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Por que Milan e Inter cogitam sair de Milão?

O conflito entre a prefeitura de Milão e os principais times da cidade pode levar Inter e Milan a deixarem para trás não só o estádio San Siro, mas a cidade mais rica da Itália.

Os rivais decidiram, há pouco mais de um ano, que se tornariam proprietários de uma nova arena, moderna, com serviços melhores e mais potencial de faturamento. Mesmo depois de todo esse tempo, ainda não houve acordo entre prefeitura, Milan e Inter sobre o papel do “velho” Meazza: demolido, reformado ou simplesmente ignorado?

Diante dos esforços da prefeitura para evitar a demolição de San Siro, e irritados com todos os trâmites envolvidos numa obra deste porte, os responsáveis por Milan e Inter parecem cada vez mais empenhados em construir um estádio em uma cidade próxima. A hipótese de se transferirem para Sesto San Giovanni, no início, parecia existir apenas como pressão política. Agora, porém, é vista uma forma de vencer a burocracia – e incluir no projeto todas as novas formas de arrecadação que as equipes pretendem.

Para ficar em San Siro

Um pressuposto importante dos clubes é: deixar tudo como está não é uma opção. O custo de manutenção do estádio é absurdo, as receitas em dia de jogo ficam muito abaixo da média dos principais times do continente e o faturamento é praticamente nulo quando nem Inter nem Milan jogam em San Siro.

A resposta mais óbvia, à primeira vista, seria mais uma reestruturação de San Siro, a maior desde 1990, quando foi instalado o terceiro anel das arquibancadas.

Esta é a ideia favorita da prefeitura. Porém, os clubes nem aceitaram discuti-la, reclamando do preço proibitivo da reforma em um estádio com 94 anos de vida e das impossibilidades de fazê-lo evoluir comercialmente e tecnologicamente como as diretorias planejam.

Terceiro anel de San Siro foi incluído em reforma para a Copa de 1990 (Marco Bertorello/AFP via Getty Images)

A outra opção para não sair do bairro de San Siro seria construir um estádio, do zero, onde hoje é o estacionamento do Meazza. Quando a nova estrutura ficasse pronta, os clubes demoliriam o antigo estádio e iniciariam obras de prédios comerciais e de escritório na região.

Esta é a ideia favorita de Inter e Milan. Porém, a obra é travada pela revisão do Piano di Governo del Territorio (PGT), um equivalente ao Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano, se comparado ao modelo brasileiro.

O impasse pode ser resumido assim: para aumentar a receita, os times pretendem incluir mais áreas comerciais e voltadas para merchandising na região, uma modernização que a prefeitura teria muita dificuldade em apoiar, já que o bairro é essencialmente residencial, com comércios pequenos, casas populares mantidas pelo governo e negócios voltados para o turismo e para o futebol. O governo também teme o impacto ambiental na região.

Crise para a prefeitura de Milão

E é nesse impasse que surgiu a “terceira via”. Um outro estádio completamente novo, construído em Sesto San Giovanni, a 20km de San Siro, teria um significado imenso para Milão. Para o prefeito Giuseppe Sala, o mesmo que ganhou as Olimpíadas de 2026 para a cidade, representaria perder os dois times de uma só vez e, de quebra, ganhar parte da conta a pagar pela mudança. Apesar de o metrô de Milão chegar a Sesto, a logística de mobilidade urbana não está tão afinada quanto a do Meazza.

No campo político, as consequências da mudança também seriam desastrosas para Sala. Político independente de centro-esquerda, ele estaria entregando os principais times da cidade e todas as operações milionárias envolvidas ao controle de um partido rival. O prefeito de Sesto San Giovani, Roberto Di Stefano, é da Lega, sigla de direita, a mesma de Matteo Salvini, ex-vice-primeiro-ministro da Itália.

Com todas as cartas na mesa, é fácil de explicar a reação do prefeito de Milão quando confrontado sobre todas as reuniões e projetos que o Milan estava tocando sobre a nova arena. “Se os times querem fazer o estádio, façamos amanhã de manhã, não vamos impedi-los. Mas, se querem hotéis e shopping, devem negociar, porque existem regras precisas que devem ser respeitadas”, bradou Sala, ao Corriere della Sera, no início de novembro.

“Procuramos um equilíbrio nos espaços comerciais para proteger os pequenos negócios.”

Na última semana, Inter e Milan chegaram a enviar uma carta ao secretário de Planejamento Urbano, Pierfrancesco Maran, cobrando uma resposta sobre as novas arenas. “Nunca vimos um estádio construído só com documentos oficiais”, disse, também ao Corriere. “Daremos uma resposta, mas precisamos transformar esses papéis timbrados em ações”, afirmou, chamando os times para conversar sobre o projeto em uma mesa, não em trocas de documentos.

Torcida quer San Siro

Na quarta-feira (20/11), o jornal La Gazzetta dello Sport publicou uma pesquisa com as opiniões dos torcedores sobre a nova arena. Os resultados das conversas com 2.046 entrevistados são, no fim, contraditórios. Para a maioria, o amor por um estádio quase centenário não se discute. Eles querem o San Siro.

Ainda assim, a maior parte dos torcedores acha muito importante que os times tenham estádios próprios, que garantam mais renda do que os ingressos das partidas. Eles também concordam que Inter e Milan dividam a propriedade. E não querem que o Meazza seja demolido.

Muito dinheiro em jogo

O prefeito de Milão, Giuseppe Sala, no evento que confirmou a cidade como sede das Olimpíadas de Inverno 2026, em junho deste ano (Foto: Robert Hradil/Getty Images)

Em setembro, os dois projetos finalistas escolhidos por Inter e Milan foram apresentados no Politecnico di Milano. Na ocasião, foi dada como certa ao menos a demolição do estádio de San Siro. Ao todo, os custos chegariam a 1,2 bilhão de euros.

A pressa dos clubes tem uma justificativa razoável: um estádio para dezenas de milhares de pessoas foi prometido ao Comitê Olímpico Internacional (COI) como sede da cerimônia de abertura das Olimpíadas de Inverno em 2026, que ocorre em Milão e Cortina d’Ampezzo. Se as obras não começarem logo, portanto, tudo terá de continuar como está por mais tempo do que as diretorias pretendem.

Uma resolução rápida também favoreceria a venda do Millan. A Elliot, grupo financeiro que controla o clube desde o ano passado enquanto não consegue um comprador, já recusou ofertas de 600 e 700 milhões de euros pelo clube, segundo o jornal Il Giorno. As contas mais otimistas dão conta de que os rossoneri poderiam levar 1,2 bilhão de euros com uma negociação para a gigante da moda Louis Vuitton, se o estádio estiver encaminhado. Seja em Milão, seja em Sesto.

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