Serie A

“Se joguei até os 40, foi pelo que aprendi na Itália”: Juan relembra passagem pela Roma

Foram 31 anos dedicados ao futebol, considerando o período nas categorias de base do Flamengo. Ídolo por onde passou, o ex-zagueiro Juan sempre se mostrou um líder em campo. Quando foi contratado pela Roma, na temporada 2007-08, o defensor já tinha um currículo vencedor, graças pelos seus feitos por Flamengo, Bayer Leverkusen e seleção brasileira, e também era consolidado na posição. Foi comparado por Rudi Völler a Aldair, outro ídolo da Roma, e, após superar lesões, foi titular na Loba durante anos. Marcado na história da equipe giallorossa, Juan pendurou as chuteiras no início de maio e concedeu entrevista à Calciopédia. Confira o papo na íntegra.

Como estão sendo os primeiros dias como aposentado?

Estou aproveitando bastante esse início [de aposentadoria] para ficar com minha família, depois dessa longa estrada no futebol. Agora é descansar um pouco, antes de voltar para o Flamengo.

Você vai seguir no futebol como dirigente? É possível imaginar um retorno à Roma?

Voltarei para o Flamengo agora nesse mês [junho]. Ainda não tenho o cargo definido, mas olha, tudo pode acontecer no futebol. [A Roma] É um clube que tenho carinho, jogadores têm histórico de trabalhar no clube. Quem sabe no futuro.

A Roma te prestou alguma homenagem, além do que foi divulgado nas redes sociais? E você procura se manter informado sobre o clube?

Não, apenas nas redes sociais. Fui lá ver meus antigos companheiros, aproveitei para levar uma camisa [do Flamengo] para o De Rossi e o Francesco [Totti], duas referências. Acompanho bastante, leio notícias, é um clube apaixonante, tenho carinho enorme. Sempre que posso, assisto jogos e me interesso por saber como estão as coisas por lá.

Juan, quando você foi contratado pela Roma chegou sendo titular em uma defesa que tinha Mexès. Posteriormente, o Burdisso chegou. Dois jogadores com temperamentos bem complicados. Como era sua relação com eles?

Sempre tivemos uma boa relação, dentro e fora de campo. Quando cheguei na Roma fui bem recebido por todos, já era um pouco conhecido. Tive adaptação rápida com todos no grupo. Acabei jogando bastante com o Burdisso por causa de uma lesão do Philippe, mas nos entrosamos rápido. Nós nos completávamos.

Juan se disse “surpreso” por De Rossi ter deixado a Roma (Getty)

Roma e Lazio têm históricos de contratar jogadores sul-americanos. No seu período, por exemplo, a Roma teve Doni, Cicinho, Taddei, Pizarro, Mancini e Burdisso. Na Lazio, Zárate, Matuzalém, Muslera e Scaloni. Existia alguma relação de amizade entre os sul-americanos das duas equipes ou era cada um no seu lado da cidade?

Não, era cada um no seu canto da cidade. Os sul-americanos do próprio clube se encontravam, saíam, mas era algo entre os jogadores do próprio clube.

Como você enxerga as saídas de Totti e De Rossi da Roma? Pela forma como ambos saíram. Abriram mão de dinheiro, sempre demonstraram lealdade e amor ao clube, mas saíram por opção da direção.

Foram saídas diferentes. A do Francesco era esperada, pela idade, mas ele já voltou a servir o clube [como dirigente]. Agora o Daniele eu não esperava. Acompanho a Roma e mesmo ele não tendo excelentes atuações, também por causa das contusões, o time todo caiu de produção. Ele era um jogador importante para o clube, sei do carinho e amor que ele tem pela Roma e pela cidade. É um cara importante dentro do vestiário. Me pegou de surpresa, a saída. Como torcedor da Roma, fiquei bem chateado.

Como você vê o atual momento da Roma?

