Nas décadas de 1990 e 2000, Hernán Crespo foi um dos melhores centroavantes do mundo. O argentino, aliás, passou a maior parte de seu 21 anos de carreira balançando as redes na Itália. Aliando força e técnica como poucos, marcava gols de todas as formas e, por isso, conquistou títulos, muitas vezes anotando em decisões. Por ser parecido com Jorge Valdano, ganhou um apelido de peso: Valdanito. Nascido em Florida, a 15 quilômetros de Buenos Aires, o atacante foi um fervoroso torcedor do San Lorenzo na infância, mas começou a carreira no River Plate e, por isso, sofreu muito quando teve que encarar a equipe do coração.
Paixão tem muito a ver com a trajetória de Crespo e, aos 13 anos, ele entrou na academia de futebol do River Plate, o primeiro passo para apaixonar os Millonarios. A carreira no Monumental de Nuñez foi intensa. No ano de estreia na equipe principal, 1993, veio o título Apertura do Campeonato Argentino, que foi repetido em 1994 e 1996. Mas o grande motivo do amor da torcida é um só: a conquista da Copa Libertadores, o último grande ato do Valdanito na Argentina.
Ao lado de Francescoli, Crespo formou o ataque do River e foi artilheiro da equipe na disputa continental, com dez gols. O centroavante foi decisivo na fase mata-mata e teve a grande emoção de eliminar o clube do coração, nas quartas de final, com dois gols anotados. Na decisão, frente ao América de Cali, os argentinos perderam por 1 a 0 fora de casa e precisavam de dois gols para a conquista. O Valdanito apareceu e fez o necessário: 2 a 0 e o placar mostrava Crespo duas vezes.
A precocidade também foi vista na caminhada pela seleção. Em 1995 foi convocado pela primeira vez e, no ano seguinte, foi artilheiro e ganhou a medalha de prata na Olimpíada de Atlanta. Com o segundo lugar nos Estados Unidos, Crespo se despediu do River Plate e foi encontrar o Parma, o “seu amor italiano”, como declarou em recente entrevista. Por oito bilhões de liras, chegou aos crociati, que já começavam a receber investimentos da Parmalat, gigante do setor de laticínios.
No Parma da Parmalat, o Valdanito se concretizou entre os craques da posição e ganhou três títulos. A temporada 1998-99 foi especial, com duas conquistas. Na Coppa Italia, na final contra a Fiorentina, apareceu com um gol em cada partida, e garantiu a taça ao Parma. Na Copa Uefa, Crespo foi muito importante, durante a campanha, marcou seis vezes e foi o vice-artilheiro gialloblù. Na decisão contra o Olympique de Marseille, foi do argentino o gol que abriu o caminho para a vitória tranquila por 3 a 0. Assim que começou a temporada seguinte, mais um título, a Supercopa Italiana, sobre o Milan e, de novo, o camisa 9 apareceu com gol importante.
No período italiano, além do sucesso pelos clubes, Crespo se consagrou com a camisa albiceleste, que defendeu em três Copas do Mundo. Em 1998, na França, fez parte do grupo, e era reserva de outro destaque da Serie A, Batistuta – jogou apenas uma partida. Quatro anos depois, na Coreia do Sul e Japão, ainda alternativa a Batigol, participou de três jogos e conseguiu seu primeiro gol em mundiais. Ter os dois ótimos centroavantes no período foi um privilégio, mas trouxe problemas para os técnicos. Afinal, normalmente, um era reserva do outro e a pressão para tê-los em campo ao mesmo tempo sempre foi muito grande.
Sem Batistuta, em 2006 na Alemanha, Crespo foi o titular, jogou quatro partidas e marcou três vezes. Porém, a Argentina parou na anfitriã, nas quartas de final. Com isso, a geração, que contou com o auge do camisa nove, não conseguiu o imaginado tricampeonato mundial. No ano seguinte, o Valdanito se aposentou da seleção albiceleste, com 64 partidas e 35 gols, que o colocam como terceiro maior artilheiro da história do país, logo à frente de Maradona, mas atrás de Messi e Batistuta.
Depois de ganhar tudo, o Parma não conseguiu voltar a vencer e os investimentos foram diminuindo. Por isso, ao final da temporada 2000-01, a equipe não rejeitou uma oferta de 35 bilhões de libras da Lazio por Crespo. O negócio envolveu 16 milhões em dinheiro e os jogadores Sergio Conceição e Matías Almeyda. Na capital italiana, o centroavante fez parte de outro time histórico e ficou ainda maior no cenário futebolístico mundial.
Apesar da escalação estrelada, os laziali só venceram a Supercopa italiana e não conseguiram repetir o sucesso da temporada anterior, quando conseguiram a dobradinha, vencendo Serie A e Coppa Italia. A culpa com certeza não foi de Crespo, afinal o centroavante argentino acrescentou muito à equipe e, no Campeonato Italiano, conseguiu a artilharia com 26 gols, em uma edição na qual a Lazio ficou apenas no terceiro lugar. No grande foco da equipe em 2000-01, a Liga dos Campeões, eliminação frustrante na segunda fase de grupos da disputa.
