A família Materazzi e o futebol são amigos íntimos. Tudo começou com o patriarca Giuseppe, que fez carreira nas divisões inferiores da Itália nos anos 1960 e 1970, para depois se tornar treinador. Depois, o filho Matteo se tornou agente Fifa e a filha Monia se casou com o filho de Tommaso Maestrelli, primeiro técnico que faturou o scudetto com a Lazio. O maior destaque, porém, é de Marco, verdadeiro filho da arte: o imponente zagueiro construiu uma carreira sólida, com títulos da Serie A, da Liga dos Campeões e uma vital participação no tetracampeonato mundial italiano, em 2006.
Marco Materazzi nasceu em 1973, em Lecce. Seu pai era jogador do time apuliano, mas o futuro zagueiro passou boa parte de sua infância mudando de região: morou na Toscana, na Calábria, na Campânia e na Emília-Romanha, embora tenha vivido a maior parte desse tempo em Bari, cidade próxima a Lecce. Aos 15 anos, quando seu pai se tornou técnico da Lazio, Marco ingressou nas categorias de base do clube, do qual é torcedor.
O jovem acompanhou seu pai quando este deixou a Lazio e assinou com o Messina, em 1990: foi exatamente pelo clube siciliano que Matrix fez sua estreia como profissional, escalado por seu pai, Giuseppe, em uma partida da Serie B 1990-91. Ao fim da temporada, alcançando a maioridade, Marco se separou do progenitor e trilhou sua carreira em clubes das divisões inferiores da Itália, chegando até a atuar como lateral esquerdo pelo Trapani, então na Serie C1. Em 1995, deu um pequeno salto na carreira e assinou com o Perugia, da segundona. No entanto, foi relegado ao time juvenil (embora já tivesse 22 anos) e conquistou o Campeonato Primavera, em uma equipe que também tinha o goleiro Marco Storari e o volante Gennaro Gattuso.
O zagueiro canhoto acabou sendo emprestado por uma temporada ao Carpi, mas só ficou seis meses no time da terceira divisão: na Emília-Romanha, Materazzi revelou a verve goleadora que o acompanharia em toda a carreira e, com sete gols em 18 jogos, foi chamado de volta pelo time umbro, que disputava a Serie A. Matrix não conseguiu ajudar os biancorossi a evitarem a queda, mas se destacou como titular e assumiu a braçadeira de capitão aos 23 anos. O zagueiro permaneceu para mais uma disputa da Serie B e, no centro da zaga, foi peça-chave na campanha do retorno imediato do Perugia à primeira divisão.
Naquele momento Materazzi já mostrava os atributos que lhe fariam ficar conhecido ao longo da carreira: era bom nas jogadas aéreas e marcava gols de cabeça ou cobrando faltas, além de marcar duro e chegar ao ponto de ser violento, às vezes. Com este repertório, assinou com o Everton em 1998 e fez parte de um sistema defensivo muito físico e faltoso, ao lado dos zagueiros Slaven Bilic, Richard Dunne e David Weir, além do volante Olivier Dacourt. Matrix, porém, conseguiu ser expulso quatro vezes na temporada e acabou sendo readquirido pelo Perugia depois de pouco menos de um ano.
A volta à Umbria fez muito bem ao defensor, então com 25 anos. Materazzi logo se tornou fundamental à equipe do meia Hidetoshi Nakata e do atacante Nicola Amoruso e, após a permanência na Serie A, recebeu a braçadeira de capitão da equipe outra vez no início da temporada 2000-01. Líder em campo, Matrix conduziu o Perugia a uma tranquila salvezza, sendo o principal nome da campanha, com 12 gols marcados – número recorde de tentos para um zagueiro em uma única temporada do Campeonato Italiano. Graças às suas atuações, Materazzi recebeu os primeiros chamados para a seleção italiana e foi contratado pela Inter.
A passagem de dez anos de Materazzi pela Inter pode ser dividida em dois momentos bem distintos. Na primeira metade, o defensor foi considerado um dos pontos mais instáveis de uma equipe que brigava por títulos, mas decepcionava na hora decisivas e não levantava taça alguma – só em 2005 a história mudou, com as conquistas da Coppa Italia e da Supercoppa Italiana. Neste período, Matrix ganhou notoriedade pelas faltas violentas, por derramar o próprio sangue em campo e por agressões a Andriy Shevchenko, Zlatan Ibrahimovic e Bruno Cirillo – veja alguns lances aqui. Até um gol contra do meio-campo, contra o Empoli, ele fez, em 2005-06.
Apesar de flutuar entre os reservas e os titulares da Beneamata e ser odiado por quase toda a Itália, o nerazzurro foi convocado para a Copa do Mundo de 2002 e para a Euro 2004 – disputou somente um jogo em cada competição. Em 2006, Matrix também participou do Mundial, na Alemanha, e o mês do torneio foi o grande divisor de águas de sua carreira.
