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Quem é Walter Sabatini, novo homem forte da Inter?

Na última semana, a Inter viveu uma pequena revolução. Além da dispensa do treinador Stefano Pioli,  o grupo proprietário do clube, o Suning, anunciou a chegada de Walter Sabatini para ocupar um cargo de coordenadoria técnica. O novo contratado trabalhará nos departamentos de futebol das duas equipes administradas pelos chineses: o do Jiangsu e também o da própria Inter, em parceria com Piero Ausilio, diretor esportivo que renovou até 2020. Quem está bastante ligado nos bastidores da Serie A já conhece bem a trajetória e os méritos de Sabatini; quem não faz a mínima ideia de quem ele seja poderá saber mais a partir de agora.

Walter Sabatini nasceu em Marsciano, na Úmbria, e começou sua carreira como jogador no Perugia, maior time da região. Ala pela direita, Sabatini ajudou os grifoni a chegarem na Serie A pela primeira vez em meados da década de 1970: na campanha, ele se destacou como uma das revelações do país e, depois de jogar no Varese, acabou contratado pela Roma. O umbro chegou a disputar posição com Bruno Conti, mas nunca teve a cabeça e o físico no lugar: treinava mal, se lesionava muito e nunca se firmou. Deixou a Cidade Eterna após uma temporada e rodou por uma série de clubes – incluindo Palermo, Vicenza, Venezia, Parma e um retorno ao Perugia – até se aposentar, com apenas 29 anos.

Fora dos campos, Sabatini acabou ganhando um cargo de colaborador do setor juvenil do Perugia, em 1986. Após treinar todos os times nas categorias de base e descobrir Gennaro Gattuso, foi elevado ao posto de supervisor do setor e auxiliar técnico do time principal, quatro anos depois. Deixaria a Umbria em 1992 para dar um passo maior: ao lado do ex-lateral Giuseppe Dossena, tricampeão mundial pela Itália, comandaria a formação de novos craques na Lazio. Na gestão da dupla, os dois principais nomes revelados foram Alessandro Nesta e Marco Di Vaio.

A partir de 1994, a carreira de Walter Sabatini entrou em momento de crise de identidade: se tornou diretor esportivo da Triestina, mas um ano depois foi ser, sem sucesso algum, técnico do Gubbio, que disputava a divisão regional da Úmbria. Acabou tirando um período sabático e só voltou à ativa em 1998, no Arezzo, da terceirona italiana. Em 2000, porém, o dirigente acabou recebendo da Federação Italiana de Futebol – FIGC uma suspensão de cinco anos do esporte, por irregularidades cometidas quando trabalhava nas divisões de base.

Por incrível que pareça, o período sabático e a suspensão parecem ter feito bem ao umbro: se reciclou, estudando e desenvolvendo métodos novos na observação de atletas. No mesmo ano em que foi suspenso pela FIGC, Sabatini começou a colaborar informalmente com o Perugia, do polêmico dirigente Luciano Gaucci – com quem havia se desentendido em 1992.

Sabatini acompanha Rossi e Zamparini, nos tempos de Palermo (Getty)

Gaucci ficou famoso por fazer contratações bastante baseadas em marketing e em mercados obscuros da bola. Em sua gestão, os biancorossi contrataram o japonês Hidetoshi Nakata, o chinês Ma Mingyu, o sul-coreano Ahn Jung-Hwan, o iraniano Ali Samereh e uma penca de jogadores oriundos da América do Sul, da África e de centros menores da Europa. Com uma extensa base de dados e olheiros espalhados pelo mundo, Sabatini teve a oportunidade de iniciar, em maior escala, aquilo que seria sua especialidade: montar planteis quase do zero (anualmente), descobrir talentos e fazer contratações de jogadores com alto potencial de valorização e revenda a valores astronômicos. Para fazer isso, colocou em ação características como criatividade, bom trânsito nos bastidores e uma intuição acima da média.

No Perugia, pelas constantes rusgas com Gaucci – com quem romperia novamente, em 2004 –, o projeto não deu certo. O dirigente começaria a ganhar notoriedade após retornar à Lazio, a convite do recém-empossado presidente Claudio Lotito, antes mesmo do fim de seu período de gancho. Sabatini ficou na Cidade Eterna de 2004 a 2008, montando inclusive o elenco que conseguiu a classificação à Liga dos Campeões em 2007. No período, investiu em jogadores como Aleksandar Kolarov, Valon Behrami, Fernando Muslera, Stephan Lichtsteiner, Modibo Diakité, Stefan Radu e Libor Kozák.

