Atualmente, Portugal é reconhecido como um país com diversas opções para o ataque. Cristiano Ronaldo, Diogo Jota, João Félix, Bruno Fernandes, Rafael Leão e outros nomes chamam a atenção no setor. No entanto, durante muito tempo, os lusitanos se destacaram pelo poder de sua defesa, com peças como Ricardo Carvalho e os duros Pepe e Bruno Alves. O terceiro dos beques citados, aliás, teve o período mais regular de sua carreira quando atuou na Itália, onde vestiu as camisas de Cagliari e Parma.
Bruno Alves foi um zagueiro viril, exemplo de entrega e liderança em todas as equipes que passou. Muito eficiente no jogo aéreo, mas extremamente técnico e exímio cobrador de faltas, o português deixou a sua marca em seu próprio país, na Rússia, na Turquia no futebol italiano e, por que não, nas canelas e em outras partes dos corpos dos adversários. Na Velha Bota, aportou já muito experiente, com quase 35 anos, quando muitos acreditavam que pouco teria a oferecer. Contudo, o beque desmentiu os incautos com brilhantes atuações por Cagliari e Parma – sendo importante, principalmente, no time do Ennio Tardini, que capitaneou.
As raízes de Bruno Alves remontam ao Brasil. O zagueiro é filho de Washington, beque nascido em Minas Gerais e com passagens por clubes como Flamengo, Portuguesa, América Mineiro, Bahia e Botafogo. O mineiro de Barão de Cocais teve longa carreira no futebol português e se estabeleceu em Póvoa de Varzim, onde deu origem a uma família de jogadores – Geraldo e Júlio, irmãos do gabaritado defensor luso-brasileiro, também fizeram carreira no esporte.
A formação de Bruno ocorreu no Varzim, time da sua cidade natal. Ele ficou sete anos no clube e, aos 18, foi levado para o Porto B, na virada do século. Apesar de chegar a um dos grandes de Portugal de forma precoce, não recebeu muitas chances entre os profissionais e acumulou diversos empréstimos: Alves atuou por Farense e Vitória de Guimarães, na primeira divisão portuguesa, e o AEK Atenas. Na Grécia, foi treinado por Fernando Santos, seu futuro técnico na seleção lusitana. A propósito, o defensor era figurinha carimbada nas equipes nacionais juvenis, pelas quais disputou dois Europeus Sub-21 e os Jogos Olímpicos de 2004, além de ter conquistado o Torneio de Toulon.
Bruno Alves teve a sua primeira oportunidade de jogar pelo time principal do Porto pelas mãos do holandês Co Adriaanse, em 2005. O zagueiro não chegou a ser titular, mas teve as suas chances. Foi apenas a partir da contratação de Jesualdo Ferreira que o defensor, com seus 25 anos, conseguiu uma vaga fixa no onze inicial, ao superar Ricardo Costa e Pedro Emanuel.
Com confiança e sequência, o defensor se tornou o líder da equipe. Em quatro anos, venceu nove títulos, incluindo quatro campeonatos portugueses, passou a ser convocado por Luiz Felipe Scolari para a seleção e disputou a Eurocopa de 2008 a serviço do técnico gaúcho. Já sob as ordens de Carlos Queiroz, Bruno Alves foi titular dos lusitanos na Copa do Mundo de 2010 – na qual, aliás, encarou o Brasil, país de seu pai.
Essa guinada na carreira fez o zagueiro querer alçar voos mais altos e, após a Copa na África do Sul, Alves acabou vendido para o Zenit por 22 milhões de euros. Um valor alto para um jogador de defesa, mas que certamente foi bem investido pelo time de São Petersburgo. Afinal, Bruno conquistou três títulos nas três temporadas em que atuou na Rússia. Ele dividiu vestiário com seus compatriotas Danny e Fernando Meira, além de ter sido treinado por Luciano Spalletti, um grande entusiasta de seu futebol.
Em 2012, disputou mais uma Euro e, junto com Pepe, seu velho companheiro de Porto, formou uma grande dupla – que ajudou a levar Portugal até as semifinais da competição. Os lusitanos foram eliminados nos pênaltis pela Espanha, que foi a campeã da competição, e, na ocasião, Bruno Alves perdeu a sua cobrança ao carimbar o travessão de Iker Casillas. Enquanto se mantinha relevante no selecionado português, o zagueiro continuou a peregrinar pelo planeta e a Turquia apareceu em seu caminho.
O Fenerbahçe chegou a um acordo com o Zenit pelo zagueiro e o contratou por 5,5 milhões de euros, em 2013-14. Aos 32 anos, conseguiu se destacar no Campeonato Turco e, logo na primeira temporada, foi campeão da Süper Lig. O Fener foi o vencedor ao abrir nove pontos de diferença para o Galatasaray, seu grande rival.
Ao fim da temporada, o zagueiro foi titular na péssima campanha de Portugal na Copa de 2014, disputada no Brasil. Os tugas somaram 4 pontos e foram eliminados em um grupo com Gana, Estados Unidos e Alemanha. Poderia ser o fim da linha para Bruno Alves na Seleção das Quinas, mas Fernando Santos assumiu o comando da equipe após a demissão de Paulo Bento e fez questão de tê-lo no grupo nos anos vindouros.
