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Carrasco da Juve, Julio Cruz foi ídolo de Bologna e Inter

Nenhum campeonato de ponta dá tantas chances quanto a Serie A para que atacantes botinudos possam brilhar. Se a figura do centroavante grosso italiano já é uma entidade mística do futebol, o Belpaese também recebeu estrangeiros com total dignidade para ocupar este posto. Um deles foi Julio Cruz, argentino que brilhou com as camisas de Bologna e Inter.

Antes de brilhar na Itália, Cruz teve um longo e difícil percurso na Argentina. O atacante nasceu em Santiago del Estero, cidade localizada na inóspita região norte do país, mais de 1000 km distante da capital Buenos Aires e a cerca de 800 km das fronteiras com Paraguai, Chile e Bolívia. Não foi por lá, porém, que ele começou sua carreira: próximo dos grandes centros, deu seus primeiros passos nas categorias de base do Temperley, mas a falência do clube o deixou livre para assinar um contrato com o Banfield, também da região metropolitana bonairense.

Foi no clube alviverde que Julio Cruz ganhou o apelido que o acompanhou por toda sua carreira: El Jardinero. Na época em que era canterano de El Taladro, ele gostava de percorrer o campo nos carrinhos de jardinagem, que aparavam a grama. Certo dia, o treinador do time principal o viu a bordo da máquina e pediu que ele cortasse um pouco o gramado próximo à área, pois o plantel profissional treinaria em seguida. A alcunha surgiu ali e acabou pegando.

Após brilhar no Feyenoord, o argentino teve dias felizes com a camisa do Bologna (Getty)

Cruz estreou pelo Banfield em 1994 e permaneceu no clube portenho até 1996. Após 64 jogos e 16 gols pelos alviverdes, o centroavante deu o primeiro grande passo na carreira e assinou com o gigante River Plate. Pelos millonarios, El Jardinero explodiu: em apenas um ano no Monumental, ganhou os torneios Apertura e Clausura, marcando 18 vezes em 32 partidas. Aos 23 anos, recebeu sua primeira convocação para a seleção argentina, participou da Copa América de 1997 e foi vendido para o Feyenoord, da Holanda.

Em Roterdã, Cruz passou a ser conhecido de todo o continente europeu. De 1997 a 2000, período em que defendeu a camisa do chamado “clube do povo”, o argentino teve uma excelente média de gols, de quase um a cada dois jogos: foram 50 em 104 partidas. Na Holanda, o centroavante ganhou a Eredivisie e a Supercopa, em 1999, e também disputou a Liga dos Campeões. Em sua primeira participação, em 1997-98, ele marcou dois gols em uma vitória sobre a Juventus – que seria a vice-campeã do torneio – e iniciou a sina de balançar as redes contra a Velha Senhora.

O encontro com o futebol italiano na Champions também antecipava a transferência do jogador para a Serie A. Em 2000, El Jardinero fechou um contrato com o Bologna, clube tradicional da Bota e que estava buscando se consolidar novamente na elite após anos nas divisões inferiores. Os primeiros momentos de Cruz na Emília-Romanha foram complicados, porque os preparadores físicos dos felsinei pediram que ele perdesse peso rapidamente, o que comprometeu sua força. Após se adaptar, logo relegou Igor Kolyvanov e Luís Oliveira ao banco, fazendo uma ótima dupla com Giuseppe Signori.

Cruz marcou 75 gols pela Inter e se notabilizou por castigar a arquirrival Juventus (AFP/Getty)

Em três anos sob as ordens do técnico Francesco Guidolin, o Bologna fez temporadas bastante razoáveis e tranquilas, sempre do meio da tabela para cima. O estilo finalizador de Cruz combinou com a velocidade e a qualidade técnica de Signori – os dois foram os goleadores do time naqueles anos.

El Jardinero foi o artilheiro rossoblù em 2001-02, com 12 gols, e ficou logo atrás do companheiro em 2000-01 e 2002-03, com sete e 10 tentos, respectivamente. As suas atuações e os 30 gols pela equipe do estádio Renato Dall’Ara o mantiveram sob a observação da Argentina – foi convocado algumas vezes entre 2000 e 2002 – e chamaram a atenção da Inter, que, a pedido do compatriota Héctor Cúper, o contratou para substituir Hernán Crespo e ser reserva de Christian Vieri.

