Extracampo Direto da Itália

O que Zvonimir Boban, dirigente do Milan, pensa sobre o jornalismo esportivo atual

Num auditório excessivamente aquecido de Trento, cidade de montanha no nordeste italiano, Zvonimir Boban mostrou um humor mais azedo do que o normal. Nesta sexta-feira (11/10), o diretor executivo de futebol do Milan foi um dos protagonistas de uma mesa-redonda que discutiu os rumos do jornalismo durante o Festival dello Sport. A Calciopédia acompanhou.

Ao lado dele, estavam os jornalistas veteranos Andrea Monti, Roberto Beccantini, Paolo Condò e Mario Sconcerti. Mas Boban, um dos craques do Milan na década de 1990, não jogava fora de casa: foi convidado porque já atuou como comentarista na Sky e editorialista na Gazzetta dello Sport, além de ser formado em história pela Universidade de Zagreb.

Os aplausos mais longos da plateia sempre eram ouvidos depois que o croata falava. Obviedades como “não existe uma liberdade de imprensa absoluta, você não pode dizer tudo com essa desculpa” marcaram o início das intervenções de Boban.

“Tudo precisa ser dito respeitando a pessoa e respeitando o que está atrás dela: a família, a mulher, os pais”, prosseguiu. “Eu sempre falei a verdade quando achei que tinha de opinar, mas sem ofender ninguém.”

Diante de dirigentes dos principais canais que transmitem esporte na Itália, Boban reclamou que a TV incutiu no público uma cultura prejudicial para o futuro do esporte: “Ninguém fala mais do jogo. Quem fez o gol? Quem ganhou? Como foi? Ninguém fala do jogo, só de particularidades. Os jovens estão começando a gostar de outras coisas”.

Boban em mesa-redonda do Festival do Esporte, em Trento (Foto: Braitner Moreira)

Primeiro, pensar

O debate entre velhos conhecidos teve seus momentos de hostilidade. O primeiro deles, depois de Sconcerti dizer que os jornalistas precisam, antes de escrever bem, pensar bem para fazer perguntas melhores. “Por que Boban está no Milan? Temos que nos perguntar”, provocou. O croata o cortou para retrucar: “Eu também me pergunto isso”. E demorou quase 15 minutos para afirmar que o comentário havia sido uma ironia por causa do momento difícil do clube.

Entre o soneto e a emenda, o mesmo Sconcerti aconselhou Boban a “não pensar como craque, não usar a arrogância, porque é preciso deixar o passado glorioso de jogador para trás”. O diretor do Milan ironizou: “Obrigado por me chamar de arrogante. Essa época, para mim, acabou há 20 anos, sem nenhum problema com meu ego”.

Numa das poucas vezes em que falou diretamente sobre o Milan, reclamou que o clube tem o elenco mais jovem da Itália, “mas ninguém da imprensa fala disso”, lamentando que o público sofre com a falta de informação que estaria facilmente disponível para os repórteres e comentaristas.

Boban também se irritou quando os veteranos da mesa-redonda começaram a evocar o Milan de Arrigo Sacchi para cobrar maior presença dos jogadores das categorias de base. “Não é a mesma coisa, não é o mesmo futebol. O futebol mudou”, resmungou.

Mudou tanto que Boban chamou os jogadores de “verdadeiras empresas”, com departamentos claros com funções específicas. “São, acima de tudo, empresas de comunicação”, arrematou Monti, diretor da Gazzetta, capaz de compreender que a produção de conteúdo sem filtros representa uma concorrência real aos meios de comunicação tradicionalmente estabelecidos.

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