Jogos históricos

No início de sua era de ouro, o Parma faturou primeiro título internacional sobre o Antwerp

Wembley é um patrimônio do futebol e qualquer partida disputada lá fica marcada pela eternidade. Para times italianos, as decisões realizadas na praça esportiva costumam ter desfecho feliz: equipes que representavam o país chegaram a oito finalíssimas na arena e venceram seis delas. Um dos campeões foi o Parma, que fez a sua primeira final europeia no lendário estádio londrino e se sagrou vitorioso na Recopa Uefa, em 1993.

Na temporada 1992-93, o Parma vivia o início de sua era de ouro. Impulsionado pelo dinheiro da Parmalat de Calisto Tanzi, seu proprietário, o time ascendera pela primeira vez à Serie A em 1990 e, dois anos depois, já computava uma participação na Copa Uefa e uma inédita conquista da Coppa Italia. O título da competição levou os ducali à Recopa. No entanto, o caminho da equipe italiana até o debute numa decisão continental foi bastante complicado.

O Parma estreou na Recopa Uefa diante do Újpesti, da Hungria, e se classificou após placar agregado de 2 a 1. Na sequência, os crociati tiveram problemas contra o Boavista, mas o empate sem gols, no Ennio Tardini, foi compensado pelo triunfo por 2 a 0 em Portugal. Já nas quartas, o Sparta Praga era um adversário de razoável força, mas não ofereceu grande resistência e, graças a um novo 2 a 0, o time italiano avançou.

Com golaço, o capitão Minotti deu início à festa crociata em Wembley (Arquivo/Parma Calcio)

O principal desafio do Parma se deu nas semifinais, e foi tirado de letra pelos ducali: com dois gols de Faustino Asprilla, eles venceram o Atlético de Madrid por 2 a 1, em pleno Vicente Calderón. Nem a derrota em casa, pelo placar mínimo, tirou a vaga dos gialloblù na final. Já o Royal Antwerp, vice-campeão da Copa da Bélgica, deixou pelo caminho Glenavon (Irlanda do Norte), Admira Wacker (Áustria), Steaua Bucareste (Romênia) e Spartak Moscou (Rússia). Dessa forma, a Recopa Uefa teria a segunda finalíssima entre italianos e belgas num espaço de apenas três anos – em 1990, a Sampdoria superara o Anderlecht.

Wembley recebia sua segunda final de Recopa, 28 anos após sediar o confronto entre West Ham e Munique 1860. Para a estreia dos técnicos Nevio Scala e Walter Meeuws em decisões europeias, o palco estava meio vazio: pouco mais de 37 mil ingressos foram vendido. Era um público bem inferior ao de quase 98 mil presentes na vitória dos ingleses sobre os alemães, quase três décadas antes, mas vale salientar que cerca de 16 mil desses torcedores haviam atravessado a Europa, viajando de Parma para Londres.

Com elenco bem mais forte do que o do Antwerp, o Parma tratou de se impor desde os primeiros momentos da partida. Após os primeiros toques na bola, deu para perceber que o embate pelos flancos do campo seria um dos pontos-chave do duelo, que colocava frente a frente o 3-5-2 de Scala e o 4-4-2 em linha trabalhado por Meeuws. Seriam fundamentais, portanto, os arranques em velocidade dos alas Alberto Di Chiara e Antonio Benarrivo.

Logo aos 8 minutos, Benarrivo mostrou que estava ligado. O apuliano avançou com determinação pela direita, ganhou de Didier Segers com facilidade e cruzou para Alessandro Melli, que saltou de peixinho e obrigou Stevan Stojanovic a fazer grande defesa, pondo a bola para escanteio. O arqueiro iugoslavo, contudo, protagonizaria um lance de infelicidade já na cobrança do corner: saiu em falso para tentar cortar o cruzamento de Marco Osio e, involuntariamente, ajeitou para o zagueiro Lorenzo Minotti. O capitão crociato, então, emendou um belo voleio, acertando o ângulo para abrir o placar com um golaço.

Em dia pouco brilhante, o sueco Brolin foi ofuscado por Melli (Allsport)

O gol não abalou o time belga e, ao contrário, parece ter deixado o Parma desatento. Dois minutos após o tento emiliano, Daniele Zoratto foi pressionado na entrada da área e errou um passe simples, oferecendo um presentaço para Alexandre Czerniatynski. O belgo-polonês segurou a bola e, pegando a defesa gialloblù desarrumada, deu um belíssimo passe para Francis Severeyns finalizar na saída do goleiro Marco Ballotta. O responsável pelo empate, a propósito, era um velho conhecido do futebol italiano, pois passara uma temporada de altos e baixos no Pisa, em 1988-89.

