O futebol italiano é recheado de ídolos locais e também de adorados estrangeiros, como Nils Liedholm e Marco Van Basten, por exemplo. Ou Oscar Massei. Ele nasceu com um passaporte argentino, mas foi feito para ser um dos maiores ícones de outra esquadra que veste branco e azul, numa modesta cidade da Itália: a Spal, de Ferrara.
Oscar Massei nasceu em Pergamino, cidade no interior da Argentina, entre Rosário e Buenos Aires, em 1934. Depois de jogar em um pequeno time de Córdoba, foi terminar seu período como juvenil no Rosario Central, onde também iniciou sua carreira como profissional. Ali o centroavante teve grande sucesso entre 1951 e 1955, se consagrando como artilheiro do campeonato nacional de 1955 com 21 gols e salvando os canallas do rebaixamento.
Com um bom rendimento, aos 22 anos Massei chamou a atenção de times da Itália e escolheu se transferir para a Inter, na época presidida por Angelo Moratti. O argentino estreou pela equipe nerazzurra em janeiro de 1956 e teve bons resultados em sua primeira temporada na Europa, com nove gols em 14 partidas.
Por ser descendente de italianos, o atacante tinha o status de “oriundo”, o que possibilitava que fosse convocado para a Squadra Azzurra. Isso se concretizou na temporada seguinte, na qual anotou 10 gols em 21 partidas pela Beneamata. Na seleção, ficou no banco em um amistoso contra a Áustria e, infelizmente, não realizou seu sonho de receber outras convocações.
Em março de 1957, num jogo contra a Roma, Oscar se chocou com o defensor Giosuè Stucchi e lesionou gravemente o joelho, rompendo seus ligamentos cruzados, contusão que na época era muito mais delicada e preocupante do que hoje. Depois de muito tempo fora, voltou com um rendimento bem inferior e com pouco espaço no time da Inter. Assim, acabou sendo cedido à Triestina no verão de 1958.
Os alabardati lutaram contra o rebaixamento toda a temporada e Massei também não conseguiu ser titular inquestionável do time, o qual representou em 22 das 34 rodadas da Serie A. Depois da queda para a segunda divisão, os giuliani o liberaram para a transferência que mudaria a sua vida.
A Spal estreara na elite na década de 1950 e, após oito anos na primeira divisão, quase fora rebaixada: tinha ficado uma posição à frente da Triestina. O clube de Ferrara enxergou no ítalo-argentino uma esperança de melhoria, dado que, apesar da boa defesa, tivera o pior ataque da temporada. O time, ao espírito de seu tempo, aplicava um catenaccio que era pouco requintado e precisava de jogadores ofensivos cirúrgicos e experientes.
O presidente Paolo Mazza estava fascinado pelo argentino e o queria de qualquer jeito em seu time. Quando o recebeu no clube, o abraçou e disse que a Spal nunca tivera um jogador de tanta qualidade. Confuso, Massei respondeu que ainda estava em uma condição física muito ruim, que mal podia correr. Recebeu uma clássica resposta de um cartola dos tempos idos: seu papel ali não seria correr, mas pensar.
Ferrara lhe deu o que a Itália até então não tinha provido: ambiente leve, cheio de positividade e com tempo de sobre para os jogadores se adaptarem. Assim, Massei conseguiu recuperar as condições físicas e mentais para reencontrar seu bom futebol e abraçou de vez a Spal. Em quase uma década de casa, se tornou o maior jogador da história do clube, como Mazza previra, e foi protagonista dos momentos mais gloriosos dos estensi.
Sendo recuado para jogar no meio-campo, habitualmente pelo lado esquerdo, Massei fez o time jogar o que nunca havia jogado já na primeira temporada, na qual assumiu o papel de capitão e cobrador oficial de penalidades máximas. Em 29 jogos, marcou nove gols que foram responsáveis diretos por nove pontos importantíssimos. Afinal, o time emiliano ficou com o quinto lugar da Serie A, colocação que até hoje jamais foi igualada.
