O vasto e espesso bigode negro no rosto antecipa: Paolo Conti impunha respeito por fugir dos clichês e ter personalidade própria. Jogador sui generis, o romanholo sequer se preparou adequadamente para se tornar um dos maiores goleiros da Roma e, mesmo assim, entrou para a história da agremiação com bela trajetória escrita ao longo da década de 1970.
Conti nasceu em 1º de abril de 1950 e trilhou um caminho tão mirabolante que até poderia parecer de mentira. Filho de proprietários de um hotel da cidade de Riccione, Paolo levava uma vida confortável e parecia pronto para seguir o desejo dos pais: se graduar num curso universitário e assumir os negócios da família. Ele não torcia para time algum e só jogava futebol com os amigos, simplesmente por prazer. Como centroavante.
Em 1968, porém, um dirigente do Riccione, time da comuna, lhe viu jogando uma pelada e perguntou a Paolo se queria assinar um contrato. Como a equipe biancazzurra estava na Serie D, uma divisão amadora, e – após concluir o ensino médio – poderia ganhar uns trocados para se divertir, Conti aceitou. Nos treinamentos, o jovem foi testado como goleiro e permaneceu na posição para sempre, mesmo sem qualquer passagem por categorias de base ou técnica desenvolvida nos campos de terra.
Autodidata, Conti disputou duas temporadas pelo Riccione, na Serie D, e impressionou ao ponto de, em 1970, ser adquirido pelo Modena, da segundona. Paolo foi reserva no início da primeira campanha e logo assumiu o posto de titular dos canarini. Depois do rebaixamento dos emilianos para a terceirona, em 1972, foi adquirido pelo Arezzo, que também estava na B. Absoluto, foi um dos destaques dos amaranto, ao lado do atacante Francesco Graziani, e recebeu uma chance na elite. A Roma, então presidida por Gaetano Anzalone, decidiu contratá-lo para disputar posição com Alberto Ginulfi.
Até aquele momento, o goleiro não se enxergava como profissional: pensava, inclusive, que poderia abandonar o futebol sem qualquer ônus e quando bem compreendesse. Essa despreocupação, segundo ele, era o seu diferencial e fazia com que pudesse render em bom nível. Paolone se sentia apenas “emprestado” ao esporte.
Conti sequer entendia como era possível alguém perder o juízo de amores por um time. Mesmo assim, decidiu assinar com a Loba e, então, entendeu um pouco mais sobre as paixões inerentes ao mundo da bola. “A Roma é um fenômeno de autocombustão”, chegou a dizer sobre a energia dos seus torcedores.
Na Cidade Eterna, após alternar com Ginulfi em seu primeiro ano, Conti recebeu de Nils Liedholm as chaves da baliza em 1974-75. Em campo, Paolone se distinguia pelas mãos enormes e pela coragem de sair do gol com os pés, tanto para participar de jogadas quanto para dividir com os adversários. Por isso, mesmo que as caneleiras fossem opcionais na época, o arqueiro as utilizava para evitar lesões.
Essa característica lhe valia muitos elogios. Para analistas e torcedores, Conti era um goleiro moderno e até “parecia holandês”, já que colocava em prática conceitos inerentes ao totaalvoetbal popularizado pelos Países Baixos. Paolone, na verdade, usava o cacoete dos seus tempos de centroavante no intuito de se antecipar aos adversários e compensar os seus limites oriundos da falta de um trabalho de base.
Para além das características técnicas e do bigode, Conti também era uma espécie de revolucionário pelo que vestia. Numa época em que goleiros praticamente só usavam uniformes pretos ou acinzentados, ele foi um dos primeiros – juntamente a Enrico Albertosi – a envergar camisas amarelas ou laranjas. Por todo o conjunto, as suas exibições iniciais como titular absoluto da Roma causaram frisson.
