O primeiro, o segundo e o terceiro (e contando…) passos para a reestruturação de um campeonato é o equilíbrio. A frase, bem Titeônica, casa com a ideia de uma competição que todos os seus participantes têm possibilidade de vitória – uns mais, outros menos; como sempre foi desde que mundo é mundo. Para que isso aconteça em um torneio de futebol, uma das peças-chave são os direitos de televisão. Por ser uma das principais fontes de renda, a grana proveniente da TV será utilizada na montagem dos times e no fortalecimento do campeonato.
Brasil e Espanha estão bem longe da curva do “bom samaritano do futebol”. Cá em terras tupiniquins, os clubes estão divididos em quatro grupos: Corinthians e Flamengo são os que mais arrecadam – R$ 124 milhões em 2012; veja aqui; São Paulo, Vasco, Palmeiras e Santos estão inclusos no segundo grupo; os outros cariocas, gaúchos e mineiros estão no intermediário; e paranaenses e outros da Primeira Divisão são os que menos recebem. A diferença de Corinthians para Vitória, por exemplo, foi de R$ 87 milhões no ano passado. Muita coisa.Na Espanha não é diferente: o Peter Pan não existe, Barcelona e Real Madrid dominam o mercado e o Atlético de Madrid, terceira agremiação que mais recebe, tem 100 milhões de euros a menos de direitos televisivos. Não por menos alguns jornalistas e estudiosos afirmam que o Campeonato Brasileiro está virando um Espanhol.
Noutro extremo, Inglaterra, Alemanha, França e Itália propõem um sistema mais eficaz de distribuição de renda. Todos os clubes recebem a mesma fatia do dinheiro da TV. Assim, vamos explicar como funciona a distribuição na Serie A.
O Campeonato Italiano, atualmente, vale 966,2 milhões de euros na temporada 2012-13 (aproximadamente R$ 3 bi). Deste valor do acordo contratual, 10% foram (e ainda são) destinados às categorias inferiores – Serie B recebe um subsídio de pouco mais de 60 milhões de euros -, de base e para a Autorità per le Garanzie nelle Comunicazioni, uma agência reguladora das indústrias de comunicação. Assim, com a parte descontada, o restante para as equipes foi o valor de 865,3 milhões, distribuídos da seguinte maneira:
- 40% – dividido em partes iguais aos times
inscritos na competição; logo, em junho de 2012, Juventus, Roma, Palermo e
Pescara receberam a mesma quantia de 17,3 milhões; - 30% – às questões extracampo; é composto por torcedores
(25%) e habitantes da cidade (5%); - 30% – às classificações; é composto pela posição
final na tabela da temporada corrente – neste caso a de 2012-13 – (5%),
resultados do último quinquênio (15%) e classificações da época 1946-47 até a referência anterior – neste caso, 2007-08 – (10%).
É claro que existem aberrações. Pescara e Siena, rebaixados, receberam “um Napoli” a menos em comparação com a Juventus, bicampeã. No entanto, é a fatia que a Juventus ocupa em sostenitori que pende a balança para um lado. Em Kuper e Szymanski (2012), a Velha Senhora é o 10º clube preferido da Europa, com 17,5 milhões de fãs – Milan é o 8º e Inter, 12º. Mesmo com a preferência continental pelo rossonero, a Juve ainda é a preferência nacional de acordo com uma pesquisa realizada em setembro de 2012 pela Sondaggio Demos & Pi. O Torino, pela classificação histórica e pela porcentagem dada à região do Piemonte, recebe mais que o Genoa, por exemplo, que teve um melhor retrospecto nas últimas cinco temporadas.
O que pode acontecer nas próximas temporadas é uma queda (não brusca) do dinheiro recebido pela Juventus e um acréscimo considerável para Napoli e Roma. Em um ano, a Juve perdeu 700 mil torcedores, segundo o mesmo estudo de 2012. No mesmo período, enquanto a Inter teve revés de 4 milhões de fãs no País, o Napoli cresceu em 4,2 milhões de torcedores. A Roma acresceu ao seu bando de adeptos cerca de 800 mil tifosi.
Em entrevista recente ao Financial Times, Andrea Agnelli, presidente da Juventus, afirmou que um modelo híbrido entre Inglaterra (estádios), Espanha (liberdade dos clubes de vender os direitos de TV individualmente) e Alemanha (patrocínios corporativos) seria o melhor para a Itália. Discordo principalmente na questão espanhola. Para os clubes é ótimo; para o campeonato, é horroroso. No mais, o mandatário deu bola dentro ao citar o plano alemão.
O patrocínio englobaria, também, a renda proveniente de fora do país. Na Inglaterra (veja cota de TV aqui), para citar um caso, mais da metade da grana televisiva vem do estrangeiro – e olha que estamos falando de cerca de 2 bilhões de euros. Do papel-moeda italiano, o euro, 90% são gerados no próprio Belpaese. Para que investidores estrangeiros invistam na Itália, o futebol precisaria melhorar. Claro. É óbvio.Na verdade, não é só o futebol que precisa mudar; a mentalidade também. O alcance da televisão italiana é de 7.8 pontos de audiência em Copas do Mundo e campeonatos europeus. A Hungria (sim, a Hungria) tem valor maior; o Brasil chega a 8.8; e Croácia lidera com 12.4.
Enquanto o bebê-futebol engatinha, a mãe-Lega Serie A tem seus mecanismos para àquelas crianças-times que repetiram de ano. O Palermo, rebaixado na última temporada, não sofrerá efeitos devastadores pela queda mesmo já sabendo que vai receber menos dinheiro em 2013 (o Estatuto da Serie A e o Decreto Legislativo 9/08 não deixam isso acontecer).
Enfim, não tem jeito: o grande será grande e o pequeno que se vire. O que o modelo italiano mostra é que existe uma maneira de tentar beneficiar todo mundo, mas pode melhorar bastante para que o campeonato volte a ser o que foi nas décadas de 1980 e 90.
Texto escrito com base no artigo publicado no Tifoso Bilanciato