A Juventus não conseguirá conquistar seu principal objetivo da temporada – e poucas vezes isso foi tão justo. Em nenhum momento do confronto de ida e volta com o Ajax a Velha Senhora esteve confortável ou mereceu a classificação às semifinais. Não exatamente por demérito próprio, mas pelas enormes virtudes de um time que honra os principais momentos da história dos Godenzonen. Em Turim, a qualificada equipe holandesa dominou amplamente, e avançou à próxima fase com uma vitória que poderia ter sido mais elástica, mas que deu para o gasto: 2 a 1.
Erik ten Hag entendeu o que aconteceu na semana passada, em Amsterdã. Allegri, não. Na Holanda, o Ajax dominou o meio-campo graças ao dinamismo de Schöne, às chegadas de Van de Beek e à direção do maestro De Jong. Mais à frente, incomodou a última linha de defesa da Juve com a movimentação constante de Tadic e as inserções de David Neres e Ziyech nos espaços entre os zagueiros e os laterais juventinos. Foi uma constante na Johan Cruyff ArenA e no Allianz Stadium. Em Turim, então, foi pior no segundo tempo, quando a Velha Senhora já estava cansada de correr atrás dos jovens ajacieden.
Ten Hag e seus comandados têm o mérito de terem conseguido repetir o cenário do jogo de ida também no Piemonte (e com De Jong longe de estar 100% fisicamente), mas parte do show aconteceu por displicência de Allegri. O treinador não fez uma boa leitura ao sacar Bentancur – um dos melhores em Amsterdã – e tirar combatividade do seu meio-campo. Matuidi já havia sofrido na Holanda por ter que marcar por ele e Ronaldo e, dessa vez, sentiu o físico. Na meia cancha, Pjanic não se achou novamente e foi simplesmente engolido por De Jong (mais cauteloso do que o habitual) e por um Van de Beek mais agudo – como bem salientou Murillo Moret, o bósnio é praticamente nulo sem a bola, objeto que nunca teve sob controle nesta eliminatória. A bem da verdade, Can foi o único que se salvou no setor.
Novamente, a Juve apresentou fragilidade na marcação pelos lados do campo, deficiência que se deu, a princípio, pela frouxidão na marcação dobrada: Ziyech pintou e bordou em cima de Alex Sandro e Matuidi, enquanto Bernardeschi, De Sciglio e Cancelo não foram páreo para Neres. Parte disso se deu por conta do posicionamento de Ronaldo, escalado na ponta esquerda do tridente, mas com poucas atribuições defensivas. Nesse contexto, Dybala atuou como falso 9 e foi nulo. Não só por culpa sua, mas porque a Juve mal lhe acionou nesta terça, e porque ele não era o mais indicado para colar em De Jong.
Além disso, o Ajax costumava atrair a marcação bianconera para um lado e rapidamente invertia as jogadas, aproveitando os espaços vazios que os laterais deixavam ao fechar muito o centro. Nenhum gol surgiu assim, mas por puro milagre. Szczesny fez uma defesa incrível ante Ziyech, que também teve tento bem anulado por impedimento e uma chance clara interceptada no limite por Pjanic, em uma de suas únicas decisões acertadas no jogo – a outra foi a assistência para CR7. Se Allegri vinha sendo elogiado por conseguir adaptar a camaleônica Juve conforme o desafio que cada adversário proporcionaria à sua equipe, dessa vez lhe faltou lucidez.
Nesse duelo tático, não chegou a surpreender que a primeira grande chance fosse do Ajax. David Neres adentrou a área em diagonal, trocou passes com Tadic e tentou finalizar; na sobra, Van de Beek, mandou por cima. Sete minutos depois da ótima jogada holandesa, a Juve achou seu gol – afinal, o goleiro Onana só havia aparecido quando chutou em cima de Can, num erro de saída de bola, e numa ponte em chute de Dybala. Pjanic cobrou escanteio entre a quina da pequena área e a marca do pênalti e Ronaldo apareceu, desvencilhando-se de De Ligt e Veltman para cabecear para as redes.
