Este ano, o Derby della Madonnina, como é popularmente conhecido o confronto entre os times de futebol de Milão, Internazionale e Milan, completa 105 anos. O nome foi dado em homenagem à imagem da Madonna, a Virgem Maria, na Catedral de Milão. O dérbi é um dos mais prestigiosos do mundo, já que as duas equipes têm suas histórias recheadas por títulos e estão entre as mais vencedoras e conhecidas do planeta.
Na Europa, não há dérbi maior entre equipes da mesma cidade no quesito títulos – são 54 do Milan e 39 da Inter. O clássico de Milão ainda tem uma peculiaridade: é o único em toda Europa disputado por duas equipes que já venceram a Liga dos Campeões e são de uma mesma cidade. Não à toa, o estádio Giuseppe Meazza é conhecido como o “Scala do futebol”, em referência ao Teatro alla Scala, de Milão, por onde desde o século XVIII passam as maiores óperas do mundo.
Este será o dérbi de número 180 pela Serie A, competição na qual os times atualmente ocupam posições próximas, brigando pelo mesmo objetivo. Por outro lado, as duas equipes vêm de momentos distintos.
Com 9 vitórias nos últimos 13 jogos pelo campeonato, o Milan de Allegri, além do bom momento, apesar de sempre ter apresentado um futebol burocrático em suas apresentações pelo nacional, vem com a auto estima lá em cima após a vitória sobre o todo poderoso Barcelona no San Siro, em um jogo no qual o Diavolo acabou dominando os culés.
O aproveitamento de 69% nos últimos jogos, além dos tropeços de rivais como Lazio, Inter e Fiorentina, permitiu ao Diavolo entrar no “top 3” pela primeira vez na temporada, depois de começo tenebroso, em que ocupou posições inferiores da tabela. Com uma vitória no domingo, o time de Allegri terá a chance de não apenas desbancar seus principais rivais, mas também consolidar a posição e também acabar com um jejum de três dérbis sem vitórias.
Para isso, o técnico milanista contará com boa parte do plantel – Bonera e De Jong são os únicos desfalques certos. Os reservas Amelia, Salamon e Flamini buscam se recuperar a tempo, o que aconteceu com Nocerino e Robinho, nomes certos para domingo, ainda que não sejam titulares. Em relação ao time titular, Allegri deverá mudar pouco em relação ao time que bateu o Barcelona, buscando também ter uma estratégia para que o ataque seja mais efetivo e a equipe trabalhe melhor a posse de bola. Montolivo, Boateng, El Shaarawy e Balotelli são as grandes esperanças dos rossoneri.
Já em Appiano Gentile, o momento é outro. Desde a vitória sobre a Juventus em Turim, a equipe de Stramaccioni caiu muito de rendimento, sofrendo com lesões e também com o mau momento de peças importantes no time. Assim, o próprio Stramaccioni passou a ficar “acuado”, sem muitas opções e um pouco atrapalhado com a irregularidade da equipe.
Ficou para trás o incrível aproveitamento de 72% em 18 jogos no início da temporada, período em que a Beneamata conseguiu 10 vitórias consecutivas, batendo os recordes dos times comandados por Ranieri, Herrera e Mancini. Desde a derrota para a Atalanta uma semana depois da vitória no Juventus Stadium, a equipe de Stramaccioni teve um aproveitamento de apenas 40% em 22 jogos, acumulando 8 derrotas, 5 empates e 9 vitórias, com apresentações bem apáticas e uma defesa muito falha.
A equipe não terá Samuel e Milito, respectivamente o principal pilar da defesa, regendo e auxiliando Ranocchia e Juan Jesus a terem desempenhos acima do esperado e a principal peça no setor ofensivo nerazzurro nos últimos anos, artilheiro interista nos campeonatos atual e anterior.
