A Conference League tem o seu segundo campeão – e ele vem da Inglaterra. Na Fortuna Arena, casa do Slavia Praga, Fiorentina e West Ham se enfrentaram em uma decisão disputada até o último minuto. Com direito a gol no fim do tempo regulamentar, os Hammers fizeram 2 a 1 e quebraram um jejum de 58 anos sem um título no continente europeu. A Viola, por sua vez, segue há mais de duas décadas sem conquistas e com apenas uma taça de torneios organizados pela Uefa, ganha em 1961.
Os dois times não poderiam ter trajetórias mais diferentes: depois de tropeços e de passarem no sufoco para a fase de mata-mata, os italianos deslancharam a partir das oitavas, com direito a uma vitória heroica para cima do Basel no jogo de volta das semifinais. Já os ingleses se mantiveram invictos durante toda a competição, com 13 triunfos e apenas um empate, nas quartas de final, contra o Gent. Apesar de ter se mostrado praticamente imbatível na Conference League e ter caminhado tranquilo para a decisão, na Chéquia, a equipe de David Moyes encontrava uma Fiorentina em ótimo momento.
O West Ham foi a campo sem novidades. Do outro lado, Vincenzo Italiano surpreendeu muita gente ao colocar Jovic para começar a partida no lugar de Arthur Cabral, artilheiro da Viola na temporada, com 18 gols – o sérvio tem 13. Além de viver melhor fase, o brasileiro também conservava o posto de principal goleador da Conference League, com sete tentos, ao lado de Amdouni, do Basel.
Antes da partida, ocorreu uma cena lamentável nos arredores do centro de Praga: torcedores da Fiorentina e do West Ham se envolveram em uma briga dentro de um pub. Segundo a polícia local, pelo menos 15 pessoas de ambas as torcidas foram presas. Era um prelúdio das cenas lamentáveis que ultras dos Hammers protagonizariam dentro do estádio.
Alvo de vândalos na torcida do West Ham, Biraghi precisou ser atendido para contenção de sangramento (Getty)
O jogo começou arrastado, com os dois times se estudando bastante. Isso seguiria durante todo o primeiro tempo, por conta da boa organização defensiva de ambas as equipes. A Fiorentina teve mais posse de bola, porém a defesa do West Ham freava os pontas dos italianos. Do outro lado, Lucas Paquetá e Antonio encontravam poucos buracos na sólida defesa violeta. Tanto que o lance de maior perigo foi aos 32 minutos, quando González partiu na arrancada individual e incomodou a zaga dos Hammers. Ali, a partida teve de ser interrompida.
Desde o apito inicial, a torcida do West Ham atirava objetos no gramado. Em determinado momento, a assistente Guadalupe Porras Ayuso precisou desviar de um pequeno sinalizador apagado, que foi lançado no campo. Apesar disso, o árbitro Carlos del Cerro Grande mandou seguir o jogo. Só que, aos 32, Biraghi foi cobrar o escanteio para a Viola e terminou atingido por copos plásticos. Um deles fez com que a cabeça do capitão da Fiorentina começasse a sangrar e obrigasse o jogador a receber atendimento médico.
Com a final interrompida pela arbitragem, um anúncio no telão da Fortuna Arena pedia que os torcedores parassem de atirar objetos em direção ao gramado. Para completar, nenhum segurança se encontrava nas escadarias próximas as arquibancadas – na torcida dos Irons, muitos apoiadores assistiam à partida justamente desse local. Até o momento, a Uefa não se pronunciou acerca de uma possível consequência dessa atitude, mas é provável que o clube inglês receba uma multa pesada e seja punido com jogos de portões fechados. Há muitos anos, situações do tipo chegavam a ser penalizadas até com vitória do adversário no tapetão, mas a entidade mudou seu entendimento na aplicação das sanções.
Depois da confusão, o ritmo do jogo diminuiu. Mas, nos acréscimos, a Fiorentina teve uma chance de ouro: em um cruzamento para a área, Kouamé cabeceou e o goleiro Areola defendeu. A bola sobrou para Jovic marcar, numa testada, mas o sérvio estava em posição irregular e a revisão feita pelo VAR confirmou o impedimento assinalado por Porras Ayuso.
