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Alberto Bigon, um dos coadjuvantes mais importantes do futebol italiano

Sem sombra de dúvidas, um dos momentos mais importantes da bem-sucedida história do Milan foi a conquista do chamado “scudetto della stella”, ou seja, o décimo campeonato italiano da equipe, que lhe deu o direito de estampar uma estrela na camisa. Do mesmo modo, a temporada do segundo título da Serie A para o Napoli foi inesquecível. Alberto Bigon foi peça-chave nestes e em mais acontecimentos do futebol na Velha Bota, mas jamais recebeu a fama merecida.

Nascido em Pádua, em 31 de outubro de 1947, o ex-jogador e técnico aposentado curiosamente faz aniversário no mesmo dia que outra lenda rossonera, Marco van Basten. Ele recebeu oficialmente o nome de Albertino Bigon, dado por uma senhora extravagante que o registrou no cartório. Dessa forma, teve de conviver durante toda a vida com uma alcunha que nunca lhe agradou.

Com 15 anos, Bigon entrou nas categorias de base do Padova e logo foi reconhecido como um prodígio. Ainda como juvenil, levou o time ao título inédito do Campeonato Primavera de 1966 e no ano seguinte, já como profissional, ao vice-campeonato da Coppa Italia, melhor colocação do time biancoscudato na história da competição.

Atuações dignas de veterano levaram a promessa aos pés do Vesúvio. Entretanto, José Altafini e Omar Sívori não deixaram espaço algum para Alberto. Bruno Pesaola, treinador do Napoli na época, afirmou que ele ainda não estava pronto para a primeira divisão e assim, o garoto disse “até logo” sem jogar alguma partida, ainda em 1967, e se transferiu para a Spal. No clube de Ferrara, finalmente conseguiu estrear na Serie A.

O garoto começou a ter tempo de jogo, porém com atuações modestas, e a Spal caiu de divisão. Em seu segundo ano em Ferrara, os principais jogadores do time saíram e sobrou apenas o jovem atacante Bigon, habilidoso e com faro de gol. Foi o artilheiro do time, com nove tentos em 35 jogos, e a peça em volta da qual tudo girava. Não conseguiu salvar o time spallino de outro rebaixamento e foi cedido ao Foggia, que na época era comandado pelo saudoso Tommaso Maestrelli.

Em dois anos na Apúlia, Bigon viveu grandes e maus momentos, algo normal em qualquer início de carreira. Em seu primeiro ano foi coroado como artilheiro do time e o Foggia subiu para a Serie A. Já no segundo, o time viveu momentos conturbados, voltou para a segunda divisão e o paduano teve desempenho inferior ao da temporada de estreia pelos satanelli.

Bigon passou quase uma década no Milan, clube pelo qual mais se identificou (imago/Buzzi)

Alberto Bigon tinha um controle de bola incrível, somado a uma evolução com a redonda que não era possível de ser demonstrado quando jogava como centroavante. Assim, Maestrelli o colocava algumas vezes para atuar mais recuado, mas sempre perto o suficiente da meta adversária, para que marcasse seus gols. Foi essa mudança que lhe rendeu 18 tentos em 65 jogos pelo Foggia e que fez Nereo Rocco contratar o vêneto no último dia da janela de transferências do verão de 1971. Mantinha a camisa rossonera, mas agora vestiria a do Milan.

Foram nove anos maravilhosos na Lombardia, no clube onde é mais lembrado. Bigon começou com a árdua tarefa de substituir Angelo Sormani, que se transferira ao Napoli, e não sentiu a pressão. Seu ano de estreia terminou com grandes feitos coletivos e individuais: uma Coppa Italia e o vice-campeonato nacional, além da artilharia do Milan na Serie A (14 gols) e na temporada (19).

A partir da temporada seguinte, de forma inteligente, Rocco recuou Bigon, deixando mais espaço e oportunidades para Gianni Rivera, mezz’ala de qualidade ímpar, menino de ouro e ator principal no Milan, e Luciano Chiarugi, ponta que acabara de chegar da Fiorentina. O trio marcou incríveis 54 gols na temporada e foi o principal fator para as conquistas do bicampeonato da copa doméstica e da taça da Recopa Europeia.