Alves disputou mais duas temporadas no Fenerbahçe e conseguiu chegar a marca de 101 partidas e quatro gols pelos Canários Amarelos. Foi campeão da Supercopa da Turquia em 2014, porém não obteve outros triunfos relevantes por lá. Só mesmo cartões vermelhos em jogos importantes, como no clássico com o Galatasaray, por um chute em Blerim Dzemaili, e no tropeço frente ao Istanbul Basaksehir, que deu o título nacional ao Gala.
Com o fim da temporada 2015-16, as seleções europeias se preparam para a Euro, que seria na França. Dessa vez, Bruno Alves não foi o titular na zaga de Portugal, já que Pepe, Ricardo Carvalho e José Fonte eram preferidos por Fernando Santos. Porém isso não o impediu de participar da campanha, substituindo o lesionado Pepe nas semifinais, contra País de Gales, nem de festejar a maior glória da sua carreira – e o seu último título. Os lusos conseguiram a façanha de vencerem a dona da casa na decisão, mesmo com Cristiano Ronaldo lesionado.
Quando se sagrou campeão europeu, Bruno Alves já tinha um contrato assinado com o Cagliari. No início de junho de 2016, antes de a Euro começar, o defensor havia sido anunciado como reforço, a custo zero, do time da Sardenha. Para aceitar a oferta dos rossoblù, o luso-brasileiro recorreu aos conselhos de Cristiano Ronaldo, como contou à Gazzetta dello Sport. “Ele me disse que Cagliari era a melhor opção e me lembrou como são importantes os zagueiros com personalidade na Itália. O Italiano é um campeonato muito tático e o nível é muito alto aqui”, afirmou.
Alves foi um dos reforços experientes adquiridos pelo presidente Tommaso Giulini, ansioso por levar os rossoblù a um patamar mais elevado na Serie A. O empresário havia adquirido o clube em 2014, mas amargou o rebaixamento no primeiro ano e, àquela altura, comemorava o retorno à elite. Durante a mesma janela em que Bruno foi contratado, acertaram com os casteddu o goleiro Rafael, o lateral-direito Mauricio Isla, o versátil Simone Padoin e o atacante Marco Borriello.
Além dos reforços de veteranos, o Cagliari também buscou o polivalente meia Artur Ionita e deu as primeiras chances para um jovem Nicolò Barella, que voltava de empréstimo ao Como. Eles se somavam a outros bons nomes, como Daniele Dessena, Marco Sau e João Pedro. Comandado por Massimo Rastelli, o time sardo teve um ótimo campeonato, sobretudo considerando que havia acabado de subir da Serie B: conseguiu ficar na 11ª posição e, sem sustos, garantiu a sua permanência na elite com quatro rodadas de antecedência.
Bruno Alves disputou 37 partidas ao longo da temporada e marcou um gol. Aliás, um golaço: numa de suas especialidades, cobrou falta com perfeição na terceira rodada e diminuiu o prejuízo do Cagliari numa derrota por 2 a 1 para o Bologna. Durante todo o ano, deixou de lado as duras intervenções que o caracterizaram e mostrou refinamento para articular jogadas, com lançamentos precisos. O luso-brasileiro colecionou sólidas atuações e foi um dos zagueiros mais regulares da Serie A, não obstante a defesa dos isolani tenha sido a terceira mais vazada do campeonato.
Ao fim da temporada, Bruno Alves deixou o Cagliari em busca de títulos: recebeu uma proposta do Glasgow Rangers e o time da Sardenha não se opôs ao seu desejo, liberando-o de seu contrato. O português deixou impressão extremamente positiva e a diretoria fez questão de elogiá-lo no comunicado de despedida: a nota oficial afirmava que o beque “foi um exemplo dentro e fora de campo”, dando à equipe “esperança, força e carisma”.
O zagueiro veterano, que já ostentava uma vistosa mecha branca no cabelo, chegou à Escócia seduzido pelo projeto do compatriota Pedro Caixinha. Mas, se a imagem deixada na Itália foi positiva, no norte da Grã-Bretanha Bruno não viveu situações das mais agradáveis. De cara, o Rangers foi eliminado na primeira fase qualificatória da Europa League pelo Progrès Niederkorn, de Luxemburgo, o que afetou o restante da temporada.
O técnico português durou apenas 15 jogos e a instabilidade foi marca registrada do Rangers, que não conseguiu vencer o arquirrival Celtic nenhuma vez em 2017-18 – inclusive, chegou a ser goleado por 5 a 0. Após eliminações dos Light Blues em todos os torneios de mata-mata e um mero terceiro lugar na Premiership, Bruno Alves, que somou apenas 25 aparições, rescindiu o contrato com o clube ao final da época.
Mesmo em má fase, Alves foi convocado para disputar a sua última competição por seu país. Se, em 2017, havia jogado três partidas na campanha do terceiro lugar da Seleção das Quinas na Copa das Confederações, em 2018, o veterano esquentou o banco na Copa da Rússia, torneio em que os lusitanos foram eliminados pelo Uruguai, nas oitavas de final. Com 96 jogos, Bruno é um dos 10 atletas que mais vezes representaram Portugal.
