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Massimo Orlando fez Fiorentina ‘esquecer’ Roberto Baggio, mas teve carreira dizimada por lesões

Quantos são os jogadores de futebol que nos despertam os seguintes tipos de questionamentos: “Até onde fulano poderia ter chegado? E se não fossem as lesões? E se não fosse aquela transferência? E se…?” Massimo Orlando é, certamente, mais um desses atletas que surgiram com um talento único, com toda uma carreira promissora pela frente, mas que acabaram não vingando no cruel mundo da bola.

Ao longo deste tortuoso caminho, um número enorme de lesões. A mais grave delas, no joelho, basicamente invalidou o meio-campista italiano na metade da década de 1990. No entanto, o canhoto e camisa 10 se recusou a desistir e estendeu um pouco mais sua trajetória. Ainda assim, fez seu último jogo como profissional ainda antes dos 30 anos. No currículo, passagens por Milan e Juventus, mas pouquíssimas atuações, de fato, com essas camisas.

Na Fiorentina, encontrou seu recanto de paz, onde, por algum tempo, conseguiu jogar em alto nível. Curiosamente, Orlando sempre esteve acompanhado pela sombra de Roberto Baggio. Seja como reserva imediato do Divino Codino ou como uma espécie de substituto eleito pela torcida da Viola. De qualquer forma, o meia ainda colecionou momentos de brilho nas seleções de base da Itália e chegou a brigar por uma vaga na Copa do Mundo de 1994. Sua ausência no mundial foi apenas uma das inúmeras frustrações ao longo do trajeto como atleta. Sem poder lutar contra o próprio corpo, Massimo resiste no imaginário futebolístico como uma lenda inconclusa. Aquele que prometeu e não cumpriu, não necessariamente por sua culpa.

Cotado como um do jovens mais promissores da Itália, Orlando chegou à Fiorentina para substituir Baggio (Galassi)

Surge uma estrela no futebol italiano

Desde os primeiros passos com a bola no pé, Massimo deixou claro que era um futebolista especial. Nascido em maio de 1971, em San Donà di Piave, a cerca de 40 quilômetros de Veneza, ele começou sua trajetória no esporte na Libertas Ceggia, antes de passar um pequeno período na Fossalta Piave. As equipes amadoras do Vêneto propiciaram ao franzino meio-campista uma chance de se destacar em meio aos demais garotos da região. Seu estilo clássico, dotado de uma ótima perna esquerda e visão de jogo o levou para as categorias de base do Conegliano, time que disputava a quarta divisão nacional no final da década de 1980. Não tardou, então, para que Orlando despertasse a atenção da Reggina. Recém-promovida à Serie B, em 1988, a agremiação do sul da Itália enviou olheiros até o nordeste do país para observarem o jovem talento.

A viagem de mais de 1200 quilômetros valeu a pena. Massimo acabou contratado pela Reggina, assinando, assim, seu primeiro contrato profissional. Aquela temporada era importantíssima para os amaranto, que buscavam um acesso inédito à elite do futebol italiano. Para tal, foi montada uma equipe bastante jovem, que ficou muito próxima do objetivo final.

Comandada por Orlando (titular indiscutível nos dois terços finais do campeonato), a Reggina terminou a Serie B com a quinta colocação, se habilitando para a disputa de um playoff de acesso contra a Cremonese, que terminou com os mesmos 44 pontos na tabela. Na disputa extraordinária pela última vaga na elite, porém, os calabreses acabaram sofrendo um duro golpe ao serem derrotados nos pênaltis, após empate de 0 a 0. O acesso não veio, mas, em termos de experiência, a derrota doída pode ter sido um choque de realidade para Massimo.

Na temporada seguinte, em 1989-90, o talentoso meia voltou mais maduro, cometendo menos erros e com um ar de liderança ainda mais imponente. Com 13 jogos disputados a mais na Serie B, quase não perdeu minutos durante todo o campeonato e, naturalmente, pode se destacar mais. A vaga na elite novamente não foi obtida, já que a Reggina ficou na sexta posição, mas algo grandioso estava reservado para o garoto de apenas 19 anos. Na metade de 1990, a poderosa Juventus, então campeã da Copa Uefa, investiu um valor altíssimo para contratar a promessa: 6 bilhões de liras.

