Considerando todas as edições do Derby della Capitale entre Lazio e Roma, nenhuma se compara à decisão da Coppa Italia da temporada 2012-13. Afinal, até a elaboração deste texto, a partida representa a única final realizada entre as duas equipes em toda a história. E, no fim das contas, naquele dia 26 de maio de 2013, o Olímpico se coloriu de biancoceleste.
Diferentemente dos dérbis de Turim, entre Juventus e Torino, e de Milão, entre Inter e Milan, o clássico da capital italiana nunca tinha ocorrido numa final de campeonato até 2013 – algo curioso, se lembrarmos que o primeiro confronto entre Lazio e Roma data de 1929. Mas a verdade é que raramente os duelos citadinos geraram decisões da Coppa Italia: Juve e Toro definiram o título somente em 1938, quando os bianconeri levantaram o troféu. Já em 1977, quando o Diavolo bateu a Beneamata, foi realizado o único Derby della Madonnina na finalíssima da competição.
Em 2012-13, Roma e Lazio vinham em momentos bem diferentes de suas trajetórias enquanto agremiações. De um lado, a Loba estava no segundo ano da gestão do grupo formado por empresários norte-americanos de origem italiana, e assistia aos primeiros meses de presidência de James Pallotta, em substituição a Thomas DiBenedetto.
O novo cartola contratou o lendário Zdenek Zeman para substituir Luis Enrique, que conduzira os giallorossi ao sétimo lugar da Serie A e fora incapaz de se classificar a um torneio continental – além de ter dado continuidade aos investimentos no elenco. O técnico checo tinha moral na Cidade Eterna pelo que fizera na Roma na década de 1990, mas sua passagem foi infrutífera e conturbada, de modo que a sua demissão foi sacramentada em fevereiro de 2013, após uma sequência de maus resultados. Aurelio Andreazzoli, um de seus auxiliares, foi escolhido para comandar a Loba até o fim da temporada, e logo mudou o esquema da equipe: deixou o 4-3-3 e optou pelo 4-2-3-1, recuando Francesco Totti para atuar como camisa 10.
A Lazio, por sua vez, estava perto de completar a primeira década de presidência de Claudio Lotito. Com mão de ferro e muitas apostas econômicas, o cartola controlou os problemas financeiros da agremiação e a manteve entre as postulantes por vagas europeias através da Serie A e na briga por títulos de copas. Em 2011-12, último ano daquela passagem de Edoardo Reja pela capital, os celestes ficaram na quarta posição do Italiano e se garantiram na Liga Europa. O suíço Vladimir Petkovic assumiu o comando e, em 2012-13, levou os aquilotti até as quartas de final, fase em que caíram frente ao Fenerbahçe.
Finalistas da Coppa Italia, Roma e Lazio haviam feito campanhas muito similares na Serie A. A Loba foi sexta colocada, com 62 pontos, e as águias, com um pontinho a menos, ficaram logo atrás – curiosamente, com rendimento bem parecido, os biancocelestes haviam abocanhado o quarto lugar no ano anterior. O fato é que a decisão do mata-mata nacional representava uma tábua de salvação para a dupla: além de ser símbolo da vitória sobre a rival, o troféu dava vaga na fase de grupos da Liga Europa. De quebra, a vencedora deixaria a adversária de mãos abanando.
Com tanto em jogo no temperadíssimo dérbi capitolino que valia um título pela primeira vez, os dois treinadores fizeram algumas escolhas de caráter mais defensivo. Na Roma, Andreazzoli modificou muito o elenco em relação ao clássico anterior, disputado em maio de 2013. Sem Maarten Stekelenburg, lesionado, teve de escalar Bogdan Lobont no gol. Além disso, mexeu no esquema tático e deixou um 4-3-1-2 que se mostrou muito permissivo aos avanços da arquirrival e optou pelo 4-2-3-1, sacando Miralem Pjanic e Alessandro Florenzi para dar lugar a Marquinho na ponta esquerda e Mattia Destro no comando do ataque. Na lateral direita, Marquinhos, normalmente zagueiro, tomou o posto de Vasilis Torosidis, enquanto Nicolás Burdisso foi fazer a zaga com Leandro Castán. Daniele De Rossi e Totti, obviamente, eram inamovíveis.
Na Lazio, Petkovic manteve o 4-1-4-1 que dominou a Roma e por muito pouco não deu os três pontos aos celestes – por alguns detalhes, o dérbi acabou empatado em 1 a 1. Recuperado de lesão num dos músculos adutores da coxa, André Dias não voltou à equipe titular, já que o albanês Lorik Cana tinha melhor saída de bola. O jovem volante Ogenyi Onazi foi preferido em relação ao capitão Stefano Mauri, pois era mais veloz e eficiente na marcação, de modo que podia dobrar encaixes com Cristian Ledesma, herdeiro da braçadeira e homem mais recuado no meio-campo. Hernanes coordenava a criação pelo centro, enquanto Antonio Candreva e Senad Lulic atacavam os flancos. Na frente, Miroslav Klose era o responsável por definir as jogadas.
