Jorginho, considerado como ‘novo Pirlo’, é o coração da surpreendente campanha do Hellas (Divulgação)
O primeiro turno da Serie A não chegou sequer à metade. Não há quem possa apontar com completa segurança um favorito ao título e os times que irão à próxima Liga dos Campeões, com pelo menos sete clubes na condição de fazê-lo. Ou apontar quem são os favoritos ao descenso, uma vez que o lanterna pode subir até cinco posições se vencer hoje. Tudo pode, portanto, mudar. Mas de uma coisa pouquíssimas pessoas podem discordar: ninguém imaginava o Verona na posição em que está.
Quatro vitórias em sete partidas e uma quinta colocação que lhe daria vaga na Liga Europa da temporada que vem. Acima de equipes aclamadas como Fiorentina, Lazio, Udinese e Milan. Não seria nada anormal, se não estivéssemos falando de um clube que retorna à Serie A pela primeira vez em 11 anos e que, há três, se encontrava na antiga Serie C, atual Lega Pro Prima Divisione. Uma ascensão relâmpago e uma campanha, por hora, sólida no retorno à elite, com o melhor início de campanha na história do clube logo após a de 1984-85, que acabou resultando no único scudetto veronês. Quais os ingredientes dessa receita veronesa de sucesso? Nós tentamos descobrir.
Toni, o artilheiro da equipe na temporada, com quatro gols (Divulgação)
Raffaele Tomerelli, editor-chefe do departamento de esportes do jornal L’Arena, de Verona, conversou conosco a respeito do surpreendente Hellas. Entre os vários motivos, ele apontou alguns dos vários brasileiros presentes no plantel como peças-chave no desempenho veronês.
“Os resultados do Verona, na realidade, são realmente surpreendentes, sobretudo porque era uma legenda que não figurava na Serie A há 11 anos e que há três anos ainda estava na Serie C. É justo dizer, contudo, que o clube trabalhou muito bem no mercado, como demonstra a chegada de Luca Toni, um campeão do mundo em 2006 com a seleção de Lippi. Toni ainda está inteiro, é um jogador que poderia ainda se encaixar em vários clubes grandes e até mesmo na seleção de Prandelli. Até agora, ele tem sido o ‘homem a mais’ de um time que pode ser realmente a grande surpresa do campeonato”, explicou.
Toni assinou com o Verona na inter-temporada, após seu contrato com a Fiorentina chegar ao fim. Com quatro gols em seis jogos, sendo dois em uma dopietta que deu a vitória por 2 a 1 sobre o Milan no primeiro jogo do campeonato. Toni é a cereja do bolo de um time bem treinado e com um padrão de jogo. E, nessa engrenagem que vem funcionando até o momento, vários brasileiros vêm desempenhando papéis importantes.
Rafael, um dos melhores goleiros da história do clube
Ao todo, são seis jogadores brasileiros: o goleiro Rafael Bittencourt, de 31 anos, formado nas categorias de base do Santos, mas que nunca teve chances e seguiu para o clube veronês em 2007, quando este disputava a Serie C1. Foram mais cinco temporadas com a camisa dos butei, três na Lega Pro e dois na Serie B, antes de voltar à elite este ano, todas como titular absoluto; o também goleiro Nicolas Andrade, de 25 anos, formado nas categorias de base do Atlético-MG e no clube desde 2011; o zagueiro Rafael Marques, contratado há poucos meses junto ao mesmo Atlético-MG, e que ocupa a reserva; o volante Raphael Martinho, das categorias de base do Atlético-PR, que joga na Itália desde 2010 e chegou ao Verona na temporada passada e assumiu a titularidade; o lateral Rômulo, ex-Cruzeiro e Atlético-PR, que se destacou nas duas últimas temporadas pela Fiorentina; e o volante Jorginho. Mas, deste, falaremos em separado.