Cercado de lesões e em um clube que já começava a sofrer com problemas financeiros, o Valdanito acabou se transferindo em 2002. Desta vez, a nova casa seria Milão, na Inter, que havia perdido Ronaldo e precisava desesperadamente de outro anotador de gols. Foram 26 milhões de euros mais o passe de Corradi investidos no argentino. A partir daí, Crespo viveu uma fase complicada. Seguia com potencial enorme, mas, muitas vezes, as lesões impediam que este nível de futebol fosse apresentado em campo. Os números dele pela Inter provam isso: em 2002-03, jogou apenas 30 vezes e marcou 16 gols. Na Liga dos Campeões teve grande destaque e, com nove gols, ajudou a Inter a chegar nas semifinais, quando caiu contra o Milan.
Apesar do desempenho interessante, os custos eram altos para não tê-lo sempre em campo. Por isso, os nerazzurri aceitaram uma alta proposta (quase 17 milhões de libras) do Chelsea. Na Inglaterra, o atacante argentino repetiu o que havia feito na Inter e não conseguir empolgar os Blues. Havia um grande problema, Crespo tinha ido à Londres sem a esposa e a filha, que escolheram ficar em Milão, pois já estavam bem adaptadas à vida italiana. O resultado é que, na capital inglesa, o Valdanito sempre ficou dividido entre o futebol e a preocupação com a família, que estava longe.
Com a chegada de Mourinho e Drogba ao clube, o treinador logo identificou que este problema afetava o seu atacante e, agora, com outro jogador para posição de alto nível, Crespo foi liberado e pode voltar à Milão, desta vez, para vestir rossonero. Pedido especialmente por Carlo Ancelotti, o Valdanito conseguiu marcar dez gols na Serie A e dois na final da Liga dos Campeões 2004-05, que teve a incrível conquista do Liverpool.
Sem títulos, mas, com algumas aparições decisivas, Mourinho pediu e o argentino voltou à Londres mais motivado e com a consciência de que poderia fazer melhor. Apesar do ambiente favorável, Crespo conseguiu apenas 13 gols na temporada e novamente ficou devendo. Porém, a volta ao Chelsea ao menos rendeu outros dois títulos para a carreira: uma Supercopa da Inglaterra e a Premier League, primeira liga nacional conquistada no Velho Mundo.
Ainda com contrato com o Chelsea, Crespo voltou à Inter, mas, desta vez, entre 2006-09, ganhou quase tudo com o clube – cinco títulos. No primeiro ano, o argentino foi fundamental, com 14 gols, que ajudaram no título da Serie A 2006-07. Aos poucos, o Valdanito foi perdendo relevância nos nerazzurri, que, neste período, tiveram Ibrahimovic como grande homem de área.
Depois da saída de Milão, Crespo jogou seis meses pelo Genoa e encerrou a trajetória italiana onde começou, no Parma, em 2012, após mais dois anos e meio de serviços ao clube. A última passagem pelos crociati aumentou a identificação dele com o clube e fez com que fechasse sua carreira parmense com 200 partidas e 94 gols, média próxima de um gol a cada dois jogos vestindo gialloblù. Até hoje, Crespo é o maior artilheiro da história do Parma em jogos da Serie A. Com 153 gols pelo Campeonato Italiano, o argentino ainda é um dos 25 maiores goleadores da história do torneio – ocupa a 23ª posição.
O ex-centroavante estudou para se tornar treinador e, iniciou na função no sub-19 do Parma, em 2014. Entre os profissionais, começou no Modena, num trabalho de parte baixa da tabela da Serie B e, por isso, encerrado precocemente. Crespo passou algum tempo parado, se aperfeiçoando, e retornou ao batente em 2019, pelo Banfield. Novamente, não vingou.
A reviravolta se daria a partir de 2020, pelo Defensa y Justicia, que guiaria na Libertadores e levaria ao título da Copa Sul-Americana. Em seguida, comandaria o São Paulo na campanha do título paulista de 2021 e cairia durante o Brasileirão. Crespo obteve sucesso posterior no Oriente Médio, faturando três títulos pelo Al-Duhail, do Qatar, e levando o Al-Ain, dos Emirados Árabes Unidos, ao principal título da Ásia: o da Champions League da AFC. Assim, qualificou o time lilás para o Mundial de Clubes e para a Copa Intercontinental.
Hernán Jorge Crespo
Nascimento: 5 de julho de 1975, em Florida, Argentina
Posição: atacante
Clubes como jogador: River Plate (1993-96), Parma (1996-00 e 2010-12), Lazio (2000-02), Inter (2002-03 e 2006-09), Chelsea (2003-04 e 2005-06) Milan (2004-05) e Genoa (2009-10)
Títulos como jogador: Campeonato Argentino (Apertura; 1993 e 1994), Jogos Pan-americanos (1995), Copa Libertadores (1996), Prata Olímpica (1996), Coppa Italia (1999), Copa Uefa (1999), Supercopa Italiana (1999, 2000, 2004, 2006 e 2008), Community Shield (2005), Premier League (2006) e Serie A (2007, 2008 e 2009)
Clubes como treinador: Modena (2015-16), Banfield (2019), Defensa y Justicia (2020-21), São Paulo (2021), Al-Duhail (2022-23) e Al-Ain (2023-24)
Títulos como treinador: Copa Sul-Americana (2020), Campeonato Paulista (2021), Stars Cup (2023), Copa do Qatar (2023), Campeonato Qatari (2023) e Champions League da AFC (2024)
Seleção argentina: 64 jogos e 35 gols