Após dois gols marcados de maneira precoce, as equipes diminuíram o ritmo e o nervosismo normal de uma decisão mexeu com os jogadores. Poucos em campo, aliás, já haviam disputado uma final europeia: pelo lado do Parma, somente Di Chiara e o defensor belga Georges Grün; pelo Antwerp, Stojanovic, Czerniatynski e o meia Hans-Peter Lehnhoff. No frigir dos ovos, foi o time italiano que colocou a cabeça no lugar primeiro.

O Parma fez o segundo gol aos 30 minutos, novamente a partir de uma bola levantada por Osio. O meio-campista fez jogada individual, atraindo Segers para o lado direito do ataque, e aproveitou a frouxa marcação do adversário para cruzar no costado da zaga, onde encontrou Melli. O centroavante cabeceou e, aproveitando outra saída errada do goleiro Stojanovic, deixou os italianos na frente mais uma vez.

Uma entrada dura de Di Chiara, que levou o primeiro amarelo do jogo, fez as coisas esquentarem, mas rapidamente o árbitro controlou a partida. O Antwerp, por sua vez, não se entendia no ataque e tomava muitas decisões erradas na hora de finalizar. O Parma respondia com perigo através da bola parada. Numa jogada ensaiada a partir de falta no meio-campo, o crociati até marcaram, mas Melli estava em posição de impedimento ao concluir e o gol foi anulado.

Já anoitecia quando Cuoghi definiu o triunfo do Parma sobre o Antwerp (Allsport)

No segundo tempo, o Parma parecia jogar no Tardini, devido à tranquilidade que tinha para avançar e atacar, principalmente com Melli. Compensando a atuação apagada de Tomas Brolin, o centroavante poderia ter anotado uma tripletta, caso não tivesse desperdiçado tantas oportunidades. Em uma dessas chances perdidas, Stojanovic foi rápido para evitar o arremate, dividindo com o atacante. Já o Antwerp só ameaçou na bola parada: num escanteio, Wim Kiekens subiu mais alto do que os rivais e cabeceou rente à trave parmense.

A partida seguiu nessa toada até os 84 minutos, quando o Parma desferiu o golpe de misericórdia no clube mais antigo da Bélgica. A frouxa abordagem do Antwerp permitiu que Grün recebesse na altura da linha do meio-campo e tivesse todo o tempo do mundo para pensar o que fazer com a bola. Sem pressão, o defensor viu a infiltração do meia Stefano Cuoghi e, contando com a falha de marcação de seus compatriotas, lançou para o colega dominar, com liberdade, e finalizar no contrapé de Stojanovic. Os vermelhos ainda tentaram diminuir com boa enfiada de Kiekens para Lehnhoff, mas Marco Ballotta evitou o gol.

Com a sua primeira taça europeia, o Parma já tornava inesquecíveis os seus anos 1990: afinal, o time que zanzava apenas entre a segunda e a terceira divisões de seu país até o início da década agora podia celebrar a conquista de um troféu continental. No decênio seguinte, os crociati ainda seriam bicampeões da Copa Uefa, ganhariam uma Supercopa Uefa, uma Supercopa Italiana e faturariam mais duas copas nacionais, além de um vice da Serie A. A trajetória de sucesso estava apenas começando.

Parma 3-1 Antwerp

Parma: Ballotta; Grün, Minotti, Apolloni; Benarrivo, Osio (Pizzi), Zoratto (Pin), Cuoghi, Di Chiara; Melli, Brolin. Técnico: Nevio Scala.
Antwerp: Stojanovic; Kiekens, Broeckaert, Taeymans, Smidts; Jakovljevic (Van Veirdeghem), Van Rethy, Lehnhoff, Segers (Moukrim); Severeyns, Czerniatynski. Técnico: Walter Meeuws.
Gols: Minotti (9′), Melli (30′) e Cuoghi (84′); Severeyns (11′)
Árbitro: Karl-Josef Assenmacher (Alemanha)
Local e data: Wembley, Londres (Inglaterra), em 12 de maio de 1993

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