Fim da linha? Longe disso. Com uma bagagem que incluía três disputas de Euro e de Copa do Mundo, Bruno Alves foi visto como o nome perfeito para assumir a braçadeira de capitão do Parma, recém-promovido à elite italiana após uma falência que lhe custou a existência entre os profissionais.
Em 2015, os emilianos tiveram bancarrota declarada e tiveram de recomeçar da amadora Serie D. Liderado por Alessandro Lucarelli, o Parma galgou três acessos consecutivos e voltou à máxima divisão em tempo recorde. O zagueiro italiano se aposentou depois de devolver os gialloblù à elite e passou a faixa para Bruno Alves, que foi contratado a custo zero e, rapidamente, eleito por aclamação como timoneiro dessa nova fase do clube. Ele também ajudaria a tutelar jovens promissores, como Alessandro Bastoni e Federico Dimarco, emprestados pela Inter.
Com um grande início de campeonato, o Parma chegou a ocupar a sexta colocação na 13ª rodada, mas o desempenho do time foi caindo e os crociati terminaram a Serie A no 14º lugar. A equipe treinada por Roberto D’Aversa precisou da experiência de Gervinho, Juraj Kucka, Jonathan Biabiany e, claro, Bruno Alves, para manter a cabeça no lugar e conseguir escapar do rebaixamento – objetivo que se confirmou na penúltima rodada. Além de ajudar na forte defesa gialloblù, o português marcou quatro gols, sendo dois em belas cobranças de falta contra Chievo e Milan.
Na temporada 2019-20, a equipe continuou evoluindo sob o comando de D’Aversa e pode contar com bons reforços – Matteo Darmian, Dejan Kulusevski, Jasmin Kurtic e Andreas Cornelius, por exemplo. O resultado foi melhor ainda, já que o Parma terminou na 11ª posição, devido a um ótimo primeiro turno de todo o elenco. No entanto, o desempenho do time, especialmente o da retaguarda, caiu bruscamente após a interrupção da Serie A por conta da pandemia de covid-19. No período de retomada da competição, a zaga de veteranos sofreu com o calor do verão europeu e Bruno Alves, que beirava os 39 anos, sofreu.
Em 2020-21, o Parma atravessou novos problemas societários, agravados pela demora na conclusão da compra do clube pelo norte-americano Kyle J. Krause. A morosidade na transação comprometeu a capacidade de ação dos ducali no mercado e resultou no enfraquecimento do plantel. A campanha de 2020-21 foi terrível e o time segurou a lanterna da Serie A até o final.
O veteraníssimo Bruno Alves acabou perdendo espaço por lesões e ficou no banco durante boa parte da competição, concluída com o inevitável rebaixamento do Parma. Mesmo assim, ao balançar as redes contra o Sassuolo, superou recorde do compatriota Fernando Couto e se tornou o jogador mais velho a marcar um gol pelos crociati na elite, com 39 anos e 170 dias.
Com o término do campeonato e o retorno do Parma à Serie B, Bruno Alves encerrou sua passagem pelo time gialloblù com 86 partidas e cinco gols. E, ainda mais importante, com uma forte ligação com a torcida parmense, já que deu tudo pela equipe e pela cidade.
Alves voltou para Portugal e tinha tudo acertado para disputar a temporada 2021-22 da Primeira Liga pelo Famalicão. Mas, inacreditavelmente, três semanas após ser anunciado pela equipe, o jogador se desentendeu com o técnico Ivo Vieira em um treino e pediu a rescisão do contrato.
Sua última etapa como profissional acabou sendo no Apollon Smyrnis, da primeira divisão da Grécia – time no qual foi treinado por Gianluca Festa, ex-zagueiro sardo e ícone do Cagliari. Saco de pancadas da competição, a equipe do lusitano foi rebaixada e, ao fim da época, com quase 41 anos, Bruno Alves anunciou o fim de sua carreira. No entanto, permaneceu em solo helênico, já que foi escolhido como diretor esportivo do AEK.
Bruno Eduardo Regufe Alves
Nascimento: 27 de novembro de 1981, em Póvoa de Varzim, Portugal
Posição: zagueiro
Clubes: Porto B (2000-02), Farense (2002-03), Vitória de Guimarães (2003-04), AEK Atenas (2004-05), Porto (2005-10), Zenit (2010-13), Fenerbahçe (2013-16), Cagliari (2016-17), Glasgow Rangers (2017-18), Parma (2018-21), Famalicão (2021) e Apollon Smyrnis (2021-22)
Títulos: Torneio Internacional de Toulon (2001), Primeira Liga (2006, 2007, 2008 e 2009), Taça de Portugal (2006, 2009 e 2010), Supertaça Cândido de Oliveira (2006 e 2009), Premier League Russa (2010 e 2012), Supercopa da Rússia (2011), Süper Lig (2014), Supercopa da Turquia (2014) e Eurocopa (2016)
Seleção portuguesa: 96 jogos e 11 gols