O projeto de renovação do elenco da Vecchia Signora era grandioso e tinha em Roberto Baggio sua principal figura. O ex-atacante da Fiorentina havia sido contratado sob condições bastante nebulosas. Num acordo feito “às escuras”, a família Pontello, então dona da equipe, cedeu Baggio sem o consentimento do jogador — tampouco da torcida da Viola. Importante ressaltar que, dias antes do acordo ser fechado, em 18 de maio de 1990, a Juventus havia vencido a própria rival toscana na decisão da Copa Uefa. Os fãs florentinos, nada simpáticos aos adeptos da Juve, se revoltaram com a venda do ídolo para a maior rival. Houve depredação nas ruas de Florença um dia após o acerto ser revelado ao público. O caos não impediu o adeus do craque, mas forçou a venda do clube pelos Pontello, até hoje odiados na cidade.

É neste contexto que Orlando, vejam só, vai parar na Fiorentina pouco tempo depois de ser contratado pela Juventus. O jovem até chegou a entrar em campo duas vezes com o uniforme bianconero, em duelos da antiga Recopa Europeia e da Coppa Italia, entre setembro e outubro de 1990. No entanto, como tentativa de diminuir um pouco a animosidade com a rival, a Juve cedeu seu jovem contratado aos gigliati. O empréstimo fazia sentido, uma vez que a presença de Roby Baggio, com certeza, forçaria Massimo a permanecer muitas pelejas no banco, sem sequer ter minutos no gramado pela Velha Senhora. Para que ele pudesse se desenvolver, a gigante optou pela cessão, com a contrapartida de que ele jogaria, de fato, pela esquadra violeta. E jogou.

Orlando chegou a postular um lugar entre os grandes do futebol italiano (imago)

O “substituto” de Baggio na Fiorentina

Naturalmente, Orlando chega ao time Viola com o status de sucessor de Baggio. Um fardo bastante pesado para o jovem de 19 anos, mas com o qual ele conseguiu lidar bem em sua primeira temporada em Florença. De forma rápida, a torcida se apegou ao seu novo xodó, inclusive cantando nas arquibancadas que ele era “melhor do que Baggio”.

A primeira temporada com o manto violeta não poderia ter sido melhor para Orlando: oito gols marcados e a artilharia do time, compartilhada com Diego Fuser, outro jogador emprestado, mas pelo Milan. O carinho dos fãs gigliati por Massimo cresceu ainda mais em 2 de dezembro de 1990. Pouco mais de um mês após ser cedido pela Juve, o novo camisa 10 da Viola marcou contra o time de Turim, num belo gol de perna esquerda. A Fiorentina perdeu aquela partida por 2 a 1, mas o restante da campanha foi positivo para o jovem meia.

Num time com ataque improdutivo, Massimo se sobressaiu como um meia de boa chegada, podendo atuar pelo centro, mas também caindo pelo setor esquerdo. Não à toa, esta foi sua temporada mais prolífica na carreira — com direito também a dois gols diante do Cesena, em uma vitória por 2 a 0. Seu impacto foi tão grande que as arquibancadas do Artemio Franchi deram sua resposta, pedindo à diretoria da Viola que contratasse, em definitivo, seu novo ídolo. Foi o que aconteceu. Enquanto Fuser retornou ao Milan, Orlando permaneceu em Florença para a explosão dos fãs da equipe. Após a decepcionante 12ª colocação na Serie A em seu ano de estreia, esperava-se que o vêneto pudesse levar o time adiante em 1991-92.

No entanto, a evolução do jovem acabou sendo brecada. Em parte, pela aquisição de Pietro Maiellaro, vindo do Bari naquela temporada, e que revezou, em alguns momentos, com Orlando na posição mais avançada do meio-campo. A preferência do treinador brasileiro Sebastião Lazaroni pelo veterano pode ter diminuído um pouco o ímpeto do camisa 10, que viu seus números caírem de oito para quatro gols em 1991-92, mesmo com cinco jogos a mais disputados. Novamente, a Fiorentina não foi além da 12ª colocação na Serie A, apesar da chegada de outro garoto promissor: Gabriel Batistuta. Para Massimo, as boas lembranças daquela época ficaram por conta do título europeu sub-21 representando a Itália. O meia foi um dos destaques dos azzurrini, que, na fase final (disputada em 1992), bateram Checoslováquia, Dinamarca e Suécia para garantirem a taça.

A conquista serviu para manter o nome de Orlando no radar da seleção principal, apesar das dificuldades encontradas com a Fiorentina. O problema é que o desempenho da temporada seguinte, entre 1992 e 1993, seria ainda pior em Florença. Com um time recheado de bons nomes, mas uma inconsistência defensiva tremenda e uma aura pesada, a Viola acabou rebaixada de forma chocante. Nas rodadas iniciais, a equipe chegou a figurar na liderança, mas teve queda vertiginosa na tabela de classificação. Novamente, a produção de Massimo foi baixa, com apenas três gols — sendo um deles na rodada derradeira, no inútil triunfo por 6 a 2 diante do Foggia.

