Brasileiros no calcio

José Ricardo da Silva, o China, brilhou pela Sampdoria nos clássicos de Gênova

O sucesso de brasileiros pouco conhecidos em seu próprio país é uma espécie de tradição do futebol italiano e, como todo costume, vem de longa data. Na década de 1960, José Ricardo da Silva, o China, foi um dos que deram continuidade ao legado: pouco após defender a Seleção nos Jogos Olímpicos de Roma, foi adquirido pela Sampdoria e teve ótimos momentos pelos blucerchiati.

Natural de Fortaleza, capital do Ceará, José Ricardo da Silva ganhou o apelido de China por conta de seus olhos puxados – embora sua descendência seja indígena. O atacante deixou o Nordeste no fim da década de 1950 e estreou profissionalmente em 1958, pelo Botafogo.

Durante o período em que militou pelo clube da Estrela Solitária, China obteve pouco espaço. Porém, conquistou dois títulos do Campeonato Carioca e um do Torneio Rio-São Paulo – além de ter atuado ao lado de ícones do Botafogo, como Nilton Santos, Didi, Amarildo, Zagallo e Garrincha, e ter sido treinado por João Saldanha e Paulo Amaral.

Pelo Glorioso, o atacante também chamou a atenção da Confederação Brasileira de Desportos (CBD) e foi convocado para representar o Brasil nos Jogos Pan-Americanos de 1959, em Chicago, quando ficou com a prata, e nos Jogos Olímpicos de 1960. Aliás, ao embarcar para a Itália, China se tornou o primeiro cearense a disputar uma Olimpíada.

Os Jogos Olímpicos realizados em Roma, capital italiana, mudaram sua vida para sempre. O Brasil foi sorteado no Grupo C, ao lado de Itália, Reino Unido e Taiwan, e não avançou pois só o líder seguia em frente – a Canarinho ficou em segundo, atrás dos donos da casa. Porém, China somou boas atuações e marcou dois gols sobre os britânicos, entrando no radar dos clubes do Belpaese. Em 1962, a Sampdoria assegurou a contratação do atacante, que estava prestes a completar 23 anos.

A Sampdoria, na época, era uma equipe de meio de tabela que tinha algumas campanhas mais positivas no currículo – até então, seu melhor resultado na Serie A havia sido o quarto lugar, em 1961. China não mudou a agremiação de patamar, mas deu inestimável contribuição para mantê-la onde estava.

O brasileiro não foi o principal reforço da Samp na janela de verão de 1962. A equipe genovesa também foi buscar o meia-atacante Jorge Toro, que ajudara o Chile a ser terceiro colocado na Copa do Mundo realizada em casa – e que fora um dos pivôs da Batalha de Santiago, contra a Itália. A dupla chegava para reforçar um ataque que contava ainda com o experiente Sergio Brighenti e o argentino Ernesto Cucchiaroni. China, porém, não se fez de rogado e superou a todos os concorrentes na hierarquia.

Da Silva, como ficou conhecido pelos italianos, estreou na Serie A no dia 16 de setembro de 1962, em jogo fora de casa, contra a Atalanta. E logo deu seu cartão de visitas: marcou o gol da Samp no empate por 1 a 1. Depois, o brasileiro passou por um jejum de sete rodadas no campeonato, compensado com tentos na Copa das Feiras, e voltou a dar o ar da graça com uma tripletta no 4 a 0 sobre o Catania.

Em sua primeira temporada, China balançou as redes 15 vezes em 32 jogos, sendo 13 pela Serie A. Sexto principal goleador da competição e artilheiro da Sampdoria, o cearense ainda conseguiu uma doppietta na vitória por 3 a 1 sobre o Genoa, no Derby della Lanterna que foi realizado no returno – e começou, assim, a escrever sua história no clássico. No fim das contas, a Samp terminou o campeonato na 11ª posição.

