Apesar de terem apresentado o futebol aos italianos, os ingleses raramente conseguiram brilhar no futebol da Velha Bota. Paul Gascoigne, Paul Ince e David Beckham são alguns dos poucos casos de sucesso dentre os 26 que já passaram pelo Belpaese. O atacante Mark Hateley também teve seus bons momentos: não foi um jogador fora de série e passou pelo Milan em uma fase complicada do clube, mas teve destaque em campos italianos quando ainda era apontado como uma das promessas britânicas.
Filho do também atacante Tony Hateley (ex-Notts County, Aston Villa, Chelsea e Liverpool), Mark teve um início de carreira pouco usual para um jogador europeu. Após começar como profissional no Coventry City, outro clube pelo qual seu pai atuou, ele foi emprestado para o Detroit Express, da NASL. Após 19 jogos nos Estados Unidos, retornou para a Inglaterra, jogando outras três temporadas pelos Sky Blues, sempre brigando para não cair.
Em 1983-84, Hateley foi jogar a segundona inglesa pelo Portsmouth e marcou 25 gols em 44 jogos da temporada, se afirmando como um dos melhor atacantes da Inglaterra. Membro da seleção sub-21 do país desde 1982, ele foi convocado para a Eurocopa da categoria e foi campeão europeu, além de melhor jogador do torneio, em 1984. Tudo isso despertou o interesse do Milan, que investiu 1 milhão de libras para contar com o jogador.
O Diavolo vivia um dos piores momentos de sua história quando apostou em Hateley. Os rossoneri haviam vencido apenas um scudetto nos últimos 16 anos e sido rebaixados duas vezes nesse período: em 1980, por participação de jogadores no escândalo Totonero, e novamente em 1982, por mau rendimento no campo. Em 1983-84, ano do retorno à elite, o Milan apostou em outro atacante inglês, mas não obteve sucesso: Luther Blissett fez apenas cinco gols e voltou para o Watford. Mesmo assim, o Milan insistiu em jogadores da ilha e contratou dois novos ingleses: além de Hateley, o meia Ray Wilkins, proveniente do Manchester United. Os dois seriam treinados por Nils Liedholm, mito do clube, em sua terceira passagem em Milão, que durou de 1984 a 1987.
Diferentemente de outros estrangeiros que chegavam à Itália na década de 80, Hateley, então com 23 anos, não chegou com pinta de craque – Wilkins, apesar de já ter jogado Euro e Copa do Mundo pela Inglaterra, também não era tão badalado. Porém, dono de um porte físico imponente e de uma habilidade tremenda no jogo aéreo, Hateley fez um papel digno nos três anos que ficou em Milão. Ele nunca foi um artilheiro nato, mas não deixava de fazer seus gols, sobretudo de cabeça: foram 21 gols no período em que vestiu rossonero. Um destes tentos foi inesquecível para o atacante e toda a torcida milanista.
Em 24 de outubro de 1984, o Milan encarou a Inter com o San Siro quase completamente vermelho. O Diavolo lutava contra um jejum de seis anos sem vencer o rival e precisavam se esforçar para derrubar a marca negativa. Os nerazzurri saíram na frente, com um gol de Alessandro Altobelli, mas Agostino Di Bartolomei empatou. O jogo seguiu igual até o segundo tempo, quando Pietro Paolo Virdis cruzou e Hateley “voou” sobre ninguém menos que Fulvio Collovati, campeão mundial com a Itália em 1982, para vencer Walter Zenga e fazer a torcida rossonera explodir em festa. Aquele gol ganhou o nome de “o fantástico voo de Hateley”.
O inglês, que recebeu o apelido de Attila, em referência a seu corte de cabelo – similar ao do personagem de um filme italiano estrelado por Diego Abatantuono, torcedor do clube –, rapidamente virou protagonista na Itália, a ponto de ser credenciado por John Charles, galês ídolo da Juventus entre as décadas de 1950 e 1960, como o seu sucessor. “Mark é um grande jogador. Um dia creio que sua fama vai superar a minha. Os defensores italianos são muito bons, mas contra centroavantes britânicos como eu e Hateley, não basta astúcia. Com seu talento, poderia explodir na Inglaterra, mas o Milan soube encontrar antes o seu sucesso”.
