O estereótipo de volantes argentinos é o mesmo há anos. Defensores duros, que adoram “descer a lenha” na canela de atacantes, com pouca técnica e adoradores de confusões. Porém, um em especial fugiu à regra, Fernando Redondo. O jogador brilhou na década de 1990 e teria a chance de ter ainda mais sucesso no Milan, que pagou uma fortuna para tê-lo. Porém, ele atuou pelo clube em apenas 33 partidas em quatro temporadas, por conta de uma gravíssima lesão, e foi um dos piores negócios da história do futebol, por puro azar.
Natural de Adrogué, na Argentina, Redondo iniciou sua carreira no Argentinos Juniors, ainda aos 16 anos e destacou-se por ser diferente dos volantes argentinos, com lealdade na marcação e qualidade fora do comum com a bola nos pés. Foram quase cinco anos no clube argentino até que surgiu a oportunidade de brilhar em campos espanhóis, primeiro no Tenerife e na sequência, no Real Madrid, clube em que viveu o auge da carreira.
Em dez anos de Espanha, se consagrou como um dos melhores meio-campistas da década. Mesmo em meio a estrelas, venceu prêmios individuais no Real Madrid e na Uefa – chegou a ser eleito o jogador do ano pelo clube e pela própria entidade europeia, em 1999-2000. Ele tinha tudo para entrar para se tornar um lenda do futebol, não fosse sua passagem pelo Milan.
Depois de ganhar o mundo com o time madrilenho, Redondo quis realizar o sonho de atuar na Itália. “É sempre belo jogar em San Siro”, disse, indicando a todos qual seria seu destino. O destino foi o Milan, time que se reestruturava para voltar a ser um gigante na Europa, com a contratações de grandes nomes, como Andriy Shevchenko e Serginho, além de nomes que poderiam ser úteis, como os jovens Fabricio Coloccini e José Mari.
Por 25 milhões de euros, uma cifra assustadora para a época, chegava a Milão com status de grande jogador. Os mais empolgados o definiam da seguinte maneira: “Com físico de Frank Rijkaard, visão de jogo de Gianni Rivera, elegância de Giancarlo Antognoni e personalidade de Obdulio Varela”. O Redondo de sua melhor partida na carreira, aquela que fez Old Trafford e o Manchester United se renderem à sua qualidade, era aguardado ansiosamente em Milão.
Mas ainda na pré-temporada seu destino começa a mudar, mais precisamente em 19 de agosto. Em uma dividida com Luca Antonini, então jogador da base do Milan, rompeu parcialmente o ligamento cruzado anterior. A operação realizada mais de um mês depois do acidente, fez com que Redondo parasse por seis meses, praticamente perdendo quase toda a temporada.
Segundo as palavras de Alberto Zaccheroni, técnico milanista da época, Redondo veio como o grande reforço. “Contávamos muito com ele para ter melhor qualidade no meio campo. Com sua classe e sua experiência teríamos dado um grande passo a frente. É realmente um pecado”, disse, em 2000.
O que deveria ser uma lesão resolvida em alguns meses, se alongou e as contusões apareciam seguidamente, a ponto do próprio Redondo pedir a suspensão de seu milionário salário. Foram quase três anos até que pudesse atuar com regularidade. Quando conseguiu voltar, se deparou com um jovem talento, Andrea Pirlo.
Com os resultados da equipe aparecendo e sem ter a mesma força física de outrora, Fernando não hesitou em sua decisão. “Depois do Milan, não poderia jogar em nenhum outro clube da Itália”. O jogador chegou a pensar em jogar na Inglaterra, mas não teve como. Nem pelo Milan, nem por qualquer outro clube. O destino de Redondo foi mesmo pendurar as chuteiras, aos 35 anos de idade, e com apenas 16 jogos com a camisa vermelha e preta.
Bem articulado, desenvolvido e consciente, preferiu a família às salas de cirurgia. Uma escolha que só deve ter sido mais fácil do que a do início de carreira, quando abdicou da Copa do Mundo de 1990 para focar nos estudos, por desavenças com Carlos Bilardo. Aliás, seleção nacional nunca foi seu ponto forte.
Em 1994, Redondo foi à Copa do Mundo, mas sucumbiu junto com toda seleção argentina e os problemas de doping de Diego Armando Maradona. Já em 1998, que deveria ser o momento do seu auge na albiceleste, virou uma confusão. O técnico da Argentina, Daniel Passarella, obrigava os jogadores de cabelos longos a cortarem-nos curtos, para que tivessem chances. Redondo não o fez e ficou fora de mais um Mundial. Há quem acredite que com o volante em campo, a Holanda não teria eliminado os argentinos.
Em sua despedida, deixou as seguintes palavras: “A única coisa que me desagradou nessa experiência no Milan, foi o azar que tive quando cheguei, porque era o momento mais importante de minha carreira. Mas a vida é assim e temos de enfrentar os momentos difíceis”.
Ainda assim, é quase impossível deixar de lembrar Fernando Redondo. Os torcedores blancos certamente, mas os rossoneri também. Eles dificilmente esquecerão daquele que foi um dos melhores meio-campistas dos últimos tempos, e que poderia ter dado ainda mais glórias a um Milan que conquistou quatro títulos durante os anos em que Redondo esteve por lá.
Fernando Carlos Neri Redondo
Nascimento: 6 de junho de 1969, em Adrogué, Argentina
Posição: volante
Cclubes: Argentinos Juniors (1985-90), Tenerife (1990-94), Real Madrid (1994-2000) e Milan (2000-04)
Títulos: Copa das Confederações (1992) e Copa América (1993), La Liga (1995 e 1997), Supercopa da Espanha (1997), Liga dos Campeões (1998, 2000 e 2003), Mundial Interclubes (1998), Coppa Italia (2003), Supercopa Uefa (2003) e Serie A (2004)
Seleção argentina: 29 jogos e 1 gol