Não foi apenas a Serie A que finalizou o primeiro turno no último final de semana de 2018: a Serie B, segunda divisão da Itália, também completou 19 rodadas no domingo. A curiosidade é que cada equipe jogou apenas 18 vezes, o que se explica pelo fato de Avellino, Bari e Cesena não terem conseguido meios de se inscreverem. Por isso, a competição tem número ímpar de participantes (19), o que não acontecia havia cinco décadas. Como não poderia deixar de ser, a competição mais imprevisível do futebol italiano nos reservou surpresas em relação ao que prevíamos em agosto.
Para início de conversa, os três rebaixados da elite em 2017-18 não figuram nas primeiras posições. Com 30 e 29 pontos, respectivamente, Hellas Verona e Benevento estão na briga pela promoção e figuram na zona do playoff de acesso. Estão a dois e três pontos do segundo colocado, que – assim como o campeão – tem lugar garantido na Serie A, enquanto outros seis disputam a última vaga. Contudo, a dupla está abaixo da expectativa criada no início da temporada e atrás de equipes com investimentos mais tímidos.
O Verona chegou a liderar a competição por três rodadas, mas teve sequência negativa entre setembro e novembro e se recuperou apenas no último mês. Já o Benevento tem campanha mais irregular, entretanto avançou até as oitavas da Coppa Italia e enfrentará a Inter com um San Siro de portões fechados, como punição aos atos de racismo de torcedores contra o zagueiro Koulibaly, do Napoli. Em situação muito pior está o Crotone. O clube da Calábria manteve a base do elenco que disputou a primeira divisão por duas temporadas, mas atualmente é o penúltimo colocado, com apenas 13 pontos.
O Crotone é o time com mais derrotas (11, com a da última rodada) e lidera a dança das cadeiras da Serie B, com três das 14 trocas de treinadores do primeiro turno. Giovanni Stroppa comandou a equipe até a nona rodada e foi substituído temporariamente por Ivan Moschella. Sem trabalho desde a saída da Udinese, Massimo Oddo foi contratado e só durou sete rodadas: pediu demissão depois do Natal e abriu espaço para o retorno de Stroppa.
O lanterna Padova vive situação parecida. A equipe biancoscudata subiu da Serie C com Pierpaolo Bisoli, que foi demitido em novembro e trocado por Claudio Foscarini. O treinador vêneto, que chegou a passar uma década inteira no comando do rival Cittadella (de 2005 a 2015), não emplacou: sofreu a maior série de derrotas da competição (cinco partidas) e deu o lugar para o antecessor.
Entre os que não foram demitidos, quem encabeça a lista é justamente o técnico do Cittadella. Roberto Venturato lidera a curta lista, acompanhado por Vincenzo Vivarini (Ascoli), Cristian Bucchi (Benevento), Piero Braglia (Cosenza), Fabio Liverani (Lecce), Alessandro Nesta (Perugia), Giuseppe Pillon (Pescara), Pasquale Marino (Spezia) e Fabio Grosso (Verona). Mas estes clubes são assunto para daqui a pouco.
Afinal, houve casos em que as trocas trouxeram bons resultados. O maior exemplo disso é o Palermo, líder absoluto com 37 pontos, cinco de vantagem para o Pescara, segundo colocado. Durante o caos da gestão de Maurizio Zamparini, que finalmente vendeu o clube no começo de dezembro, os rosanero iniciaram a competição com Bruno Tedino. O treinador esteve à frente da equipe na campanha passada e foi demitido antes do playoff, numa tentativa de animar o grupo. Porém, não deu certo, uma vez que o substituto Roberto Stellone caiu na final.
De forma bizarra, Zamparini fez um mea culpa e decidiu reatar laços com Tedino, em julho. A segunda passagem do treinador, porém, foi claudicante: com a equipe na sétima posição da Serie B e eliminada precocemente na Coppa Italia, Tedino foi demitido na sexta rodada, após a derrota para o Brescia, a única dos sicilianos até o momento. Zamparini protagonizou mais uma das suas e chamou Stellone de volta. Por incrível que pareça, deu certo.
No comando de um elenco pouco modificado em relação a 2017-18, por causa dos problemas financeiros apresentados pelo clube no início da temporada, Stellone rapidamente fez o time virar o fio. O conhecimento das peças impulsionou o trabalho do ex-atacante, que mantém os sicilianos invictos há 13 rodadas. O Palermo se consolidou como uma equipe estável, que tem desempenho parecido dentro e fora de casa, e ainda por cima leva poucos gols: tem a defesa menos vazada do campeonato, com 13 gols sofridos.
