A história do futebol é repleta de jogadores que obtiveram grandes feitos apesar de travarem uma intensa batalha contra as contusões. O lateral-direito Sime Vrsaljko foi um deles. Dono de boa passagem pela Serie A, onde defendeu Genoa, Sassuolo e Inter, o atleta integrou da seleção da Croácia vice-campeã mundial em 2018 e acabou se aposentando precocemente, devido a uma sequência de lesões no joelho.
Sime é de uma família ligada à política. Um de seus bisavôs colaborava com a Ustasha, organização paramilitar que mantinha um estado-fantoche nazista na Croácia e, por isso, foi assassinado pelos partisans que libertaram a região durante a II Guerra Mundial, na década de 1940. Já nos anos 1990, Svemir, seu tio paterno, foi comandante de batalhão de uma força especial na Guerra de Independência Croata e, após a separação do país da Iugoslávia, virou vice-prefeito de Benkovac.
Vrsaljko em 1992, nasceu durante o conflito, enquanto seus genitores se refugiaram dos bombardeiros em Rijeka, cidade que a cerca de 70 quilômetros de Trieste, no nordeste da Itália. O lateral cresceria mais ao sul, em Zadar, e lá daria seus primeiros passos no futebol por influência de seu pai. Mladen era zagueiro do homônimo time local, que disputava a máxima divisão croata.
Bem mais talentoso que seu pai, Sime foi descoberto pelo Dinamo Zagreb quando tinha 14 anos e foi agregado às respeitadas categorias de base da agremiação da capital croata. O lateral-direito teve a chance de estrear como profissional aos 17, no Lokomotiva, um clube-satélite dos azuis que também disputava a primeira divisão. Bastaram apenas seis meses de empréstimo para convencer os diretores do maior time da Croácia a repatriá-lo.
Com a camisa do Dinamo, Vrsaljko entrou para o rol das maiores revelações do país e, aos 19 anos, estreou pela seleção principal croata, numa vitória por 4 a 2 em amistoso contra a Chéquia – obviamente, já era figurinha carimbada nas equipes de base. Sime também sentiu o gostinho de debutar na Champions League e integrou, na condição de reserva não utilizado, o elenco da Croácia na Euro 2012. Depois de chegar a rejeitar uma proposta do Marseille, o time de Zagreb negociou o lateral com o Genoa, em julho de 2013. O valor da transação foi de 4,6 milhões de euros.
Aos 21 anos, Vrsaljko chegou à Itália cercado de expectativas e correspondeu a elas na temporada de debute na Bota, mostrando razoável arcabouço defensivo e ótimas qualidades no apoio, graças a sua velocidade, à eficácia nos cruzamentos e à facilidade de chegar até a linha de fundo. Apesar disso, os primeiros momentos do lateral no Genoa foram complicados: o time não se acertou sob o comando de Fabio Liverani, que já estreou com eliminação na fase preliminar da Coppa Italia para o Spezia, rival local. Sime atuou naquela partida e em cinco das outras seis que o técnico fez pelos grifoni. Mas nem mesmo a vitória por 3 a 0 no clássico contra a Sampdoria, no qual o croata forneceu assistência para o gol de Emanuele Calaiò, seguraram o comandante no cargo.
Sob o comando de Gian Piero Gasperini, que iniciou a sua segunda passagem pelo Genoa ao substituir Liverani, Vrsaljko deixou de atuar como lateral-direito e avançou um pouco no campo, passando a jogar como ala destro no 3-4-3 do novo treinador. Por ali, se tornou um dos melhores jogadores do campeonato no setor e colecionou 22 aparições na Serie A: foi escalado quase sempre que esteve apto fisicamente, já que uma inflamação no joelho o tirou de ação por várias rodadas.