Sem os argentinos e também sem Ranocchia, que se lesionou na quinta, Stramaccioni vai em busca de uma nova formação para encontrar o melhor time sem seus pilares, e deve ter ficado feliz com o desempenho do quarteto Guarín, Palacio, Álvarez e Cassano contra o Cluj, com a equipe postada num (inédito na temporada regular) 4-2-3-1, marcando à frente, fazendo boas triangulações e inversões de posicionamento, e, claro, explorando o que seus comandados melhor fazem: bola nas costas da última linha adversária, através de passes em velocidade, lançamentos e bolas longas.
A massacrante derrota para a Fiorentina de Montella no último domingo abalou bastante os interistas, mas a vitória tranquila sobre o Cluj reanimou um pouco o grupo para o dérbi de domingo. O objetivo é único: vencer, o que significaria voltar a ficar na frente do rival e até mesmo ocupar a terceira colocação, dependendo da Lazio, e, claro, dar um gás (e tanto) para o restante da temporada, na qual ainda existem chances de vencer Coppa Italia, Europa League e obter uma vaga na próxima Champions.
Os últimos dérbis
18ª rodada da Serie A 2011-12 (15/01/2012) – Milan 0x1 Inter
Diferentemente de hoje, Milan e Inter viviam bom momento no campeonato em janeiro do ano passado. O Diavolo vinha de uma invencibilidade de 12 jogos e ocupava a primeira colocação da tabela, enquanto a Beneamata pragmática de Ranieri vinha de 5 vitórias seguidas na Serie A, conseguindo alcançar os primeiros postos depois de um início horrível com Gasperini e irregular com o próprio Ranieri. Com os rossoneri em cima, mas parando em Lúcio, Samuel e Júlio César, Milito contou com a ajuda de Abate para fazer o único gol do jogo.
37ª rodada da Serie A 2011-12 (06/05/2012) – Inter 4×2 Milan
Mesmo em baixa, a cambaleante Inter de 2011-12 teve motivos para comemorar. Além das conquistas na base (como o time principal, também não perdeu nenhuma partida para os rivais milaneses), a Inter conseguiu bater por duas vezes o Milan de Allegri, ainda sonhando com o título, que acabaria escapando justamente nesta derrota de maio. Motivada pela chegada de Stramaccioni, a Beneamata foi superior em boa parte dos 90 minutos, com o estreante técnico dando um nó tático em Allegri com um 4-4-1-1 muito funcional e, sobretudo, contando com a ótima fase de Milito. O argentino anotou uma tripletta no dérbi, batendo o “rival” Ibrahimovic, que fez dois. Na partida que seria a última de Júlio César, Lúcio, Maicon e Córdoba com a camisa nerazzurra em Milão, o lateral brasileiro foi quem fechou a vitória interista com um chutaço de fora de área.
7ª rodada da Serie A 2012-13 (07/10/2012) – Milan 0x1 Inter
Nova temporada, novos tempos. Enquanto a Inter de Stramaccioni começava a embalar na temporada, o Milan de Allegri amargava apresentações ruins e resultados irregulares. Com o gol de Samuel logo aos três minutos, em jogada aérea, os nerazzurri se fecharam e tiveram grande atuação defensiva, enquanto os rossoneri tropeçaram em seus próprios problemas, como a falta de criatividade e pontaria. A Inter voltaria a repetir as três vitórias consecutivas no dérbi, feito que já havia conseguido nos tempos de Mancini e Mourinho.
Estatísticas gerais
Neste domingo, Inter e Milan completarão o 180º confronto pela Serie A. Nos 179 jogos anteriores, a vantagem é nerazzurra, com 67 vitórias, contra 60 dos rossoneri e outros 52 empates. Por sinal, não há um empate no dérbi desde outubro de 2004, quando os times de Mancini e Ancelotti ficaram num 0 a 0 modorrento. Nos gols, a Beneamata também tem vantagem: 261 contra 241 do Diavolo. No geral, contando também partidas não oficiais, o Milan leva vantagem. Em 278 jogos, são 108 vitórias contra 98 da Inter, além de 72 empates, com 438 gols rossoneri e 411 gols nerazzurri.