A vantagem bianconera durou menos de seis minutos – quase todos consumidos pela revisão do gol feita através do VAR. O Ajax empatou quando a defesa juventina cochilou após uma cobrança de corner – algo imperdoável num mata-mata europeu. Bernardeschi demorou para sair e deixou Van de Beek em condições de aproveitar a sobra de um chute torto de Sinkgraven. De Sciglio também foi lento na recomposição e perdeu tempo ao pedir impedimento (totalmente desnecessário num torneio com auxiliares de vídeo). Bonucci até tentou cortar, mas o meia bateu no cantinho de Szczesny e fez 1 a 1.
Tal qual em Amsterdã, o Ajax cresceu no segundo tempo e empurrou a Juventus contra as cordas. A velocidade nas trocas de passes e na movimentação em campo ofensivo deixou o time bianconero atordoado, quase incapaz de reagir. Em toda a etapa final, inclusive, a única boa chance de gol dos mandantes ocorreu numa finalização de Kean, que passou à esquerda do gol de Onana.
Se o Ajax acelerou a partida na volta do intervalo, Szczesny teve trabalho redobrado. Aos 51, o polonês fez a principal defesa de toda a sua carreira, ao evitar que os Godenzonen virassem o placar. Tadic e Van de Beek confundiram a defesa juventina numa rápida troca de passes em contra-ataque e o camisa 6 holandês achou Ziyech livre na ponta direita: o marroquinho chutou forte, mas Szczesny esperou a pancada e esticou o braço esquerdo, teso, para negar-lhe o gol – e não dar rebote, defendendo em dois tempos.
Cinco minutos depois, após ensaiar três chegadas rápidas, o Ajax arriscou de fora da área, novamente com Van de Beek: Szczesny foi buscar no ângulo e espalmou para escanteio. Aos 62 e aos 64, Ziyech apareceu sozinho duas vezes no espaço vazio do lado direito da defesa juventina, mas não finalizou: na primeira, por causa de corte de Pjanic; na segunda, por excesso de altruísmo. Não fez diferença, pois aos 66, um terceiro escanteio foi decisivo. Schöne cruzou no segundo pau, Alex Sandro e Rugani estavam mal posicionados e o capitão De Ligt, de frente para o gol, subiu mais alto do que os dois juventinos e não deu chances de defesa a Szczesny.
O massacre não terminou por aí. Mesmo com a ótima vantagem na eliminatória, o Ajax nem pensou em segurar a vitória – já que, para ser eliminado, teria de levar a virada. Neres, Tadic, Ziyech e Van de Beek continuavam se movimentando muito, sem guardar posição fixa, e continuavam confundindo a defesa juventina. Rugani, coitado, nunca deve ter corrido tanto a esmo em uma partida de futebol. Sem conseguir decodificar a movimentação adversária, a Juve cedeu campo e teve sorte que David Neres perdeu ótima chance e que Ziyech estava impedido quando anotou um gol com um balaço no ângulo.
Em 38 jogos por torneios europeus, a Juve teve apenas sua quarta derrota no Allianz Stadium – a segunda nessa temporada. Somando partidas de competições nacionais, os tropeços também podem ser contados nos dedos. Este foi apenas o décimo e, sem dúvidas, o mais impactante deles. O maior carrasco da Velha Senhora em sua arena não foi a Inter, que aplicou 3 a 1 em 2012 e decretou a primeira queda da rival em sua nova casa, nem mesmo o Bayern de Munique um ano depois ou o Real Madrid de Ronaldo, que aplicou acachapante 3 a 0 em 2018. O visitante mais indigesto foi o Ajax.
Juventus 1-2 Ajax (placar agregado: 2-3)
Juventus: Szczesny; De Sciglio (Cancelo), Bonucci, Rugani, Alex Sandro; Can, Pjanic, Matuidi; Bernardeschi (Bentancur), Dybala (Kean), Ronaldo. Técnico: Massimiliano Allegri.
Ajax: Onana; Veltman, De Ligt, Blind, Mazraoui (Sinkgraven; Magallán); Schöne, De Jong; Ziyech (Huntelaar), Van de Beek, Neres; Tadic. Técnico: Erik ten Hag.
Local: Allianz Stadium, em Turim (Itália)
Gols: Ronaldo; Van de Beek e De Ligt
Árbitro: Clément Turpin (França)
A Juve será octa ,mas necessita repensar seu futebol jogado que é pobre em relação ao time que tem. Mal comparando, é o que ocorre com o Palmeiras no Brasil.