O Milan na época tinha nove campeonatos nacionais e estava atrás de seu décimo, para, enfim, colocar a estrela no peito, algo que as rivais Juventus e Inter já tinham. Em 1972-73, o time fez um campeonato excelente, disputando a liderança com a Juve e foi para última rodada dependendo apenas de si mesmo, já que, com a vitória, sagrar-se-ia campeão.

O adversário era o Verona, time muito mais fraco, que precisava vencer para escapar do rebaixamento. Contra todas as apostas, o Hellas venceu os lombardos por 5 a 3 em casa. Bigon afirmou em entrevista que, se pudesse apagar uma partida da memória, seria esta. Chorou pela primeira vez por causa de futebol, escondido no chuveiro do vestiário.

Os anos seguintes foram um tanto complicados para o Milan, que teve várias trocas de treinadores e de diretores, mas sobretudo pela turbulência entre o comando e o craque Rivera. A equipe, então, ganhou apenas um título de Coppa Italia em cinco longos anos. No verão de 1978, prestes a fazer 31 anos, Bigon ficaria acima do limite de idade imposto pelo Milan, que estava se renovando com a batuta de Nils Liedholm, e seria cedido a algum time interessado.

Bigon jogou com craques no Milan e treinou lendas no Napoli (imago/Buzzi)

Como Albertino era seu protegido e fiel escudeiro, porém, o astro interveio, se opôs a qualquer negociação e garantiu a permanência do amigo por mais um ano. Naquele momento, se sobressaíram também características do temperamento de Bigon, conhecido por ser um homem calmo, sério e classudo, que não se importava com os holofotes.

As luzes da ribalta, porém, incidiriam sobre Bigon. Rivera se machucou no início da temporada 1978-79 e assim, toda a responsabilidade ficou com o paduano por grande parte da campanha. Herdou a camisa 10, a faixa de capitão e recebeu a batuta do meio de campo do treinador sueco, que armou um esquema especial, com Franco Baresi comandando a defesa e espaço total para o craque brilhar – oficialmente como meia-atacante. Alberto foi artilheiro do Milan, com 12 gols, e finalmente levou seu time à glória nacional, com a conquista do décimo scudetto e da tão desejada estrela. Chorou pela segunda e última vez por causa de futebol.

Bigon ainda jogou mais um ano pelo Milan, que foi terceiro colocado, mas acabou sendo rebaixado por envolvimento de jogadores no escândalo Totonero. Na fase final da carreira, o vêneto acabou trocando de clube após a queda, e fechou sua passagem no Milan com 218 jogos e 56 tentos. Alberto jogou por dois anos na Lazio, que também amargou o descenso à Serie B, e depois voltou para casa: atuou por mais dois anos no Vicenza, time de cidade homônima, vizinha à Pádua.

No mesmo ano em que Bigon chegou ao clube, uma jovem promessa de 15 anos de idade tinha acabado de subir para o profissional – um menino chamado Roberto Baggio. Não é exagero dizer que Alberto foi um dos primeiros que puderam compartilhar ensinamentos com Robi, um dos maiores craques do futebol italiano. Bigon se aposentou aos 36 anos, sem nunca ter jogado uma partida pela seleção principal, mesmo tendo futebol para isso.

Depois de uma breve pausa, Alberto Bigon retornou para os gramados, mas agora para ficar na área técnica. Logo após o Mundial do México, em 1986, estreia como treinador na Reggina, recém-promovida à terceira divisão. O time acabara de falir e Bigon resolve ajudar na reformulação, com sua cancha e toda a experiência no futebol. Conseguiu a proeza de alcançar um sexto lugar, com orçamento limitado, e recebeu um convite, prontamente aceito, da diretoria do Cesena. A equipe bianconera tinha acabado de retornar à Serie A.