Pelo que pude acompanhar, o momento é mais conturbado fora de campo. O time, depois de várias temporadas, não conseguiu manter o ritmo dos últimos anos. Foi uma temporada atípica, o clube perdeu jogadores importantes e os novos contratados demoraram para se adaptar. Todos têm potencial, acho que para o próximo ano a Roma tem tudo para voltar a disputar as primeiras colocações. Em Roma nem sempre as pessoas têm paciência, mas acredito que uma temporada um pouco abaixo é normal, levando em consideração que foram quatro, cinco anos jogando em alto nível. Me chamou mais atenção que internamente o ambiente parece estar mais complicado, a direção muda muito.

Flamengo, Bayer Leverkusen, Roma, Internacional e Seleção. Por onde você passou acabou deixando imagem de líder. No seu período na Itália, você conviveu com líderes como De Rossi, Totti, Pizarro e Perrotta. Como você define a influência de liderança desses jogadores para a sequência da sua carreira, dentro e fora de campo?

Todos eles são ídolos e foram líderes dentro do vestiário. Cada um com sua característica. A cada dia aprendi muita coisa com cada um. Talvez o meu perfil se encaixe mais com o estilo do Perrotta, que também foi um líder técnico do clube. São perfis diferentes, que se completam, e pude aprender bastante com todos.

Na Europa você atuou apenas no Leverkusen e na Roma. O futebol alemão é conhecido pela mentalidade forte, velocidade, força física. Na Itália, destacam-se as estratégias, os sistemas táticos, a força defensiva. O que o período na Europa, em especial, na Roma agregou para a sequência da sua carreira?

O meu período na Itália me ajudou a ler mais taticamente o jogo, me ajudou a construir mais durante uma parte e até [auxiliou] em condicionamento físico. Se joguei até os 40 anos, foi pelo que aprendi na Itália. Além de posicionamentos em campo, leitura do jogo, aprimorei muito a parte física. Evoluí como atleta.

Na Itália, Juan foi vítima de racismo num jogo contra a Lazio (Getty)

Pela Roma você foi campeão da Coppa Italia e da Supercopa Italiana. Disputou partidas da Champions League, além dos nacionais. É ídolo. Você sente que faltou algo durante sua passagem pelo clube italiano?

Quando joguei na Roma disputamos muitas vezes o scudetto, principalmente, com a Inter. Naquele período jogamos futebol de alto nível e poderíamos ter conquistado esse título. O investimento era menor em relação aos principais rivais e conseguimos competir de igual para igual. Tivemos jogadores de alto nível, realmente poderíamos ter ganhando um scudetto.

Como era essa rivalidade com a Inter, naquele período?

Nos enfrentamos bastante em jogos decisivos. Quando não eram em finais diretas, foram em quartas ou semis [da Coppa]. Foi uma rivalidade que cresceu bastante, a Inter também tinha muitos jogadores sul-americanos, então a rivalidade aumentava entre nós. Foi um período de muita disputa entre Roma e Inter e de crescimento desse clássico.

A torcida da Roma tem, como uma de suas características mais fortes, um amor incondicional pelo time. Pressionam jogadores, criticam dirigentes, cantam para ídolos, fazem “greve” e ficam sem ir ao estádio etc. Como você vê a força de atuação da torcida em relação ao time?

É uma torcida apaixonada pela Roma, que respira a cidade e o clube. Ela influencia muito na equipe porque vivem pelo clube, estão próximos no dia a dia. Quem conhece sabe da paixão que a torcida tem pela Roma.

Em 2012 você foi vítima de um episódio de racismo em um Derby Della Capitale. Nesta temporada o zagueiro Koulibaly, do Napoli, passou pela mesma situação em uma partida contra a Inter. Na sua opinião, porque isso ainda ocorre e o que será preciso ser feito para episódios desse tipo acabarem no ambiente do futebol italiano, que também é conhecido por outros tipos de preconceitos?

Acontece porque é um problema que está dentro da sociedade. Nós vimos aí dois casos com diferenças de sete anos. Lamento que isso ocorra, precisa ser combatido. Não sei dizer como, mas tem que ser combatido. Fifa, Uefa e federações nacionais têm que tentar combater isso ao máximo, mas é difícil porque é um problema que está dentro da nossa sociedade.

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