Técnicos

O futebol italiano nunca viu alguém como Zdenek Zeman

Zdenek Zeman é um desses tipos que surgiram no país errado. Nascido na República Checa, tem estampado no rosto a marca da Itália, pois foi no Campeonato Italiano que ele alcançou sucesso. Seja com o marcante 4-3-3 ou com as críticas a outros treinadores, Zeman é um dos grandes admiradores do jogo bonito – em detrimento até mesmo do resultado da partida – e, como ele mesmo diz, gosta de divertir o público com seus times. Inovador, levou ao futebol movimentos pouco usuais, especialmente em saídas de bola.

A porta de entrada do checo na Itália foi a Sicília, para onde se mudou nos anos 1960. Em 1968, foi morar com o tio materno Čestmír Vycpálek, que jogou por Palermo e Juventus e também treinou os dois times. Seguiu a carreira do irmão da sua mãe e virou técnico. Após comandar times amadores da Sicília e os juvenis do Palermo, ganhou uma chance em um time profissional.

Entre 1983 e 1986 ele treinou o Licata na Serie C2 (quarta divisão) e o levou à Serie C1 (terceira). Depois disso, foi treinador de Foggia, Parma e Messina, mas acumulou fracassos. No início da temporada 1989-90, Pasquale Casillo, presidente do Foggia, o recontratou para tirar o time da C1. Foi então que a equipe pugliese viveu seus dias mais gloriosos no futebol italiano.

Com um futebol arrojado, marcando por pressão, fazendo linhas de impedimento e em um 4-3-3 que ficou conhecido como Zemanlandia, o Foggia precisou de três temporadas para voltar à Serie A. Naquele time, que contava com os até então desconhecidos Giuseppe Signori, Francesco Baiano e Roberto Rambaudi, a ascensão foi tão meteórica que ficou conhecida como “O Milagre de Foggia”.

Zeman conseguiu verdadeiros milagres com o Foggia (imago)

Naqueles anos, parecia que Zeman levava um universo paralelo pra jogar nos campos italianos. Era um futebol divertido, mas que nem sempre funcionava. Como exemplo histórico, ficará a derrota em casa, por 8 a 2, para o Milan de Fabio Capello, na última rodada da temporada 1991-92.

Durante a era de ouro do Foggia, o tcheco trabalhou com Rambaudi, Di Biagio, Shalimov, Chamot, Petrescu e Kolyvanov. Após bater na trave por diversas vezes para alcançar a disputa da Copa da Uefa, Zeman deixou a equipe no final da temporada 1993-94. Os satanelli foram rebaixados no ano seguinte e nunca mais voltaram à primeira divisão.

Na Lazio, o vice-campeonato na temporada de estreia (com outro 8 a 2 marcante, agora sobre a Fiorentina) e a terceira colocação em 1995-96 não foram suficientes para segurar Zeman no comando da equipe. Em janeiro de 1997, foi demitido. Neste período, o técnico boêmio lançou um dos grandes zagueiros do futebol mundial, Alessandro Nesta.

Depois da queda, o treinador continuaria na capital italiana, desta vez para assumir a Roma, equipe que tinha um talentoso jovem meio-campista que viria a ser seu maior ídolo histórico, Francesco Totti. Foi Zeman quem lhe deu a faixa de capitão e apurou seu faro artilheiro. Sem um vasto elenco e mais jogadores de ponta, em duas temporadas conseguiu apenas um quarto e um quinto lugar. Acabou sendo substituído por Fabio Capello em 1999. Mas uma declaração mudou para sempre seu destino no futebol italiano.

Gascoigne e Zeman: para não faltar polêmica (Allsport)

Em julho de 1998, Zdenek Zeman acusou a Juventus de dar esteroides aos seus jogadores e disse que Gianluca Vialli e Alessandro Del Piero ganharam massa muscular muito rápido. Luciano Moggi, então diretor da Velha Signora, iniciou uma caçada para manchar a imagem do treinador na Itália, segundo alguns jornais da época. Depois da polêmica, Zeman demorou a repetir outro grande trabalho. Passou, sem sucesso, por Fenerbahçe (Turquia), Napoli (à época de Edmundo), Salernitana, Avellino, Lecce, Brescia e Estrela Vermelha (Sérvia).

Após algumas especulações, Zeman voltou ao Foggia para a temporada 2010-11, a convite de Pasquale Casillo, que recomprou o clube e o rebatizou de Unione Sportiva Foggia. A equipe está na Serie C1, mesmo lugar onde Zeman a encontrou pela segunda vez, em 1989. Tudo para tentar uma nova ascensão meteórica. Tudo por um novo “Milagre de Foggia”, que quase chegou: o time ficou a um passo dos play-offs. Neste ano na Puglia, deu espaço a diversos jovens, dentre os quais Lorenzo Insigne e Marco Sau, que chegaram à seleção principal da Itália.

Zeman e Totti, uma relação duradoura (Bartoletti)

No ano seguinte, na segundona, voltou a fazer ótimo trabalho, e novamente tornando jovens protagonistas. O checo montou um Pescara muito insinuante, que tinha novamente em Insigne um dos destaques, ao lado dos também jovens Ciro Immobile e Marco Verratti. Assim, Zeman levou a equipe do Abruzzo de volta à Serie A após uma década. Por este trabalho, ganhou o prêmio Panchina d’Argento, dado ao melhor treinador da categoria.

A volta por cima do boêmio fez com que ele tivesse outra chance em uma equipe grande. A história construída na Roma foi o suficiente para que a diretoria norte-americana do clube da capital desse a Zeman a chave para que ele fizesse a equipe voltar a jogar bem, após dois campeonatos de decepções. A nova experiência, porém, durou apenas seis meses, e o checo foi demitido quando o time estava fora da zona de classificação às competições europeias. De bom, só a utilização de Alessandro Florenzi, que vai se constituindo como bandeira da equipe romana.

Depois de um ano sabático, Zeman voltou a treinar uma equipe na elite ao tentar salvar o tradicional Cagliari da queda para a Serie B: não teve sucesso e foi demitido antes mesmo de o rebaixamento ser consumado. O boêmio ainda teve uma breve passagem pelo Lugano, da Suíça, e viria a comandar um time da primeira divisão italiana no fim da temporada 2016-17. Zdenek assumiu um Pescara em queda livre e amargou um descenso inevitável antes de adicionar outra demissão a seu currículo. No entanto, quando dirigia os biancazzurri, pode celebrar um feito daqueles: ultrapassou os 1000 jogos como técnico.

*Texto original de 2010, atualizado em 2020.

Zdenek Zeman
Nascimento: 12 de maio de 1947, em Praga, Chéquia
Clubes: Licata (1983-86), Foggia (1986-87, 1989-94 e 2010-11), Parma (1987-88), Messina (1988-89), Lazio (1994-97), Roma (1997-99 e 2012), Fenerbahçe (1999-2000), Napoli (2000), Salernitana (2001-03), Avellino (2003-04), Lecce (2004-05 e 2006), Brescia (2006), Estrela Vermelha (2008), Pescara (2011-12 e 2017-18), Cagliari (2014-15) e Lugano (2015-16)
Títulos: Serie B (1991 e 2012) e Serie C2 (1985)

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