Dez anos atrás, a Itália era campeã mundial pela quarta vez, se consagrando como a segunda maior detentora de taças da Copa do Mundo. Título que coroou a geração de ouro dos anos 1990, que até então havia fracassado nos Mundiais de 1998 e 2002 e na Euro 2004, além de ter batido na trave em 2000. Contra a França, a Nazionale vingou a final perdida com o gol de ouro de David Trezeguet, justamente o único a não converter o pênalti em Berlim.
A conquista veio em momento turbulento do futebol italiano: o Calciopoli resultou no rebaixamento da então bicampeã da Serie A, a Juventus, e em punição do Milan, que também teve dirigentes envolvidos. As duas equipes formavam a base da seleção de Marcello Lippi – curiosamente, o Palermo era o terceiro clube com mais jogadores convocados, fruto das boas campanhas na elite nos dois anos anteriores à Copa.
Na Alemanha, Lippi dispunha de uma equipe com experiência internacional, com campeões nacionais, europeus e rodagem na seleção: idade média de 28 anos e média de 32 partidas por jogador. Na formação consagrada que entrou em campo na semifinal e na final – Buffon, Zambrotta, Cannavaro, Materazzi, Grosso, Camoranesi, Gattuso, Pirlo, Perrotta, Totti e Toni -, o jogador com menos presenças era Grosso (17 partidas) e o mais novo era Pirlo (27 anos). A base da seleção havia sido formada quase inteiramente em trabalhos das seleções de base, de 1994 a 2004. Dez anos que construíram o tetra.
Mas onde estão os tetracampeões hoje? Quase todos os jogadores já penduraram as chuteiras e nós contamos o que os 23 escolhidos por Lippi fazem atualmente.
Goleiros
Começamos pelo consagrado Gianluigi Buffon. Com 28 anos, ele já era um dos melhores do mundo e hoje, uma década depois, talvez seja o melhor da história. Recordista de partidas pela seleção (161), após cinco Copas do Mundo e quatro Eurocopas, Gigi projeta se aposentar depois do Mundial da Rússia, em 2018. O goleiro é o segundo atleta que mais partidas disputou pela Juventus (579), chegou a sete scudetti e foi o capitão do pentacampeonato da Velha Senhora, entre 2012 e 2016.
Na sua reserva, o veterano Angelo Peruzzi se aposentou um ano depois, pela Lazio, enquanto o promissor Marco Amelia não vingou: esperava-se que seria um grande goleiro, após bons anos por Livorno, Palermo e Genoa, mas foi relegado à reserva do Milan, passou por equipes das divisões inferiores e se aposentou. Depois, se tornou presidente honorário do Lupa Castelli Romani, da terceirona, e foi terceiro goleiro do Chelsea.
Defensores
Entre os zagueiros, o principal destaque é Fabio Cannavaro. O capitão foi eleito o melhor jogador do mundo no final do ano do tetra e seguiu sua grande carreira pelo Real Madrid, se transferindo após o rebaixamento da Juventus. O zagueiro foi mal na capital espanhola e retornou a Turim em 2008, mas foi hostilizado pela torcida juventina e só ficou por um ano. Com isso, Cannavaro para o Al-Ahli, clube pelo qual se aposentadoria e começaria como treinador (ainda assistente), passando depois por Guangzhou Evergrande e Al-Nassr antes de seu trabalho atual, no Tianjin Quanjian.
Alessandro Nesta, titular da zaga até se lesionar novamente, ainda jogou uma partida pela seleção depois do Mundial da Alemanha e se aposentou em seguida. Ele seguiu como profissional por mais sete anos e foi campeão da Serie A e da Liga dos Campeões pelo Milan, se mantendo no hall dos grandes zagueiros do futebol italiano e mundial. Encerrou a carreira no Montréal Impact e retornou brevemente no indiano Chennaiyin, treinado por Marco Materazzi, antes de assumir o comando técnico do Miami FC, time dirigido por Paolo Maldini e da segunda divisão do futebol norte-americano.
Por falar em Materazzi, ele foi um dos grandes personagens naquela Copa. O bruto e técnico zagueiro se aposentou da seleção apenas após a Euro de 2008 e prosseguiu sua carreira na Inter até 2011, um ano depois do triplete nerazzurro. Retornou da aposentaria rapidamente no Chennaiyin em 2014, clube indiano no qual continua apenas como treinador.
Outro ídolo inesperado da conquista, o lateral Fabio Grosso se juntou à Matrix após a Copa, mas não teve destaque em Milão: foi reserva de Maxwell e Javier Zanetti antes de ser campeão francês pelo Lyon. Nos últimos três anos de carreira, foi reserva da Juventus, período em que se formou em ciência política e estudou para ser treinador, função que assumiu em 2014 na Primavera bianconera. Em seu currículo, o romano já tem o título da Copa Viareggio em 2016 e o vice da Coppa Italia e do campeonato sub-20 no mesmo ano.