Biraghi acabou tocando na bola com o braço ao tentar marcar Bowen e cometeu pênalti (Getty)
Italiano voltou para o segundo tempo com Arthur Cabral no lugar de Jovic, mas a Fiorentina continuava a ter problemas para criar jogadas, diante das linhas baixas do West Ham. O time inglês seguiu bem posicionado em seu campo de defesa e marcando com eficiência, porém pouco criava – até um pênalti aparecer de forma fortuita.
Aos 59 minutos, Bowen recebeu um cruzamento longo e, na tentativa de apertar para marcar o adversário, Biraghi acabou socando a bola. O VAR confirmou o pênalti para o West Ham e Benrahma bateu com categoria para abriu o placar em Praga e levar a torcida dos Irons ao êxtase.
No entanto, a vantagem inglesa duraria pouco tempo. Aos 67 minutos, Amrabat levantou a bola na área e González apareceu para ganhar de Emerson Palmieri e escorar, de cabeça, para quem vinha de trás. Em uma de suas costumeiras infiltrações, Bonaventura chegou ajeitando a pelota de um pé para o outro e logo efetuou um belo chute para balançar as redes.
O empate incendiou a torcida da Viola – literalmente, pois surgiu até um pequeno foco de incêndio no lado da organizada gigliata, que foi controlado pelos próprios torcedores. A Fiorentina passou a gostar mais do jogo: como o West Ham estava afrouxando a marcação após a igualdade, os pontas violetas ficaram mais soltos para atacar. No entanto, o time continuava a desperdiçar chances. A melhor delas começou com um cruzamento rasteiro de González e teve Arthur Cabral servindo de pivô. O brasileiro ajeitou para Mandragora chutar de primeira, mas à direita da meta de Areola.
O West Ham aproveitou a linha avançada da defesa da Fiorentina e matou o jogo no finalzinho (Getty)
Do outro lado, os Hammers começaram a achar também espaços na defesa violeta e se soltaram mais no ataque – o que ajudou, e muito, a vida de Lucas Paquetá. Foi na jogada do brasileiro, inclusive, que saiu a o gol da vitória, a 10 segundos do fim do tempo regulamentar, já à beira dos acréscimos. Na roubada de bola, o meia percebeu a linha alta da retaguarda italiana e achou Bowen livre, na profundidade. O ponta inglês disparou entre a zaga adversária e só parou ao finalizar na saída do goleiro Terracciano e anotar o tento que representou a pá de cal para a Fiorentina.
Dessa forma, o West Ham obteve uma taça histórica e, depois de 58 anos da conquista da Recopa Europeia por Bobby Moore e companhia, Rice pode repetir o gesto do lendário capitão. Para os Irons, foi o feito de maior importância em mais de duas décadas: o último título de relevância havia sido o da extinta Copa Intertoto de 1999, quando venceram o Metz em sua chave e puderam ter acesso à Copa Uefa. O troféu salvou uma temporada em que o time flertou com o descenso e, claro, preservou o cargo de Moyes. O escocês obteve apenas o terceiro caneco de sua carreira, visto que até então havia ganho somente uma terceirona inglesa, pelo Preston North End, e uma Community Shield, com o Manchester United.
Além disso, o ítalo-brasileiro Emerson Palmieri se tornou o primeiro jogador a ganhar os títulos da Champions League, da Europa League e da Conference League – o lateral também venceu a Supercopa Europeia e a Euro 2020. Contudo, antes do paulista, outros atletas haviam faturado três grandes copas organizadas pela Uefa: quando existia a Recopa, nove obtiveram o feito, incluindo os juventinos Stefano Tacconi, Sergio Brio, Gaetano Scirea, Antonio Cabrini e Marco Tardelli. Vale destacar que o elenco vencedor do West Ham ainda conta com Angelo Ogbonna e Gianluca Scammaca, que também já representaram a seleção italiana.
A Fiorentina, por sua vez, terminou a temporada com derrotas nas duas finais que disputou – além da derrota na Conference League, caiu para a Inter na Coppa Italia. Apesar dos reveses e da decepção óbvia, a Viola manteve seu estilo de jogo o tempo inteiro e buscou sempre a vitória, o que talvez tenha sido o seu pecado em Praga, visto as linhas muito altas num momento tão crítico da decisão. Porém, é uma equipe ainda em construção e que pode levantar taças em breve, principalmente se o trabalho de Italiano tiver continuidade.
