Um garoto promissor com a bola nos pés, mas totalmente pirado longe dos gramados. Este é um breve resumo da curta carreira de Andy van der Meyde. O ponta-direita holandês despontou em um dos ambientes mais propícios para jogadores talentosos na Europa, o Ajax, mas viveu ao limite após deixar Amsterdã e se perdeu no futebol. A passagem de dois anos anos pela Inter foi o começo do fim para o atleta, que se afundou no álcool e em outras drogas, compulsão sexual e problemas pessoais. Ele ganhou o apelido de The Dutch Sniper (O Atirador Holandês) devido à sua icônica comemoração segurando uma arma imaginária.
Natural de Arnhem, cidade localizada na parte oriental da Holanda, Van der Meyde cresceu nas divisões de base do Ajax. Chegou ao clube na década de 1990 e, como todo jovem promissor, estreou rápido no profissional: aos 18 anos, entrou nos últimos minutos da vitória magra por 1 a 0 sobre o Twente, em novembro de 1997, em casa. Ao final daquela temporada, conquistou seus dois primeiros títulos: Eredivisie e Copa da Holanda.
Na campanha de 1999-2000, o Ajax decidiu emprestar Van der Meyde ao Twente para fazê-lo ganhar experiência. Deu certo. O atacante se tornou titular absoluto do time, ajudando-o a terminar o Campeonato Holandês na sexta posição. Encerrado o período de empréstimo, retornou à equipe de Amsterdã, onde deslancharia de vez. Com o número 7 às costas, contribuiu para as conquistas de mais uma Eredivise, duas Copas da Holanda e uma Supercopa da Holanda.
No Ajax de Ronald Koeman, o jogador foi contemporâneo de atletas que viriam a ser estrelas do futebol mundial: Zlatan Ibrahimovic, Wesley Sneijder e Rafael van der Vaart, além dos conhecidos Cristian Chivu, Steven Pienaar e Mido. Inclusive, há uma anedota peculiar envolvendo Ibra e Andy. “Eu costumava sentar ao lado do Zlatan no ônibus quando estávamos no Ajax. Uma vez, com ele dormindo, o beijei na boca. Alguns segundos depois, fui alvo de alguns socos”, revelou, em entrevista ao programa VTBL, da TV holandesa.
Van der Meyde atravessou a melhor fase de sua carreira na temporada 2002-03, o que lhe rendeu convocação à seleção holandesa e uma transferência à Inter. No verão europeu de 2003, aos 24 anos, recebeu um conselho de Koeman para não aceitar a proposta do clube de Milão. Na visão do técnico, o ponta-direita ainda não estava pronto para encarar outro estilo de futebol, outra liga, outra cultura. O jovem, no entanto, não deu ouvidos à recomendação do então treinador do Ajax e assinou com os nerazzurri. A diretoria da Beneamata desembolsou 8 milhões de euros para tê-lo no Giuseppe Meazza. Mas, como havia previsto o comandante, Andy dera um passo maior que sua perna. E, por sua vez, o presidente Massimo Moratti fez um dos piores negócios de sua gestão.
Em campo, o momento mais marcante do holandês com a camisa nerazzurra foi um golaço de voleio, após cruzamento de Kily González, contra o Arsenal, no antigo estádio Highbury, em jogo válido pela primeira rodada da Liga dos Campões — naquela campanha, a Beneamata sequer avançou à fase mata-mata. Em seu primeiro ano na Itália, disputou 25 partidas no total, marcou três gols e forneceu três assistências. Ele realmente havia sentido o impacto da mudança para um novo país.
“[Trocar o Ajax pela Inter é como] deixar um negócio de campo para ir a uma multinacional. Tudo extremamente profissional, uma rodada louca de dinheiro, o presidente que, após cada vitória, dava 50 mil euros a cada jogador”, escreveu Andy, em sua biografia “Nessuna pietà” (“Sem piedade”, em tradução do italiano para o português). Fora das quatro linhas, a vida do jogador estava começando degringolar. Ainda em seu livro, o atacante contou uma anedota engraçada durante seu período em San Siro.