Na última década, contando partidas oficiais, uma constatação interessante: o domínio rossonero entre 2003 e 2005 é o período de maior sequência de invencibilidade no dérbi: o Milan venceu cinco de seis partidas. Posteriormente, a Inter teve uma sequência de três vitórias entre 2006 e 2007, interrompida por duas vitórias do Milan em 2008. O lado preto e vermelho de Milão voltou a sofrer três reveses nerazzurri entre 2009 e 2010 e, depois, os rossoneri repetiram três triunfos entre 2010 e 2011. Por fim, as três vitórias da Beneamata já citadas. Seria agora o início de uma série de vitórias do Diavolo? Seguindo a lógica…
Personagens principais
Impossível falar de Inter x Milan e não lembrar de Sandro Mazzola x Gianni Rivera. Os principais destaques dos times de Milão nos anos 60 e 70, bandeiras das equipes (Mazzola jogou 17 anos na Inter e Rivera 19 pelo Milan), também foram destaques pela disputa por uma vaga na Nazionale comandada por Ferruccio Valcareggi, que resistia em colocar ambos no 11, geralmente preterindo o rossonero pelo nerazzurro, que foi titular na Copa de 1970.
Na época, os dois eram treinados, em seus clubes, por Helenio Herrera e Nereo Rocco, dois dos maiores técnicos da história dos times, que também protagonizavam sadia rivalidade fora das quatro linhas.Entre os anos 70 e 90, o dérbi de Milão tinha uma outra grande peculiaridade: pelo Milan, jogava um zagueiraço chamado Franco Baresi. Pela Inter, jogava seu irmão mais velho, o bom (mas menos famoso) zagueiro Giuseppe Baresi, atual auxiliar de Stramaccioni.
Falar de Inter e Milan também é falar do empresário Massimo Moratti e do político (e também empresário) Silvio Berlusconi, donos e presidentes dos clubes há 18 e 27 anos, respectivamente. Os dois também divergem nas preferências políticas, sempre motivo de conflito entre os clubes desde a saída de alguns dirigentes do então Milan Cricket and Football Club, que acabaram criando a Football Club Internazionale, apoiados pela burguesia milanesa, e por interesse em importar jogadores de outros países.
Voltando a falar sobre a bola no campo, o maior artilheiro do dérbi é Andriy Shevchenko com 14 gols, a frente de Giuseppe Meazza (13), Gunnar Nordahl e István Nyers (11), e Enrico Candini (10). Meazza e Candini, inclusive, são ídolos na Inter, mas já jogaram pelo Milan, também marcando no dérbi por ambos os lados, a exemplo de Aldo Cevenini, Zlatan Ibrahimovic, Clarence Seedorf e Ronaldo.
Destacaram-se também os rossoneri o brasileiro José Altafini, conhecido aqui como Mazola, (único a marcar quatro gols num único dérbi), Louis Van Hege, Aldo Boffi e, mais recentemente, Kaká e Pippo Inzaghi; e os interistas Alessandro Altobelli, Roberto Boninsegna, Benito Lorenzi, Sandro Mazzola, e, mais recentemente, Diego Milito e Walter Samuel. O defensor da Inter detém a marca de 10 vitórias em 10 dérbis jogados na Serie A – no último, ele mesmo marcou o gol da vitória.
Paolo Maldini é quem tem mais partidas no dérbi, com 56, seguido por Javier Zanetti, com 45. O capitão nerazzurro ultrapassou, no último dérbi, um outro histórico líder da Inter, o zagueiro Giuseppe Bergomi, que disputou 44 dérbis. Outros rossoneri com número considerável de partidas no dérbi são Alessandro Costacurta, Gianni Rivera, Franco Baresi e Mauro Tassotti, todos da mesma geração (duradoura) de Maldini, à exceção de Rivera.
Os nerazzurri com mais partidas, além dos já citados, são Giacinto Facchetti, Sandro Mazzola, Giuseppe Meazza, Tarcisio Burgnich, Beppe Baresi e Mario Corso, jogadores que integraram grandes equipes da história da Beneamata. A grande curiosidade é que dentre os 15 jogadores que mais partidas tem num dérbi de Milão, apenas dois são estrangeiros: Zanetti e o holandês Clarence Seedorf – o último tem 7 jogos pela Inter e 24 pelo Milan, totalizando 31 presenças.