Foram dois anos de adaptação no mais alto nível do futebol italiano. Bigon não conseguiu títulos mas manteve a equipe romanhola com louvor na primeira divisão, inclusive com uma arrancada histórica na segunda temporada. Com grande participação de Massimo Agostini – que fez nove gols na parte derradeira do campeonato –, os bianconeri ficaram invictos nos últimos cinco jogos em casa e em todos os confrontos diretos do returno. A 9ª colocação de 1987-88 e a 13ª de 1988-89 chamaram a atenção do Napoli, que acabara de perder Ottavio Bianchi para a Roma.

Bigon foi o técnico do Napoli de Maradona na conquista do segundo scudetto (LaPresse)

O acordo foi feito e o vêneto voltou ao Vesúvio. O mundo dá voltas e o jogador que não conseguiu jogar um só jogo em 1967, mais de duas décadas depois retornaria, agora em outra função, para comandar o elenco estelar de Diego Maradona, Careca, Alemão e companhia. O treinador sempre teve uma ideia de jogo muito clara e, embora tenha sido atacante, era bastante conservador e tradicional: um fiel replicador do modelo clássico de zona mista, ao qual não acrescentava nenhum tipo de toque pessoal.

Dando continuidade ao trabalho anterior e com atuações inesquecíveis de seus craques, o Napoli trouxe para casa seu segundo scudetto e foi também campeão da Supercopa Italiana. O ano seguinte foi complicado para o treinador, que até tinha um bom relacionamento com o gênio argentino, mas sucumbiu ao stress de tentar defender o título. Depois de um péssimo primeiro turno e do resultado positivo do exame antidoping de Maradona, em março, o time finalizou a temporada em oitavo. Isso levou a diretoria a reformular o elenco e demitir seu técnico, acusado por alguns de ser um “catenacciaro” – ou seja, um retranqueiro.

Com problemas de saúde relacionados ao nervosismo, como a pressão alta, Bigon ficou alguns meses parado. Quando retomou a carreira, em março de 1992, resolveu voltar uma casa e assumir o Lecce, na Serie B. Alberto guiou a equipe numa fuga do rebaixamento e voltou à elite, para também salvar a Udinese da queda – feito obtido apenas num jogo-desempate contra o Brescia. Após passar sem destaque pelo Ascoli, na segundona, e contribuir com a queda dos bianconeri para a terceira divisão, Bigon resolveu atravessar a fronteira e assumir o helvético Sion, em 1996.

Teve ali sua última glória como treinador, ganhando o campeonato e a copa da Suíça, em 1997 – o que fez com que os colegas lhe conferissem o prêmio de melhor treinador italiano no exterior. No ano seguinte, assumiu o Perugia por poucas rodadas e depois teve passagens breves por Olympiacos, Sion (novamente) e Interblock Ljubljana, na Eslovênia. Aos 62 anos, em 2009, Alberto decidiu se aposentar e sair de cena do futebol definitivamente.

Seus filhos Riccardo e Davide acabaram seguindo seus passos, mas atuaram somente nas categorias inferiores. O primogênito, porém, virou um diretor esportivo de relevo: Riccardo Bigon foi funcionário de Reggina, Napoli e Verona e, desde 2016 é responsável pelo futebol do Bologna. Alberto, por sua vez, leva uma vida pacata: joga golfe por lazer e é dono de um bed & breakfast de veraneio, em Pádua, dividindo a gerência com sua esposa e seus filhos.

Albertino Bigon
Nascimento: 31 de outubro de 1947, em Pádua, Itália
Posição: atacante e meia-atacante
Clubes como jogador: Padova (1964-67), Napoli (1967), Spal (1967-69), Foggia (1969-71), Milan (1971-80), Lazio (1980-82) e Vicenza (1982-84)
Títulos como jogador: Coppa Italia (1972, 1973, 1977), Recopa Uefa (1973) e Serie A (1979)
Clubes como treinador: Reggina (1986-87), Cesena (1987-89), Napoli (1989-91), Lecce (1992), Udinese (1992-93), Ascoli (1995), Sion (1996-97, 2007), Perugia (1997-98), Olympiacos (1999-2000) e Interblock Ljubljana (2008-09)
Títulos como treinador: Serie A (1990), Supercopa Italiana (1990), Campeonato Suíço (1997) e Copa da Suíça (1997)

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