Com capacidade reduzida, o estádio Olímpico recebeu cerca de 55 mil pessoas sedentas por um jogo eletrizante e disputado até o último segundo. A realidade, porém, foi um pouquinho diferente: até por conta das escolhas dos treinadores, o clássico foi truncado. Os nervos à flor da pele, comuns no Derby della Capitale, também marcaram presença. Só no primeiro tempo, cinco jogadores já tinham recebido cartão amarelo – Marquinho e Federico Balzaretti pelo lado giallorosso, Ledesma, Hernanes e Klose pelo celeste.
A etapa inicial também foi de poucas chances, apesar do início agitado. Logo aos 3 minutos, Lulic arriscou chute rasteiro de fora da área e Lobont espalmou para o lado. Klose tentou rebater para o gol, mas acertou o lado externo da rede. Aos 10, a Roma respondeu com boa infiltração de Michael Bradley, que finalizou para fora. Por fim, na marca dos 35, o centroavante alemão da Lazio cabeceou forte e o arqueiro romeno conseguiu defender à queima-roupa.
Na volta dos vestiários, as defesas continuaram trabalhando bem e deixando os atacantes isolados – além disso, a tensão seguia nas alturas. Ainda no início do segundo tempo, porém, Ledesma saiu machucado e Petkovic optou por deixar a sua equipe um pouco mais ofensiva, pondo Mauri em seu lugar e recuando Onazi. Dali em diante, a Lazio intensificou os ataques pelos flancos e, numa infiltração do meia recém-entrado, quase abriu o placar: aos 67 minutos, o camisa 6 recebeu cruzamento de Lulic e bateu cruzado, mas Klose não conseguiu empurrar para as redes.
O aumento de ritmo da Lazio resultou em seu momento de glória aos 71 minutos. Mauri e Candreva tabelaram até o ponta chegar na área adversária e efetuar um cruzamento a meia altura. Lobont espalmou a bola, mas, com isso, acabou impedindo o corte de Marquinhos, pego no contrapé. O brasileiro marcava Lulic, que ficou com a pelota amaciada e a baliza desguarnecida para, meio sem jeito, balançar as redes. Em sua segunda temporada vestindo a camisa biancoceleste, o bósnio já era benquisto pela torcida, mas ali, naquele momento, virou um ícone da agremiação.
A Roma ainda tentou reagir de imediato. Logo depois do gol, Totti cobrou uma falta na área e, após raspada de Destro, a bola bateu no travessão e ficou com o goleiro Federico Marchetti que quase empatou o jogo. Andreazzoli fez alterações e mudou o esquema tático da equipe para atuar com dois homens de área – Destro e Pablo Daniel Osvaldo, que substituiu Balzaretti –, mas os giallorossi não conseguiam oferecer perigo. Dali em diante, foi a Lazio que levou mais perigo, já no finalzinho, quando Mauri teve a chance de ampliar e a desperdiçou com chute em cima de Lobont.
Quando o árbitro Daniele Orsato apitou pela última vez, os aquilotti já estavam em festa. Ganhar aquele título em pleno estádio Olímpico, em cima da maior rival, talvez valesse mais do que os dois scudetti conquistados pela equipe anteriormente. Exageros à parte, certamente a sexta Coppa Italia obtida pelos biancocelestes foi a mais saborosa de todas.
Não à toa, a conquista de 2013 foi celebrada uma década depois, quando a Lazio reuniu a maior parte do elenco campeão e ainda utilizou uma camisa especial na vitória por 3 a 2 sobre a Cremonese, na Serie A – a partida ainda marcou a despedida do futebol de Stefan Radu, atleta com mais aparições pela equipe biancoceleste e titular da lateral esquerda naquele dérbi capitolino. Antes disso, os aquilotti ainda faturaram mais uma Coppa Italia e duas Supercopas Italianas.
Para a Roma, a derrota caiu muito mal para além de ter sido perpetrada por sua arquirrival. Afinal, a Loba não ganhava nada desde 2008 e conservaria o jejum até 2022, quando a trupe de José Mourinho faturou a Conference League. Os giallorossi sequer disputaram outra final até conquistarem a sua primeira taça de um torneio Uefa – o que significa que a queda para a Lazio foi a última decisão de Totti e De Rossi. Para o deleite dos laziali, até se aposentarem, os craques romanistas tiveram de se contentar com três vice-campeonatos da Serie A.
Roma 0-1 Lazio
Roma: Lobont; Marquinhos, Burdisso, Leandro Castán, Balzaretti (Osvaldo); Bradley, De Rossi; Lamela, Totti, Marquinho (Dodô); Destro. Técnico: Aurelio Andreazzoli.
Lazio: Marchetti; Konko, Biava, Cana, Radu; Ledesma (Mauri); Candreva, Hernanes (González), Onazi (Ciani), Lulic; Klose. Técnico: Vladimir Petkovic.
Gol: Lulic (71’)
Árbitro: Daniele Orsato (Itália)
Local e data: estádio Olímpico, Roma (Itália), em 26 de maio de 2013
Teve show do Psy (cantor sulcoreano) antes que tomou uma vaia enorme!