Depois de ajudar o Genoa a ficar na 14ª posição da Serie A, o lateral foi convocado para representar a Croácia na Copa do Mundo de 2014, disputada no Brasil. Sime atuou na estreia, em derrota por 3 a 1 ante os anfitriões, e também no tropeço pelo mesmo placar ante o México, ficando de fora do terceiro compromisso dos xadrezes, já eliminados, porque o técnico Niko Kovac quis dar uma chance a atletas menos utilizados. O fato é que Vrsaljko pouco pode mostrar na competição por ter sido escalado pelo treinador como titular no flanco esquerdo, no lugar de Danijel Pranjic.
Na volta à Itália, Vrsaljko não se transferiu para um clube maior, como era esperado. Ao contrário, fechou com o Sassuolo, que faria apenas a sua segunda campanha na Serie A. Só que Sime foi a contratação mais cara dos neroverdi naquela janela – custou 5,5 milhões de euros – e entendeu que o projeto do time emiliano era interessante para a maturação de um jovem. A sua escolha se revelaria acertada.
Mesmo que algumas lesões musculares tenham atrapalhado o seu rendimento em 2014-15, o croata forneceu quatro assistências nas 23 partidas que realizou. Dessa forma, Sime acabou sendo um dos bons nomes que fizeram o time treinado por Eusebio Di Francesco concluir a Serie A na 12ª posição e ostentando o posto de sensação do certame. Além de Vrsaljko, brilharam também Andrea Consigli, Francesco Acerbi, Paolo Cannavaro, Francesco Magnanelli, Domenico Berardi, Nicola Sansone e Simone Zaza.
Em 2015-16, o Sassuolo, que já havia sido sensação da Serie A anterior, ligou o modo turbo e decolou para a sexta posição do campeonato, deixando figurões como Milan e Lazio para trás. Com isso, o time de Di Francesco garantiu uma vaga na Liga Europa em sua terceira temporada na elite. Um feito e tanto, e com participação decisiva de Vrsaljko, que atingiu a consagração definitiva durante aquele ano.
Na histórica campanha do Sassuolo, Sime assumiu papel de protagonista, compensando o desempenho mesmo brilhante de Berardi, que atuava no mesmo lado direito do gramado. Vrsaljko disputou 35 das 38 rodadas, forneceu quatro assistências e ainda ajudou a retaguarda neroverde a sofrer apenas 40 gols, sendo a quarta menos vazada do certame. Sem dúvidas, aquela foi a melhor temporada de sua carreira e, figurando no grupo dos melhores laterais do futebol italiano, o croata não demorou a alçar voos mais altos.
Após representar a Croácia na Euro 2016, numa campanha em que os xadrezes foram eliminados nas oitavas por Portugal, que se sagraria campeão, Vrsaljko foi anunciado como reforço do Atlético de Madrid. Os colchoneros pagaram cerca de 18 milhões de euros pelo lateral, que deixaria o Sassuolo após 59 aparições. Contudo, seria na Espanha que o jogador daria início a uma espécie de via-crúcis.
Vrsaljko chegou ao Atleti para ser reserva do veterano Juanfran, mas conseguiu ganhar a posição na equipe de Diego Simeone em meados da temporada 2016-17. Só que, quando começava a se consolidar com a camisa rojiblanca, sofreu uma séria lesão, que comprometeu a integridade de dois ligamentos de seu joelho esquerdo. Sem o croata na reta final da campanha, o time madrilenho foi semifinalista da Champions League e da Copa do Rei, além de terceiro colocado em La Liga.
O croata ficou de molho até a temporada seguinte, que ainda foi parcialmente comprometida por lesões menores, associadas à contusão principal. Quando voltou, reassumiu a titularidade, mas sem a mesma convicção de antes – inclusive, ficou marcado por uma tola expulsão com apenas 10 minutos de jogo contra o Arsenal, pela ida das semifinais da Liga Europa. O Atlético de Madrid superou os Gunners mesmo assim e, depois, se sagrou campeão.
