Brasileiros no calcio

Serginho imprimiu ritmo devastador pelo Milan durante uma década

Um dos maiores clichês do futebol é dizer que os laterais brasileiros são indisciplinados taticamente. Como nem toda frase pronta é um espelho fiel da realidade, uma série de jogadores nascidos no Brasil que atuaram nesta função fizeram sucesso na Serie A italiana, um dos campeonatos mais complexos do ponto de vista tático. Um deles foi Serginho, peça importante de um Milan vitorioso nos anos 2000.

Nascido em Nilópolis, na região metropolitana do Rio de Janeiro, o jovem Serginho teve dois esportes preferidos na infância e na adolescência: além do futebol, ele também praticava atletismo, já que tinha muita velocidade, arranque e potência. Apesar da aptidão para os desportos, ele nunca chegou a treinar em categorias de base de qualquer clube e só iniciou a carreira como jogador depois de passar em um teste no pequeno Itaperuna, do interior do seu estado.

Depois de se destacar pelo clube rubro-negro do noroeste do Rio de Janeiro, que disputava o Campeonato Carioca e a Série B, Serginho acertou com o Bahia e ganhou projeção nacional graças ao título do Baianão, em 1994. O jogador, que atuava como meia, ainda garantiu uma transferência para o Flamengo no mesmo ano, mas ficou apenas seis meses na Gávea: em janeiro de 1995, foi cedido para o Cruzeiro.

Em Belo Horizonte, Serginho mostrou todo o seu potencial e foi titular da equipe cruzeirense, eliminada pelo Botafogo nas semifinais do Brasileirão – que seria vencido pelos botafoguenses. No início de 1996, o jogador fluminense foi vendido para o São Paulo, clube brasileiro pelo qual mais tempo atuaria – três temporadas. Foi no tricolor do Morumbi que Serginho virou lateral e ganhou real destaque: improvisado na função, já que a ascensão de Denílson limitava sua frequência no meio-campo, o garoto de Nilópolis foi campeão paulista e recebeu suas primeiras convocações para a Seleção, em 1998.

O lateral chegou ao Milan com experiência e se consolidou na Itália (imago)

Após a saída de Denílson para o Betis, Serginho voltou a ser utilizado como meia e continuou em alta. Em 1999, marcou três gols e deu duas assistências na goleada são-paulina sobre o rival Palmeiras, por 5 a 1, e também disputou a Copa América pelo Brasil, faturando seu único título com a amarelinha. Reserva na competição – só entrou em campo no 7 a 0 contra a Venezuela –, o lateral foi titular na Copa das Confederações, que aconteceu na sequência da disputa continental. Depois do vice-campeonato no México, Serginho foi contratado pelo Milan, campeão italiano meses antes, por um valor de cerca de 18 bilhões de velhas liras – um valor alto para um jogador de 28 anos.

A altíssima velocidade, as chegadas perigosas na linha de fundo e o poder de decisão no último terço do campo fizeram de Serginho uma peça fundamental ao Milan de Alberto Zaccheroni e lhe renderam o apelido de Concorde, em referência à rápida e elegante aeronave de fabricação francesa. O brasileiro rapidamente ganhou a posição de ala canhoto no 3-4-3 do treinador romanholo e estreou dando uma assistência para Andriy Shevchenko na vitória por 3 a 1 contra o Perugia. Duas rodadas depois, diante do Bari, anotou seu primeiro gol na Itália. Era um presságio dos bons momentos que estavam por vir.

Sob as ordens de Zac, o Milan ganhou o scudetto em 1998-99, antes da chegada de Serginho, mas viveu altos e baixos nas duas temporadas subsequentes. O brasileiro, no entanto, nunca destoava: durante todos os anos em que defendeu o time do San Siro, como titular ou saindo do banco, um de seus fortes foi a regularidade.

O Concorde ainda crescia nos momentos em que a equipe jogava bem e deu um grande exemplo disso na histórica goleada no Derby della Madonnina, em maio de 2001: os rossoneri atropelaram a Inter por 6 a 0 (até hoje a maior surra no confronto) e Serginho marcou um gol e deu três assistências na ocasião. Somente isso já o colocaria nos anais da Serie A e de um dos duelos de maior importância no futebol mundial, mas o brasileiro fez ainda mais.

