Ser campeão mundial é um feito para poucos. Chegar ao topo do planeta enquanto defende um time pouco expressivo, que nunca havia disputado a elite de seu país, é para menos pessoas ainda. O clubinho fica ainda mais seleto quando acrescentamos uma terceira condição: ter sido rebaixado à segunda divisão poucos dias antes de alcançar a maior glória da carreira. Pedro Pasculli atende a todos os quesitos. O atacante foi um dos maiores jogadores do Lecce e, enquanto militava pelos salentinos, levantou a Copa de 1986 com a Argentina.
Pasculli desenvolveu sua trajetória à margem dos principais clubes dos países em que atuou. Natural de Santa Fé, o argentino deu seus primeiros passos no Colón, um dos times de sua cidade. Após dois anos de poucas oportunidades pelos sabaleros, Pedro ganhou mais chances em 1980, quando já tinha 20 anos, e marcou seis gols em 19 aparições na elite do futebol local. O atacante, então, acabou contratado pelo Argentinos Juniors.
Com a camisa do Bicho, PPP despontou. Pasculli teve dois primeiros anos razoáveis, nos quais anotou 13 gols no Campeonato Argentino, e veio a se tornar, nas quatro temporadas seguintes, um dos ícones da equipe de La Paternal – juntamente a Jorge Olguín, Enrique Vidallé, Mario Videla, Sergio Batista e Claudio Borghi. Pedro Paulo empilhou gols nos melhores anos da história do Argentinos Juniors: foram 21 em 1982 e 15 em 1983, antes de entregar a cereja do bolo.
O baixinho de Santa Fé marcou nove vezes no Torneio Nacional de 1984, sagrando-se máximo goleador, e foi o vice-artilheiro do Metropolitano, com 21. Dessa forma, Pasculli foi o grande nome da primeira taça conquistada pelo Bicho em sua história. O Argentinos Juniors repetiria a dose em 1985, com oito gols de PPP em 10 partidas, e iria à Copa Libertadores para ser o seu campeão e encarar a Juventus na final do Mundial Interclubes. Pedro, contudo, não participou dessa trajetória crescente e enfrentaria a Velha Senhora em outro torneio: a Serie A.
No verão de 1985, Pasculli recebeu uma oferta para rumar à terra de seus avós paternos: a Apúlia. Seus antepassados eram de Bitonto, mas Pedro aportou mais ao sul. Ao invés de se alocar na província de Bari, no “calcanhar” da Bota, o argentino foi para o seu “salto”. O destino era o Lecce, que estreava na Serie A depois do vice-campeonato na segundona.
Pasculli foi uma das principais contratações da equipe de Eugenio Fascetti. PPP, assim como o compatriota Juan Alberto Barbas, era um jogador da seleção argentina – o meio-campista, inclusive, atuara na Copa de 1982. A dupla chegava ao Via del Mare juntamente a Franco Causio, campeão do último mundial, e Luigi Danova, que também tinha passagem pela Nazionale italiana.
O jogador de Santa Fé começou sua trajetória no Lecce com gols na Coppa Italia, contra Salernitana e Pescara, mas não conseguiu fazer os salentinos avançarem no grupo. Na Serie A, o percurso foi mais tortuoso. Pasculli passou em branco durante todo o primeiro turno e só se livrou da “urucubaca” na rodada inaugural do returno, ante o Verona – que defendia o título e perdeu a partida por causa do seu gol. O argentino enfileirou alguns bons jogos nos meses iniciais de 1986 e chegou a anotar um tento no dérbi contra o Bari, mas não evitou a queda dos giallorossi. O Lecce ocupou a lanterna de ponta a ponta, aliás.
Apesar da campanha vexatória dos lupi, Pasculli foi levado para o Mundial de 1986 por Carlos Bilardo. PPP começou como titular, contra a Coreia do Sul, mas só atuou em mais uma partida da competição – e que partida. Nas oitavas de final, o chaveamento colocou a Argentina frente a frente com o Uruguai e Bilardo decidiu começar com o baixinho de Santa Fé naquele clássico platino.
O camisa 17 justificou a confiança depositada e, aos 42 minutos do primeiro tempo, aproveitou uma rebatida da defesa charrua para marcar o único gol da peleja e decretar a classificação portenha. Depois, a Argentina bateria Inglaterra, Bélgica e Alemanha Ocidental e ficaria com o bicampeonato mundial. Pasculli, que acabou tendo enorme importância para a conquista, deixou de ser convocado para a albiceleste em 1987, com apenas 27 anos.
Após a conquista do mundo, Pasculli permaneceu no Lecce – o que, por incrível que pareça, não era uma escolha tão absurda. É que naqueles tempos o futebol da Itália dominava o cenário de clubes europeu de tal forma que a Serie B era um campeonato mais forte do que as primeiras divisões de muitos países tradicionais. A forçada competição incentivava atletas de fora a atuarem por lá, pensando num trampolim para a elite – visto que havia limitação de dois estrangeiros por clube no país. PPP foi um dos nomes gabaritados que permaneceram na segundona e marcou nove gols, mas não conseguiu levar os lupi de volta à primeira divisão em 1986-87: o Lecce caiu no triangular de desempate com Cremonese e Cesena.