Gianluca Zambrotta, assim como Cannavaro, foi para a Espanha em 2006, mas para o Barcelona. Permaneceu dois anos na Catalunha antes de encerrar a carreira no Milan, como campeão italiano – pela seleção, parou em 2010, após quase 100 partidas. O lateral estudou para ser treinador e retornou aos campos, como Materazzi, para ser jogador e treinador do Chiasso, até 2015. Atualmente treina o também indiano Delhi Dynamos.
O jovem Cristian Zaccardo seguiu no Palermo até 2008, se confirmando um bom defensor. Depois, ele foi campeão alemão pelo Wolfsburg e se consagrou no Parma antes de ir para o banco do Milan, que esquentou por três temporadas. Em 2015-16, o zagueiro foi capitão do Carpi na estreia do modesto clube na Serie A.
Andrea Barzagli, seu companheiro no Palermo, também foi campeão no Wolfsburg e fundamental no time de Felix Magath. No retorno à Serie A em 2011, chegou sob desconfiança na Juventus, mas se tornou um dos grandes zagueiros da Europa, parte essencial do time pentacampeão italiano e veterano do trio BBC, com Leonardo Bonucci e Giorgio Chiellini.
Reserva de Zambrotta, Massimo Oddo ficou mais um ano na Lazio antes de retornar ao Milan, clube que defendeu nos anos 1990. O lateral foi campeão europeu na primeira temporada e italiano mais tarde, revezando na posição com Cafu e o próprio Zambrotta, posteriormente. Teve rápida passagem pelo Bayern, por empréstimo, e encerrou a carreira no Lecce. Desde 2015 é treinador do Pescara e nesta temporada disputará a Serie A.
Meias
Andrea Pirlo se tornou gênio. O camisa 21 demorou para ganhar espaço na Azzurra, com Giovanni Trapattoni, mas se consolidou na seleção após grande desempenho na Alemanha. Ídolo do Milan, ficou por mais cinco anos em Milão e foi campeão da Serie A e da Liga dos Campeõe, antes de se transferir para a Juventus. Chegou desacreditado após problemas físicos, mas sob o comando de Antonio Conte cresceu ainda mais, regendo a equipe tetracampeã italiana. Produtor de vinho, agora aproveita o final da carreira no New York City, treinado por Patrick Vieira. Na seleção, chegou a 116 partidas e se aposentou em 2014, retornando por um breve período com Conte em 2015. Depois que foi para os Estados Unidos, não voltou a ser convocado.
Fiel escudeiro de Pirlo, Gennaro Gattuso foi um dos tantos tetracampeões que se aposentaram da seleção em 2010, mas seguiu a carreira no Milan por outros dois anos, também chegando aos títulos italiano e europeu. Seu último ano mordendo canelas foi pelo Sion, da Suíça, equipe na qual estreou como treinador. O volante ainda teve passagens apagadas por Palermo e pelo grego OFI Creta. Atualmente treina o Pisa, que sob seu comando subiu para a Serie B.
Daniele De Rossi era o reserva de Rino e o mais jovem do grupo de 2006, com 22 anos. O romano se agigantou desde então: com 106 participações pela seleção, esteve em todos os torneios disputados pela Itália até 2016 e segue como vice-capitão da Roma. O eterno Capitan Futuro, à espera da aposentadoria de Francesco Totti, já coleciona mais de 500 partidas pelo clube do seu coração e, apesar das especulações, não espera sair tão cedo.
Um dos destaques do Palermo de Francesco Guidolin e Luigi Delneri, Simone Barone não teve destaque na seleção, pela qual jogou apenas com Lippi. Após o Mundial, o volante seguiu a modesta carreira em Torino, Cagliari e Livorno. Como treinador, passou pelas categorias de base do Modena por dois anos e teve uma temporada na base do Parma, refundado por Nevio Scala. Agora é o assistente de Zambrotta no Delhi Dynamos.
Outro que se consagrou na Alemanha foi o versátil Simone Perrotta, titular do time de Lippi. Seguiu na seleção até perder espaço com o próprio Lippi, em 2009. Na Roma, se destacou como um dos líderes das equipes de Luciano Spalletti e Claudio Ranieri, batendo na trave pelo título quatro vezes. Em nove temporadas na Cidade Eterna, foram 326 partidas e dois títulos da Coppa Italia. Após se aposentar, em 2013, começou a trabalhar com o ex-companheiro Damiano Tommasi na Associação de Jogadores Italianos, focando no futebol de base da Bota.
Mauro Germán Camoranesi foi o único oriundo do grupo de 2006 – o primeiro depois de quatro décadas, sucessor do ítalo-brasileiro Angelo Sormani. O meia nascido na Argentina seguiu a carreira no futebol italiano até 2010, quando trocou a Juventus pelo Stuttgart e abandonou a seleção, com 55 participações. Camoranesi ainda voltou a sua terra natal para jogar no Lanús e se aposentou no Racing, em 2014. Como treinador, já atuou no México (Coras de Tepic, da segunda divisão) e no argentino Tigre – ambas passagens sem sucesso.