“Eu tinha um zoológico no quintal de casa: cavalos, cães, zebras, papagaios, tartarugas. Dyana, a minha primeira esposa, era a verdadeira doente. Por ela, recusei uma transferência para o Monaco: em Monte Carlo só há apartamentos, ela me disse, então onde vamos colocar nossos animais? Uma noite desci até a garagem, no escuro, vi uma silhueta imponente e ouvi sons estranhos. Ela havia comprado um camelo”, revelou o neerlandês.
Embora não tenha emplacado na Inter, Van der Meyde defendeu a seleção da Holanda entre 2002 e 2004, sendo, inclusive, titular na Eurocopa de 2004. Ele não marcou gols, mas deu assistência para o gol de Ruud van Nistelrooy no empate em 1 a 1 com a Alemanha, na estreia do torneio. A Laranja Mecânica avançou às semifinais, caindo diante do anfitrião Portugal. Após a Euro 2004, e com a ascensão de Arjen Robben, Robin van Persie e Van der Vaart, o espaço de Andy acabou limitado, de modo a não ser mais convocado.
Tal qual havia acontecido na seleção holandesa, Van der Meyde perdera espaço também na Inter, dessa vez por causa da contratação de Roberto Mancini como novo treinador da Beneamata, no verão de 2004. Ele ainda permaneceu um ano no clube até deixar a Velha Bota. Foram 54 jogos, quatro gols e nove assistências pelos nerazzurri. Quase todos estes números foram obtidos ante times de menor expressão, mas Andy ainda faturou um título, o da Coppa Italia, nas duas temporadas em que viveu em Milão.
Após a breve passagem por Milão, o ponta-direita viajou à Inglaterra e fechou contrato com o Everton. Em solo inglês, ganharia 37 mil euros semanais para atuar pelos azuis de Liverpool, que optam por comprá-lo mesmo lesionado. No entanto, a mudança de país simbolizou a ruína para o jogador. Ele se afundou em muitas distrações, que tiraram seu foco do futebol.
O holandês teve seu contrato rescindido ao fim da quarta temporada no Everton. A diretoria do clube chegou a um consenso após muitas lesões, problemas pessoais e desentendimentos com o treinador David Moyes. Foram somente 24 jogos em quatro anos a serviço do time inglês. Após deixar os Toffees, Andy permaneceu morando em Liverpool, com um amigo, por mais um ano, enquanto sua esposa e seus filhos retornaram à Holanda. Nesse momento, o jogador caiu em ruína completamente, abusando de bebidas, jogos de azar e drogas — cocaína entre elas.
Após uma conversa com seu agente, Van der Meyde retornou ao seu país de origem, em 2010. Firmou vínculo com o PSV Eindhoven, mas sequer chegou a entrar em campo em jogos oficiais. Sua última aventura no futebol foi no time amador WKE, com o qual entrou em campo apenas seis vezes antes de pendurar as chuteiras, aos 33 anos, em 2012. No mesmo ano de sua aposentadoria, lançou sua biografia.
“A certa altura fiquei em segundo atrás de Luís Figo como o melhor extremo da Europa e por vezes penso que desperdicei [talento]. Isso é uma lição e agora quero ajudar outros jogadores a não cometer os mesmos erros que cometi”, ressaltou o ex-ponta, pai de cinco filhos (três com a primeira esposa e dois com a segunda), em entrevista à BBC Radio 5.
Andy van der Meyde
Nascimento: 30 de setembro de 1979, em Arnhem, Holanda
Posição: ponta-direita
Clubes: Ajax (1997-99 e 2000-03), Twente (1999-2000), Inter (2003-05), Everton (2005-09), PSV Eimdhoven (2010) e WKE (2011-12)
Títulos: Eredivise (1998 e 2002), Copa da Holanda (1998, 1999 e 2002), Supercopa da Holanda (2002) e Coppa Italia (2005)
Seleção holandesa: 17 jogos e 1 gol