Em seus tempos de ouro, o Parma ficou conhecido por contratar uma série de jogadores que tinham ou teriam renome mundial – alguns italianos, mas muitos estrangeiros. Isto não significa, porém, que o clube não desse espaço para pratas da casa, jovens criados nas categorias de base e com grandes ligações afetivas com a agremiação. O principal exemplo deles foi o atacante Alessandro Melli, que vestiu a camisa crociata por 10 anos e participou dos momentos mais gloriosos da história parmense.
Filho da arte, Alessandro – ou Sandro, como era apelidado – é o primogênito de Emilio Melli, centroavante de físico robusto que nasceu em Parma e defendeu o clube local nos anos 1960. Seu rebento, porém, seria gerado bem longe dali: veio ao mundo em Agrigento, Sicília, durante a passagem do pai pelo pequeno Akragas. Anos depois, a família deixou a ilha e foi morar novamente na cidade da Emília-Romanha conhecida por seus presuntos e seus queijos.
Mellino logo foi colocado pelo pai na escolinha de futebol do Audace Parma, pequeno clube do município. Alessandro ficou lá até os 13 anos, quando foi seguir os passos do pai como centroavante da base dos ducali, que à época não tinham as glórias que viriam a ser conquistadas nos anos 1990 – o Parma nunca havia disputado a Serie A e alternava entre a segunda e a terceira divisão. Foi justamente na antiga Serie C1 que Melli fez suas primeiras partidas como profissional, aos 16 anos: em 1985-86, Arrigo Sacchi o colocou em campo em seis partidas da reta final do campeonato, vencido pelos gialloblù, e viu a revelação balançar as redes uma vez.
Já na Serie B, Melli recebeu mais chances do treinador e atuou em 20 partidas, até enfrentar o Pisa e receber uma falta do zagueiro Davide Lucarelli – hoje colaborador técnico de Stefano Pioli na Inter. A pancada ocasionou uma lesão no joelho do jogador, que ficou fora de combate por grande parte da temporada 1986-87 e só conseguiu retornar nos últimos jogos, a tempo de marcar um gol sobre a Sambenedettese.
A contusão, no entanto, seria apenas o início de um período muito negativo para Sandro. Na temporada seguinte, foi pouco utilizado pelos técnicos Zdenek Zeman (que não confiava em sua forma física) e Giampiero Vitali, e, após ser terceiro colocado com o time sub-20 na Copa Viareggio, acabou emprestado para o Modena, da terceira divisão. Pelos canarini, não estourou: dentro de campo não parecia ter confiança e não balançava as redes, enquanto fora do futebol se dedicava a noitadas, garotas e futilidades – o que lhe rendeu o apelido de Casanova. Voltou ao Parma após seis meses e só entrou nos eixos em meados de 1989, época em que conheceu a advogada Silvia Serena – com quem se casaria – e quando passou a trabalhar com um novo treinador, Nevio Scala.
Sob as ordens de Scala, Melli virou o ponto de referência do ataque do Parma na Serie B: na campanha do acesso à elite, Alessandro anotou 11 gols (entre os quais uma tripletta num 5 a 3 contra o Foggia de Zeman) e foi o vice-artilheiro da equipe gialloblù na competição. A ótima fase levou o atacante siciliano, então com 20 anos, à seleção sub-21 da Itália, para a qual começou a ser convocado com frequência. A falta de continuidade estava ficando para trás e Melli teria a chance de demonstrar ser um grande atacante nos principais palcos italianos.
O ano de estreia na Serie A não poderia ser melhor. O Parma estava endinheirado por causa do patrocínio da Parmalat, mas decidiu apostar na sua joia e reforçou apenas outros setores, deixando Melli no comando do ataque do 3-5-2 de Scala. A temporada gialloblù foi concluída com a 5ª posição no Campeonato Italiano e a campanha surpreendente se deveu basicamente aos 13 gols marcados pelo artilheiro. Sandro iniciou sua trajetória na elite com um bom presságio, anotando contra a Juventus – maior campeã do futebol local e adversária dos ducali nos anos que estariam por vir –, e também vazou as defesas de Fiorentina, Inter, Milan e do rival local Bologna. Em fevereiro de 1991, o atacante foi convocado por Azeglio Vicini para a seleção principal da Itália, mas não foi utilizado em um amistoso contra a Bélgica.
Apesar de ter feito muitos gols em seus dois primeiros anos como titular do Parma, Melli era um centroavante atípico, não era um mero goleador. Grande finalizador, com uma perna direita fulminante, o siciliano era bom no posicionamento e forte no cabeceio, o que lhe conferia a camisa 9. Só que Sandro também vestia a 7: atuava como segundo atacante, graças a sua velocidade, e era muito hábil para fazer o pivô ou assistir os companheiros.
