São poucas as coisas que lembro da Copa de 94. Afinal, não tinha completado quatro anos quando ela foi disputada. Lembro da Bulgária de Stoichkov. Lembro dos cinco gols de Oleg Salenko contra Camarões. Lembro das vastas cabeleiras de Lalas, Valderrama e Larsson. Lembro de um dos poucos pênaltis perdidos por Roberto Baggio na carreira. Mas duas recordações são as que vêm primeiro à memória. São duas faltas: a de Brolin, contra a Romênia, e a de Branco, contra a Holanda. Na Itália, Cláudio Ibrahim Vaz Leal, o antecessor de Roberto Carlos, também soltou seus mísseis com a perna canhota durante cinco temporadas.
Natural de Bagé, Branco iniciou a carreira no Guarany e só foi estrear profissionalmente no Fluminense, em 1982, após passagem pelo Internacional. O lateral, ainda jovem, atuou ao lado de Paulo Vitor, Ricardo Gomes, Romerito, Tato e Assis, conquistando o tricampeonato carioca no período entre 1983 e 85. O currículo em território nacional também mostrava o título do Campeonato Brasileiro, em 1984, vencido em cima do Vasco, do artilheiro Roberto Dinamite.
Logo após a derrota para a França, no Mundial do México, em 1986, Branco foi liberado pelo Fluminense para acertar seu empréstimo com o Brescia. Os três gols em 26 partidas não salvaram os rondinelle do rebaixamento. A equipe da Lombardia desceu de divisão com 22 pontos marcados em 30 partidas – se tivesse um a mais, empurraria o Empoli à Serie B.
A pouca idade e inexperiência no futebol italiano fizeram com que Branco permanecesse na Bota por mais uma temporada, na divisão de acesso. Depois da oitava colocação em 1988-89, Branco deixou Brescia para se aventurar em Portugal. No Porto, o lateral evoluiu e adicionou novos títulos a sua carreira, pois conquistou o campeonato nacional, a Supercopa de Portugal e, com a seleção, ficou com o ouro da Copa América. Em 1990, retornou à Itália para disputar a Copa do Mundo, mas acabou caindo junto com o Brasil nas oitavas de final, ante à Argentina, numa partida em que acabou sendo vítima da água “batizada” por alguns hermanos.
Depois da Copa do Mundo, Branco permaneceu na Itália. Dessa vez deu certo: o lateral se encaixou como uma luva na equipe treinada por Osvaldo Bagnoli. O Genoa terminou a liga com 40 pontos, na quarta colocação. Aquele da temporada 1990-91 era o melhor Grifone, nos resultados, desde 1942. A equipe de Gênova contava com Aguilera e Skuhravý no ataque – ambos marcaram 30 dos 51 gols do time na Serie A. E também contava com Branco, que marcou um golaço, em cobrança de falta, na vitória por 2 a 1 em dérbi contra a Sampdoria que se sagraria campeã italiana naquela temporada. Para os rossoblù, bastava vencer o dérbi e termnar o campeonato na quarta posição, que levaria o Genoa a uma competição europeia pela primeira vez na história.
Na Copa da Uefa, os Grifone passaram por Oviedo, Dinamo Bucareste, Steaua Bucareste e Liverpool. Vivendo sua melhor fase na Bota, Branco tinha ótima relação com os jogadores (sobretudo com o capitão, o zagueiro Gianluca Signorini) e sempre era aplaudido pela torcida. Os fãs adoravam Branco, principalmente após balançar a rede no clássico contra a Sampdoria. Na competição europeia, o Genoa eliminou o Liverpool com mais um gol magnífico do lateral, na primeira partida – 2 a 0, em casa –, e dois de Aguilera, na Inglaterra. O sonho continental, no entanto, foi interrompido na semifinal, contra o Ajax.
Nas duas Serie A seguintes, o time de Gênova não teve mais o mesmo sucesso, principalmente depois das saídas de Bagnoli, para a Inter, e Aguilera, para o Torino. A temporada 1992-93 foi conturbada e o Genoa teve três técnicos. A desorganização refletiu em uma modesta 13ª posição e Branco optou por retornar ao Brasil, após sete anos no exterior. A peregrinação, então, começou: o lateral passou por quatro times no biênio 1993-95, até retornar à Europa para atuar pelo Middlesbrough, onde pouco jogou.
Antes disso, porém, Branco marcou aquele golaço nas quartas de final da Copa de 1994, quando o Brasil venceu a Holanda, no jogo mais dramático da campanha, até o momento. Branco, que havia perdido a sua vaga como titular para Leonardo, fazia sua primeira partida entre os 11, após a expulsão do seu concorrente, por cotovelada em Tab Ramos, dos Estados Unidos, e marcou presença. Seu gol, que abriu o caminho para o tetracampeonato do Brasil, e sua comemoração estão entre os momentos antológicos na história da seleção brasileira.
Depois da Copa, Branco voltou a peregrinar e foi um dos jogadores a abrir caminho para a crescente liga norte-americana, a MLS, com sua passagem pelo New York MetroStars. Sua segunda casa, o Fluminense, foi o último time a ceder o uniforme a Branco, que o vestiu em 1998. Depois, foi dirigente do Flu e das categorias de base do Brasil, além de ter sido técnico de clubes como Figueirense, Sobradinho e Guarani.
Cláudio Ibrahim Vaz Leal, o Branco
Nascimento: 4 de abril de 1964, em Bagé (RS)
Posição: lateral-esquerdo
Carreira como jogador: Internacional (1980-81), Fluminense (1981-86, 1994 e 1998), Brescia (1986-88), Porto (1988-91), Genoa (1991-93), Grêmio (1993), Flamengo (1995), Middlesbrough (1995-97), Mogi Mirim (1997) e New York MetroStars (1997)
Carreira como técnico: Figueirense (2012), Sobradinho (2013) e Guarani (2013)
Títulos: Campeonato Gaúcho (1981 e 1993), Campeonato Carioca (1983 e 1985), Campeonato Brasileiro (1984), Copa América (1989), Campeonato Português (1990), Supercopa de Portugal (1990) e Copa do Mundo (1994)
Seleção brasileira: 69 jogos e 9 gols
O Branco era chamado em Genova de Il Caraglio, pois após toda jogada que fazia, falava: caralho.