Cinco anos atrás, publicamos na Calciopédia um texto sobre o empresário Massimo Ferrero, que poucos meses antes havia comprado a Sampdoria, e como ele era uma definitiva incógnita para o futuro do clube. Ninguém conseguia prever o que o excêntrico novo proprietário da sociedade genovesa poderia fazer – de bom ou de ruim – para o clube. Hoje, quase seis anos depois da transação, a administração do diretor de cinema romano se mostra desastrosa e prestes a chegar ao fim. Mas como e por que uma figura admirada no início se tornou uma das personalidades mais odiadas pelo torcedor da Samp?
Para começo de conversa, é bom explicar que os problemas vividos pela Samp nesses seis anos sob a tutela de Ferrero não se refletem tanto dentro de campo quanto fora dele. Nas últimas cinco temporadas, o Doria viveu os melhores dias da década, terminando entre os dez primeiros colocados em quatro delas. Os dorianos, inclusive, voltaram à Europa em 2015, após Sinisa Mihajlovic levar a equipe ao sétimo lugar na Serie A. Porém, fora de campo, a administração do Viperetta dificilmente poderia ter sido pior. Vamos pincelar alguns de seus principais erros nesse tempo, para tentar entender melhor o motivo da reputação de Ferrero ter ficado irreparavelmente manchada aos olhos do torcedor blucerchiato.
- No vermelho logo no primeiro ano – Poucos meses após aquele texto de 2015, o primeiro mau presságio já veio à tona. Quando Edoardo Garrone vendeu o clube a Ferrero em junho de 2014, ele ainda tirou do próprio bolso 36,5 milhões de euros e deixou nos cofres do clube. Nos meses seguintes, o grupo de Ferrero emprestou à sociedade somente 3 milhões. Com isso, a Samp terminou 2014 com um balanço de 24,6 milhões negativos. Após a virada do ano, especulou-se, inclusive, que Ferrero poderia pedir ajuda a Garrone novamente.
- Perde a presidência do clube – Em abril de 2017, a FIGC determinou que Ferrero deixasse a presidência da Sampdoria. O motivo foi a condenação do empresário pela justiça italiana (na figura da GUP) a 1 ano e 10 meses, por seu grupo ter sido considerado responsável pela falência fraudulenta da companhia aérea Livingston Energy Flight, ainda em 2010. O problema é que uma condenação superior a um ano viola o artigo 22º das Normas Organizacionais Internas Federais (NOIF) da FIGC, que diz que alguém que sofra tal tipo de penalidade não está apto a ser mandatário de um clube. Ferrero apelou da decisão e em dezembro a federação comunicou que a decisão seria revogada e ele poderia voltar às funções de presidente.
- Usou dinheiro do clube para fins pessoais – No fim de 2018, aconteceu talvez o maior dos escândalos envolvendo Ferrero e a Samp. A justiça determinou o bloqueio dos bens do empresário e de cinco outros investigados, no valor de 2,6 milhões de euros. A polícia encontrou indícios, através de movimentações bancárias suspeitas, de que Ferrero teria tirado das contas do clube 1,2 milhão, que foi parte do valor recebido pelo time na venda do meio-campista Pedro Obiang ao West Ham, em 2015. A quantia teria sido utilizada por ele para sanar dívidas de suas empresas. Dentre as acusações resultadas da investigação, estariam “apropriação indevida, fraude, emissão e utilização de faturas falsas, lavagem de dinheiro e emprego de dinheiro, bens ou utilidades de origem ilícita”. Um mês depois, o bloqueio foi revogado.
Tudo isso serviu para acabar com a paciência da torcida da Samp quase que de maneira unânime. Durante todo o ano de 2019, o presidente foi alvo de infindáveis protestos por parte de grupos de organizadas da Gradinata Sud, dentro e fora do estádio. Conta-se, inclusive, que alguns ultrà teriam até mesmo ameaçado o empresário, ao encontrá-lo em um restaurante.
Tanta revolta serviu para aumentar a pressão da torcida para que Ferrero vendesse o clube. No ano passado, fortaleceu-se a possibilidade de um grupo encabeçado por Gianluca Vialli, ex-jogador do clube e parte da equipe que ganhou o scudetto de 1990-1991, comprar a sociedade. Porém, no segundo semestre, Vialli anunciou que estava deixando a negociação, pois Ferrero teria feito “exigências econômicas excessivas”.
Além de tudo isso, Ferrero ainda se envolveu em polêmicas recentes, como ataques públicos a seus colaboradores, um golpe de 200 mil euros que teria levado em uma negociação para construir um resort em Gênova e o estado deplorável em que ele, juntamente com a direção do Genoa, teriam deixado o estádio Luigi Ferraris, quando a cidade passou a administração da praça aos dois clubes, no ano passado. Não à toa, Enrico Preziosi, dono do Genoa, também é alvo de forte contestação da tifoseria rossoblù.
Todos esses ingredientes resultam em uma pressão cada dia mais forte, tanto dos torcedores quanto dos credores, para que Ferrero e seu grupo vendam a Sampdoria – algo que, agora, parece ser só uma questão de tempo. Ele precisa disso para salvar suas empresas, que estão à beira da falência. Nenhum banco está mais disposto a emprestar um centavo sequer ao empresário e, na pior das hipóteses, a Samp (que não corre o risco de falência) seria mandada a leilão. Para piorar as coisas, o clube vive um de seus piores anos recentes dentro de campo e se encontra apenas um ponto acima da zona de rebaixamento.
Ferrero administrou a Samp como um governo petista, em resumo.