Enfim, relegado à Serie B, o meio-campista começou a ver sua carreira despencar em queda livre a partir da temporada 1993-94. Em primeiro lugar, é fato que Orlando não se deu muito bem com Claudio Ranieri, o treinador da Fiorentina para aquele ano. Sem ser um dos preferidos do professor, acabou se tornando coadjuvante de um time que levou o título (e a vaga de volta à elite) com alguma tranquilidade. Já na parte final do campeonato, o camisa 10 demonstrava o desejo de ir embora de Florença. Para piorar, a potencial vaga entre os convocados para a Copa de 1994 ficou somente nos sonhos do meia da Viola. Sem um bom rendimento nas duas épocas que antecederam o Mundial, Massimo não impressionou o técnico Arrigo Sacchi, que optou por levar Antonio Conte para compor o setor central da Squadra Azzurra, posteriormente vice-campeã nos Estados Unidos.

Ou seja, muitas notícias ruins para um jogador que também começou, nesta época, a conviver com lesões. Nada extremamente grave até então, mas o suficiente para fazê-lo ser emprestado ao Milan. Na equipe rossonera, Massimo já chegou com problemas físicos.

Com a Fiorentina na Serie B, Orlando perdeu a chance de jogar a Copa do Mundo e viu sua carreira decair (Sestini)

A passagem frustrada pelo Milan e o retorno à Florença

Durante uma temporada completa no Milan, em 1994-95, Orlando teve o mesmo número de jogos… que os rossoneri obtiveram de títulos. Com diversos problemas para se recuperar de algumas lesões, o meia simplesmente não conseguiu atuar. Sequer foi uma opção confiável para Fabio Capello, treinador da equipe. Ainda assim, Massimo consta na lista do elenco campeão da Supercopa Italiana, contra a Sampdoria, e da Supercopa Uefa, diante do Arsenal.

Em nenhuma das decisões ele sequer esteve apto para entrar no gramado. Na verdade, Orlando só atuou nos últimos dois jogos da temporada, frente ao Bari e, curiosamente, Fiorentina, pela Serie A. Foram, portanto, somente 37 minutos com a camisa rossonera. As chances do meio-campista de se manter em Milão acabaram, então, pouco antes do início de 1995-96. Novamente, por “culpa” de Baggio, que deixou a Juventus para se juntar ao Milan. Sendo assim, para não amargar o banco da estrela mais uma vez na carreira, Massimo acabou resgatado pelo gigliati. De volta a Florença, até recuperou alguma forma, mas por pouco tempo.

Novamente sob comando de Ranieri, Massimo ainda tinha o agravante de estar em uma equipe mais qualificada. Batistuta, Francesco Baiano e, principalmente, Rui Costa minavam as chances de o italiano ser titular do time. Ainda assim, ele iniciou a temporada 1995-96 como figura carimbada nas partidas da Viola — geralmente entrando logo após o intervalo ou durante a segunda etapa.

Prestigiado pelo comandante que um dia o esnobou, o então camisa 11 (a 10 havia sido entregue a Rui Costa) chegou até a marcar um bonito gol de canhota para sacramentar uma vitória da Fiorentina contra o Napoli, fora de casa, por 2 a 0. No entanto, duas rodadas depois, o pior aconteceu para a carreira do meio-campista.

Diante do Bari, no Artemio Franchi, Orlando começou jogando, porém precisou ser substituído aos 29 minutos da etapa inicial. O lance parecia inofensivo: uma leve deslizada no gramado, mas que foi suficiente para prender o pé do italiano no solo e forçar um giro nada natural do joelho. Uma entorse gravíssima que acabou com praticamente toda a sua temporada. Ele ainda conseguiu retornar nas rodadas finais da Serie A e, principalmente, a tempo de disputar a final da Coppa Italia. Foram 45 minutos no primeiro duelo, em Florença, e apenas 120 segundos na volta, em Bérgamo. Ainda assim, um prêmio merecido para Massimo: ao menos, foi campeão de um torneio em que, de fato, atuou.

Contudo, apesar da conquista, a confiança do jogador italiano jamais voltou a ser a mesma. Da mesma forma que seus movimentos, debilitados por conta das sucessivas lesões. Logo no começo da temporada 1996-97, Massimo ainda levou mais um título. Embora não tenha sido relacionado para a partida única no San Siro, esteve na lista de campeões da Viola, que bateu o Milan por 2 a 1, com gols históricos de Batistuta.

