Polêmico e promissor. Adrian Mutu tinha tudo para ser um dos maiores jogadores romenos depois de Ghoerghe Hagi: alto, forte, técnico e rápido, o atacante despontou aos 17 anos, no Arges Pitesti, e chamou a atenção apenas dois anos depois da incrível campanha da Romênia na Copa do Mundo de 1994. Ao longo dos anos, ele acabou se estabelecendo como um dos principais nomes de sua geração, mas nunca foi muito regular porque se envolvia em polêmicas ou problemas extracampo, como quando foi suspenso pelo uso de cocaína. Depois de duas décadas de dedicação ao esporte, Mutu anunciou sua aposentadoria em maio de 2016.
Desde que deixou o Arges, o atacante se tornou uma espécie de cigano da bola e não conseguiu emplacar mais de duas temporadas em nenhum clube – a não ser na Fiorentina, onde foi ídolo. Poderia até ter passado mais tempo no Dinamo Bucareste, mas o jogador logo chamou a atenção dos gigantes europeus. Mutu passou a ser chamado de Briliantul (“O Brilhante”) por causa de grandes exibições nas seleções de base e no clube, pelo qual atingiu alta média de gols (fez 25 em 24 partidas de 1999-2000), que encaminharam a conquista da dobradinha local para o Dinamo. Com status de grande promessa, ele se transferiu à Inter em janeiro, antes mesmo do fim da temporada do futebol romeno.
Adrian chegou na Itália com a temporada em andamento e impressionou no início, com gols nas quartas e nas semifinais da Coppa Italia, contra Milan e Cagliari, respectivamente. Em seus primeiros meses pelos nerazzurri ele obteve sua primeira convocação para a seleção romena, porém, a estadia em Milão durou apenas 14 jogos: a Beneamata vivia uma época conturbada e não havia muita paciência da diretoria com atletas e treinadores. Dessa forma, no início de 2000-01, ele foi negociado em copropriedade com o Verona.
No Vêneto, o atacante de 21 anos encontrou um time estruturado, com o goleiro Fabrizio Ferron, os defensores Massimo Oddo, Luigi Apolloni, Martin Laursen e Anthony Seric, o meia Mauro Camoranesi e muita concorrência no ataque, que tinha como opções Alberto Gilardino, Emiliano Bonazzoli e o brasileiro Adaílton. O romeno conquistou seu espaço e, com quatro gols, ajudou o Hellas a ficar na elite – a equipe venceu o spareggio contra a Reggina.
Mutu foi comprado em definitivo e continuou no clube por mais uma temporada, desta vez como titular incontestável: disputou 32 dos 34 jogos dos butei na Serie A e anotou 12 gols, sendo o artilheiro gialloblù. Apesar disso, o Verona foi rebaixado na última rodada, depois de perder por 3 a 0 para o Piacenza e ver o Brescia de Roberto Baggio e Luca Toni fazerem o mesmo placar sobre o Bologna.
Após a queda do seu time, Adrian Mutu foi negociado com o Parma, onde reencontraria Gilardino e faria dupla com Adriano. Vivendo seus últimos anos da parceria com a Parmalat, os crociati fizeram uma temporada de grande destaque sob o comando de Cesare Prandelli, terminando na quinta colocação da Serie A – não obstante a queda prematura na Coppa Italia e na Copa Uefa. Em um time muito bom, Mutu foi o centro das atenções.
O Parma vendeu o atacante Marco Di Vaio para a Juventus e apostou em Mutu como seu substituto, já que os dois tinham algumas características similares, como muita movimentação e habilidade nas finalizações, inclusive de fora da área. O romeno só desencantou em outubro, quando marcou em jogos da Copa Uefa, contra o CSKA Moscou, e na Serie A, contra o Perugia. Depois disso, deslanchou: foi o artilheiro da equipe na temporada com 22 gols, 18 deles na Serie A, competição da qual foi vice-artilheiro, atrás apenas de Christian Vieri, da Inter. Àquele momento, Mutu era considerado um dos melhores atacantes do futebol europeu.