Em pouco tempo, o sucesso do prodígio inglês já causava furor na mídia italiana, mas poucos jogos depois, num confronto ante o Torino, Hateley sofreu uma grave lesão no joelho, que o tirou por quase toda a temporada – no fim das contas, ele concluiu sua temporada de estreia com oito gols marcados e o Milan acabou classificado à Copa Uefa.
Ao voltar, Attila continuou fazendo seus voos: em 1985-86 os rossoneri tiveram desempenho mais fraco em relação à temporada anterior, mas Hateley anotou 11 gols – embora nenhum deles com tanta importância quanto em seu primeiro ano. mas jamais conseguiu reapresentar o futebol que chocou a Itália em seus primeiros meses. Dali para frente, teve apenas apresentações discretas, tendo sua progressão na carreira ofuscada.
Em 1987, Hateley disputou sua última partida com a camisa do Milan, contra o Como. Depois de apenas 86 jogos e 21 gols, encerrou sua trajetória no clube escrevendo uma dedicatória para os torcedores: “Obrigado a todos. Eu te amo Milan”. O estádio inteiro se juntou em aplausos para um jogador que mostrou muito apego pela gloriosa camisa apesar do pouco tempo que passou em San Siro.
Quis o ingrato destino que, no ano seguinte à sua saída, o Milan voltasse a conquistar um título, o de campeão italiano. Hateley, no entanto, não deixou de comemorar: não apenas pela conquista do antigo clube, como também por ter faturado a taça de Campeão Francês, levantada pelo Monaco, equipe para a qual se transferiu.
O atacante ficou três temporadas no principado e ganhou certo reconhecimento, mas ainda esteve longe do futebol que teve em seus primeiros dias em Milão. Em 1988, inclusive, foi o último ano em que o atacante foi convocado com regularidade para a seleção da Inglaterra: com o English Team ele participou da Copa do Mundo de 1986, quando ainda atuava na Itália, e da Euro 1988.
Em 1990, Hateley trocou a França pela Escócia. Perto de casa, reencontrou o bom futebol jogando no Rangers, no que talvez tenha sido o melhor momento de sua carreira. Multicampeão, Mark fez história pelo clube dos protestantes de Glasgow, fazendo o maior número de aparições por temporada e o maior número de gols em sua carreira – ao todo, com a camisa azul, ele anotou 115 gols.
Hateley também voltou à Inglaterra para jogar por Queens Park Rangers, Leeds United e Hull City, clube pelo qual dividiria as funções de jogador e treinador ao longo de uma temporada. Aos 38 anos, o atacante voltou à Escócia para encerrar a carreira no modesto Ross County e, desde então, está afastado do futebol. Seu filho Tom, no entanto, segue a linhagem futebolística da família e também é jogador: após rodar por clubes pequenos da Inglaterra e da Escócia, ele atua na Polônia.
Mark Wayne Hateley
Nascimento: 7 de novembro de 1961, em Derby, Inglaterra
Posição: atacante
Clubes como jogador: Coventry City (1978-80 e 1980-83), Detroit Express (1980), Portsmouth (1983-84), Milan (1984-87), Monaco (1987-90), Rangers (1990-95 e 1997), Queens Park Rangers (1995-97), Leeds United (1996), Hull City (1997-98) e Ross County (1999)
Títulos conquistados: Campeonato Francês (1988), Campeonato Escocês (1991, 1992, 1993, 1994 e 1995), Copa da Escócia (1992 e 1993), Copa da Liga Escocesa (1990, 1992 e 1993) e Eurocopa Sub-21 (1984)
Clubes como treinador: Hull City (1997-98)
Seleção inglesa: 32 jogos e 9 gols
Wilkis lembra muito, mas muito o Sneijder, fisicamente.
Muito bacana a história! Só um comentário; David Beckham nunca jogou o campeonato italiano!
Beckham jogou pelo Milan em duas passagens, em 2009 e em 2010.