Dérbis marcantes
Curiosamente, o primeiro dérbi disputado por Inter e Milan não aconteceu em solo italiano. Em amistoso disputado em 19 de outubro de 1908, 7 meses após a fundação da Inter, o Milan bateu o futuro rival por 2 a 1 em Chiasso, cantão italiano na Suíça. No primeiro jogo oficial, em janeiro de 1909, nova vitória rossonera: 3 a 2. Desde então, o dérbi foi marcado por forte equilíbrio.
Milan e Inter fizeram poucos jogos decisivos na Serie A, uma vez que, por questões de sorteio, o dérbi raramente acontece no final do campeonato – na última temporada, o fato de o dérbi ter acontecido na penúltima rodada foi inédito. Nas décadas de 40 e 50, quando Nordahl e Nyers jogavam pelas equipes de Milão, muitos dos duelos acabavam com muitos gols. Foi o que houve, por exemplo, nos da temporada 1949-50: 4 a 4 no turno e 6 a 5 para a Inter no returno – este último é o jogo com mais gols na história do dérbi. Destaque ainda para o 5 a 3 rossonero em 1960, na partida em que Altafini deixou seus quatro gols – feito chamado na Itália de poker.
Para a Inter, um período mágico se estabeleceu entre 1965 e 1968, com a Grande Inter. Naquele período, a equipe passou três anos invicta no dérbi – com destaque para o jogo que abriu a série; um 5 a 2 com direito a doppietta de Mazzola, e para um 4 a 0 em 1967. A maior derrota em um dérbi é da Inter e aconteceu em um dos piores períodos da história do clube, no auge da crise pelo jejum de títulos nacionais que durou de 1989 a 2006. Em 2000, o Diavolo aplicou um sonoro 6 a 0 sobre a rival, com dois gols de Shevchenko (sempre um carrasco para a Inter) e Comandini.
Mais recentemente, impossível esquecer do memorável 4 a 3 para a Inter em outubro de 2006, jogo sempre lembrado pelos comentários e narração de Tiziano Crudeli (Milan) e a dupla Gianluca Rossi e Elio Corno (Inter). A Beneamata chegou a fazer 3 a 0 com Crespo, Stankovic e Ibrahimovic. Seedorf descontou e Materazzi ampliou, enquanto Gilardino e Kaká marcaram para o Diavolo, mas não foi o bastante.
Na temporada do triplete interista, os dois dérbis marcaram muito a campanha vitoriosa. Já na segunda rodada, na estreia de Sneijder, a Inter colocou o Milan no bolso e fez 4 a 0, com direito a 3 a 0 no primeiro tempo e um golaço de Stankovic. No jogo de volta, com um a menos desde o primeiro tempo, por causa da expulsão de Sneijder, a Inter fez das tripas coração e acabou vencendo por 2 a 0.
Outros jogos memoráveis e mais recentes foram os empates nas semifinais da Champions League 2002-03. Com o mando de campo do Milan, o jogo ficou no zero, enquanto na volta Shevchenko fez nos acréscimos do primeiro tempo e Martins empatou para a Inter já no final da partida, o que não foi o bastante para a Beneamata, já que o Diavolo foi para a final por causa do gol fora de “casa”. Na final, os rossoneri viriam a bater a Juventus nos pênaltis.
Dois anos depois, as equipes voltaram a se encontrar na Champions, em duelo válido pelas quartas de final, novamente com vantagem para o Milan. Após o 2 a 0 no jogo de ida, Shevchenko abriu o placar na volta, obrigando a Inter a fazer quatro gols para se classificar. Revoltada com decisões arbitrais, parte da torcida nerazzurra atirou sinalizadores no gramado, impedindo que o jogo prosseguisse. No tapetão, a Uefa confirmou a vitória rossonera por 3 a 0 e ainda puniu a Inter com 6 jogos com portões fechados na Europa.
Mazzola e não “Mazzolla”, favor corrigir.