Ao fim da temporada, Sime se juntou à Croácia e foi titular dos vatreni na histórica campanha realizada na Copa do Mundo de 2018 – aliás, durante a repescagem das eliminatórias europeias, o lateral já havia fornecido duas assistências primordiais para que a sua seleção derrotasse a Grécia por 4 a 1. Os croatas foram vice-campeões na Rússia e Vrsaljko contribuiu com uma assistência para Ivan Perisic marcar o primeiro na dramática vitória por 2 a 1 sobre a Inglaterra, nas semifinais.
O bom desempenho de Vrsaljko no Mundial lhe revalorizou e fez a Inter buscá-lo por empréstimo avaliado em 6,5 milhões de euros – além de opção de compra de 17,5 mi. Sime já havia sido sondado pela Beneamata quando ele defendera Genoa e Sassuolo, mas dessa vez teve a transferência incentivada pelos compatriotas Perisic e Marcelo Brozovic. Em Milão, ganhou a camisa 2 nerazzurra, anteriormente utilizada por ídolos como Giuseppe Bergomi e Iván Córdoba, e largava com vantagem sobre Danilo D’Ambrosio para ser titular da equipe treinada por Luciano Spalletti.
Apesar disso, logo nos primeiros meses de Inter, o joelho de Vrsaljko deu sinal de que lhe trairia novamente e o fez perder seis partidas. O lateral já vinha jogando com dores desde a Copa do Mundo e, segundo Boris Nemec, médico da seleção croata, o tratamento da lesão ligamentar não havia sido feito de forma correta pelo Atlético de Madrid.
Sime voltou a jogar pela Inter em outubro de 2018 e até colecionou boas atuações. Até que, em janeiro de 2019, não aguentou mais a agonia causada pelas dores persistentes e decidiu operar o joelho, encerrando a sua trajetória em nerazzurro com 13 aparições, duas assistências e pequena contribuição para o quarto lugar conquistado pela equipe na Serie A.
Vrsaljko só voltou a atuar profissionalmente em janeiro de 2020, já pelo Atlético de Madrid. E jogou muito pouco até 2022: foram somente 49 partidas. Nesse período, inclusive, teve que operar o joelho outra vez, por conta de uma infecção bacteriana. O calvário não tinha fim.
Durante sua segunda passagem pelos colchoneros, Sime ainda pode comemorar o título de La Liga, em 2021. Depois da conquista, representou a Croácia na Eurocopa e, do banco, viu os xadrezes serem eliminados nas oitavas de final, pela Espanha.
No verão europeu de 2022, Vrsaljko assinou um contrato de três temporadas com o Olympiacos, da Grécia. Pouco depois, anunciou a sua aposentadoria da seleção croata, renunciando à participação na Copa do Mundo. Talvez fosse um prenúncio do que viria pela frente.
Apesar do vínculo trienal, Sime e o clube de Piraeus optaram pela rescisão amigável em novembro de 2022, nove partidas após a firma. A razão? Problemas físicos. O mesmo motivo que faria o lateral pendurar as chuteiras, em março de 2023, aos 31 anos. Precocemente, Vrsaljko colocava ponto final numa carreira com grandes feitos, mas que poderia ter sido ainda mais impactante se as lesões não tivessem sido tão graves e constantes.
Sime Vrsaljko
Nascimento: 10 de janeiro de 1992, em Rijeka, Croácia
Posição: lateral-direito
Clubes: Lokomotiva Zagreb (2009), Dinamo Zagreb (2009-13), Genoa (2013-14), Sassuolo (2014-16), Atlético de Madrid (2016-18 e 2019-22), Inter (2018-19) e Olympiacos (2022)
Títulos: Campeonato Croata (2010, 2011, 2012 e 2013), Supercopa da Croácia (2010), Copa da Croácia (2011 e 2012), Liga Europa (2018) e La Liga (2021)
Seleção croata: 52 jogos