Depois dos 10 gols em 1986-87, Pasculli melhorou sua marca para 12 bolas nas redes e foi decisivo para devolver o Lecce à Serie A – como coadjuvantes importantes, a equipe ainda tinha Barbas e também Francesco Moriero e Marco Baroni. A equipe, treinada por Carlo Mazzone, ganhou o reforço de Ubaldo Righetti e viu Antonio Conte receber cada vez mais espaço. PPP ainda era o seu líder e fez valer esse status ao comandar os salentinos rumo a uma belíssima campanha.
A equipe de Mazzone era muito forte na defesa, mas pouco criativa. Aquele Lecce dependia basicamente das arrancadas, jogadas individuais e finalizações de Pasculli, que correspondia ao que o treinador pedia. Com sete gols, o argentino foi o artilheiro dos giallorossi, que conseguiram sua melhor classificação em toda a história – a nona posição. As vitórias sobre Napoli e Juventus foram símbolos daquela campanha e PPP deixou sua marca num desses jogos: fez o segundo no triunfo por 2 a 0 sobre a Velha Senhora.
Para 1989-90, o Lecce foi buscar o atacante Pietro Paolo Virdis, que fora campeão europeu pelo Milan. Pasculli manteve seu posto de líder do time e, com um parceiro de alto nível, teve sua temporada mais prolífica na elite: anotou nove vezes e contribuiu com a permanência dos salentinos.
A magia do Lecce acabou no verão de 1990, quando Mazzone deixou a Apúlia e o clube foi atrás de Zbigniew Boniek, que estreava como técnico. Inexperiente, o polonês não conseguiu obter bons resultados e conduziu os giallorossi ao rebaixamento – que foi confirmado na penúltima rodada, com uma derrota para a Sampdoria, então campeã. Pasculli até contribuiu com sete gols (um deles, no clássico contra o Bari, com um petardo), mas não foi suficiente.
Já em decadência física, o argentino ficou para a disputa de mais uma Serie B, mas não foi bem em 1991-92 – em 25 jogos, marcou apenas três vezes. Aos 32 anos, Pasculli encerrou sua passagem como jogador do Lecce com ótimos números: em 227 partidas oficiais, anotou 62 gols. PPP é o maior artilheiro estrangeiro dos salentinos, embora algumas fontes informem incorretamente que o uruguaio Ernesto Chevantón lhe teria ultrapassado.
Assim que deixou o Lecce, Pasculli voltou para a Argentina, mas não teve sucesso: defendeu o Newell’s Old Boys por apenas alguns meses e só entrou em campo cinco vezes. Em 1994, o atacante foi atuar na segundona japonesa e marcou 17 gols pelo PJM Futures, atual Sagan Tosu.
Após um ano de inatividade, PPP decidiu retornar à Itália e surpreendeu ao acatar a quinta divisão: disputou a competição amadora e ajudou a Casertana a subir para a quarta categoria. Em 1996-97, já como um autêntico gira-mundo, Pedro defendeu o Pelita Jaya, da Indonésia, e decidiu se aposentar.
Depois de pendurar as chuteiras e perder os cabelos, Pasculli voltou a morar na Itália. O ex-atacante treinou uma penca de times pequenos, como Virtus Entella, Verbania e Torres, e diversas agremiações amadoras. Numa dessas experiências pelo baixíssimo clero da Velha Bota, PPP levou a Horatiana Venosa ao título de um dos grupos da Eccellenza, a sexta categoria. A equipe gialloverde faturou a divisão regional da Basilicata.
Pasculli também rodou o mundo e passou pela seleção de Uganda e por Dinamo Tirana, da Albânia, e Bangor City, do País de Gales. Entretanto, não deixou a Apúlia e a Itália sumirem no retrovisor. O ex-jogador treinou as categorias de base do Lecce em 2013-14, passou pela Sambenedettese como consultor e pelo Lanciano como técnico, e também ocupou cargos diretivos em times amadores. Além disso, mantém residência na península salentina, onde é tratado como um verdadeiro rei.
Pedro Pablo Pasculli
Nascimento: 17 de maio de 1960, em Santa Fé, Argentina
Posição: atacante
Clubes como jogador: Colón (1977-80), Argentinos Juniors (1980-85), Lecce (1985-92), Newell’s Old Boys (1993), PJM Futures (1994), Casertana (1995-96) e Pelita Jaya (1996-97)
Títulos como jogador: Campeonato Argentino (1984 e 1985) e Copa do Mundo (1986)
Carreira como técnico: Virtus Entella (2000-01), San Pietro Vernotico (2001-02), Verbania (2002-03), Uganda (2003), Dinamo Tirana (2004-05), Horatiana Venosa (2006-07), Toma Maglie (2007-08), Paternò (2010-11), Cittanova Interpiana (2012), Bocale (2012-13), Torres (2017), Bangor City (2019-20) e Lanciano (2022)
Seleção argentina: 20 jogos e 5 gols
Belíssima matéria, parabéns, é uma pena que mesmo a Série B da velha bota não tenha mais a mesma atratividade de outrora, eu me diverti muito vendo a Série A durante meados da década de 90 nas transmissões da Band, onde desfilavam grandes craques como Zidane, Batistuta, Weah, entre outros.