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Angelo Pagotto chegou a colocar Gigi Buffon no banco, mas se afundou por causa da cocaína

Em outubro de 1997, Gianluigi Buffon iniciava a sua caminhada de 21 anos debaixo das traves na Squadra Azzurra. Cerca de 16 meses antes, porém, esquentava o banco enquanto outro goleiro brilhava no título da Euro Sub-21 em cima da Espanha. Era Angelo Pagotto, uma das promessas daquele grupo, ao lado dos garotos Francesco Totti, Fabio Cannavaro e Alessandro Nesta. Se, por um lado, as expectativas sobre o trio se cumpriram, o arqueiro viu a sua carreira desmoronar após decepcionar no Milan e, pouco depois, ser pego em exame antidoping.

Pagotto nasceu em Verbania, na região de Piemonte, e já defendia a seleção sub-18 enquanto militava pelo no time que leva o mesmo nome da cidade. Em novembro de 1991, chamou a atenção de olheiros do Napoli e se transferiu para a Campânia. A passagem pelo San Paolo durou pouco e o jovem jamais atuou entre os profissionais. Angelo somou atuações na equipe Primavera, correspondente à sub-19, e foi o terceiro goleiro do elenco adulto, chegando a esquentar o banco em 13 partidas.

Em 1994, o goleiro foi emprestado à Pistoiese, da Serie C1, e se tornou titular absoluto da olandesina. Pagotto atuou em todas as rodadas do certame e contribuiu de forma decisiva para o acesso da equipe laranja à segundona, de modo que despertou o interesse da Sampdoria – que, em 1994-95, havia sido oitava colocada da primeira divisão e semifinalista da Recopa Uefa. Em Gênova, teve a visibilidade necessária para despontar no futebol.

Bastou pouco tempo para o garoto convencer o técnico Sven-Göran Eriksson a lhe dar a vaga de Walter Zenga, ex-goleiro da seleção italiana, que acumulava problemas físicos: Pagotto teve a titularidade confirmada já na pré-temporada e ajudou a Samp a repetir o oitavo posto na Serie A. Sua oportunidade de ouro viria na Euro Sub-21, ao ser convocado por Cesare Maldini e receber a camisa 1.

Observado, do banco de reservas, por Buffon, o arqueiro doriano foi destaque na final vencida contra a Espanha. Pagotto simplesmente defendeu os pênaltis cobrados por Iván de La Peña e Raúl e se tornou o herói do título. Mas, curiosamente, Gianluca Pagliuca e Gigi, seu suplente, seriam os escolhidos para representarem a Itália na Olimpíada de Atlanta, dois meses depois. A justificativa? O então goleiro do Parma se beneficiaria da experiência do vice-campeão do mundo.

Pagotto conseguiu destaque pela Sampdoria, mas não conseguiu confirmar o bom rendimento nos anos seguintes (imago)

Em alta no mercado italiano, Pagotto já havia recusado uma proposta da Juventus, porque julgava que teria mais minutos na Sampdoria – o que, de fato, aconteceu, visto que fez 26 partidas pelos blucerchiati. Mas, em 1996, o piemontês aceitou defender o Milan. Um passo em falso.

Angelo não teve muitas chances sob o comando de Óscar Tabárez: reserva do veterano Sebastiano Rossi, só atuou em dois jogos da Coppa Italia. Após algumas falhas do camisa 1 e a demissão do técnico uruguaio, o lendário Arrigo Sacchi, que o substituiu, lhe ofereceu mais oportunidades. No entanto, Pagotto não conseguiu se firmar pelos rossoneri e limitou sua passagem pelo Milan a 11 jogos realizados.

Um novo empréstimo estava por vir, desta vez ao Empoli. Porém, Pagotto não conseguiu convencer o técnico Luciano Spalletti e, após três meses, decidiu jogar a segunda divisão para recuperar protagonismo. Em outubro de 1997, o arqueiro foi comprado pelo Perugia e, finalmente titular, participou diretamente do acesso dos biancorossi à Serie A.

Tudo parecia se reorganizar até o fantasma do banco de reservas assombrar o goleiro novamente. Ele voltou a frequentar a suplência depois da chegada de Andrea Mazzantini ao elenco dos grifoni. Além disso, foi acusado pelo presidente Luciano Gaucci de favorecer a Juventus em uma derrota por 4 a 3, na rodada inaugural da Serie A 1998-99. Chovia bastante, o que também dificultou o trabalho de Angelo Peruzzi, arqueiro adversário, mas o polêmico cartola, conhecido por não ter papas na língua, preferiu se apegar ao fato de Pagotto ser empresariado por Alessandro Moggi, filho de Luciano Moggi, diretor bianconero.

