogo a ser ocupada.
No calcio, a primeira posição entre os meio-campistas é a de mediano (também conhecida por interditore), com a função de bloquear as ações adversárias e reconstruir o jogo da equipe. Comparando à escola brasileira, seria o nosso primeiro volante. E não há exemplo melhor que Dunga, capitão do tetra – e, hoje, talvez o entrevistado mais difícil de se lidar no cenário nacional. A Itália tem boas gerações na posição há algumas décadas. Na de 1960, Pierluigi Cera tornou-se bandeira do Cagliari e Gianfranco Bedin foi indispensável na Grande Inter de Helenio Herrera.
Desde então, destacaram-se nomes como os de Stefano Desideri e Gabriele Oriali, o último citado pelo cantor e compositor Luciano Ligabue na letra de Una vita da mediano: “uma vida de mediano / trabalhando como Oriali / anos de cansaço e entradas duras / e se vence, às vezes, o Mundial”. Hoje, os dois principais destaques do calcio na posição são Daniele De Rossi e Gennaro Gattuso, tetracampeões mundiais na Alemanha e titulares absolutos em Roma e Milan, respectivamente.
Já o regista é um arranjo praticamente desconhecido na realidade brasileira. Geralmente é um jogador coberto por algum mediano, que pode, assim, fazer uso de sua visão de jogo para armar com mais tranqüilidade as jogadas, através de lançamentos e passes precisos, atuando na frente dos defensores. No Brasil, um de seus raros exemplos é Paulo Roberto Falcão, que se tornou o oitavo Rei de Roma atuando pelo clube da capital. Seu reserva na Copa de 1986, Valdo, fez dupla com Dunga na Copa de 90.
Em âmbito europeu, o primeiro grande regista foi o espanhol Luis Suárez, lenda no Barcelona e na Inter nas décadas de 1950 e 60. No mesmo período Johan Cruijff se firmou como bandeira do Ajax. Na década de 1970, o grande nome da posição foi o laziale Vincenzo D’Amico, que, segundo relatos da época, pecava pela “falta de personalidade” em jogos decisivos. A década de 90 também viu o surgimento de Eugenio Corini e Sergio Volpi na posição. Andrea Pirlo, que começou a carreira no ataque do Brescia, só foi transformado em regista após Carlo Mazzone convencê-lo a treinar por quinze dias na posição.
A partir daí surgem o centrale e o interno (por vezes chamado de mezz’ala). Em tese, a diferença entre os dois se dá pelo fato de que o centrale tem mais preocupações defensivas, enquanto o interno preocupa-se mais em aparecer para o jogo com toques e movimentações em velocidade, ainda sem se descuidar da defesa. O centrale Marco Tardelli marcou um dos gols italianos na final contra a Alemanha na Copa de 1982.
Outro representante de peso na posição é o holandês Ruud Gullit, peça-chave nos primeiros momentos do Milan de Silvio Berlusconi, e Bola de Ouro em 87. Neste mesmo ano surgia um jovem chamado Gennaro Rutuolo, que se tornaria o jogador com maior número de presenças na história do Genoa, tendo jogado por lá durante quatorze temporadas. Toninho Cerezo, considerado o jogador mais simpático das histórias de Roma e Sampdoria, talvez seja o brasileiro que mais se aproxime da definição de centrale.
Carlo Ancelotti, hoje técnico do Milan, e Giancarlo Antognoni, coordenador-geral da seleção sub-17 italiana, dividiram as atenções da posição de interior durante as décadas de 1970 e 80. Ancelotti, revelado pelo Parma, brilhou pela Roma e foi o primeiro capitão após Di Bartolomei. Também fez sucesso com o Milan, com duas Copas dos Campeões e dois scudetti, além de outros títulos.