Com tal cacife, o Briliantul recebeu uma proposta do Chelsea, que iniciava a Era Roman Abramovich. O magnata russo começou a abrir a carteira para reforçar o time londrino e pagou 22,5 milhões de euros para levar Mutu à corte de Claudio Ranieri. Seu começo foi promissor, com quatro gols em três partidas (incluindo uma doppietta contra o rival Tottenham), mas no restante da temporada o camisa 7 não jogou bem.
No início da temporada seguinte, algumas desavenças com o novo técnico, José Mourinho, já limitariam seu espaço. Para piorar, o jogador foi flagrado em um teste antidoping, que apontou resultado positivo para uso de cocaína, e foi demitido pelo clube inglês. O Chelsea também acionou a justiça e exigiu uma compensação financeira: o processo correu na justiça por mais de 10 anos até que o clube ganhasse a causa e Mutu fosse obrigado a ressarci-lo em 17 milhões de euros.
O atacante também foi suspenso por sete meses pelo uso do entorpecente e estava sem clube. Mesmo assim, três meses e meio antes de sua pena expirar, a Juventus fez uma proposta a Mutu, que aceitou fechar com o clube. A Velha Senhora não podia contratar jogadores extra-comunitários vindos do exterior naquele momento e fez uma manobra com o Livorno, que o contratou e o renegociou imediatamente com a equipe de Turim.
Ele treinou no clube piemontês entre janeiro e maio, até estrear na última rodada da Serie A 2004-05, quando a Juve já faturara o scudetto. No Delle Alpi, Adrian Mutu era um reserva bastante utilizado por Fabio Capello e alternou bons e maus momentos no time que viria a sagrar-se campeão também em 2005-06. Ele fez 32 partidas e marcou sete gols na campanha, mas viu a Juventus ter os bicampeonato cassado e o rebaixamento decretado devido aos incidentes do Calciopoli. O descenso levou o romeno a uma das grandes rivais dos bianconeri, a Fiorentina, clube em que enfim teria sequência.
Mutu teve rápida adaptação à equipe comandada por Prandelli, seu treinador no Parma – em Florença, ele também reencontrou o goleiro Sébastien Frey, colega na Emília-Romanha. A Fiorentina havia sido punida em 15 pontos por envolvimento no Calciopoli e precisou fazer um campeonato de recuperação: ficou na 6ª posição e garantiu vaga na Copa Uefa – sem a penalização, ficaria com vaga na Liga dos Campeões.
O romeno foi titular durante toda a Serie A e só não entrou em campo enquanto esteve suspenso por cartões amarelos – foram 13, ao todo. O romeno também foi responsável por várias assistências e marcou 16 gols no campeonato, dividindo a artilharia da equipe com Toni. Algumas publicações e canais de TV chegaram a eleger Mutu como o melhor jogador da competição.
No ano seguinte, Mutu continuou em alta e com espírito goleador. Balançou as redes 17 vezes na Serie A e foi o artilheiro do time na campanha que levou os gigliati à 4ª posição e a uma vaga na Champions. Na Copa Uefa, o romeno fez seis gols e foi fundamental para que a Fiorentina alcançasse as semifinais do torneio, em um dos melhores resultados internacionais dos florentinos. No final da temporada, foi o destaque de sua seleção na Euro 2008 e deu trabalho para a Itália no jogo entre as duas seleções: fez um gol e teve um pênalti defendido por Gianluigi Buffon.
Vivendo seu melhor momento, em 2008 o Briliantul chegou a recusar uma proposta da Roma para renovar seu contrato com a Viola até 2012. Em Florença ele ainda teve uma boa temporada em 2008-09, quando sua equipe voltou a ficar com a 4ª posição e uma vaga na LC: nesta campanha Mutu sofreu com uma série de lesões, mas anotou 13 gols em 19 partidas pelo campeonato, incluindo uma tripletta sobre o Genoa.
Dali para frente, o romeno viveu poucos momentos de alegria com a camisa violeta. Mutu sofreu uma lesão no menisco e depois testou positivo para sibutramina, substância utilizada para perda de peso. O romeno foi suspenso por nove meses e só voltou aos gramados em outubro de 2010. Três meses depois foi afastado do elenco por comportamento antiprofissional, mas acabou reintegrado após se desculpar, em fevereiro de 2011. Ainda assim, parecia o fim da linha para o jogador, que era querido pela torcida, mas não atuava mais no mesmo nível que antes.