Massei ainda foi protagonista na melhor campanha que a Spal conseguiu na Coppa Italia. Em 1961-62, o ítalo-argentino entrou em campo a partir das oitavas de final e marcou gols decisivos contra Vicenza e Novara, além de ter participado em alto nível da incrível vitória por 4 a 1 dos biancazzurri sobre a Juventus, na semifinal. Na decisão, o Napoli fez 2 a 1 e os spallini ficaram com um honroso vice-campeonato.
Depois disso, Oscar se tornou a grande figura dos biancazzurri, tanto dentro quanto fora de campo. Rejeitou propostas de outros clubes e ajudou a criar um bom ambiente, no qual Edy Reja e Fabio Capello – entre outros grandes jogadores – foram formados e amadureceram. Também foi referência para os raros estrangeiros que eram contratados pelo clube, como o atacante alemão Erwin Waldner (a seu lado direito, na foto que abre este texto) e o ponta-esquerda brasileiro Carlos Cézar.
Massei ficou na Spal até 1968, tendo sido emprestado por um breve período, entre as temporadas 1967-68 e 1968-69, para disputar o Campeonato Norte-Americano pelo Chicago Mustangs, time que era representado pelo Cagliari na United Soccer Association. Após retornar do torneio de tiro curto nos Estados Unidos, Oscar fez a sua última temporada com a camisa dos estensi e amargou o rebaixamento do time para a Serie B pela segunda vez.
Na primeira queda, em 1963-64, o clube contou com o futebol de Massei para retornar de imediato. A segunda queda foi muito mais dolorida, uma vez que a Spal só pisaria na elite do futebol italiano outra vez em 2017-18. Oscar não disputou outra Serie B pela equipe de Ferrara: após o rebaixamento, acometido pela labirintite, se aposentou aos 34 anos. Sua passagem pelo clube foi tão expressiva que até hoje ele se encontra entre os cinco primeiros em número de partidas (253) e gols (59) pela Spal. O argentino também detém o recorde de sul-americano com mais jogos, tentos e pênaltis convertidos com a camisa spallina na primeira categoria.
Fora dos gramados, Oscar Massei teve uma modesta – porém longeva – carreira como treinador nas divisões inferiores da Itália, obtendo maior sucesso na Lombardia. Pelo Lecco, o ex-atacante ganhou uma Coppa Italia de Semiprofissionais e uma Copa Anglo-Italiana, em 1977, e ainda teve o prazer de treinar o filho Rafael. Massei também foi campeão da Serie D pela Vogherese.
Massei ainda passou pela Suíça, onde treinou equipes da região do Ticino (cantão helvético em que se fala italiano) e teve sua última experiência como técnico de um time profissional, à frente do Chiasso. Embora não tenha conseguido realizar a proeza de treinar o time profissional do time que salvou sua carreira como jogador, o argentino comandou as categorias de base da Spal entre 1989 e 1994, até se aposentar.
Ídolo da Spal, o ex-jogador recebeu a cidadania honorária do Prefeito de Ferrara em ocasião comemoração ao centenário do time italiano, em 2007, e é ovacionado efusivamente pela torcida dos estensi todas as vezes que aparece no estádio Paolo Mazza. Massei vive na Itália e, apesar dos muitos anos na Bota, até hoje guarda um sotaque portenho, lembrando bastante o Papa Francisco, segundo alguns. O coração de Oscar nasceu branco e azul, por sua argentinidade, e pela adoção pelos spallini, nunca deixará de sê-lo.
Oscar Alberto Massei
Nascimento: 29 de setembro de 1934, em Pergamino, Argentina
Posição: atacante e meio-campista
Clubes como jogador: Rosario Central (1951-55), Inter (1955-58), Triestina (1958-59), Spal (1959-67 e 1967-68) e Chicago Mustangs (1967)
Carreira como técnico: Trevigliese (1968-70), Treviso (1970-71), Messina (1971-73), Ignis Varese (1973-74), Milanese (1974-75), Lecco (1975-77 e 1979-80), Lugano (1977-79), Vogherese (1980-83 e 1986-87), Novara (1983-84), Pro Italia Galatina (1984-85 e 1987-88), Pro Vercelli (1985-86) e Chiasso (1989)
Títulos como técnico: Coppa Italia de Semiprofissionais (1977), Copa Anglo-Italiana (1977) e Serie D (1981)