Serie A

“E agora, salvemos o Mantova”

O jornal local não poderia ser mais claro: “E agora, salvemos o Mantova”. Após o rebaixamento
para a Lega Pro,
clube lombardo corre risco real de desaparecer (Gazzetta di Mantova)
Neste domingo, o Mantova viajou para Ancona em busca de um milagre para permanecer na Serie B. Tinha de vencer, longe de sua torcida, um time que também precisava de uma vitória para se livrar do rebaixamento. Ao mesmo tempo que esperava um tropeço do Padova, em casa. Se tudo corresse dentro dos conformes, os virgilianos ainda teriam a chance de tentar a sobrevivência na categoria através das disputas dos play-outs. Mas a tentativa não vingou, é claro.

Com o empate em 2 a 2 que selou seu rebaixamento, o Mantova transferiu a luta pela sobrevivência: do terreno de jogo para os gabinetes. Afogado em dívidas próximas de 13 milhões de euros, sem perspectivas de novos investimentos de sua propriedade – capitaneada pelo presidente Fabrizio Lori, cujas empresas estão sob risco de moratória – e com a compreensível dificuldade de se achar um parceiro ou novo comprador, o clube biancorosso corre seríssimo risco de desaparecer.

Crônica de uma morte anunciada

O campeonato 2009-10 viu o Mantova ser uma infeliz vítima de si mesmo. Lutando com suas finanças, como todo clube provinciano, e certamente não auxiliado pelas constantes mudanças que estão fazendo da Serie B uma disputa desinteressante, o Mantova teve grandes dificuldades para confirmar sua inscrição no torneio. O grupo de empresas de seu presidente, do qual advinha praticamente todos os recursos do clube, também entrou em período de recessão. Neste ambiente, o clube optou por um elenco pouco homogêneo, mesclando jogadores experientes a jovens de pouca visibilidade. Um time de claríssimas limitações técnicas.


A permanência na Serie B já seria um sonho difícil. Nos bastidores, o Mantova já estava condenado há algum tempo. A Nuova Pansac, empresa de seu presidente e única proprietária do pacote acionário do clube, entrou em crise financeira e deixou de pagar os salários de seus trabalhadores, espalhados em filiais pela Itália. Após ser vitima de protestos e ameaçada de intervenção, a empresa começou a saldar as pendências com seus funcionários, em janeiro.

Mas ao que tudo indica, os acordos com os funcionários da Nuova Pansac foram feitos em detrimento dos dependentes e jogadores do Mantova, onde os pagamentos já estavam atrasados desde outubro passado. Daí em diante, o que se viu foi um festival de promessas seguidas de adiamentos. No final de abril, já em situação desesperadora na tabela, o Mantova foi considerado, ao lado do Gallipoli, o clube em maior atraso de pagamentos da Serie B. Seus jogadores, em silêncio à imprensa, ameaçavam processar o clube.

Mesmo em grande desvantagem técnica e estrutural diante de boa parte dos clubes da Serie B, os jogadores biancorossi foram protagonistas de um primeiro turno que deixou o Mantova em condições de reverter a história. Já o segundo, todo disputado numa atmosfera de terra arrasada, foi de menor performance. Abalado, o time desperdiçou pontos preciosos em casa, como no empate em confronto direto com o Modena e no jogo sem gols contra um Torino completamente dominado no estádio Danilo Martelli.

Nos bastidores, Lori seguia com sua política de promessas e adiamentos, explicada com comunicados à imprensa. A propriedade também dizia negociar com interessados no pacote societário do clube e clamava para que a cidade “se unisse em prol do Mantova”.

O levante da torcida – e do próprio time
Estava claríssimo que, se dependesse do empresariado local, o Mantova morreria em meio à indiferença de quem espera por um bom negócio a baixo preço. Leia-se: a aquisição do título esportivo pós-falência, possivelmente em um campeonato amador. Por isso, a própria torcida organizou um movimento de acionariado popular, visando a construção de um capital sólido para o clube. A proposta, acessível através da Gazzeta di Mantova e do Facebook, é de que cada torcedor disponibilize mil euros para o clube, por um período de quatro anos. Uma demonstração de pensamento a longo prazo, mas também um possível indício de que a esperança nos resultados do campo já eram limitadas.

Em Ancona, na última rodada da Serie B, foi impossível parar Mastronunzio. O artilheiro do time da casa marcou duas vezes no empate por 2 a 2 e o Mantova estava rebaixado. Era o final de uma era vitoriosa, que viu o Mantova reestrear na Serie B depois de 32 anos de ausência e durar cinco anos na serie cadetta. E uma mácula definitiva no currículo de Fabrizio Lori, presidente que havia transformado o Mantova de um clube decadente: de perdido no meio de outros tantos da antiga Serie C2 em equipe que ficou apenas a um gol de distância da promoção à Serie A, em 2006.

Na triste história atual do Mantova, a dor uniu jogadores e torcida. Mesmo sendo a parte mais prejudicada pelos maus humores financeiros do clube, a equipe resolver renunciar a parte de seus salários para fazer um apelo à cidade e pedir que o Mantova seja salvo da falência:

Ao final de uma temporada conturbada, na qual fomos responsáveis por um insucesso em campo, nós, jogadores, queremos dar um último sinal de identificação com as cores sociais e tentar garantir um futuro à Associazione Calcio Mantova. Pela manhã, a equipe se dispôs a renunciar de uma parte consistente dos pagamentos, diminuindo, assim, o montante dos débitos societários, com o fim de permitir a inscrição do Mantova Calcio no próximo campeonato profissional. A esperança é de que, em sequência ao nosso gesto, venha uma concreta e solícita resposta de nosso Presidente, de grupos empreendedores e de todas as instituições mantovanas – prefeitura, em primeiro lugar. O objetivo é o de não fazer que uma praça importante, que merece outros cenários, afunde-se no abismo e no anonimato dos campeonatos amadores.

Corrida contra o tempo

30 de junho é a data limite para que o Mantova salde suas dívidas, ou ao menos dê garantias de que poderá fazê-lo. A cessão societária, que poderia resolver o problema, está cada vez mais fora de questão. O acionariado popular ainda é de baixa adesão e, mesmo que fosse de alta, não conseguiria dar ao clube uma solução imediata para seus problemas mais urgentes. Tudo indica que o Mantova fará parte de uma estatística cruel que, nos últimos dois anos, viu quatro clubes – Spezia, Treviso, Avellino e Pisa – falirem após o rebaixamento para a Lega Pro. Com a mesma fé da fatídica partida de Ancona, seus torcedores esperam.

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