Na segunda temporada dos crociati na Serie A, o Mellino “número 7” foi mais visto no campeonato local, torneio em que ele deixou sua marca seis vezes, enquanto o 9 apareceu na Coppa Italia. Graças a seus cinco gols – dois nas semifinais, contra a Sampdoria, e um no jogo de volta das finais, diante da Juve –, o Parma levantou o primeiro caneco importante em mais de 80 anos de história. Ainda em 1992, Melli teria outra glória na carreira, ao ajudar a Itália a ser campeã europeia sub-21 e a classificar-se para os Jogos Olímpicos – competição em que também defendeu os azzurrini.
Em 1992-93, a Parmalat intensificou seus investimentos no clube, mas Melli não perdeu sua vaga no time titular, mesmo com as contratações de Tomas Brolin e Faustino Asprilla. A chegada dos dois ótimos jogadores só melhorou as atuações de Sandro, que viria a marcar 12 gols na excelente campanha parmense na Serie A – a melhor na história até aquele momento –, concluída com um terceiro posto.
No entanto, Mellino foi mesmo decisivo para a conquista da Recopa Uefa, primeiro título internacional da equipe: fez três gols na competição, um deles na final, contra o Royal Antwerp. Os grandes momentos o levaram a mais quatro convocações para a Nazionale, que já era comandada por Sacchi, que o lançara para o futebol. No entanto, devido à grande concorrência para a posição, o atacante só jogou contra Malta e Estônia, pelas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 1994.
Embora Melli vivesse uma grande fase, ele acabou sendo vítima da pressão da Parmalat para que o Parma tivesse um sucesso internacional ainda maior e pudesse ser campeão italiano. Com isso, a diretoria contratou Gianfranco Zola, do Napoli, o que limitou as suas participações, que caíram quase pela metade. Ainda assim, o centroavante siciliano participaria da conquista da Supercopa Uefa, do vice da Recopa e das boas campanhas na Serie A e na Coppa Italia. Ao fim da temporada, acabaria vendido para a Sampdoria.
Sandro tinha somente 25 anos e estava próximo do auge físico e do amadurecimento total como jogador. Apesar disso, não seria em Gênova que viveria este momento da carreira: menos de quatro meses depois de ter chegado à Samp e ter se tornado titular, o atacante foi envolvido em uma troca por Ruud Gullit. O holandês atuaria novamente na equipe blucerchiata, enquanto Melli faria o caminho inverso, indo jogar no todo poderoso Milan.
Dessa forma, os rossoneri conseguiram concretizar um sonho antigo, pois Alessandro havia sido sondado como reforço dos gigantes quatro anos antes, em 1990. O grande problema é que Sacchi não estava mais no comando da equipe lombarda: enquanto o carequinha gostava de seu futebol e pretendia lhe dar chances, Fabio Capello só o utilizou em seis jogos, apenas dois como titular. Ao menos, Melli adicionou ao currículo mais um troféu da Supercopa Europeia.
A temporada cheia de percalços entre Gênova e Milão foi um divisor de águas na carreira de Alessandro Melli: depois das frustrações de 1994-95, ele nunca mais seria o atacante perigoso do início da década, nem mesmo em Parma. Sandro voltou para sua casa em 1995, mas só atuou em um nível regular apenas no primeiro ano, quando foi um reserva bastante utilizado por Scala. O treinador seria substituído por Carlo Ancelotti em 1996, o que fez as aparições do atacante siciliano rarearem, a ponto de ele ter ficado seis meses sem ser utilizado no ano seguinte.
Melli tentou retomar a carreira no Perugia, clube com o qual assinou em dezembro de 1997. Os grifoni estavam na Serie B, mas com a ajuda do experiente atacante conseguiram subir para a primeira divisão após eliminarem o Torino no spareggio. Longe da melhor fase, o atacante ainda fez duas temporadas com o clube umbro na elite e se transferiu, em 2000, para defender o Ancona, na série cadetta. Com apenas 31 anos e rendendo muito menos do que já havia desempenhado, Sandro optou por se aposentar do futebol.
Até hoje a torcida do Parma tem uma forte identificação com o ex-atacante, que honrou por mais de uma década as cores do clube que o formou. Neste período, Alessandro Melli se consagrou como uma bandeira: é um dos 10 atletas que mais vezes vestiram a camisa gialloblù, com 241 partidas, e também é o quarto maior artilheiro ducale, com 56 gols marcados. Depois de se aposentar, Sandro não deixou de contribuir com os crociati, ainda que fora das quatro linhas. Desde 2005, ele é o team manager parmense, peça importante para a reconstrução de um clube que faliu duas vezes em menos de 15 anos.
Alessandro Melli
Nascimento: 11 de dezembro de 1969, em Agrigento, Itália
Posição: atacante
Clubes em que atuou: Parma (1985-88, 1989-94 e 1995-97), Modena (1988-89), Sampdoria (1994), Milan (1994-95), Perugia (1997-2000) e Ancona (2000-01)
Títulos: Recopa Uefa (1993), Coppa Italia (1992), Supercopa Uefa (1993 e 1994), Serie C (1986) e Eurocopa Sub-21 (1992)
Seleção italiana: 2 jogos