O restante da temporada, porém, foi melancólico. Aparentando certa desmotivação, Orlando não conseguia mais ter uma sequência de partidas em campo. Quando era escalado, deixava de desfrutar da oportunidade. Foram apenas 16 jogos na Serie A e nenhum gol marcado – ambas suas piores marcas com a camisa violeta. Nas copas, ainda anotou dois golzinhos, mas tanto ele quanto a torcida em Florença já sabiam que sua trajetória no time estava perto do fim. A sua peleja derradeira pela Fiorentina aconteceu em 25 de maio de 1997. Sem grande badalação, a equipe gigliata venceu a Reggiana por 3 a 0. Com apenas 26 anos, a joia italiana dava sinais de que não conseguiria se recuperar mais na carreira.

Orlando tentou resgatar o seu futebol na Atalanta, mas não conseguiu dar a volta por cima (EMPICS/Getty)

Os últimos anos, defendendo Atalanta e Pistoiese

Atestar a reta final da trajetória de Orlando nos gramados é, de fato, muito triste. Após deixar a Fiorentina, em 1997, ele foi contratado pela Atalanta, onde até começou bem. Logo na estreia da Serie A, marcou um gol na vitória da Dea por 4 a 2 diante do Bologna. As boas notícias, porém, pararam por aí. Massimo atuou por somente mais 27 minutos, contra a Sampdoria, na terceira rodada, antes de novamente precisar abandonar o jogo devido a uma lesão. De novo, problemas no joelho, e um filme repetido na cabeça do italiano, que voltou a perder toda a temporada. Os orobici, no fim das contas, acabaram rebaixados, e o vêneto jamais disputou um duelo de primeira divisão novamente.

Nos 27 meses seguintes, entre setembro de 1997 e dezembro de 1999, o meio-campista atuou em somente 14 partidas — 10 pela Serie B e quatro na Coppa Italia. Em apenas um desses confrontos, permaneceu por 90 minutos. E foi, curiosamente, contra a Fiorentina, o time pelo qual, ao menos, conseguiu se manter saudável por algum tempo.

Na virada do século, com a temporada na metade, Orlando decidiu deixar a agremiação nerazzurra. Aos 30 anos, ele assinou com a Pistoiese, também da Serie B, a partir de janeiro de 2000. Após chegar machucado à equipe da Toscana, Massimo fez duas partidas seguidas no mês de março. A segunda delas, novamente, reservou uma curiosidade: foi justamente diante da Atalanta, equipe da qual havia acabado de se transferir. De fato, não foi a primeira vez que o meia enfrentou uma esquadra que já havia defendido na carreira, apesar de tantas ausências por lesão. Contudo, acabou sendo a última. Este duelo diante da Dea, que terminou em 0 a 0, foi o jogo derradeiro de sua carreira.

Antes de completar 30 anos, o italiano acabou por desistir. Mesmo diante da constatação de que jamais conseguiria jogar em alto nível de novo, permaneceu por mais uma temporada antes de abrir mão do período restante de contrato com a Pistoiese. Sendo assim, ao final de 2000-01, Orlando se aposentou oficialmente dos gramados.

Na vida fora dos campos, Massimo chegou a coordenar as categorias de base da Fiorentina. Depois, tornou-se comentarista de futebol italiano na televisão — posição, esta, que exerce até hoje e que, frequentemente, o coloca em evidência nas capas dos periódicos. Dono de opiniões fortes (e polêmicas), Orlando mostra uma boa capacidade de improviso, além de sacadas inteligentes, tal qual conseguiu reproduzir, por tempo limitado, com uma bola nos pés. Para azar de todos os amantes da bola, o corpo, um dia jovem, rapidamente envelheceu, impedindo que aquele carismático garoto vingasse no ofício que amava. Foram apenas 247 jogos oficiais em toda a carreira.

Os cabelos esvoaçantes e uma certa pinta de galã não enganavam: Massimo Orlando gostava de jogar bola. Ao menos, houve tempo para que sua figura conquistasse certo simbolismo em Florença. Mesmo que por poucos meses, este rapaz foi responsável por “curar” fãs da Fiorentina devastados pela perda de Roberto Baggio. E ele foi capaz de fazer isso através de seu futebol, que, um dia, foi digno de primeiro escalão na Itália.

Massimo Orlando
Nascimento: 26 de maio de 1960, em San Donà di Piave, Itália
Posição: meia-atacante
Clubes: Conegliano (1986-88), Reggina (1988-90), Juventus (1990), Fiorentina (1990-94 e 1995-97), Milan (1995-96), Atalanta (1997-2000) e Pistoiese (2000-01)
Títulos: Europeu Sub-21 (1992), Serie B (1994), Coppa Italia (1996), Supercopa Italiana (1994 e 1996) e Supercopa Uefa (1994)

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