Ao deixar a Lazio, Sabatini acertou com o Palermo do presidente Maurizio Zamparini – de temperamento e modelo de negócio muito similares aos de Gaucci. O umbro chegava para substituir Rino Foschi, diretor esportivo que ficou no clube entre 2002 e 2008, ganhando popularidade por ter acertado no alvo na montagem do elenco do time rosanero, que subiu para a Serie A e conquistou três vezes a classificação à Copa Uefa. Só para citar alguns contratados por Foschi: os tetracampeões mundiais italianos Simone Barone, Andrea Barzagli, Fabio Grosso, Cristian Zaccardo e Luca Toni e o uruguaio Edinson Cavani.

Sabatini ficou na Sicília por pouco mais de dois anos, até se demitir, por motivos pessoais, em novembro de 2010. No entanto, o “mago do mercado” substituiu Foschi à altura e montou elencos muito competitivos: em 2009-10, o Palermo realizou a melhor temporada de sua história e, na campanha seguinte, seria vice-campeão da Coppa Italia. Na gestão do cartola umbro, foram contratados jogadores como Afriyie Acquah, Armin Bačinovič, Abel Hernández, Josip Iličič, Pajtim Kasami, Javier Pastore, Matteo Darmian e Ezequiel Muñoz. Ano após ano, o clube precisou remontar seu time, devido a vendas de alguns atletas, e Sabatini foi o responsável por fazer isso.

Viciado em fumar, Sabatini costuma dar tragadas até durante entrevistas coletivas em espaços fechados (Iguana Press/Getty)

Depois de alguns meses parado, Sabatini foi o nome escolhido para tocar um novo projeto na Roma recém-adquirida por empresários ítalo-americanos. Nada dava certo para os giallorossi desde a passagem do clube das mãos da família Sensi para o grupo de Thomas DiBenedetto e James Pallotta e Walter foi o escolhido para apagar o incêndio, em 2011. Em suas cinco temporadas de capital, obteve sucesso, embora a equipe romana não tenha vencido títulos: montou elencos competitivos e estabeleceu o time como a segunda força do país, atrás da Juventus.

Em Roma, mais do que em outros trabalhos, Sabatini prezou pela fuga do óbvio. Não por acaso, três do quatro treinadores da sua gestão foram Luis Enrique, Zdenek Zeman (alçado aos grandes palcos do futebol italiano após fazer o Pescara encantar na segundona) e Rudi Garcia. Em termos de jogadores, buscou Marquinhos, Miralem Pjanic, Medhi Benatia, Radja Nainggolan, Kevin Strootman, Kostas Manolas, Erik Lamela, Mohamed Salah e Stephan El Shaarawy, colocando alguns em evidência ou relançando-os após períodos turvos em suas carreiras. Alguns deles, como Marquinhos, Pjanic, Benatia e Lamela, foram negociados a peso de ouro e renderam muitos dividendos à agremiação.

Claro, nem todas as contratações realizadas por ele deram certo. “Às vezes acontecia de eu me confundir e contratar, sei lá, Iván Piris, que não tinha qualidade para atuar na Roma. Vale também para quando vendi Lamela e achei que Juan Iturbe era mais jogador”, confessou, em sua última entrevista no centro de treinamentos de Trigoria, em outubro de 2016. Sua saída se deu basicamente para que o clube diminuísse potencialmente, a margem de erro em contratações.

Pallotta, presidente do clube, queria uma estrutura de observação baseada estritamente em estatísticas, enquanto Sabatini não esconde que prefere confiar mais em sua intuição. “Para o presidente, o futebol é como uma empresa, e para mim não. Apesar do respeito, ficou evidente que tínhamos um conflito quanto à forma de trabalhar”, declarou. A saída foi em comum acordo e amigável e Pallotta até fez uma brincadeira, divulgada pelas redes sociais dos giallorossi: “O agradeço por tudo que fez pela Roma, mas… por favor, pare de fumar”.

Largar o cigarro não parece estar nos planos de Walter Sabatini, uma vez que ele até pediu licença aos jornalistas para dar um trago em “meio cigarrinho” em sua despedida da Roma, argumentando que a nicotina o acalma. Ao aceitar trabalhar na Inter e tentar resolver o cenário caótico do clube nerazzurro, o dirigente sabe que assumiu uma tarefa árdua e exasperante. De quantos maços ele precisará para cumprir pelo menos parte dessa missão?

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