“No Verona mais sul-americano de todos os tempos, os jogadores brasileiros têm uma grande importância. Excelente, acima de tudo, a chegada de Rafael, que já começa a ser considerado um dos melhores goleiros da história do Verona. Rafael fez toda a escalada, da Serie C à Serie A, e vem demonstrando também na elite que é um dos pontos fortes da equipe. Outro que entrou muito bem foi Rômulo, um coringa preciosíssimo para Mandorlini, que até já está presente na lista dos artilheiros do time. Outra presença fundamental é a de (Raphael) Martinho, que estourou no ano passado na B e já é um dos mais destacados nesta temporada. Falta vermos apenas (Rafael) Marques, que acaba de chegar do Atlético Mineiro e ainda não estreou. De Jorginho, obviamente, falemos à parte”, disse Tomerelli.
Percebe-se o preciosismo com o qual se fala de Jorginho até no discurso do jornalista. Tratado como uma verdadeira jóia, o brasileiro não tem história no futebol brasileiro, pois sua família mudou-se para a Itália quando ele ainda era muito jovem, de Imbituba, no litoral catarinense. Sua carreira como jogador foi inteira construída nas categorias de base do Verona e sua chegada ao time principal do clube se deu na temporada 2009-2010, ainda na Lega Pro, quando o mesmo tinha 18 anos. Após uma temporada de empréstimo ao Sambonifacese, da Serie D italiana, ele retornou ao Hellas para jamais sair novamente.
Jorginho (dir.), regista da equipe, e Rômulo (esq.), peça importante
Após duas temporadas na Serie B, como titular, Jorginho se tornou um dos pilares da equipe e passou a chamar atenção de vários grandes clubes e da seleção italiana sub-21, pela qual já foi convocado. A diretoria veronesa optou por manter o jovem mesmo quando se confirmou o acesso à Serie A e agradece aos céus pela aposta. Jorginho é o décimo jogador da Serie A com mais passes certos, com 361, e já é alvo de uma disputa majoritária entre Fiorentina, que tem uma boa via de negócios com o clube veronês e Juventus que, acreditem ou não, estaria apostando em sua contratação para repor uma provável saída de Pirlo, na janela de janeiro. Clubes ingleses também teriam interesse no brasileiro.
Seria prepotência demais chamar o brasileiro de um “novo Pirlo” no atual momento, mas Tomerelli crê que o atleta reúne características que o colocam como um dos jogadores mais promissores do futebol italiano. “Jorginho tem todas as qualidades, a técnica, a tática e a moral para se tornar um grande jogador, e, portanto, tem calibre também para chegar a um clube gigantesco como a Juve. Sua experiência com a camisa do Verona tem demonstrado que ele é capaz de executar todas as funções do meio-campo, sem acusar dificuldades e com a mesma segurança sempre. Sinal de uma grande personalidade, a mesma que o colocou no alvo de várias outros grandes clubes europeus. Certamente que colocá-lo hoje no mesmo nível que Pirlo é arriscado, mas, entre os jovens meio-campistas do campeonato italiano, ele é, seguramente, o mais maduro. E o desenrolar do campeonato tem demonstrado claramente isso”, disse.
Luciano Bruni, treinador da equipe primavera da Juventus, em entrevista ao mesmo jornal L’Arena, confidenciou que persegue Jorginho há tempos. “Eu sinalizei para os nossos diretores sobre esse jogador, pois sempre acreditei nele com uma perspectiva segura. Mas não tive influência o bastante para concretizar sua contratação. Um pecado… Novo Pirlo? Não sei se podemos compará-lo a Pirlo, propriamente, pois Andrea é um jogador único. Mas sem dúvida alguma ele seria muito útil à Juventus”, disse o treinador.
Na nossa conversa com Tomerelli, ele ainda nos falou sobre a recente perda do vice-presidente Giovanni Martinelli, que faleceu na última terça-feira e que abalou o clube. Martinelli foi o presidente que resgatou o Hellas no pior momento de sua história, evitando sua falência, e estruturando a volta à Serie A. Trataremos disso na próxima parte deste especial.