Atacantes
No ataque, dois ídolos máximos e atacantes históricos do futebol italiano e mundial. Apesar da pressão da mídia e torcida, Francesco Totti se aposentou da seleção e nunca mais voltou, colecionando apenas 58 partidas com a camisa azzurra. Na sua casa, porém, segue Rei. Depois de 2001, sonha com outro scudetto, mas continua batendo na trave: desde então são seis vices. De qualquer forma, são 758 partidas e 304 gols pelos giallorossi, sendo fundamental mesmo no final de carreira e sem condições físicas. Totti também é o segundo maior artilheiro da história da Serie A.
Do outro lado, Alessandro Del Piero. O maior artilheiro da Juventus, com 290 gols em 705 partidas, seguiu no clube até 2012, com seis scudetti alcançados e com participação no primeiro dos cinco consecutivos nesta década. Pela seleção, também teve mais sucesso que Totti, iniciando a carreira antes e terminando somente após a Euro 2008, com 91 participações e 27 gols. Pinturicchio também jogou na Austrália, pelo Sydney FC, e se aposentou no indiano Delhi Dynamos, em 2014. Comentarista da Sky italiana em 2015, atualmente não está empregado e vive de ações de mídia.
No auge da carreira, Luca Toni seguiu outro ano na Fiorentina e partiu para Munique em 2007. No Bayern, além de campeão alemão, teve seu melhor ano, com 39 gols em 46 partidas e seguiu no clube por outras duas temporadas, sendo emprestado na metade da última para a Roma. Após isso, teve passagens sem destaque por Genoa, Juventus e ganhou alguns trocados no Al Nasr, antes de reaparecer na Fiorentina e colocar sua carreira nos trilhos pouco depois da morte de seu filho. O bomber rejeitou um contrato como diretor em Florença para continuar jogando e se aposentou com chave de ouro: foi artilheiro da Serie A em 2015 e, no total, anotou 51 gols em 100 partidas pelo Verona (48 deles na Serie A), virando o maior goleador da história do clube. Na seleção, seguiu até 2009, encerrando seus dias em azzurro com 16 gols em 47 partidas.
Por falar em bomber, Pippo Inzaghi teve na Alemanha sua última grande competição na seleção, já que não foi mais convocado depois de 2007. Sexto maior artilheiro da Azzurra, com 25 gols em 57 partidas, Super Pippo também é o terceiro maior marcador da Liga dos Campeões e encerrou a carreira em 2012, depois de uma década no Milan. Como treinador, seguiu em Milanello até 2015, comandando o sub-17, a Primavera (foi campeão em Viareggio em 2014) e o time principal por uma temporada cada. Agora seu desafio é treinar o Venezia na Lega Pro.
Apesar de não ter se tornado tão grande como o projetado, Alberto Gilardino também é um clássico bomber italiano. Desde a Copa, teve oito temporadas com mais de dez gols na Serie A e atualmente está entre os 10 maiores artilheiros do campeonato, com 188 gols marcados. Depois do Milan, onde foi campeão europeu e mundial, fez três boas temporadas na Fiorentina e virou um peregrino: passou por Genoa, Bologna, Guangzhou Evergrande (China), outra vez pela Fiorentina, Palermo e agora reforçou o Empoli. Não é convocado para a Nazionale desde 2013 e atualmente tem 19 gols em 57 partidas pela Azzurra.
Daqueles atacantes sem grande destaque que surgem na seleção, Vincenzo Iaquinta teve bom rendimento nas 40 partidas em que vestiu azul. Estreou com Lippi, em 2005, e abandonou a Nazionale com o próprio, cinco anos depois. Segundo maior artilheiro da Udinese, com 69 gols em 205 partidas, foi para a Juventus em 2007 e teve boas temporadas, apesar da fase ruim dos bianconeri. Entre 2011 e 2013, porém, não jogou um único minuto com Conte, e foi emprestado ao Cesena em 2012, naquela que foi sua última experiência como jogador profissional. Atualmente estuda para ser treinador.
O comandante
Por último e não menos importante, o treinador. Depois do título, Marcello Lippi abriu espaço para Roberto Donadoni e virou comentarista da Sky italiana, mas acabou retornando ao comando da seleção após o resultado ruim da Azzurra na Euro 2008. O treinador de Viareggio foi artífice de uma vexatória participação na África do Sul em 2010, dando espaço para boa parte do já envelhecido elenco campeão em 2006. Depois da queda na primeira fase, Lippi ficou novamente afastado por dois anos, até assumir como treinador do chinês Guangzhou Evergrande. Na Ásia, faturou três campeonatos nacionais consecutivos e um título da Liga dos Campeões local em 2013. Entre 2014 e 2015, ocupou o posto de diretor, função que exerceu até fevereiro. Recentemente foi cotado para ser diretor da seleção italiana, mas o Tribunal Federal não permitiu, por conflito de interesse – seu filho é agente de jogadores.