Em 1974-75, a Roma chegou a brigar pelo scudetto com Juventus (campeã) e Napoli (vice), tendo como ponto forte a sua defesa – a menos vazada da Serie A, com apenas 15 gols sofridos em 30 rodadas. Conti liderava uma retaguarda que ainda tinha Sergio Santarini e Francesco Rocca, ícones romanistas, e entrou em campo em todas as partidas do certame. Naquela temporada, o arqueiro fez a defesa que acredita ter sido a mais marcante de sua carreira: a Loba vencia a Inter por 1 a 0, graças a Pierino Prati, e, nos acréscimos, Paolone voou no canto esquerdo para evitar que Sandro Mazzola anotasse o tento de empate.
Nas quatro temporadas posteriores, a Roma não chegou nem perto de repetir este desempenho – teve somente campanhas medianas com o próprio Liedholm, Gustavo Giagnoni e Ferruccio Valcareggi. Conti, no entanto, prosseguiu atuando em alto nível pela Loba e, em 1977, recebeu a sua primeira chance na seleção italiana: estreou num triunfo por 1 a 0 sobre a Bélgica, em amistoso. No ano seguinte, Paolone foi o reserva imediato de Dino Zoff na Copa do Mundo, disputada na Argentina.
A última partida de Conti pela seleção aconteceu durante a sua derradeira temporada pela Roma. Após jogar a segunda etapa de um amistoso vencido por 1 a 0 sobre a Suécia, no fim de setembro de 1979, Paolo teve alguns atritos com Liedholm, o que levou Franco Tancredi a assumir o posto de titular dos giallorossi. Já no banco de reservas, o bigodudo conseguiu o seu único troféu pelo time capitolino: o da Coppa Italia de 1980.
As rusgas com o treinador se estenderam também às organizadas e, no verão de 1980, o divórcio entre o goleiro e a Roma se tornou inevitável. Após 206 jogos pelo time da Cidade Eterna, Conti acertou com o Verona, na Serie B, e viveu uma realidade bem diferente daquela com a qual se acostumara na capital: lutou contra o rebaixamento até o fim do certame.
Em 1981, Conti se transferiu à Sampdoria e ajudou o time a ser promovido à primeira divisão, embora problemas físicos tenham atrapalhado a sua sequência de jogos, inclusive na elite. Depois do biênio pela equipe blucerchiata, Paolone se despediu de Gênova e rumou ao Bari, que disputava a terceirona. Aos 34 anos, teve a sua derradeira experiência como titular na meta dos galletti e foi um dos nomes mais importantes para a conquista da categoria, em 1984.
Por ainda estar em forma e ser um goleiro bastante seguro, o romanholo acabaria se credenciando para voltar à Serie A, na qualidade de reserva da Fiorentina – pela Viola, seria a alternativa a Giovanni Galli, até 1986, e Marco Landucci, nos dois anos seguintes. O veterano disputou apenas seis partidas em quatro temporadas, todas em 1985-86. As últimas foram nas semifinais da Coppa Italia, contra a Roma (2 a 0 para os giallorossi no Olímpico e 1 a 1 em Florença). A Loba se sagraria campeã do torneio.
Depois de encerrar a carreira, aos 38 anos, Conti jura que nunca mais vestiu as luvas para ser goleiro. Ou mesmo os calções para bater uma bolinha entre amigos, sendo centroavante. “Não guardo vídeos ou fotos dos meus tempos como jogador. É uma etapa superada: joguei, me diverti e, pronto, aqui estou”, contou o ex-atleta ao jornalista Luca Prosperi, do diário La Repubblica. Apesar disso, Paolo não abandonou o esporte por completo, já que se tornou procurador de atletas.
Paolo Conti
Nascimento: 1º de abril de 1950, em Riccione, Itália
Posição: goleiro
Clubes: Riccione (1968-70), Modena (1970-72), Arezzo (1972-73), Roma (1973-80), Verona (1980-81), Sampdoria (1981-83), Bari (1983-84) e Fiorentina (1984-88)
Títulos: Coppa Italia (1980) e Serie C1 (1984)
Seleção italiana: 7 jogos e 6 gols sofridos