O centroavante de 29 anos chegou com moral e ganhou logo a camisa 9, mas foi visto com alguma desconfiança pelos torcedores, já que não era um primor de técnica. Porém, campeonato após campeonato Cruz mostrava o seu valor – especialmente como arma para o segundo tempo – e fazia a torcida se render a seu estilo trombador, mas eficiente. Nos seis anos de Beneamata, a maior parte dos gols de El Jardinero foram de cabeça, aproveitando seu 1,90m de altura e ótimo posicionamento, ou dando apenas um ou dois toques na bola para completar de dentro da grande área as jogadas criadas pelos companheiros. Cruz também era um bom cobrador de faltas.

Nem sempre com técnica, mas com muita vontade o tempo inteiro: assim, El Jardinero conquistou a torcida nerazzurra (AFP/Getty)

O argentino é dono de uma bela média de gols pela Inter: foram 75 gols em 190 partidas, superior a um tento a cada três jogos. Para quem quase sempre foi reserva, é um número muito expressivo – principalmente considerando os 15 gols marcados em 2005-06, que o levaram à Copa do Mundo de 2006, e os 13 de 2007-08. Além disso, Cruz era conhecido por ser um artilheiro de gols importantes: marcava em partidas complicadas e ajudou bastante a Beneamata a ganhar quatro scudetti, duas edições da Coppa Italia e três Supercopas Italianas no período em que esteve lá.

El Jardinero deu uma amostra de seu poder de decisão em sua segunda partida pelo clube: seu primeiro gol vestindo nerazzurro aconteceu em Highbury Park, em uma vitória por 3 a 0 sobre o Arsenal. Na temporada 2003-04 Cruz ainda anotou uma doppietta sobre a Juventus, time de que se revelou um verdadeiro carrasco: o argentino balançou as redes 10 vezes quando encarou a Velha Senhora, sete delas pela rival Inter. Para completar, o caneleiro ainda decidiu partidas contra o Milan (uma delas com apenas 11 segundos em campo) e uma final de Coppa Italia contra a Roma.

Em 2009, ao fim do contrato com a Inter, Cruz ficou livre para assinar com outro clube. O argentino assinou com a Lazio e, ironicamente, estreou logo batendo a Inter na Supercopa Italiana – um desentendimento forte com o ex-companheiro Maicon fez com que a imprensa especulasse um mal estar entre os dois, mas foi coisa de campo. Naquele ano, o atacante de 35 anos fez 30 partidas pela equipe romana, entrando quase sempre nos minutos finais. Com apenas quatro gols marcados e vários problemas físicos, optou por rescindir seu contrato e se aposentar.

Antes de encerrar a carreira, o atacante passou um ano na Lazio (Getty)

A aposentadoria fez com que Cruz voltasse a viver na Argentina ainda em 2010. Em seu país natal, decidiu que já se sentia realizado com o futebol e optou por não seguir carreira como treinador ou dirigente. Aliás, mudou radicalmente de planos: se aliou ao ex-cartola máximo do Boca Juniors, Mauricio Macri, e iniciou-se na política. Filiado ao Propuesta Republicana, mesmo partido do atual presidente argentino e ex-prefeito de Buenos Aires, El Jardinero sonha em ser o governante de Lomas de Zamora, cidade em que se tornou um futebolista vestindo a camisa do Temperley.

Julio Ricardo Cruz
Nascimento: 10 de outubro de 1974, em Santiago del Estero, Argentina
Posição: atacante
Clubes: Banfield (1993-96), River Plate (1996-97), Feyenoord (1997-2000), Bologna (2000-03), Inter (2003-09) e Lazio (2009-10)
Títulos: Campeonato Argentino (1996 e 1997), Eredivisie (1999), Supercopa da Holanda (1999), Serie A (2006, 2007, 2008 e 2009), Coppa Italia (2005 e 2006) e Supercopa Italiana (2005, 2006, 2008 e 2009)
Seleção argentina: 22 jogos e 3 gols

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1 Comentário

  • Bela matéria! Comecei a gostar dele jogando no Playstation e depois passei a acompanhar melhor sua carreira e a torcer por ele. Artilheiro decisivo demais!

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