Alessandro Nesta começou a Copa como titular da defesa italiana, ao lado de Fabio Cannavaro, mas tinha acabado de se recuperar de uma lesão muscular no músculo adutor da coxa direita. No terceiro jogo da trajetória azzurra, o milanista teve recaída da lesão e foi substituído por Materazzi, o que provocou medo na torcida. Porém, com 10 minutos em campo, o jogador da Inter marcou o primeiro gol da partida, vencida contra a República Checa.
Na partida seguinte, nas oitavas de final contra a Austrália, Materazzi foi expulso injustamente pelo árbitro Luis Medina Cantalejo: o espanhol levou em conta o histórico negativo do italiano para expulsá-lo por um carrinho que valia apenas cartão amarelo. Com Nesta fora de combate até o fim da competição, Matrix voltou ao time nas semifinais, contra a Alemanha, e foi confirmado como titular diante da França de Zinédine Zidane, na final. Os dois foram exatamente os grandes nomes daquela decisão.
O árbitro Horacio Elizondo assinalou um pênalti controverso de Materazzi sobre Florent Malouda logo aos seis minutos de jogo, que foi convertido por Zizou. O italiano se redimiu 13 minutos depois, marcando um gol de cabeça e empatando a peleja – curiosamente, as duas únicas vezes que Matrix balançou as redes em 41 jogos pela Squadra Azzurra foram no Mundial. Na prorrogação, o zagueiro da Nazionale ainda provocou Zidane e recebeu a famosa cabeçada no peito, cena que rodou o mundo e valeu a expulsão do francês, no último lance de sua carreira. Depois do 1 a 1 e para fechar a noite de grandes emoções, Materazzi converteu sua cobrança de pênalti, ajudando a Itália a ficar com o tetracampeonato.
Materazzi voltou mudado após o título mundial. Aos 33 anos, viveu um dos melhores momentos de sua carreira, aparecendo no time titular da Inter até 2008, ano em que foi convocado para sua segunda Eurocopa. A temporada de maior destaque do apuliano pela equipe nerazzurra foi 2006-07, no qual Matrix marcou 10 gols e foi um dos principais defensores da Serie A.
Depois da chegada do técnico José Mourinho, em 2008, Materazzi perdeu a titularidade, mas continuou sendo uma peça muito importante nos bastidores, sendo responsável por dar broncas nos mais jovens – que o diga Mario Balotelli. Zagueiro e técnico desenvolveram relação de proximidade e o português, inclusive, homenageou Matrix ao colocá-lo em campo nos minutos finais da decisão da Liga dos Campeões 2009-10, vencida pela Inter. A cena do abraço emocionado dos dois, na despedida de Mourinho, foi bastante comentada.
Matrix seguiu na Inter por mais um ano, sempre como sombra de Lúcio, Walter Samuel e Iván Córdoba. Em 2011, com quase 38 anos, o xerife italiano decidiu parar: pela Beneamata conquistou 15 troféus (cinco Serie A, quatro Copas da Itália, quatro Supercopas Italianas, um Mundial de Clubes da Fifa e uma Liga dos Campeões) em 301 partidas disputadas. Também acumulou seis cartões vermelhos – dois dos quais em clássicos.
Três anos depois de anunciar sua aposentadoria, Materazzi reconsiderou sua decisão e aceitou o desafio de ajudar a desenvolver o futebol na Índia. Dessa forma, Matrix se tornou jogador e técnico do Chennaiyin, da Superliga Indiana, e conquistou seu primeiro título nacional em 2015. Após pendurar as chuteiras definitivamente, aos 42 anos, o italiano prosseguiu como técnico da equipe do Golfo de Bengala até 2017, quando voltou para a Itália e voltou a ser figurinha carimbada em San Siro – como torcedor da Inter. E, claro, continua dividindo opiniões: amado por uns e odiado por tantos outros, marcou a história do esporte no Belpaese.
Marco Materazzi
Nascimento: 19 de agosto de 1973, em Lecce, Itália
Posição: zagueiro
Clubes como jogador: Messina (1990-91), Tor di Quinto (1991-92), Marsala (1993-94), Trapani (1994-95), Perugia (1995-96, 1997-98 e 1999-2001), Carpi (1996-97), Everton (1998-99), Inter (2001-11) e Chennaiyin (2014-16)
Títulos como jogador: Campeonato Primavera (1996), Coppa Italia (2005, 2006, 2010 e 2011), Supercopa Italiana (2005, 2006, 2008 e 2010), Serie A (2006, 2007, 2008, 2009 e 2010), Copa do Mundo (2006), Liga dos Campeões (2010), Mundial de Clubes da Fifa (2010) e Superliga Indiana (2015)
Clubes como treinador: Chennaiyin (2014-17)
Títulos como treinador: Superliga Indiana (2015)
Seleção italiana: 41 jogos e 2 gols