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Maior artilheiro do Torino, Paolino Pulici foi vital para o último scudetto grená

No final de 1976, o então zagueiro Berti Vogts tinha em seu currículo uma Eurocopa e uma Copa do Mundo – esta última, conquistada como titular da Alemanha Ocidental. Também era uma das bandeiras do Borussia Mönchengladbach, que vivia sua era de ouro e já havia levantado uma penca de Bundesligas e uma Copa Uefa. Não era qualquer um que podia encará-lo com tanta determinação e acinte. Como mostra a foto acima, o atacante Paolino Pulici era um dos poucos que se sentiam capazes de desafiá-lo. Três vezes artilheiro do Campeonato Italiano e maior goleador da história do Torino, Puliciclone foi um dos principais avantes daquela época.

Um dos motivos que fizeram Paolino receber o apelido de “ciclone” foi a sua velocidade: ele afirma que era capaz de correr 100 metros em 10,5 segundos, mesmo que tenha começado a fumar aos 14 anos. A ligeireza que apresentava desde menino, no entanto, acabou impedindo que ele fosse jogar na Inter.

Então com 15 anos, o garoto saiu do vilarejo de Roncello, localizado entre as cidades de Monza e Bérgamo, e viajou 20 quilômetros até Rogoredo, onde haveria uma peneira nerazzurra. O dia era especial, já que a Beneamata enviou o técnico Helenio Herrera, o treinador dos juvenis, Giovanni Invernizzi, e um séquito de auxiliares. A avaliação dos olheiros, no entanto, foi dura: segundo o grupo, Pulici se daria melhor se praticasse atletismo.

Descartado pela Inter, Paolino conseguiu uma vaga nas categorias de base do Legnano, então na Serie C. Ao mesmo tempo, para ajudar a família, o adolescente mantinha um trabalho como ajudante numa pequena fábrica de molas em sua cidade natal. Em 1967, pouco depois de sua estreia pela terceira divisão, surgiu a oportunidade que mudaria sua vida: uma oferta do Torino. Aos 17 anos, Pulici se mudou para o Piemonte, mas fez o dono da oficina lhe prometer que teria seu emprego de volta se, dentro de um ano, as coisas não dessem certo na agremiação granata. Não foi necessário.

Pulici e Graziani formaram uma dupla muito prolífica no Torino das décadas de 1970 e 1980 (LaPresse)

Os primeiros passos de Pupi na base do Torino foram felizes. O atacante venceu por duas vezes o Campeonato Primavera, para jogadores com menos de 19 anos, e foi integrado ao elenco principal pelo técnico Edmondo Fabbri em março de 1969. Em seu segundo jogo pelo Toro, Pulici precisou de apenas sete minutos para marcar o seu primeiro gol. A vítima? A Inter.

O mar de rosas do início da passagem de Pulici pelo Torino se encerraria ali. Nos três anos seguintes, o atacante jogou 98 partidas, mas só marcou 16 gols – grande parte deles nas fases preliminares da Coppa Italia, competição que o Torino até conquistou, em 1971. Nem mesmo um novo tento diante da Inter e um outro decisivo, contra a Juventus, mudaram a sua relação com a torcida.

O diagnóstico da comissão técnica era de que Pupi não tinha serenidade para finalizar. Dessa forma, em 1972, o treinador Gustavo Giagnoni decidiu afastá-lo do plantel principal e fez com que Paolino se dedicasse a treinos intensivos de finalização por dois meses. Ainda que tivesse a consciência de que aquilo era para seu bem, Pulici deu um passo atrás a contragosto e assistiu de longe o Torino ser vice-campeão italiano.

Voltar a trabalhar com Oberdan Ussello, no entanto, salvou a carreira do atacante. O ex-jogador, que fora seu técnico na base, aperfeiçoou os arremates de Paolino: embora fosse destro, começou a usar mais a perna esquerda e passou a gerar dúvidas nos marcadores. Também virou o batedor de pênaltis oficial da equipe. Dali em diante, Pupi ganharia de Gianni Brera o apelido de Puliciclone e entraria para a história do Torino – motivo pelo qual se declara eternamente grato a Giagnoni e Ussello.

Depois de momentos difíceis, Pulici se consolidou e, com a conquista do scudetto, virou ídolo do Torino (Ansa)

Os resultados dos treinamentos intensivos se fizeram sentir logo na temporada 1972-73. Na quinta rodada do campeonato, o Torino encontrava a Juventus e Pulici já tinha três gols marcados: foi a cinco com dois gols da entrada da área, ambos com a canhota anteriormente descalibrada, e decidiu o clássico. No segundo deles, Pupi encobriu Dino Zoff e anotou aquele que considera o tento mais bonito da carreira.

Puliciclone continuou marcando gols em profusão naquela Serie A e voltou a castigar a Inter e a própria Juve, que seriam duas de suas principais vítimas na carreira: foram nove contra cada uma das gigantes, número menor apenas do que os anotados contra Bologna e Fiorentina (13). O Torino terminou a temporada na sexta posição, com a satisfação de ter ficado com uma vaga na Copa Uefa e de ter batido a campeã Juventus duas vezes, no turno e no returno. Pulici, pela primeira vez, se sagrou como artilheiro do certame: foram 17 gols, tal qual Gianni Rivera e Giuseppe Savoldi. Inevitavelmente, foi convocado à seleção italiana.

