Basta citar o dia 5 de maio de 2002 para fazer um torcedor da Inter relembrar os seus maiores pesadelos. Na tarde daquele dia seria realizada a última rodada da Serie A e os nerazzurri precisavam de apenas uma vitória para ficar com o scudetto, aguardado havia 13 anos. A torcida só não contava com Vratislav Gresko.
Bem antes de causar maus sentimentos nos interistas, aos 18 anos o lateral-esquerdo Gresko deixou o vilarejo de Tajov, na Eslováquia, para atuar pelo Dukla Banksá Bystrica, de uma cidade vizinha. Sua carreira começou de forma promissora, e após atuar pelo Inter Bratislava, maior equipe de seu país, foi vendido ao Bayer Leverkusen. Seria a chance de jogar a Liga dos Campeões.
Na Alemanha, porém, ele não teve muito espaço, já que Zé Roberto dominava o setor, mas o técnico Marco Tardelli achou que ele tinha potencial e o indicou à diretoria da Inter, em 2000. Meses antes, o meia tricampeão mundial em 1982 estava à frente da seleção sub-21 da Itália, campeã europeia da categoria na Eurocopa, disputada na Eslováquia. Os azzurrini enfrentaram a sub-21 eslovaca na fase de grupos da competição e Gresko, capitão de seu país, agradou ao treinador italiano. Assim, no final de outubro (havia uma janela de transferências no outono europeu àquela época), Tardelli, que já era o treinador nerazzurro, o levou para Milão por cerca de 10 bilhões de velhas liras. O jogador assinou um contrato de quatro anos.
Àquele momento a Inter era um time à deriva, que estava sem seu principal jogador – Ronaldo, que sofrera seríssima lesão – e que demitira o técnico Marcello Lippi após a primeira rodada da Serie A e eliminação na fase preliminar da Liga dos Campeões. O mercado daquela temporada se revelaria desastroso para os nerazzurri, que não aproveitaram Andrea Pirlo (foi emprestado à Reggina e depois negociado com o Milan, em troca por Francesco Coco) e ainda gastaram rios de dinheiro para contratar Hakan Sükür, Robbie Keane, Francisco Javier Farinós, Cristian Brocchi, Vampeta, Michele Serena, Bruno Cirillo e Anselmo Robbiati. Todos eles fracassaram e Gresko não seria exceção.
Na temporada de estreia, o primeiro (e único) eslovaco da história da Beneamata atuou 1216 minutos, distribuídos em 18 partidas. A estreia foi boa e ele até deu uma assistência para Álvaro Recoba marcar um dos gols da vitória sobre a Roma. No ano inteiro não chegou a ir tão mal, dadas as condições da equipe, e até acertou alguns cruzamentos para Christian Vieri, Iván Zamorano e Sükür e conseguiu trabalhar algumas jogadas com Clarence Seedorf. A torcida pegava no pé do eslovaco, mas ele foi confirmado para a temporada 2001-02.
Os nerazzurri fizeram outro mercado bastante questionável, mas a equipe melhorou. O argentino Héctor Cúper acertou a equipe em um 4-3-1-2 e Gresko ganhou a titularidade em definitivo – disputaria 23 partidas naquela Serie A. A torcida continuava torcendo o nariz para ele, mas como a Beneamata assumiu a liderança do Campeonato Italiano e Ronaldo voltava do longo período no estaleiro no melhor estilo goleador, a presença do eslovaco não atrapalhava tanto. Até o dia 5 de maio de 2002.
A Inter era líder, com 69 pontos, seguida por Juventus (68) e Roma (67). Bastava ir ao Olímpico e vencer a Lazio, que tinha pouquíssimas chances de se classificar à Copa Uefa e tinha interesses de ver a Roma não faturar seu segundo scudetto consecutivo. A Velha Senhora fazia sua parte e vencia a Udinese fora de casa, fazendo 2 a 0 em 11 minutos. A Roma ficava no empate com o Torino, mas a vitória da Juve a deixava sem chances de título.
E a Inter? Após saber do placar em Údine, fez 1 a 0 com Vieri, mas sofreu o empate. A reação veio quatro minutos depois, com Luigi Di Biagio. O título ia ficando com o time de Milão, que não levantava a taça desde 1989, mas Gresko entrou em ação.
No final do primeiro tempo o eslovaco estava sozinho na grande área e ia escorar para trás um cruzamento mal feito pela Lazio. Só que o checo Karel Poborsky intuiu a jogada, muito previsível, e apareceu para roubar a bola e fazer seu segundo. Com o moral baixo após o empate, os nerazzurri se enrolaram na volta do intervalo e, por 4 a 2, perderam a partida e o título.
O scudetto ficou com a Juve, treinada por Lippi, e, graças à vitória da Roma sobre o Torino, a Inter ainda caiu para a terceira posição – teve de jogar os playoffs da Champions. Uma tragédia com contornos irônicos, cuja imagem mais lembrada foi a do choro copioso de Ronaldo no banco de reservas do Olímpico.
Grupos de torcedores interistas tentaram se organizar para agredir o eslovaco, que virou o bode expiatório para o vexame, mas ele não foi encontrado. Gresko viajou logo para passar as férias em seu país e, quando voltou, a Inter tentou negociá-lo. Nenhum clube quis ficar com o jogador e a solução foi emprestá-lo gratuitamente ao Parma, que mal o utilizou: após entrar em campo em seis partidas, deixou a Itália.
Fora do Belpaese, o fantasma de ter sido um dos principais responsáveis pela incrível perda do scudetto da Inter não o acompanhava tanto. Mas nem por isso Gresko se soltou e se tornou um jogador de maior destaque: fez pouquíssimos jogos por Blackburn, Nürnberg e Bayer Leverkusen antes de ir jogar no Podbrezová, da segunda divisão eslovaca. Curiosamente, a equipe tem um acordo de cooperação justamente com a Inter.
Um dos mais criticados jogadores dos tempos recentes do futebol italiano, Gresko anunciou sua aposentadoria em 2015. Entre as poucas glórias de sua vida, estão a conquista da Copa da Alemanha, como reserva, e o título da segunda divisão eslovaca.
Vratislav Gresko
Nascimento: 24 de julho de 1977, em Tajov, Checoslováquia (atual Eslováquia)
Posição: lateral-esquerdo
Clubes: Dukla Banksá Bystrica (1995-97), Inter Bratislava (1997-99), Bayer Leverkusen (1999-2000 e 2007-09), Inter (2000-02), Parma (2002-03), Blackburn (2003-06), Nürnberg (2006-07) e Podbrezová (2011-15)
Títulos: Copa da Alemanha (2007) e Fortuna Liga (2014)
Seleção eslovaca: 34 jogos e 2 gols