Já Antognoni, “o garoto que joga olhando para as estrelas”, nas palavras de Vladimiro Caminti, passou quinze anos na Fiorentina, e só deixou o clube para buscar tranqüilidade financeira na Suíça, em sua última temporada. Mesmo com sua qualidade inquestionável, só venceu dois títulos: uma Coppa Italia, com o time viola, e uma Copa do Mundo, com a Squadra Azzurra, sempre titular. Outros mezz’ale importantes foram Giulio Schubert, Sandro Mazzola e Giancarlo De Sisti. A importância do picchio De Sisti pôde ser percebida na Copa de 1970, onde Mazzola e Rivera disputaram posição a seu lado.
O esterno, por fim, é figura surgida com o advento das defesas com quatro homens. Por muito tempo viu-se no calcio a divisão entre esterno e ala tornante. O primeiro geralmente atuava pela esquerda, enquanto o segundo era figura comum na direita. A missão dos dois, contudo, não variava: cabia a eles partir da linha do meio de campo para fazer fluir o jogo da equipe, tendo como aporte velocidade e habilidade.
A posição tornou-se mais utilizada pelos treinadores com a finalidade de evitar os seguidos impedimentos dos homens de frente da equipe, lançados pelo meio – bastaria ao esterno fazer o cruzamento da linha de fundo. O barone Franco Causio fez história como ala tornante da Juventus, na década de 1970, sendo inclusive titular no Mundial de 1978. Quatro anos depois, porém, na Espanha, foi o canhoto Bruno Conti que se destacou ao ponto de ser eleito o melhor do torneio. Pelé, após o título italiano na Copa, declarou que “é Bruno Conti o verdadeiro brasileiro do Mundial; o melhor dos jogadores que vi na Espanha. Acredito que jogadores como ele não nascerão mais”.
O primeiro ala destro de real fama foi Romeo Menti, titular do Grande Torino e falecido na tragédia de Superga. O estádio comunal de Vicenza, sua cidade natal, lhe é dedicado. Mas o fato mais curioso é que Menti também tem dedicado a si os campos de Castellamare di Stabia e Montichiari. É o único caso no mundo de três estádios dedicados a um mesmo jogador.
Nas últimas duas décadas, destacaram-se nos campos italianos desde nomes do nível de Marco Simone e Attilio Lombardo até alguns de passagem efêmera, como Gianluigi Lentini e Roberto Rambaudi. Lentini foi contratado pelo Milan em 1992 por quarenta milhões de liras, enquanto Roberto Baggio custou à Juve “apenas” dezoito, dois anos antes. Gigì está hoje no Canelli, que disputa o torneio Eccelenza (equivalente à sexta divisão).
Entre os exemplos mais recentes, destaca-se Pavel Nedvěd, esterno sinistro sempre indispensável à Lazio e à Juve. Ou ainda Luís Figo, nos momentos em que Mancini opta por utilizá-lo em sua posição original. Falando em Mancini, o ex-lateral-direito do Atlético Mineiro só encontrou seu melhor futebol em Roma quando Spalletti o efetivou de esterno, pela esquerda. Coisas do futebol.
Como é bom ler tuas postagens sobre o Italiano…
Parabéns pelo texto.
abraços.
Excelente texto Braitner. Na verdade, um dos melhores que já li sobre definição de posicionamento em campo. Além disso, o post é bastante informativo e leve. Não tem aquela espécie de ressentimento em relação ao futebol que a imprensa costuma mostrar. Lembra também os grandes textos de Rodolfo Moura no Calcio Serie A. Meus sinceros parabéns!
Outra coisa, provavelmente vc deve falar dos atacantes. Tenho um post no meu blog sobre o tema que gostaria que desse uma olhada: http://fbwe.zip.net/arch2006-11-05_2006-11-11.html
Valeu!
Muito bom! Estava procurando esse assunto pela Net a muito tempo. Muito bom o Blog, continuem assim!
Show de bola Braitner, parabéns pela matéria, até o Silvio Lancellotti ficaria com inveja hahahahah.
Olá!
No jogo da Juve ouvi os meninos comentando do seu blog, e sem querer acabei achando-o procurando coisas sobre o Cristiano Doni. Adorei, ganhou uma assídula leitora!
Denize
Juventina***