Atrás do Palermo, aparecem Brescia e Pescara, empatados com 32 pontos. Os lombardos levam vantagem por terem o melhor ataque do campeonato, com 35 gols marcados – para tal, conta bastante ter o artilheiro Alfredo Donnarumma, autor de 14. Em meio aos investimentos do ambicioso e impetuoso Massimo Cellino, as andorinhas trocaram David Suazo (aquele mesmo, ex-atacante de Inter e Cagliari), por Eugenio Corini logo na quarta rodada. A equipe, melhor mandante e invicta no Mario Rigamonti, vive boa fase desde que o treinador, historicamente ligado ao Chievo, assumiu. Outros destaques da campanha são o atacante Ernesto Torregrossa e o meia organizador Sandro Tonali, de apenas 18 anos, já convocado para a seleção principal da Itália.
O Pescara era líder da Serie B até pouco tempo, mas continua tendo desempenho acima das expectativas iniciais. O topo da tabela escapou depois que os biancazzurri perderam por 3 a 0 para o Palermo e,e m seguida, sofreram mais duas derrotas. Nas últimas duas rodadas de 2018, a equipe recuperou o prumo e manteve a boa forma no Adriatico: perdeu apenas uma vez e, como o Brescia, venceu sete vezes em casa. Como sempre, os delfini apostaram na juventude e têm colhido os frutos com boas revelações, como o badalado Andrew Gravillon, cria da Inter e hoje acompanhado por clubes da elite.
Outro tradicional participante da segundona e candidato ao acesso, o Perugia continua a render menos do que pode, frustrando o apoio de sua apaixonada torcida e os fortes investimentos, feitos com o objetivo de retornar para a Serie A. Os grifoni da Úmbria não disputam o torneio desde 2004. A equipe do estádio Renato Curi conta com vários jogadores com experiência na elite, a exemplo de Valerio Verre. Agora avançado de meia central para trequartista, o jogador revelado pela Roma se destacou ao marcar por cinco rodadas seguidas. No entanto, a boa sequência entre outubro e novembro foi o único ponto positivo e o time treinado por Alessandro Nesta saiu da zona do playoff no mês seguinte: está empatado com Spezia e Cittadella, com 26 pontos, mas perde nos critérios de desempate.
Conforme descemos na tabela, os flops aumentam. A exemplo do Perugia, a Salernitana também conta com diversos jogadores experientes e tinha a expectativa de estar colocado numa posição mais confortável. Segundo clube de Claudio Lotito, presidente da Lazio, os granata ocupam apenas o 11º lugar. Uma sequência de três derrotas no início de dezembro levou ao pedido de demissão de Stefano Colantuono, o que reforça a nossa tese de que o Torino é um verdadeiro cemitério de treinadores. De qualquer forma, o time, agora comandado por Angelo Gregucci (ex-zagueiro laziale), tem 24 pontos e segue próximo da briga pelo acesso.
Quem também não poupou esforços no seu retorno para a Serie B foi o Venezia de Joe Tacopina, que esteve envolvido nas gestões de Roma e Bologna. Depois de bater na trave pelo acesso na temporada passada, o clube administrado pelo nova-iorquino de raízes italianas começou o ano treinado por Stefano Vecchi, multicampeão com o sub-19 da Inter. Os resultados, porém, não vieram e o badalado Walter Zenga foi contratado. Apesar do bom início, a equipe terminou 2018 em fase negativa e está distante dos times mais fortes: tem 21 pontos e ocupa a 13ª posição.
Entre Salernitana e Venezia está a Cremonese, com 22 pontos. O tradicional clube da Lombardia também investiu pesado em jogadores experientes para buscar o retorno à elite, que não disputa desde 1995-96, mas ainda não se mostrou à altura do desafio. Os brasileiros Claiton e Paulinho, os meias Daniele Croce e Leandro Greco e o zagueiro Emanuele Terranova são algumas das figuras da equipe, que começou comandada por um técnico caro para a Serie B: Andrea Mandorlini, ex-Atalanta, Verona e Genoa. Demitido em novembro, foi substituído por Massimo Rastelli, outro nome de peso. Sob as ordens do treinador que ficou dois anos e meio no Cagliari, o time terminou o ano em alta, com goleada de 4 a 0 sobre o Perugia.
Dois lugares que poderiam estar sendo ocupados por estes favoritos encontram-se, neste momento, com Spezia e Cittadella. Os dois times estão empatados com 26 pontos, nas últimas posições da zona do playoff de acesso e cumprem a expectativa de incomodar equipes mais estruturadas. O clube da Ligúria, contudo, certamente almeja mais do que isso e desde 2013 tem brigado pelo acesso com o dinheiro de Gabriele Volpi, empresário do ramo petrolífero que também é proprietário do Rijeka (Croácia) e da Pro Recco, clube mais vitorioso do polo aquático mundial. Mais modesto, o Citta mantém a fórmula de apostar em longos trabalhos técnicos. Após Foscarini passar uma década no comando grená, Roberto Venturato o substituiu: desde 2015 no cargo, é o mais longevo da segundona e aposta num time equilibrado. Se marcou apenas 20 gols, a equipe do Vêneto sofreu 17.