Apesar de ter sido sinônimo de velocidade no flanco canhoto do Milan, Serginho teve poucas oportunidades pela Seleção (Bongarts/Getty)

A partir de novembro de 2001, com a chegada de Carlo Ancelotti, o Milan passou a atuar no 4-3-2-1 e Serginho alternava algumas partidas na lateral com muitas como meia. Titular na primeira temporada do emiliano na equipe, o jogador de Nilópolis voltou a ser chamado para a seleção brasileira para um jogo das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2002, mas foi só. Assim, pediu dispensa de uma outra convocatória, desta vez após o Mundial: chateado com a falta de reconhecimento, enviou uma carta à CBF em que declarava não querer mais ser convocado. Com isso, encerrou sua trajetória na amarelinha com 22 lembranças para a Seleção, mas apenas 10 partidas e um gol.

Com dedicação exclusiva ao Milan a partir daquele momento, Serginho já não era mais titular, mas sim uma espécie de décimo segundo jogador da equipe. Ajudando a equipe como peça de segundo tempo, o Concorde foi campeão italiano, da Coppa Italia e também atuou em duas finais de Liga dos Campeões naquele período. No torneio continental, converteu um dos pênaltis que deram a orelhuda ao Milan em 2003, sobre a Juventus, mas acabou desperdiçando uma cobrança dois anos depois, na rocambolesca final de Istambul, diante do Liverpool.

O sabor amargo daquele vice-campeonato poderia ter abalado a continuidade do camisa 27, mas o que aconteceu foi exatamente o inverso. A partir de 2005-06, Serginho voltou a atuar como lateral-esquerdo e foi titular absoluto na equipe de Ancelotti, terceira colocada na Serie A e semifinalista da Champions League.

A forma do brasileiro era tão impressionante que seu retorno à seleção Canarinho chegou a ser especulado, principalmente depois que o Concorde declarou que aceitaria o chamado caso fosse convocado para ser reserva de Roberto Carlos na Copa de 2006. O treinador Carlos Alberto Parreira, porém, preferiu não contar com o jogador, que acabara de completar 35 anos.

Serginho foi um dos vários brasileiros de sucesso da Era Ancelotti no Milan (New Press/Getty)

Os dois anos seguintes seriam os últimos de Serginho no Milan e como profissional. Para sua infelicidade, uma hérnia de disco e uma série de pequenas lesões limitaram suas presenças em campo naquele período – foram somente 23 partidas pelos rossoneri entre 2006-07 e 2007-2008. Apesar de ter jogado pouco, o Concorde ainda pode comemorar as conquistas de mais uma Liga dos Campeões, uma Supercopa Uefa e do seu único Mundial Interclubes.

Em maio de 2008, prestes a completar 37 anos, o lateral anunciou sua aposentadoria e fez sua última partida pelo Diavolo contra a Udinese. Ao todo, Serginho entrou em campo 281 vezes, anotou 24 gols e levantou oito taças pelo clube da Lombardia. Tal contribuição fez com que o brasileiro entrasse para o Hall da fama do Milan.

Após se aposentar, o Concorde manteve laços com os rossoneri. Como olheiro do Milan no Brasil, Serginho foi um dos grandes incentivadores da contratação de Thiago Silva. Nessa função, portanto, ele pode continuar ajudando a dar felicidades à torcida e glórias ao clube. O ex-lateral também atuou como auxiliar de Leonardo na breve passagem do compatriota pelo Antalyaspor, da Turquia, em 2017.

Sérgio Cláudio dos Santos, o Serginho
Nascimento: 27 de junho de 1971, em Nilópolis (RJ)
Posição: lateral-esquerdo e meio-campista
Clubes como jogador: Itaperuna (1988-93), Bahia (1994), Flamengo (1994), Cruzeiro (1995-96), São Paulo (1996-99) e Milan (1999-2008)
Títulos conquistados: Campeonato Baiano (1994), Campeonato Paulista (1998), Copa América (1999), Coppa Italia (2003), Liga dos Campeões (2003 e 2007), Supercopa Uefa (2003 e 2007), Serie A (2004), Supercopa Italiana (2004) e Mundial Interclubes (2007)
Seleção brasileira: 10 jogos e 1 gol

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