Em 1973-74, o Torino contratou Francesco Graziani, que seria o principal parceiro de Paolino pelo restante de sua carreira. Os dois se completavam de forma avassaladora e produziram uma das grandes duplas de ataque da história do futebol italiano: foram os primeiros gêmeos do gol. Com eles, o Toro passou a incomodar os grandes cada vez mais. Em boa fase, Pulici foi chamado para representar a Itália na Copa do Mundo de 1974, mas não entrou em campo na má campanha azzurra.

De volta a Turim, Pulici engatou nova artilharia da Serie A, com 18 gols anotados em 1974-75 – tendo jogado apenas 23 partidas, por conta de uma lesão. O ano seguinte, o da terceira artilharia, seria o melhor de todos, considerando, ainda, que Pupi contribuiu para que Graziani fosse o segundo maior goleador da competição.

Com ou sem Graziani a seu lado, Paolino era perigo constante para as defesas adversárias (LaPresse)

Sob as ordens de Luigi Radice, Paolino entrou em campo nos 30 jogos da campanha e anotou 21 tentos, sendo capaz de deixar uma tripletta em três ocasiões. O ciclone grená também marcou nos duelos contra a Juve, ajudou sua equipe a tomar a liderança no segundo confronto direto contra a Velha Senhora e, de quebra, foi o autor do gol que garantiu matematicamente o título do Torino, num empate contra o Cesena. O sétimo scudetto do Toro aconteceu 27 anos após a Tragédia de Superga e foi o único conquistado pelo clube após o desastre aéreo.

Nos dois anos seguintes, o Torino foi vice-campeão italiano e fez a sua única participação na Copa dos Campeões – acabou eliminado pelo Mönchengladbach, num duelo em que Vogts abusou de entradas duras. Pulici continuou marcando uma boa quantidade de gols, mas perdeu boa parte do protagonismo para Graziani, um pouco mais novo. Uma prova disso é que, mesmo convocado por Enzo Bearzot para a Copa de 1978, Puliciclone novamente não entrou em campo – seu companheiro de clube, ao contrário, jogou.

Após o Mundial da Argentina, Pulici foi perdendo sua importância no elenco do Torino gradativamente, conforme a idade ia chegando – fator provavelmente agravado pelo fato de ser fumante. O centroavante, que só voltaria a ter números razoáveis em 1978-79 e 1980-81, notava que não era mais insubstituível. Dessa forma, aos 32 anos, foi comunicado por Luciano Moggi que seria cedido para renovar o elenco – o clube, no entanto, contratou Franco Selvaggi, apenas dois anos mais novo. Com isso, após 15 temporadas no Piemonte, Puliciclone se despediu do Torino com 172 gols em 437 jogos. Até hoje, é o maior artilheiro do clube e o maior goleador grená no Derby della Mole, com nove bolas na rede.

Depois de brilhar pelo Torino, Paolino Pulici assinou com a Udinese, onde foi companheiro de Edinho. Aquele time não tinha um ataque poderoso – prova disso é que o defensor brasileiro foi o artilheiro, com sete gols, seguido por Pupi, com cinco – mas surpreendeu ao ficar com a sexta posição na Serie A. Foi a melhor campanha dos friulanos em 26 anos. Um desempenho que só viria a ser superado em 1997.

Durante 15 anos, Pulici foi sinônimo de Torino (Arquivo/Torino FC)

Além do único ano em Údine, Pulici teve ainda um biênio apagado na Fiorentina. Em Florença, o atacante foi reserva e só mostrou serviço mesmo na Coppa Italia. Longe do mesmo sucesso dos anos de Torino, Pupi decidiu se aposentar, aos 35 anos.

Até hoje, Puliciclone é um dos 30 maiores goleadores da história do campeonato, com 142 gols marcados. Sua média de bolas na rede foi de uma a cada 223 minutos. Uma proporção que caiu por causa dos primeiros e últimos anos de sua carreira: durante os cinco anos de ápice, entre 1972 e 1977, a média foi de um tento a cada 142.

Ao contrário de muitos ex-jogadores, Pulici não seguiu carreira nos maiores palcos do futebol após se aposentar. O lombardo até chegou a ser auxiliar técnico do Piacenza, mas depois de três anos se desiludiu com os bastidores do esporte. Preferia apenas jogar, numa época em que julgava ter menos ocupações extracampo. Desde 1990, Puliciclone dá aulas em uma escolinha que leva o seu nome, em Trezzo sull’Adda, nas cercanias de Milão. Além de formar jovens para o Tritium, pequeno clube local, Paolino também foi homenageado pelo Torino em 2014 e teve seu nome inserido no Hall da Fama grená.

Paolino Pulici
Nascimento: 27 de abril de 1950, em Roncello, Itália
Posição: atacante
Clubes: Legnano (1966-67), Torino (1967-82), Udinese (1982-83) e Fiorentina (1983-85)
Títulos conquistados: Campeonato Primavera (1968 e 1970), Coppa Italia (1968 e 1971) e Serie A (1976)
Seleção italiana: 19 jogos e 5 gols

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