O Foggia também tinha capacidade de surpreender, não obstante seus problemas administrativos, que lhe fizeram começar o campeonato com oito pontos a menos. Nem por isso a diretoria apuliana deixou de contratar jogadores da Serie A e montar uma boa equipe, mas os resultados não vieram e a equipe demorou seis rodadas para zerar a pontuação. Atualmente na zona de rebaixamento, com 13 pontos, os satanelli dividem com Padova e Carpi o posto de piores defesas do campeonato, com 31 gols sofridos. Recentemente, o time rossonero voltou a ser treinado por Pasquale Padalino, ex-defensor do clube nos anos 1990. De boas campanhas nas divisões inferiores, Gianluca Grassadonia novamente não teve bom rendimento na segundona e não resistiu no cargo.
Tidos como figurões, Ascoli e Carpi estão em situações opostas, separados por sete pontos. Enquanto o clube marquesão está bem acomodado no meio da tabela com paridade entre vitórias, empates e derrotas (seis de cada), os emilianos perderam metade das suas partidas e estão na zona do playout de descenso, com quatro pontos de vantagem para a zona da degola. Nem mesmo a volta do retranqueiro Fabrizio Castori, que substituiu Marcello Chezzi na quarta rodada, evitou que a equipe tivesse uma das defesas mais vazadas do torneio.
Entre os promovidos da Serie C, se o já citado Padova ocupa a lanterna, o Livorno não está em situação muito melhor. O clube do litoral da Toscana foi o último colocado por muitas rodadas e somente em dezembro começou a melhorar, a ponto de hoje fazer companhia ao Carpi na zona de playout. As nove derrotas sofridas aconteceram nas 13 primeiras rodadas, e depois de muita relutância da diretoria e da torcida, o ídolo Cristiano Lucarelli acabou sendo demitido. Com Roberto Breda, o time está invicto há cinco jogos e subiu na tabela.
Por sua vez, Cosenza e Lecce surpreendem – um muito mais do que o outro, é verdade. Clube mais modesto da liga, com valor médio de 285 mil euros por jogador, segundo o Transfermarkt, o Cosenza tem obtido resultados acima do esperado no seu retorno à segunda divisão depois de 15 anos. Claro, com 19 pontos e o pior ataque do campeonato (foram apenas 14 gols marcados), os silani estão próximos da briga contra o rebaixamento. Apesar disso, a realidade no início da temporada parecia mais cruel para os calabreses, que chegaram até a perder um jogo no tapetão por causa das péssimas condições do estádio San Vito. Os lobos folgaram na última rodada do primeiro turno e mesmo assim estão na 14ª posição, com seis pontos de vantagem para o Z-3.
Já no estádio Via del Mare os torcedores são só sorrisos – quer dizer, o time de segunda melhor média de espectadores em casa, não tem lá um grande aproveitamento em casa. Ainda assim, o Lecce está muito bem no campeonato. O time de Fabio Liverani ocupa a quarta posição, com 30 pontos, e é dono de um dos melhores ataques da competição, com jogadores dividindo as responsabilidades: Andrea La Mantia e Simone Palombi têm ses gols, enquanto Marco Mancosu tem cinco. Com tal artilharia, os salentinos tentam voltar à elite após sete anos, seguindo o legado de Sassuolo, Verona, Carpi, Frosinone, Spal, Benevento e Parma. Todas estas equipes saíram das divisões inferiores e chegaram na Serie A em pouco tempo.
Por último, falemos sobre os goleadores. O topo da artilharia tem uma disputa ferrenha entre atletas mais rodados: Alfredo Donnarumma (ex-Empoli, atualmente no Brescia) tem 14 gols, enquanto Leonardo Mancuso (emprestado pela Juventus ao Pescara) aparece com 12. Logo atrás, com oito tentos, os perseguem Massimo Coda (Benevento) e Giampaolo Pazzini (Verona), sem falar em Ilija Nestorovski (Palermo) e no interminável Alessandro Diamanti (Livorno), que já balançaram as redes seis vezes. Os garotos, por sua vez não deixaram por menos. Entre os 15 melhores colocados na lista de marcadores encontram-se Luca Vido (‘97 da Atalanta, emprestado ao Perugia), Simone Palombi (‘96 da Lazio, emprestado ao Lecce) e Federico Bonazzoli (‘97 da Sampdoria, emprestado ao Padova).