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A carreira meteórica e o trágico fim do habilidoso Luigi Meroni

“Quando você vai a campo, meu amor, alguns pensamentos e dores são transformados em um show de mágica.” Este é um trecho da música Chi si recorda di Gigi Meroni?, da banda italiana de folk rock Yo Yo Mundi. Em 15 de outubro de 1967, uma cidade chorava a morte do habilidoso ponta de 24 anos.

No norte de Milão, 22 anos antes, era Luigi Meroni quem chorava a morte do pai. Ele começou a jogar futebol em um pequeno pátio de 60 metros quadrados. Foi o Como quem deu a primeira chance no mundo da bola para o jogador. Dois anos na equipe foram suficientes para que a velocidade, a técnica e o controle de bola de Meroni fossem vistos com bons olhos por outro clube, o Genoa.

Ele fez apenas 15 jogos em sua primeira temporada na equipe que havia retornado à Serie A na temporada anterior. A Genoa ficou à beira do abismo, encerrando a época com apenas um ponto a mais do que o Napoli, primeiro clube a ser rebaixado. Na última rodada daquele campeonato, Meroni foi chamado para um teste anti-doping. Ele se recusou a fazer o exame. Resultado: suspensão das cinco primeiras rodadas da Serie A 1963-64. Este contratempo, porém, não ofuscou a temporada do ponta: seis gols em 27 jogos e uma decente oitava colocação ao fim da temporada.

Foi aí que apareceu o Torino na vida de Meroni. A diretoria do Genoa era contra a venda do jogador, mas 450 milhões de liras (cerca de R$ 540 mil, em dinheiro atual) levaram o atleta a Turim. À direita do time de Nereo Rocco, ele aterrorizava os defensores adversários com dribles desconcertantes em velocidade – Gigi era especialista em fintar entre as pernas, o famoso “rolinho”.

O estilo boêmio marcou carreira do habilidoso Meroni (Liverani)

O estilo e habilidade levaram o italiano a ser comparado com a então promessa norte-irlandesa George Best, futura lenda do Manchester United e lhe valeram o apelido de  “La Farfalla Granata”, ou “A Borboleta Grená”. Em 1967, quando Bestie já brilhava pelos Red Devils, Gigi marcou o memorável gol que ajudou o Torino a derrotar a Inter de Helenio Herrera. Fazia quase três anos que os nerazzurri não perdiam no Giuseppe Meazza.

Não era só dentro de campo que Meroni marcava presença. Fora dele, o jogador estava presente nas conversas sobre moda. Ele usava roupas fora de época, óculos de sol grandíssimos e cabelo coberto com chapéus extravagantes. O cabelo, aliás, virou uma obsessão nacional quando ele foi convocado por Edmondo Fabbri para a Seleção B. O técnico pediu para o jogador cortar as madeixas, e Meroni ficou furioso por ter de fazê-lo.

Em 1965, Fabbri o chamou novamente para representar a Nazionale, agora em uma partida eliminatória para a Copa do Mundo. O treinador pediu o mesmo. Meroni recusou e, em entrevista coletiva, disse: “Espero jogar apesar do cabelo comprido”. Jogou. E foi para o Mundial de 1966, competição em que atuou na derrota da Itália para a União Soviética – um dos tropeços da campanha azzurra que terminou em enorme decepção.

Considerado como um dos grandes talentos italianos da década de 1960, Gigi disputou uma Copa do Mundo (LaPresse)

Durante o verão de 1967, a arquirrival Juventus ofereceu a exorbitante quantia de 750 milhões de liras (pouco mais de R$ 910 mil) pelo jogador, então com 24 anos. Astronômica para o momento, a transferência seria realizada, não fosse pelos torcedores granata. Eles protestaram contra a venda nas ruas e em frente às mansões de Orfeo Pianelli, presidente do Torino, e Gianni Agnelli, mandatário bianconero.

Dois meses depois, em 15 de outubro, Meroni foi convencido por Fabrizio Poletti, amigo e zagueiro do Torino, a celebrar a vitória recém-conquistada sobre a Sampdoria por 4 a 2 com suas namoradas. O clima festivo subiu à cabeça do ponta, que iria pedir Cristiana Uderstadt em casamento.

Ao atravessar a rua para chegar a um bar, Meroni deu um passo para trás para se esquivar de um carro que vinha à sua direita, mas outro veículo vinha da esquerda. Poletti foi atingido pelo Fiat Coupé, mas de raspão. Meroni foi jogado para o outro lado da rua e depois atingido por um Lancia Appia que o arrastou pelo chão por 50 metros. A ambulância ficou presa no tráfego pós-partida e Meroni não resistiu as fraturas nas pernas, bacia e crânio.

Conhecido como “borboleta grená”, devido a sua habilidade, Meroni teve um trágico fim de vida (LaPresse)

Mais de 20 mil pessoas assistiram ao funeral do craque do Torino. Prisioneiros de uma cadeia da cidade se juntaram para mandar uma coroa de flores para Meroni. O padre Don Francesco Ferraudo disse à multidão que ele “não era apenas corpo, músculos e nervos… Mas também gênio, bondoso, corajoso, compreensivo e generoso”. No dia seguinte, as manchetes resumiam a morte do jogador. “Toda Turim chorou”. Ao fim da temporada, o Toro faturou a Coppa Italia e Gigi, que atuou numa das partidas da campanha, ganhou – de maneira póstuma – o seu único título.

O mundo dá voltas

Attilio Romero foi eleito presidente do Torino em 2000. Filho de um médico rico, 33 anos antes tinha um corte de cabelo similar ao de Meroni. Aliás, até parecia fisicamente com o jogador. Era ele quem dirigia o Lancia Appia daquela fatídica noite. A chegada de Romero à cadeira de mandatário expôs o clube a críticas de fãs que atribuíam ao presidente a responsabilidade do incidente que tirou a vida do elegante ponta da camisa 7.

No 40º aniversário do falecimento de Meroni foi colocado um monumento no local onde ocorreu o acidente. Além disso, foram dedicados a ele vários livros e mensagens de clubes de futebol. A memória de um jogador que poderia ter se tornado um dos grandes da história italiana permanece inalterada.

Luigi Meroni
Nascimento: 23 de fevereiro de 1943, em Como, Itália
Morte: 15 de outubro de 1967, em Turim, Itália
Posição: ponta
Clubes: Como (1960-62), Genoa (1962-64) e Torino (1964-67)
Títulos: Coppa Italia (1968)
Seleção italiana: 6 jogos e 2 gols

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