China chegou à Sampdoria após boa participação na Olimpíada de Roma e teve um bom desempenho com a camisa blucerchiata (Mondadori/Getty)

Nas duas temporadas seguintes, China e a Sampdoria caíram um pouco de produção. O brasileiro marcou nove e oito gols pela Serie A, respectivamente, e ajudou a equipe doriana a permanecer na elite do futebol italiano por muito pouco: em 1963-64, foi 15ª colocada e precisou vencer o Modena no spareggio; em 1964-65, 14ª, somou apenas um ponto a mais do que o Genoa, seu arquirrival, que foi rebaixado.

Naquela temporada, a Samp perdeu os dois clássicos para o Genoa, mas China deixou a sua marca num deles. Com isso, se tornou o maior goleador estrangeiro da história do Derby della Lanterna, com três gols. Décadas depois, o cearense foi superado por Diego Milito, que anotou quatro, e igualado por Éder.

No verão europeu de 1965, China se despediu da Sampdoria, que passava por uma reformulação. Artilheiro da equipe blucerchiata em dois dos três anos em que a defendeu, Da Silva encerrou sua passagem pela Ligúria com 36 gols marcados em 89 aparições e fechou com a Roma.

A Roma daqueles tempos não era nada competitiva e não conseguia ir além do meio da tabela. Mesmo assim, China não obteve espaço no esquema do técnico Oronzo Pugliese. Em toda a temporada 1965-66, o atacante brasileiro entrou em campo somente 13 vezes, com três gols marcados. Ofuscado por Paolo Barison, seu colega dos tempos de Sampdoria, Lamberto Leonardi e Fulvio Francesconi, rumou ao Vicenza no ano seguinte.

O Vicenza, que tinha sido sexto colocado na Serie A, vendera Luís Vinício, seu grande craque, para a Inter, e o substituiu com China e Sergio Gori – este último, proveniente dos nerazzurri. O cearense, contudo, voltou a decepcionar: entrou em campo apenas 14 vezes, com seis gols marcados. Apesar da pequena contribuição do fortalezense, os lanerossi se mantiveram na elite.

Em 1967-68, China fez seus últimos jogos pela Serie A, mas com a camisa do Mantova. O atacante foi utilizado somente duas vezes na campanha do rebaixamento dos virgiliani e, com quase 29 anos, se despediu da Itália. Em nítida queda de desempenho após sua era de ouro na Sampdoria, o cearense regressou ao Brasil em 1969 e integrou o elenco do Bangu até 1972.

Com 33 anos em 1972, China voltou para a Europa e decidiu tentar a sorte no futebol suíço, mas apenas em nível amador. Na verdade, pouco se sabe de sua vida por lá – e, no geral, dos passos que deu em seguida. Aposentado, ele retornou à Itália e se fixou em Rapallo, cidade da região metropolitana de Gênova, onde teria falecido em data desconhecida, no fim da década de 1990.

Coadjuvante no Botafogo, José Ricardo da Silva buscou o futebol da Itália para ir atrás do protagonismo. O cearense o encontrou na Sampdoria, onde conseguiu construir uma história marcante no Dérbi de Gênova e descolar um lugar no coração dos mais fanáticos torcedores blucerchiati. Mesmo assim, o seu falecimento, longe dos holofotes, deixou evidente quão efêmeras podem ser as situações na vida.

José Ricardo da Silva, o China
Nascimento: 11 de setembro de 1939, em Fortaleza, Ceará
Morte: fim dos anos 1990, em Rapallo, Itália
Posição: atacante
Clubes: Botafogo (1958-62), Sampdoria (1962-65), Roma (1965-66), Vicenza (1966-67), Mantova (1967-68) e Bangu (1969-72)
Títulos: Campeonato Carioca (1961 e 1962) e Torneio Rio-São Paulo (1962)
Seleção olímpica brasileira: 13 jogos e 9 gols

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1 Comentário

  • Non se consegue na cidade de Rapallo, a relação dos mortos ? Ele tem um filho ai na Italia de nome: Allesandro David da Silva, será que ele non sabe nada sobre a morte de seu pai ? Muito obrigado.

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