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Os bons e os maus gastadores da Serie A 2020-21

Em época de pandemia, com menos receitas, todos os clubes buscam otimizar cada centavo. A covid-19 gerou um impacto direto no orçamento das agremiações, já que as receitas de patrocínio e de bilheteria diminuíram, o que forçou os times e a própria Liga da Serie A a se movimentarem. Recentemente, foi ventilada até a proposta de imposição de limite salarial no futebol italiano, numa iniciativa inspirada nas grandes ligas norte-americanas, que estabelecem um teto para os gastos com salários.

A lógica do futebol italiano, nesse momento, é a de otimizar os gastos. Se entra menos dinheiro, ele precisa ser gasto da melhor forma possível. Esse modelo, que se popularizou com o “Moneyball” do beisebol, vem sendo incorporado por agremiações ao redor do mundo, que também bebem de outra referência desse modelo de otimização – aquele visto no livro “Os Números Do Jogo”, de Chris Anderson e David Sally. Na publicação, os autores mostram como métodos estatísticos podem ser utilizados para que os clubes possam ser geridos de maneira mais eficiente.

Atualmente, é improvável que uma agremiação não tenha um departamento de análise de desempenho, com scouts e outras ferramentas que busquem sempre adicionar, de maneira qualitativa, para os resultados da própria equipe. Existem exemplos como os de Midtjylland (Dinamarca) e Brentford (Inglaterra), que já têm essa influência dos dados em suas operações diárias.

Ganhando “apenas” 500 mil euros por ano, Raspadori é um dos destaques do Sassuolo (Insidefoto)

Sabendo de todo esse contexto e da importância de buscar o melhor resultado com menores gastos, é possível montar um ranking envolvendo as equipes da elite do futebol italiano. Sabemos do poder financeiro da Juventus e do trabalho de Gasperini na Atalanta, mas e quanto aos outros clubes? É possível fazer uma comparação e estabelecer um ranking da Serie A.

Baseado em informações oficiais e em levantamentos dos próprios clubes, o site Sporting Free elencou as maiores folhas salariais desta temporada da elite italiana. A partir disso, junto do competentíssimo Gabriel Gomide (a quem agradecemos pela ajuda), montamos um gráfico e relacionamos a folha salarial de cada equipe com o seu desempenho na temporada 2020-21.

O gráfico acima é composto por quatro quadrantes, que buscam classificar os clubes de acordo com a correlação entre folha salarial e pontuação. Foi utilizada a mediana de todas as folhas salariais a fim de reduzir a disparidade entre a Juventus e os outros participantes da Serie A. A linha verde é a regressão linear, o que teoricamente mostra quanto o time deve gastar para alcançar determinada pontuação. Quanto mais abaixo verticalmente, menor a pontuação e quanto mais à direita, maior a folha salarial.

No primeiro quadrante do gráfico vemos Atalanta, Sassuolo e Sampdoria. Essas são equipes que, mesmo sem um alto valor de folha salarial, conseguiram pontuar na média ou acima dela na competição. Ou seja, é possível interpretar que há uma otimização dos seus gastos e que a montagem do elenco foi feita de maneira eficiente. A presença de Atalanta e Sassuolo nesse bloco já era de se esperar, visto que os times vem se destacando bastante nos últimos anos por conta de seus modelos de gestão e cada vez mais se consolidam em suas determinadas posições. A presença da Samp neste quadrante é uma agradável surpresa, pois mostra que, em relação ao que tem gasto, consegue apresentar um bom rendimento.

O segundo quadrante é composto por Lazio, Milan, Napoli, Roma, Inter e Juventus. São as equipes que mais investem em folhas salariais no torneio e a Juve, como se pode observar, tem uma larga distância para as outras – é, de longe, a agremiação que mais gasta em salários. Todos esses times estão acima da média de pontuação, o que é esperado, dado o alto investimento. Porém, a posição abaixo da linha verde nos mostra que Juventus e Roma conseguiriam alcançar melhores resultados em função do orçamento. Lazio e Milan estão mais à esquerda no gráfico: ou seja, são mais eficientes gastando menos.

Ronaldo ganha 31 milhões de euros líquidos e encabeça, de longe, a inchada folha salarial da Juventus (imago)

O terceiro quadrante é aquele em que se localizam a maior parte das equipes: Verona, Spezia, Udinese, Genoa, Bologna, Benevento, Crotone e Parma. São os times que pontuaram abaixo da média do campeonato e apresentam orçamentos intermediários. Verona, Genoa, Bologna, Udinese e Spezia aparecem como destaques, já que tiveram um desempenho condizente aos seus investimentos. Por sua vez, Crotone e Parma não têm as folhas salariais mais baixas, mas foram os que menos pontuaram – o que os deixam bem abaixo nessa zona do gráfico.

O quarto quadrante, composto por Fiorentina, Torino e Cagliari é o pior lugar possível para se estar no diagrama. Afinal, indica um investimento acima da mediana do campeonato e uma pontuação inferior ao esperado, sob um ponto de vista estatístico. Essas equipes se encontram no grupo das 10 que mais investem em salários, mas o rendimento em campo não chegou nem na média da pontuação. O Toro e o time da Sardenha, inclusive, brigaram até as últimas rodadas pela permanência na elite italiana e terminaram a competição à frente apenas dos rebaixados. Os motivos do fraco desempenho são os mais variados e não é possível explicar apenas com um gráfico, mas os números mostram que será preciso muito trabalho para equacionar essa relação entre gastos e rendimento.

Numa rápida análise, podemos afirmar que, levando em conta o contexto em que cada clube está inserido, Juventus, Roma, Fiorentina, Torino, Cagliari e Parma tiveram os piores desempenhos. A Juve, mesmo com todo investimento que fez, não conseguiu manter a hegemonia nacional e ficou a um passo de não se classificar para a Champions League, enquanto a Roma não tem um time barato e ficou fora das duas principais competições europeias.

Lanterna do campeonato, o Parma pagou salários robustos a diversos medalhões, como Pellè (IPA)

Abaixo na tabela, o Parma foi o lanterna da Serie A mesmo sem ter a menor folha salarial – cinco clubes, aliás, gastaram menos do que os crociati. Por sua vez, Fiorentina, Torino e Cagliari tiveram um desempenho desproporcional aos investimentos feitos por suas diretorias. Aliás, os seus presidentes projetavam, declaradamente, uma temporada 2020-21 mais competitiva por parte dos seus. As equipes foram mal treinadas ou foram feitas contratações equivocadas? Cada caso tem suas especificidades, mas os departamentos de futebol se debruçarão sobre estas falhas durante o verão europeu.

Por outro lado, destacam-se os trabalhos de Atalanta, Sassuolo, Sampdoria e Verona. A Dea já é um exemplo famoso e bem-sucedido de como uma boa gestão financeira e um scouting eficiente podem resultar em bons frutos. O Sassuolo também chama a atenção pelo expressivo número de atletas revelados e pelas contratações pontuais, o que acaba resultando num time barato e que rende bem sob o modelo de jogo bem definido por Roberto De Zerbi. Já Samp e Hellas souberam traduzir os pequenos gastos em atuações decentes, o que evoca a competência de seus técnicos e uma montagem de elenco adequada.

Naturalmente, é possível realizar mais observações a partir do que está representado no gráfico, esmiuçando-o à luz de outros contextos em que cada time está inserido. Os números mostram uma parte da história e do que foi apresentado, mas as atuações e desempenhos podem ir muito além do que mostram as planilhas. O futebol não é lá tão obediente à frieza dos modelos matemáticos.

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