O clima ficou ruim para Angelo e ele passou metade da temporada emprestado à Reggiana, que terminou 1998-99 rebaixada à Serie C1. Mas o grande revés na carreira de Pagotto aconteceu às vésperas do seu aniversário de 26 anos, em 20 de novembro de 1999. Ele retornara ao Perugia e, após os grifoni enfrentarem a Fiorentina, ele e Hidetoshi Nakata – vendido uma semana depois para a Roma – foram submetidos a um exame antidoping. O japonês passou ileso, mas o goleiro testou positivo para cocaína. Ele sofreu uma punição de 20 meses e, de forma imediata, o clube da Úmbria rescindiu seu contrato.

Até hoje, porém, o ex-arqueiro se defende das acusações e alega que foi vítima de fraude. “Um investigador me disse que um crime havia sido cometido, mas não havia nenhuma arma fumegante [que pudesse servir de prova]. Fui demitido do Perugia por justa causa. Perdi um contrato importante e uma reputação. Eu sei a verdade e isso é o suficiente para mim. Quando estava errado, eu admitia. Mas dessa vez eu era inocente e vou repetir até morrer”, afirmou em entrevista à Gianluca Di Marzio.

O fracasso no Milan acabou sendo um catalisador para que a carreira de Pagotto fosse por água abaixo (Allsport)

Pagotto até tinha a opção de admitir a culpa e reduzir a pena para seis meses de gancho, mas não o fez. Segundo o goleiro, o teste não foi feito de acordo com as normas de segurança adequadas, o que poderia ter gerado contaminação (proposital?) das amostras. Em 2005, a hipótese ganhou força após o pedido de arquivamento do caso, mas o arqueiro já havia sido afetado. O processo também não foi extinto.

Dois anos depois de ter iniciado a cumprir a suspensão, o goleiro recomeçou na Triestina, pela Serie C1. Pagotto fez valer o aproveitamento excepcional nas divisões de acesso e liderou a equipe rumo à segundona, em 2002. Na temporada seguinte, entretanto, foi acometido por mais uma onda de azar: machucou o joelho e foi acusado de manipular partidas mais uma vez. Nesta ocasião, o denunciante também era presidente do clube que defendia – Amilcare Berti, que dirigiu a agremiação alabardata de 2000 a 2005.

Nada foi provado e, no verão de 2003, Angelo foi vendido ao Arezzo, fazendo seu retorno à Serie C1. E, adivinha? O arqueiro conquistou mais um acesso. Na sequência, como titular absoluto, ajudou os amaranto a se manterem na segunda divisão. O bom nível de atuações lhe abriu as portas do Torino, que almejava a promoção à elite após ter superado um confuso processo de falência. O time grená subiu, mas o reserva, então com 32 anos, se contentou em jogar duas vezes pela Coppa Italia.

Pagotto deixou o Piemonte após uma temporada e teve passagens pouco relevantes por Grosseto, na Serie C1, e Crotone, na B. Sua estadia na Calábria, aliás, foi de menos de seis meses. E acabou interrompida após outro gancho por doping – agora de oito anos, pela reincidência. Desta vez houve mea culpa por parte do goleiro: “Eu tinha cheirado mais de dez dias antes, sem considerar as consequências dessa loucura. Nem pensei nisso enquanto enchia o tubo de ensaio”, afirmou a Gianluca Di Marzio.

Com a suspensão, Pagotto abandonou o futebol de forma permanente, aos 34 anos. Ele deixou a Itália e buscou uma nova vida na Alemanha, onde atuou como cozinheiro e pizzaiolo. Em 2018, foi trabalhar em Prato, na Toscana, após sua irmã lhe conseguir emprego como encarregado de armazém numa fábrica têxtil. Mas a paixão pelo futebol nunca deixou de existir e ele pode voltar a cultivá-la de perto. À beira da falência, a Lucchese lhe ofereceu um cargo de preparador de goleiros sem remuneração. Angelo concordou e ficou lá durante três meses, até acertar um acordo para fazer parte da comissão técnica fixa do Avellino. Em 2024, trocou o clube do sul da Itália e voltou a Prato, mas para trabalhar no time homônimo da cidade.

Angelo Pagotto
Nascimento: 21 de novembro de 1973, em Verbania, Itália
Posição: goleiro
Clubes: Napoli (1993-94), Pistoiese (1994-95), Sampdoria (1995-96), Milan (1996-97), Empoli (1997), Perugia (1997-99 e 1999-2000), Reggiana (1999), Triestina (2001-03), Arezzo (2003-05), Torino (2005-06), Grosseto (2006-07) e Crotone (2007)
Títulos: Euro Sub-21 (1996), Serie C1 (2004) e Supercopa da Serie C (2004)

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