E assim foi: após quase cinco anos, 143 partidas e 69 gols pela Fiorentina, o Briliantul foi negociado em definitivo com o pequeno Cesena. A equipe bianconera havia sido promovida à primeira divisão em 2010 e apostava no atacante de 32 anos como sua principal arma na busca de uma nova salvezza.
O time da Emília-Romanha fez uma temporada bem abaixo do que dele se imaginava: o elenco não era ruim e tinha jogadores como o goleiro Francesco Antonioli, os meias Roberto Guana, Marco Parolo, Antonio Candreva e Mario Santana, além de Mutu e Éder no ataque. O romeno foi o artilheiro do time, com oito gols, mas não conseguiu ajudar os cavalos marinhos a permanecerem na Serie A – na verdade, os romanholos foram lanternas e caíram com grande antecedência.
Mesmo com a queda do Cesena, foi com o clube do estádio Dino Manuzzi que Mutu alcançou a marca de 103 gols no Campeonato Italiano. Dessa forma, ele se tornou o romeno com mais gols pela competição, além de um dos 100 maiores goleadores de toda a história da Serie A.
Após o rebaixamento, jogador e clube decidiram rescindir o contrato em mútuo acordo, um ano antes do seu final. Dessa forma, Adrian Mutu deixou a Itália para atuar no Ajaccio, da França, clube em que também se frustrou. Apesar das boas partidas, 11 gols e a salvação na Ligue 1 na primeira temporada, o atacante entrou 2013-14 em má fase e, sem marcar gols, rescindiu o contrato em janeiro de 2014.
Já com 35 anos e sem mercado nos principais campeonatos europeus, restava ao atacante retornar ao seu país natal. Mutu acertou com o Petrolul Ploiesti, time sob o comando de Cosmin Contra (ex-lateral do Milan), que já havia tentado o levar para o futebol chinês. Poucas atuações e poucos gols mostraram que a promessa de voltar aos bons dias não chegou a se tornar realidade. Assim como outros jogadores em fim de carreira ou já aposentados, Mutu foi um dos escolhidos para atuar no futebol indiano, onde quase não chegou a jogar, devido a problemas contratuais.
Após algumas rápidas apresentações pelo Pune City, o atacante romeno decidiu pendurar as chuteiras. Mutu repensou sua aposentadoria no início deste ano, quando recebeu oferta para atuar no ASA Targu Mures, também da Romênia, mas realizou somente quatro jogos pela equipe da primeira divisão do país.
Mesmo sem conseguir levar a seleção romena de volta a uma Copa do Mundo (competição que não disputa desde 1998), Adrian Mutu é, ao lado de Hagi, o maior artilheiro da seleção, com 35 gols marcados. O Briliantul, que também foi eleito o melhor jogador romeno em quatro oportunidades (2003, 2005, 2007 e 2008), anotou o último gol do país numa competição europeia, a Euro 2008. Ao mesmo tempo, enfrentou dois períodos de suspensão da seleção da Romênia: um por beber em um bar durante um jogo da Tricolorii da qual havia sido barrado e outro por ter comparado o técnico Victor Piturca a Mr. Bean.
Falar que Mutu não construiu uma importante história no futebol seria uma calúnia. Ao mesmo tempo, é impossível não pensar qual seria a dimensão que o romeno poderia ter atingido caso não tivesse se envolvido em tantas polêmicas extracampo e tivesse desperdiçado um bom pedaço de seu talento. Talvez os três anos de grandes exibições por Fiorentina e Parma tivessem se repetido em outras ocasiões.
Adrian Mutu
Nascimento: 8 de janeiro de 1979, em Calinesti, Romênia
Posição: atacante
Clubes em que atuou: Arges Pitesti (1996-99), Dinamo Bucareste (1999-00), Inter (2000), Verona (2000-02), Parma (2002-03), Chelsea (2003-04), Juventus (2005-06), Fiorentina (2006-11), Cesena (2011-12), Ajaccio (2012-13), Petrolul Ploiesti (2014), Pune City (2015) e ASA Targu Mures (2016)
Títulos conquistados: Campeonato Romeno (1999-00) e Copa da Romênia (1999-00)
Seleção romena: 77 jogos e 35 gols